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Metabolismo Secundário Vegetal

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24 Biotecnologia CiŒncia & Desenvolvimento
Engenharia do
METABOLISMO SECUND`RIOPESQUISA
Otimizaçªo da produçªo de metabólitos secundÆrios em culturas de cØlulas vegetais
Marcelo Maraschin
Laboratório de MorfogŒnese e Bioquímica Vegetal,
Departamento de Fitotecnia, Universidade Federal de Santa
Catarina – Florianópolis/SC.
m2@cca.ufsc.br
Robert Verpoorte
 Division of Pharmacognosy, Leiden/Amsterdam Center for
Drug Research, Leiden University, Leiden, The Netherlands.
verpoort@lacdr.leidenuniv.nl
Foto cedida pelos autores
esde os tempos antigos as
plantas vŒm sendo utiliza-
das nas sociedades huma-
nas com propósitos tera-
pŒuticos, sendo que suas
propriedades tóxicas ou curativas foram
descobertas pelo homem principalmen-
te enquanto este buscava por alimento.
De fato, o conhecimento etnobotânico-
farmacológico acumulado ao longo de
geraçıes tem servido como base para o
desenvolvimento de fÆrmacos
de grande importância, tais
como : digoxina, quinina, mor-
fina, hiosciamina, Æcido salicí-
lico e artemisina. Neste con-
texto, os metabólitos secundÆ-
rios vegetais apresentam um
grande valor do ponto de vista
social e econômico e, como
exemplo, na dØcada de 80 fo-
ram identificados 121 compos-
tos de origem vegetal, prove-
nientes de 95 espØcies, os quais
tŒm sido usualmente emprega-
dos como terapŒuticos nos pa-
íses ocidentais. AlØm disso, do
total de medicamentos aprova-
dos no período 1983-1994, 6%
sªo obtidos diretamente de es-
pØcies vegetais, sendo deno-
minados produtos naturais, 24%
sªo compostos derivados e 9%
foram desenvolvidos a partir de com-
postos vegetais cuja estrutura molecular
serviu como unidade precursora em
processos de síntese.
Do ponto de vista econômico, pode-
se mencionar os alcalóides indólicos
terpenoídicos vincristina (utilizado no
tratamento de leucemia) e vinblastina
(usado na terapia de corio-carcinomas e
na doença de Hodgkin’s) de Catharan-
thus roseus, os quais tŒm seus valores de
mercado estimados em US$ 6.000 e
12.000/g, respectivamente. Todavia, alØm
do alto valor agregado que algumas
drogas de origem vegetal apresentam,
esta Ærea demonstra um grande potenci-
al no que concerne ao desenvolvimento
de novos medicamentos, uma vez que a
diversidade química associada à diversi-
dade biológica encontrada em ecossiste-
mas terrestres e aquÆticos, Ø um impor-
tante aspecto a ser considerado em
processos e diretrizes de desenvolvi-
mento de novos biofÆrmacos. Como
estimativa, cerca de 110.000 compostos
tŒm sido identificados atØ o presente,
sendo que deste total, os terpenóides
constituem o maior grupo [~ 33.000
compostos], seguidos pelos alcalóides
[~16.000 compostos] (1). Anualmente,
4000 novos compostos de origem vege-
tal tŒm sido relatados, com uma tendŒn-
cia de crescimento para este valor. Como
característica geral, tais compostos mos-
tram um padrªo de ocorrŒncia restrito a
alguns grupos taxonômicos, nªo sendo
considerados essenciais ao metabolismo
basal da cØlula vegetal, donde surge a
denominaçªo metabólitos secundÆrios.
No âmbito da interaçªo planta/ambiente
(efeito atrativo/repulsivo a microrganis-
mos, insetos, vertebrados, plantas, etc.),
desempenham um importante papel,
garantindo a sobrevivŒncia das espØcies
no ecossistema. Adicionalmente, meta-
bólitos secundÆrios sªo utilizados em
escala industrial para a pro-
duçªo de inseticidas, coran-
tes, flavorizantes, aromatizan-
tes e medicamentos. Exem-
plos de metabólitos secundÆ-
rios de grande importância
na indœstria farmacŒutica sªo
mostrados na Figura 1. A des-
peito do alto valor econômi-
co de alguns destes biofÆrma-
cos, baixos níveis de produti-
vidade tŒm sido usualmente
encontrados nos sistemas de
produçªo agrícola convenci-
onais, decorrentes de uma
sØrie de motivos. Tal fato gera
a necessidade de desenvol-
ver sistemas alternativos de
produçªo e, neste contexto, o
cultivo de cØlulas e tecidos
vegetais tem sido considera-
do como um sistema de alto
potencial para a superaçªo desse pro-
blema, embora algumas dificuldades con-
cernentes à sua viabilidade econômica
ainda nªo tenham sido superadas.
Em funçªo disso, diversas estratØgias
tŒm sido empregadas objetivando au-
mentar os valores de produtividade de
compostos bioativos em sistemas de
cultura de cØlulas e tecidos vegetais,
incluindo a manipulaçªo epigenØtica, a
elucidaçªo de vias biossintØticas e a
aplicaçªo de tØcnicas de biologia mole-
Ajmalicina Quinina
Morfina Taxol
Figura 1: Estrutura molecular de metabólitos secundÆ-
rios vegetais utilizados como biofÆrmacos
Biotecnologia CiŒncia & Desenvolvimento 25
cular, segundo uma abordagem de en-
genharia de vias metabólicas. O presen-
te artigo enfoca algumas estratØgias fre-
quentemente adotadas quando se busca
a otimizaçªo da produçªo de metabóli-
tos secundÆrios em sistemas de culturas
de cØlulas vegetais.
Manipulaçªo epigenØtica
Provavelmente, a primeira estratØgia
utilizada para otimizar a produçªo de
metabólitos secundÆrios em cultivos ce-
lulares vegetais foi a manipulaçªo epige-
nØtica. Tal estratØgia considera a identi-
ficaçªo e seleçªo de linhagens celulares
de maior potencial produtivo, otimiza-
çªo do meio de cultura, manipulaçªo de
fatores de ambiente (intensidade lumi-
nosa, fotoperíodo, temperatura, CO
2
,
O
2
, e.g.), a influŒncia do nível de dife-
renciaçªo celular, a adiçªo de inibidores
ou precursores ao meio de cultura e a
elicitaçªo.
Identificaçªo, seleçªo clonal e otimi-
zaçªo do meio de cultura: Ao longo das
œltimas dØcadas, vÆrios relatos tŒm sido
feitos na literatura mostrando incremen-
tos na produçªo de metabólitos secun-
dÆrios atravØs da identificaçªo e seleçªo
de linhagens celulares com maior poten-
cial de biossíntese/acœmulo de metabó-
litos secundÆrios. A seleçªo de clones
celulares pode ser feita atravØs da adiçªo
de compostos tóxicos (Æcido nicotínico,
e.g.) ou seletivos ao meio de cultura, os
quais atuam de modo a permitir apenas
a sobrevivŒncia de cØlulas com maior
capacidade de metabolizaçªo do inter-
mediÆrio, ou ainda atravØs de alteraçıes
nos fatores ambientais. Todavia, com
relativa frequŒncia e de modo espontâ-
neo, observa-se a expressªo de variaçªo
genØtica em linhagens selecionadas, de
modo que o potencial de biossíntese
do(s) composto(s) de interesse Ø uma
característica instÆvel. As razıes que
determinam tal fato nªo sªo claramente
conhecidas atØ o presente momento. A
hipótese baseada na variaçªo genØtica e
seleçªo celular (2) tem sido proposta
com o intuito de explicar a heterogenei-
dade/instabilidade observada em cultu-
ras de cØlulas vegetais quanto à produ-
çªo de metabólitos secundÆrios. Bus-
cando superar tal problema, a identifica-
çªo de clones de maior produtividade
tem sido feita atravØs do cultivo de
protoplastos (single cell), ou de peque-
nos agregados celulares (cell nursery
culture) em programas de longa dura-
çªo. Os resultados indicam que para
algumas espØcies esta abordagem possi-
bilitou a obtençªo de linhagens com alto
potencial produtivo e estÆveis, como no
caso de berberina e antocianina em
cultivos celulares de Coptis, Thalictrum
e Euphorbia, respectivamente. A supe-
raçªo da instabilidade neste sistema Ø
atribuída à reduçªo da heterogeneidade
genØtica nos cultivos ao longo dos su-
cessivos subcultivos. A otimizaçªo da
composiçªo do meio de cultura se mos-
tra como uma estratØgia efetiva para a
obtençªo de incrementos de produtivi-
dade de metabólitos secundÆrios in vi-
tro. A literatura disponível ilustra este
aspecto enfocando a utilizaçªo de cons-
tituintes de natureza orgânica ou inorgâ-
nica. Contudo, um meio de cultura que
ofereça condiçıes ótimas ao incremento
da biomassa celular Ø, via de regra,
antagônico à síntese do(s) composto(s)
de interesse. Em funçªo disto, o estabe-
lecimento de um meio de cultura ade-
quado simultaneamente aocrescimento
celular e à produçªo Ø bastante difícil.
Um sistema de produçªo envolvendo
dois estÆgios tem sido proposto (3)
como estratØgia para superar a condiçªo
de antagonismo entre o crescimento
celular/biossíntese metabólitos secun-
dÆrios. Este sistema consiste no cultivo
celular em meio de
crescimento,inicialmente, de modo a fa-
vorecer o mÆximo acœmulo de biomas-
sa, seguido pela transferŒncia para o
meio de produçªo, onde a biossíntese
do(s) metabólito(s) de interesse Ø favo-
recida. Incrementos de produtividade
de 84% e 47% para o triterpenóide
velutinol A e seu derivado glicosilado
MV8612 foram obtidos em cultivos celu-
lares de Mandevilla velutina (4) com a
utilizaçªo deste sistema. Entretanto, como
regra geral, esta abordagem somente
funciona se um nível basal do composto
de interesse estiver presente no cultivo
celular. Se as cØlulas nªo sintetizam o
composto, como no caso de morfina,
hiosciamina e vinblastina, tal estratØgia,
de fato, nªo poderÆ ser utilizada.
Adiçªo de precursores : Em diversos
cultivos celulares a produçªo de meta-
bólitos secundÆrios pode ser positiva-
mente afetada pela adiçªo de intermedi-
Ærios da via biossintØtica. Como exem-
plo disto, culturas de cØlulas de Catha-
ranthus roseus suplementadas com se-
cologanina mostraram elevaçªo nos teo-
res de estrictosidina, o precursor comum
na biossíntese de alcalóides indólicos
monoterpenoídicos (5). Resultados si-
milares foram encontrados com a adiçªo
de L-Triptofano, com uma resposta tem-
po-dependente, enquanto a produçªo
de ajmalicina nªo foi afetada. É interes-
sante mencionar trŒs aspectos bÆsicos
ao se considerar esta metodologia como
estratØgia para a obtençªo de incremen-
Figura 2. Estruturas de fitoanticipi-
nas constitutivas encontradas em
cØlulas de (a) Sorghum bicolor e (b)
Cicer arietinum. As antocianinas
pelargonidina e cianidina tŒm açªo
protetora contra radiaçªo UV, en-
quanto as isoflavonas formononetina
(FGM) e biochanina A (BGM) sªo
inibidores de infecçªo fœngica (Lo &
Nicholson, 1998 e Barz & Macken-
brock, 1994)
(A)
(B)
Figura 3. Estrutura química de fito-
alexinas produzidas por cØlulas de
(a) Brassica, (b) Oryza e (c) Cole-
ostephus como resposta à infecçªo
por microrganismos (Keen, 1990).
(A) Brassilexina
(B) Orizalexina A
(C) Micosinol
26 Biotecnologia CiŒncia & Desenvolvimento
tos de produtividade de metabólitos de
interesse: a) a concentraçªo do substra-
to; b) o metabólito de interesse Ø (ou
nªo) um produto final da via biossintØ-
tica; c) a capacidade celular de acœmulo
do composto. No primeiro caso, a adi-
çªo de precursor(es) pode induzir au-
mentos de produçªo do composto bio-
ativo, na medida em que permite supe-
rar a pequena disponibilidade de subs-
trato no meio de reaçªo, especialmente
quando a arquitetura da via biossintØtica
Ø linear, como no caso da maioria das
vias de biossíntese de metabólitos se-
cundÆrios conhecidas. Em segundo lu-
gar, se o metabólito alvo nªo Ø um
produto final da via biossintØtica, a taxa
de seu catabolismo pode tornar inefetiva
a adiçªo de precursor(es). Neste contex-
to, tem sido demonstrado que a taxa de
síntese e de degradaçªo de ajmalicina
sªo similares em culturas celulares de
Catharanthus roseus, de modo que nªo
foi observado acœmulo deste alcalóide
em cultivos suplementados com precur-
sor. A curta meia-vida de compostos na
planta, como observado para nicotina
(22 horas) e morfina (7,5 horas) reforça
a importância deste aspecto. A capacida-
de celular de acœmulo de metabólitos
secundÆrios nªo tem sido estudada em
profundidade atØ o presente momento.
Contudo, Ø esperado haver um limite de
acœmulo destes compostos, o que influ-
encia a produtividade dos cultivos. Como
exemplo, a produçªo de antocianinas
em cultivos celulares de Catharanthus
roseus Ø dependente da percentagem de
cØlulas produtoras, quando todas as cØ-
lulas tŒm similar conteœdo daquele com-
posto.
CØlulas diferenciadas: Como regra
geral, em plantas hÆ uma grande corre-
laçªo entre citodiferenciaçªo e metabo-
lismo secundÆrio, Um aumento de 4-6
vezes no teor de alcalóides (voafilina,
aparicina, and 3S-hidroxi-voacangina),
concomitante a um incremento no nível
de diferenciaçªo celular foi observado
em culturas celulares de Tabernaemon-
tana pandacaqui (6). A ocorrŒncia de
estruturas compacto-globulares (agre-
gados celulares exibindo um alto grau
de diferenciaçªo) foi observada em cul-
tivos de Tabernaemontana and Cincho-
na, os quais produziram quantidades
bastante superiores dos alcalóides aspi-
dospermatanos valesamina e O-acetilva-
lesamina e de quinina, respectivamente,
em relaçªo ao controle. Ao longo da
œltima dØcada, o cultivo de meristemas e
raízes recebeu grande atençªo quanto
ao seu potencial como sistema produtor
de compostos bioativos. Os resultados
tŒm demonstrado valores de produtivi-
dade nos cultivos semelhantes aqueles
observados na planta ex vitro, ou mesmo
valores mais elevados, via manipulaçªo
epigenØtica. Uma metodologia que tem
despertado grande interesse neste con-
texto Ø a transformaçªo genØtica de
plantas com Agrobacterium rhizogenes,
uma bactØria de solo capaz de infectar
cØlulas vegetais, causando a prolifera-
çªo do crescimento radicular (hairy roots).
O cultivo de raízes (ou pŒlos radicula-
res) transformados pode ser realizado
em meio de cultura desprovido de regu-
ladores de crescimento, apresentando
estabilidade genØtica e bioquímica, e
produçªo similar àquela observada em
raízes nªo-transformadas (3). No entan-
to, este sistema requer a utilizaçªo de
biorreatores com características específi-
cas (biorreatores com nebulizaçªo, e.g.),
dificultando a produçªo de biomassa em
larga escala, com um consequente au-
mento nos custos de produçªo.
Elicitaçªo : Elicitores bióticos sªo
compostos que induzem respostas de
defesa em cØlulas vegetais contra infec-
çıes microbianas, em particular a pro-
duçªo de fitoalexinas, ou ainda induzem
aumentos no nível de fitoanticipinas
constitutivas (Fig. 2) Fitoalexinas sªo
compostos com atividade antibiótica, de
baixo peso molecular, formados e acu-
mulados em cØlulas vegetais em respos-
ta à infecçıes por microrganismos (Fig.
3). Elicitores de natureza abiótica (radi-
açªo UV e íons de metais pesados)
tambØm tŒm sido utilizados neste con-
texto. Este princípio tem sido aplicado
em estudos de biossíntese de fitoalexi-
nas, como tambØm para aumentar a
produtividade de metabólitos secundÆ-
rios em cultivos celulares vegetais. Em
geral, a elicitaçªo de uma cultura celular
resulta na síntese de novo de compostos,
algumas vezes nªo encontrados na plan-
ta intacta (dihidropiranocumarina, e.g.),
ou no aumento da produçªo de metabó-
litos secundÆrios nos cultivos in vitro
(antraquinonas, e.g.). Todavia, a eficiŒn-
cia do tratamento com um dado elicitor,
no que concerne à induçªo de produti-
vidade de um composto, depende de
vÆrios fatores, sendo a resposta de indu-
çªo restrita a certas vias biossintØticas.
Em funçªo disto, a escolha correta do
elicitor Ø fundamental, nªo havendo
regras indicadoras de uma combinaçªo
adequada para o sistema cØlula/elicitor.
AlØm disto, a concentraçªo do elicitor, a
densidade de inóculo, o momento de
adiçªo do elicitor, o período de contato
entre as cØlulas e o agente de elicitaçªo
e o teor de nutrientes do meio de cultura
sªo fatores importantes a se considerar,
quando se busca a otimizaçªo da produ-
çªo de biofÆrmacos atravØs desta abor-
dagem. Na prÆtica, poli/oligossacaríde-
os (oligossacarinas – Fig. 4) de parede
celular de plantas ou microrganismos,
enzimas (celulases, hemicelulases e pec-
tinases, e.g.), peptídeos, glicopeptídeos
e lipídios tŒm sido usados como elicito-
res. Da mesma forma, compostos sinali-
zadores envolvidos em vias de transdu-
çªo, como o Æcido jasmônico e seu metil
Øster, ou ainda o ergosterol (Fig. 5)
podem induzir respostasde estresse
celular, levando ao aumento da síntese/
acœmulo de metabólitos secundÆrios.
Provavelmente, cada espØcie vegetal tem
uma classe de compostos que sªo sinte-
tizados após o estímulo causado pelo
Figura 4. Estrutura de oligossaca-
rídeos elicitores isolados de pare-
de celular de (a) plantas e fungos
(b, c, e d). O grau de polimeriza-
çªo (n) varia de 11 a 14 (Hahn et
al., 1992)
(A)
(B)
Figura 5. Aspectos estruturais de
molØculas sinalizadoras em cØlulas
vegetais: [A] ergosterol e [B] Æcido
jasmônico (R = H), ou seu metil
Øster (metil jasmonato, R = CH
3
)
Biotecnologia CiŒncia & Desenvolvimento 27
elicitor, os quais nªo sªo
encontrados na planta na
ausŒncia deste estímulo. As-
sim, muitos compostos de
interesse, constitutivamen-
te formados na planta, nªo
sªo passíveis de induçªo
por elicitores em cultivos
celulares, como observado
para quinina, morfina e vin-
blastina. Por outro lado,
compostos outros como
Æcidos fenólicos (Catharan-
thus roseus), triterpenos
(Tabernaemontana divari-
cata), velutinol A e seu
derivado glicosilado (Man-
devilla velutina – Fig. 6)
tiveram suas concentraçıes
aumentadas em culturas de
cØlulas. Metabólitos cuja bi-
ossíntese Ø induzida sªo
usualmente produzidos em
altos níveis, podendo al-
cançar valores de 3 a 10%,
com base em peso seco. A
utilizaçªo desta estratØgia
possibilita a induçªo de in-
cremento de produtivida-
de em momento específico
do processo produtivo. No
entanto, o maior problema verificado atØ
o presente momento reside no nœmero
limitado de compostos que tem sua
biossíntese aumentada, os quais, em
alguns casos, nªo sªo o produto final de
interesse.
Engenharia Metabólica
A introduçªo de genes em plantas ou
cØlulas vegetais atravØs de tØcnicas de
engenharia genØtica (sistema Agrobac-
terium e o bombardeamento com partí-
culas metÆlicas coloidais, e.g.) permite a
alteraçªo da expressªo de genes envol-
vidos em vias biossintØticas de interesse
e assim modificar a produçªo de meta-
bólitos secundÆrios. Agrobacterium tu-
mefaciens tem sido amplamente utiliza-
da para a transformaçªo de plantas,
apresentando como maior restriçªo o
nœmero limitado de hospedeiros, princi-
palmente dicotiledôneas, ainda que nem
todas as espØcies deste grupo. O bom-
bardeamento com partículas Ø, em prin-
cípio, aplicÆvel a qualquer espØcie, mas
ainda que a transformaçªo seja viÆvel, a
regeneraçªo da planta a partir da cØlula
transformada tem se mostrado uma tare-
fa difícil. AlØm disso, a reduzida disponi-
bilidade de genes e promotores especí-
ficos ao objetivo em tela, o pouco co-
nhecimento sobre a estabilidade genØti-
ca de cØlulas transformadas e tambØm
sobre os mecanismos de regulaçªo de
vias biossintØticas de metabólitos secun-
dÆrios sªo fatores limitantes nesta abor-
dagem. Entretanto, os progressos que
tŒm sido alcançados na tecnologia gŒni-
ca permitirªo um aumento no nœmero
de genes clonados, bem como um maior
entendimento das vias biossintØticas em
seus aspectos estruturais e regulatórios,
de modo que perspectivas interessantes
de aplicaçªo da engenharia metabólica
surgem no que se refere à otimizaçªo da
produçªo de compostos de interesse.
Num contexto mais amplo, a engenharia
metabólica objetiva o incremento do
fluxo de carbono em direçªo ao produto
final de interesse. Neste sentido, diver-
sas estratØgias tŒm sido utilizadas bus-
cando superar o(s) evento(s) limitante(s),
bloqueando vias metabólicas competiti-
vas ou do catabolismo pela utilizaçªo de
genes com transcriçªo no sentido inver-
so (anti-sense), ou ainda pelo uso de
anticorpos. O aumento da atividade de
uma determinada enzima poderÆ ser
conseguido com a clonagem de seu(s)
gene(s), o(s) qual(is)
poderÆ(ªo) ser oriundo(s)
da planta em si, de outra
espØcie vegetal, ou ainda
de outro organismo (bactØ-
ria, e.g.). Independente do
objetivo, a engenharia me-
tabólica tem como pressu-
posto bÆsico o conhecimen-
to de todos os passos cons-
tituintes da via biossintØtica
do metabólito de interesse,
aspecto que limita a aplica-
çªo desta abordagem, visto
que a maioria destas vias
sªo conhecidas apenas a
nível de seus intermediÆri-
os. Com o conhecimento
da via biossintØtica a nível
dos intermediÆrios envolvi-
dos, o passo seguinte Ø a
identificaçªo das enzimas
envolvidas e a determina-
çªo de quais destas apre-
sentam funçªo regulatória.
AlØm disto, Ø importante
considerar outros aspectos
intrínsecos ao processo de
síntese, como a arquitetura
da via biossintØtica, a exis-
tŒncia de etapas regulatóri-
as, o transporte do produto final e a
compartimentalizaçªo. A arquitetura da
via biossintØtica poderÆ ser linear, ou
mesmo apresentar-se como uma rede
complexa. No primeiro caso, a situaçªo
Ø mais simples no que concerne à sua
manipulaçªo, contudo, em sendo o per-
fil da via biossintØtica uma rede comple-
xa de etapas (terpenóides, e.g.), a pos-
sibilidade de manipulaçªo no contexto
da engenharia metabólica Ø tarefa que
encontrarÆ maior grau de dificuldade. A
existŒncia de mecanismos de regulaçªo
a nível enzimÆtico Ø bastante comum
(retro-inibiçªo), como observado na bi-
ossíntese de triptofano em culturas de
cØlulas de C. roseus. Nesta via, a super-
expressªo da antranilato sintetase (AS)
nªo apresentou efeito positivo, porque a
mesma Ø inibida pelo produto final da
via biossintØtica (7). Adicionalmente, Ø
importante considerar o efeito que a
compartimentalizaçªo exerce sobre a
biossíntese de metabólitos secundÆrios,
indicando que o transporte do produto
final e/ou de intermediÆrios da via bios-
sintØtica atuam como agentes de regula-
çªo desta. A biossíntese de alcalóides
indólicos terpenoídicos requer no míni-
mo trŒs compartimentos : os plastídios
[produçªo de triptofano e a porçªo ter-
penoídica do produto final], o citosol
[descarboxilaçªo do triptofano] e o va-
⇒ Velutinol A [(15R, 16R, 20S)-14,16:15,20:16,21-triepoxi-15-16-
seco-14β,17α-pregn-5-ene-3β,15-diol] (Bento et al., 1995).
Figura 6. Mandevilla velutina
(Apocynaceae), planta nativa de
ecossistemas de restinga e
cerrado no Brasil, fonte de
velutinol A, um antagonista de
bradicinina (BK)
28 Biotecnologia CiŒncia & Desenvolvimento
cœolo [ligaçªo entre triptamina e secolo-
ganina] (8). A clonagem de genes de
plantas relacionados à vias biossintØticas
foi primeiramente realizada, em escala
comercial, com o intuito de alterar a
coloraçªo de flores. Outra aplicaçªo diz
respeito à introduçªo do gene tdc (trip-
tamina descarboxilase) em plantas de
tabaco, resultando no aumento da pro-
duçªo de triptamina em níveis que atin-
gem 1% com base em peso seco. No
entanto, a instabilidade dos cultivos ce-
lulares transgŒnicos em relaçªo à produ-
çªo de metabólitos secundÆrios tŒm sido
mais recentemente observada, ainda que
estes apresentem níveis superiores de
expressªo do produto gŒnico (enzima).
Por outro lado, alguns estudos tŒm de-
monstrado que a despeito da expressªo
de estabilidade de clones celulares
transgŒnicos, o fluxo total atravØs da
via biossintØtica de alcalóides indóli-
cos apresenta um comportamento
de instabilidade, como observado
em linhagens selvagens de C. roseus.
Outra importante e óbvia conclusªo
refere-se ao fato de que a superaçªo
de uma etapa limitante da via bios-
sintØtica remete, automaticamente,
ao encontro da próxima etapa com
esta característica.
Conclusıes
Muitos metabólitos secundÆ-
rios de grande importância econômi-
ca sªo produzidos em quantidades
muito baixas, ou ainda nªo sªo pro-
duzidos (e.g. morfina, vinblastina,
vincristina) em cultivos de cØlulas
vegetais atØ o presente momento.
Em decorrŒncia disto, somente uns
poucos produtos gerados a partir
desta tecnologia alcançaram uma
escala comercial (e.g. chiconina e
misturas de polissacarídeos). A produ-
çªo industrial de biofÆrmacos a partir da
biotecnologia vegetal sugere à anÆlise
duasquestıes bÆsicas : a) a viabilidade
da tecnologia disponível b) a competiti-
vidade econômica desta tecnologia em
relaçªo aos mØtodos de produçªo exis-
tentes. Em muitos casos, a tecnologia
disponível se mostra viÆvel, ainda que
cÆlculos do custo de produçªo indiquem
a necessidade de incrementos de produ-
tividade, para que tais processos sejam
adequados do ponto de vista econômi-
co. As razıes que concorrem para este
quadro sªo o alto investimento necessÆ-
rio, principalmente devido ao custo de
depreciaçªo do biorreator e tambØm a
baixa produtividade de metabólitos se-
cundÆrios dos cultivos celulares, como
discutido anteriormente. Na tentativa de
superar essas dificuldades, estratØgias
para otimizar a produçªo in vitro de
compostos bioativos tŒm sido continua-
mente desenvolvidas e revistas, com
resultados promissores, sendo que para
o atual momento, maior atençªo vem
sendo dada à utilizaçªo combinada das
abordagens anteriormente discutidas. Os
avanços em estudos de engenharia me-
tabólica permitirªo incrementos de pro-
dutividade de metabólitos secundÆrios
nos cultivos in vitro, contribuindo para a
reduçªo dos custos de produçªo, ou
mesmo viabilizando a produçªo de no-
vos compostos. É importante considerar
que nos casos em que a produçªo de um
biofÆrmaco nªo Ø possível por mØtodos
agrícolas convencionais ou químicos, ou
mesmo quando sua demanda nªo Ø
totalmente suprida, a biotecnologia ve-
getal poderÆ ser o sistema final de pro-
duçªo.
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Figura 7. Exemplos de mecanismos
de regulaçªo de vias biossintØticas
considerados na engenharia de
metabolismo secundÆrio. A concen-
traçªo do produto final (PF) Ø de-
pendente de alguns fatores: a) nível
de inibiçªo da atividade enzimÆtica
pelo produto (retro-inibiçªo
A⇒E1); b) disponibilidade do subs-
trato (B) em via nªo linear; 
c
) trans-
porte e compartimentalizaçªo. A
engenharia metabólica requer a
identificaçªo de todos os constituin-
tes da via biossintØtica (intermediÆ-
rios e enzimas - E
1
→→→→→E
7
)

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