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nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 1� Capítulo 6 Consenso e índices numéricos Árvores de Consenso Em certas circunstâncias é necessário combinar duas ou mais árvores em uma única configuração que sintetize a informação original. A necessidade deste procedimento pode advir de várias razões. Ocasionalmente pode haver duas hipóteses de autores diferentes que sejam temporariamente consideradas plausíveis. Também pode ser necessário combinar hipóteses advindas de dados de natureza diferentes (e.g. dados moleculares e morfológicos) ou de diferentes tratamentos dos mesmos dados. Entretanto, a mais freqüente utilização de árvores de consenso acontece quando existe mais de uma árvore mais parcimoniosa para a mesma matriz. Neste caso pode ocorrer a necessidade de se combinar centenas ou até milhares de árvores diferentes. A idéia geral que guia a utilização dos consensos é que o grau de concordância encontrado entre as várias árvores a serem combinadas é um indicador do grau de confiança que pode ser depositado em grupos específicos. Os grupos considerados mais “sólidos” são incluídos na árvore de consenso, enquanto que aqueles considerados duvidosos são omitidos. Árvores de consenso, portanto, funcionam como um procedimento para avaliar grupos quando na presença de hipóteses não-idênticas. Para além deste ponto em comum, existem vários tipos diferentes de árvores de consenso, de acordo com o critério utilizado para avaliar graus de concordância ou discordância entre os cladogramas fundamentais. Consenso Estrito Figura 6.1. A-D. Quatro topologias igualmente parcimoniosas (árvores fundamentais) e seus componentes. O tipo mais simples de consenso é o chamado consenso estrito, originalmente proposto por Sokal & Rohlf (1981). Conforme o nome indica, este tipo de consenso é o mais restritivo em termos de tolerância a hipóteses contraditórias. O consenso estrito considera como aceitáveis apenas aqueles componentes (descendentes de um nó) que estejam presentes em todas as árvores a serem combinadas. Considere o exemplo na Figura nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 2� 6.1A-D. Temos aqui quatro árvores a serem combinadas. Se enumerarmos todos os grupos monofiléticos, ou seja seus componentes, de cada uma delas, teremos aqueles representados em notação parentética abaixo de sua respectiva árvore. Comparando os grupos, vemos que três deles (ABCDEF), (AB) e (DEF) ocorrem nas quatro árvores. Um consenso estrito, portanto, irá ter representados apenas aqueles três grupos, e nenhum mais, conforme mostrado na Figura 6.2. Se, por outro lado, tivermos as três árvores representadas na Figura 6.3A-C, constatamos que o único grupo comum a todas é (ABCDE), ou seja, o grupo inteiro (Figura 6.3D). Neste caso, o consenso estrito terá apenas aquele grupo representado, todos os outros serão colapsados em politomias. Figura 6.2. Consenso estrito baseado nos cladogramas fundamentais da Figura 6.1. Figura 6.3. A-C. Três topologias igualmente parcimoniosas. D. Consenso estrito baseado nas topologia A-C. Fica claro que a árvore de consenso estrito portanto terá apenas um número de nós igual ao número dos grupos comuns a todas as arvores combinadas (e.g. três no exemplo da Figura 6.3A-C e um no consenso estrito da Figura 6.3A-C). Observe que o consenso estrito é insensível a diferentes freqüências dos grupos nas árvores combinadas. Por exemplo, se tivermos 1000 árvores a combinar, e determinado grupo esteja presente em 999 delas, mas faltando em uma, este grupo não entrará no consenso estrito. Consenso Semi-Estrito O consenso semi-estrito, também chamado consenso de componentes combináveis, só foi formalmente publicado por Bremer (1990), embora já fosse implementado há mais tempo em alguns programas de análise filogenética. O consenso semi-estrito é semelhante ao estrito. A única diferença é que um grupo que não seja contradito em nenhuma árvore é nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 3� incluído no consenso. Para entendermos esse detalhe, temos que revisar alguns aspectos relativos à compatibilidade de grupos e subgrupos. Dois ou mais grupos são compatíveis quando a informação neles contida não é contraditória. Por exemplo, na Figura 6.4A,B podemos dizer que o grupo (BCD) existe nas duas árvores apresentadas. Logo, este grupo seria parte de um consenso estrito nelas baseado. O grupo (CD), por outro lado, só está presente em uma delas (Figura 6.4B). Apesar de não estar presentes nas duas árvores originais, observa-se que o grupo (CD) não é contradito pela da Figura 6.4A, onde não ocorre. A da topologia da Figura 6.4A não está indicando nenhum grupo oposto a (CD), como seriam por exemplo (CB) ou (DB), mas simplesmente não tem nenhuma implicação sobre as relações dentro de (BCD). Pode-se dizer que a árvore da Figura 6.4A nem nega nem afirma o grupo (CD), mas é simplesmente neutra com relação a essa questão. A topologia da Figura 6.4A, portanto, é compatível com o grupo (CD), embora não o corrobore. Vê-se então que grupos compatíveis não são necessariamente idênticos, embora todos os grupos idênticos sejam necessariamente compatíveis. Figura 6.4. A-B. Duas topologias igualmente parcimoniosas. A diferença entre o consenso estrito e o semi-estrito reside neste detalhe. O consenso semi-estrito aceita grupos que estejam presentes em apenas parte das árvores originais, desde que não sejam contraditos em nenhuma delas. Assim sendo, o consenso semi-estrito das duas árvores na Figura 6.4A,B seria aquele visto na Figura 6.4B, ao passo que o consenso estrito seria aquela da Figura 6.4A. Figura 6.5. A-B. Três topologias igualmente parcimoniosas. C. Consenso semi-estrito baseado nas topologia A-B. Um fato interessante acerca do consenso semi-estrito é que em certos casos ele pode ser mais resolvido (ou seja, ter mais nós) que qualquer uma das árvores originais combinadas. Um exemplo é visto na Figura 6.5A-C. Vemos que os grupos (AB), (DEFG) e (FG) não coexistem em nenhuma das árvores fundamentais, mas estão os três presentes no consenso semi-estrito. Cada árvore original contem três nós, enquanto que o consenso contem cinco nós. Tal propriedade não ocorre com o consenso estrito. nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 4� Deve-se lembrar que somente poderá haver diferenças entre o consenso semi-estrito e o estrito quando as árvores a serem combinadas contiverem politomias (embora isso não seja por si só condição suficiente para que haja a diferença). Com árvores originais exclusivamente dicotômicas, os dois tipos de consenso terão sempre resultados idênticos. Outro ponto a considerar é que as árvores de consenso, independe do tipo, são sempre menos parcioniosas que suas árvores fundamentais. Consenso de Maioria A última formade consenso que apresentamos é o consenso de maioria (Majority Rule consensus). Ao contrário dos demais tipos de consenso, essa forma considera a freqüência dos componentes encontrados nas árvores fundamentais. Considere o exemplo apresentado na Figura 6.6. Figura 6.6. Consenso de maioria. A-D. Cladogramas fundamentais. E. Freqüência dos componentes. F. Consenso de maioria. A freqüência dos componentes (Figura 6.6E) varia em relação às topologias fundamentais (Figura 6.6A-D). A árvore de consenso considera os componentes mais freqüentes (Figura 6.6F) e informa a freqüência de cada componente (Figura 6.6F). O limite mínimo para a inclusão de grupos nessa forma de consenso varia de 50-100%, e fica a cargo do investigados estipular limites mínimos para os grupos considerados. Esse tipo de consenso é freqüentemente utilizado e pode até ser obrigatório para algumas análises que ao invés de parcimônia utilizam outro critério para a escolha de topologias mais condisentes com os dados (i.e., análises probabilísticas como análises nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 5� Baeysiana, não discutida aqui. Um pouco de atenção à topologia gerada pelo consenso de maioria neste exemplo em comparação às árvores fundamentais revela uma propriedade indesejada do consenso de maioria muitas vezes ignoradas por seus usuários. Note que a topologia apresentada na árvore de consenso (Figura 6.6F) não existe no conjunto de árvores fundamentais (Figuras 6.6A-D). Ou seja, esse tipo de consenso pode gerar uma topologia que contempla relações de parentescos que não possui nenhum suporte nos dados. No exemplo acima, nenhuma topologia (Figuras 6.6A-D) considera que (AC) é grupo irmão de (BDE) como propõe a árvore de consenso (Figuras 6.6F)! Índices numéricos Na ausência de homoplasia, a relação entre árvores e caracteres é direta. Os caracteres concordam integralmente com um ou mais grupos monofiléticos do dendrograma. Entretanto, as relações entre cladogramas e caracteres raramente são tão simples, exatamente por que a homoplasia é um fenômeno muito freqüente. Uma matriz de dados pode ter inúmeras árvores igualmente parcimoniosas, ou seja, várias soluções igualmente satisfatórias para o mesmo conjunto de caracteres. Alguns caracteres podem concordar mais com o cladograma que outros. Da mesma forma, diferentes árvores podem concordar mais ou menos com as respectivas matrizes de onde foram derivadas. Existe todo um espectro imaginável de graus de concordância entre caracteres e arvores. Para lidar com essa complexidade, foram idealizados vários tipos de indicadores numéricos que expressam o grau de concordância (ou discordância) entre dados e arvores através de um numero. Cada um deles nos fornece informação sobre uma faceta ligeiramente diferente das possíveis interações existente entre cladogramas e caracteres. Neste capitulo veremos alguns dos indicadores numéricos (coletivamente chamados "estatísticas de arvore") mais utilizados atualmente. Comprimento O comprimento da arvore é o mais simples dos indicadores numéricos. A noção na realidade já foi utilizada de maneira informal em capítulos prévios. O comprimento de uma arvore é simplesmente o conjunto de todas as transformações nela observadas. Mais precisamente, é a soma de todas as transformações observadas em todos os ramos do dendrograma, e é expressa por número de passos. Cada transformação é computada como uma unidade (1), e o comprimento da arvore será sempre um número inteiro positivo. Ao calcular o comprimento, temos que sempre manter em mente que no caso de caracteres multiestado teremos no mínimo duas transformações por caráter, que serão somadas normalmente. Figura 6.7. Matriz de dados e cladograma mais parcimonioso. nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 6� Para entender adequadamente a noção de comprimento, iniciaremos com um exemplo simples e depois analisaremos casos progressivamente mais complicados. Portanto vejamos primeiramente a situação representada na Figura 6.7. Aqui temos uma matriz de 10 caracteres dois-estados e uma única arvore mais parcimoniosa. Note que cada caráter mostra apenas uma única transformação nesta árvore, e que portanto temos um total de 10 transformações para a árvore inteira. Diz-se neste caso que o comprimento da árvore é 10, ou 10 passos. Em árvores sem homoplasia e unicamente com caracteres dois-estados, o comprimento será sempre igual ao numero de caracteres na matriz. O raciocínio inverso obviamente também e valido. Se encontrarmos uma árvore cujo número de passos seja igual ao número de caracteres (ou colunas) da matriz, tendo esta matriz unicamente caracteres dois-estados, podemos concluir sem nenhum exame adicional que não existe homoplasia no problema. Figura 6.8. Matriz de dados e cladograma mais parcimonioso. Vejamos agora o exemplo na Figura 6.8. Aqui temos uma matriz com 12 caracteres dois-estados e uma árvore mais parcimoniosa dela derivada. Somando-se todas as transições observadas ao longo dos ramos da arvore, chegamos ao valor de 14. O comprimento da arvore, portanto e de 14 passos. Imediatamente podemos dizer que neste caso temos homoplasia, do contrário o comprimento seria igual ao número de caracteres, ou seja, 12. Mais uma vez frisamos que esta conclusão somente se justifica por que sabemos de antemão que todos os caracteres na matriz são dois-estados. Existem dois passos adicionais, uma diferença devida a ocorrência de homoplasia. As origens destes dois passos adicionais são facilmente localizáveis: são os caracteres 6 e 11. Na árvore vê-se que estes dois caracteres exigem mais de uma transformação para se encaixarem no cladograma. Índices Conforme já foi observado, os caracteres podem concordar em maior ou menor medida com hipóteses de relações filogenéticas. Existem vários graus imagináveis de concordância e discordância, dependendo da complexidade do caso. Para se lidar com essa questão e permitir a comparação do grau de concordância entre caracteres e árvores, foram criados alguns indicadores que expressam tal concordância por meio de um número. Vários índices já foram idealizados, cada um mais apropriado para expressar uma determinada faceta das possíveis interações entre dados e cladogramas. Dois destes têm sido utilizados com muita freqüência e atualmente são incluídos como parte integrante de estudos nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 7� filogenéticos aplicados. Índice de Consistência O chamado índice de consistência (comumente abreviado por ic, ou ci, em inglês) é um dos mais antigos dos indicadores numéricos atualmente em uso, e também um dos mais simples. Foi originalmente proposto por Kluge & Farris (1969), e é até hoje utilizado sem grandes modificações. O índice de consistência pode se aplicar a duas situações diferentes. A primeira é quando ele expressa o grau de concordância entre um caráter individual e uma hipótese, o chamado índice de consistência unitário ou individual. Esta versão do índice de consistência é a relação entre onúmero de transições presentes na série de transformação de um determinado caráter e o número de transformações que este caráter apresenta em uma determinada árvore. Por exemplo, considere um caráter com 3 estados (0, 1 e 2). Esta série de transformação possui portanto duas transformações. Se este caráter apresentar quatro transformações em uma determinada árvore, dizemos que seu ic é igual a 0.5, ou seja, 2 (número de transformações na série de transformação) dividido por 4 (número de passos na árvore). É freqüente que se represente o número de transformações na série por m, e o número de passos observado na árvore por s. Sendo assim, o índice de consistência pode ser representado como: ci=m/s No caso de caracteres dois estados, o numerador será sempre igual a 1, nos multiestados esse valor será maior de acordo com o número de transformações observadas em sua série de transformação. No caso de um caráter exibir na árvore o mesmo número de passos de sua série de transformação, teremos o numerador igual ao denominador, o que resulta em um ci=1. Este é o máximo valor que o índice de consistência pode apresentar, e representa a situação em que o caráter não mostra nenhuma homoplasia em uma determinada árvore. É fácil entender que na medida em que o caráter apresenta mais homoplasia, o denominador aumenta, enquanto que o numerador permanece sempre com o mesmo valor. Portanto, quanto mais homoplasia o caráter apresenta, menor o seu ci. Um ci de 1 significa que o caráter se encaixa perfeitamente na hipótese, enquanto que um ci menor que 1 significa a presença de homoplasia. Quanto mais baixo for o ci, maior será o grau de homoplasia observado. Desta forma, pode-se dizer que um caráter binário com ci=0.9 é menos homoplástico que um de ci=0.2. O ci nunca atinge a marca zero, por mais homoplasia que um caráter apresente. Isto acontece porque para que m/s resultasse em zero, m teria de ser zero, ou s infinito, o que nunca ocorre já que todo caráter mostra pelo menos uma transformação e o número de passos é necessariamente finito. Entretanto, como não existe um limite para s, o ci pode se aproximar ilimitadamente de zero, sem nunca efetivamente atingir esse valor. No caso de autapomorfias (ou seja, transformações que ocorrem somente em um único terminal), o ci será sempre igual a 1. Isto acontece porque autapomorfias não podem jamais apresentar homoplasia, já que nenhuma configuração imaginável de terminais resultaria em um número adicional de passos. Portanto neste caso s será sempre igual a m, e ci portanto igual a 1. O índice de consistência também pode ser utilizado para expressar o grau de concordância entre uma hipótese e o conjunto total de caracteres, ou seja, entre uma árvore e sua correspondente matriz de dados. Neste caso, não se mede o grau de concordância entre uma árvore e um caráter em específico, mas sim entre uma árvore e todos os nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 8� caracteres tomados como um conjunto. Este é o chamado índice de consistência conjunto ou global (normalmente abreviado por CI, em maiúsculas). A noção do índice de consistência conjunto é muito semelhante a do unitário. Seu cálculo também segue as mesmas linhas, representando uma função entre a soma de todas as transições observadas na matriz de dados como um todo e o número de passos (ou comprimento) do cladograma: CI=Σm/Σs Por exemplo, se uma matriz apresenta um total de 10 transformações, e uma árvore nela baseada apresenta comprimento de 20 passos, diz-se que o IC da árvore é igual a 0.5, ou seja, 10 dividido por 20. O número total de transformações observadas numa matriz costuma ser representado por M, enquanto que o comprimento de uma árvore é representado por S. Portanto, a fórmula para o cálculo do índice de consistência global seria: CI=M/S. No caso de matrizes contendo exclusivamente caracteres dois-estados, o cálculo de CI é particularmente direto, sendo simplesmente a divisão do número total de caracteres na matriz pelo comprimento da árvore. Nestes casos em particular, M é igual ao número de caracteres, já que cada caráter apresenta uma única transformação. Este não é o caso quando existem caracteres multiestados na matriz, já que cada multiestado apresenta mais de uma transformação. Nestes casos M será evidentemente maior que o número de caracteres. Deve-se portanto estar atento para a presença de multiestados na matriz ao se calcular o CI. O índice de consistência global, assim como o unitário, é máximo quando o número de transformações observado na árvore é igual àquele presente na matriz. Neste caso, M é igual a S, e portanto CI=1. Tal situação indica que não existem homoplasias no cladograma. Na medida em que o número de passos na árvore aumenta em relação às transformações na matriz, o quociente M/S se torna progressivamente menor, se afastando de 1. Quanto menor o CI, mais homoplasias existem na árvore. Novamente da mesma forma que o ci, o CI nunca chega a zero. Também não há limites para o quanto o CI pode se aproximar de zero, já que não há limites para S. O índice de consistência global pode ser empregado como indicador do grau relativo de parcimônia de árvores. Para uma determinada matriz, a árvore mais parcimoniosa será aquela com maior CI. Caso haja várias árvores igualmente parcimoniosas, todas elas terão o mesmo valor de CI e vice-versa. A razão desta correlação é simples: as árvores mais parcimoniosas minimizam o valor de S, e por conseguinte resultam em um incremento do quociente M/S. Árvores menos parcimoniosas, por sua vez, têm o efeito contrário sobre o índice. O valor de M para uma mesma matriz é evidentemente constante independentemente da árvore, portanto o fator determinante do valor maior ou menor de CI é S. Tem sido freqüentemente observado que a presença de autapomorfias em uma matriz tende a aumentar o CI (Brooks et al., 1986). Isto ocorre porque tais caracteres adicionam sempre uma unidade tanto a M quanto a S, e nunca aumentam S em relação a M. Desta forma, sua inclusão tende a “inflacionar” a estimativa do CI. Por essa razão, autapomorfias são comumente eliminadas do cálculo de CI (Carpenter, 1988), uma nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 9� sugestão freqüentemente seguida mas não unânime (cf. Yeates, 1992). Da mesma forma, caracteres ditos invariáveis (ou seja, aqueles que estão presentes em todos os terminais) também tendem a inflacionar o CI, e deveriam igualmente ser omitidos para cálculos de CI (Carpenter, 1988; Yeates, 1992). Índice de Retenção O índice de consistência, apesar de sua simplicidade e ampla utilização, sofre de algumas características indesejáveis. Consideremos uma análise filogenética para 10 terminais na qual um caráter A ocorre com estado 1 em dois deles e 0 em oito. Um outro caráter, B, ocorre com estado 1 em quatro terminais e 0 em seis. Digamos que no cladograma mais parcimonioso o caráter A necessite de dois passos (por exemplo, transformação 0-1 independentemente em dois terminais), enquanto que o caráter B também necessite de dois passos (por exemplo, uma transformação 0-1 em um terminal e outra na base de um grupo formado por três terminais). O ic dos dois caracteres será igual a 0.5 em ambos os casos (com m=1 e s=2). Entretanto, ao observarmos a situação em mais detalhe, vemos que os dois caracteres não são iguais em seunível de homoplasia. O caráter A não está nos fornecendo nenhuma informação sobre a estrutura do cladograma, e é tão homoplástico como é possível ser naquela situação. O caráter B, por outro lado, ainda nos fornece alguma informação sobre o monofiletismo de três dos terminais. O caráter B não é tão homoplástico quanto seria possível dadas as circunstâncias. Claramente, há uma diferença entre os dois caracteres à qual o índice de consistência não é sensível. Este índice não discrimina a proporção de homoplasia possível no caráter. Para suprir estas deficiências, foi criado o índice de retenção (ir). O ir foi inicialmente proposto no programa Hennig86 (de S. Farris, 1988), e publicado primeiramente em Farris (1989) e Fitzhugh (1989, com crédito a Farris). O índice de retenção é também de cálculo bastante simples, mas um pouco mais complexo que o ic. Em sua fórmula, há o recurso a uma outra variável, g, que expressa o máximo de homoplasia que um caráter pode apresentar, dadas as proporções de distribuição de seus estados nos terminais. Para caracteres dois-estados, este máximo é igual ao número de terminais que apresentam o estado menos freqüente. No exemplo acima, g será igual a 2 no caráter A e 4 no caráter B. Para caracteres multiestados, o cálculo de g é um pouco mais complexo, e pode ser feito da seguinte maneira. Considera-se os terminais como formando uma politomia total, cada um dos terminais com o respectivo estado do caráter cujo g se quer determinar. Na raiz da politomia, se considera cada um dos estados como sendo o estado primitivo, e estima-se, para cada um deles, o número de passos total para explicar todas as outras distribuições. Dos números de passos obtidos, o menor valor corresponde ao g do multiestado. Uma vez de posse do valor de g, as restantes variáveis são aquelas utilizadas no cálculo do ic, e o índice de retenção é definido como: ir=(g-s)/(g-m). No exemplo acima, temos que o ir do caráter A é (2-2)/(2-1)= 0, enquanto o do caráter B é (4-2)/(4-1)=0.67. Desta forma, vemos que o índice de retenção claramente expressa a diferença entre os dois caracteres, indicando que o caráter B é mais informativo na hipótese mais parcimoniosa. Ao contrário do índice de consistência, o de retenção pode chegar a zero, como no caráter A, quando a homoplasia observada é a máxima possível. nã o d ist rib uir Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 6: Consenso e índices numéricos 10� Isto indica que o caráter não tem nenhuma informação congruente com a hipótese. No outro extremo, temos que o ir chega a 1 quando não há homoplasia. Para autapomorfias, o ir resulta em 0/0, o que é indeterminado. O resultado faz sentido, já que não é coerente indagar sobre o máximo de homoplasia em um caráter que por definição não pode apresentar homoplasia. Freqüentemente este resultado é erroneamente expresso nos programas como 1, embora alguns simplesmente informem "aut" quando se pede o ir de uma autapomorfia. O índice de retenção para uma árvore inteira, ou índice de retenção conjunto – ou global, (RI), é calculado como o somatório das variáveis da fórmula para todos os caracteres, como: IR=(Σg-Σs)/(Σg-Σm). É comum representar-se Σg como G, Σs como S e Σm como M. O índice de retenção global também se diferencia do de consistência por não ser sensível à influência das autapomorfias. Assim, não existe o fenômeno de "inflação" do RI. O índice de retenção deriva de vários outros indicadores numéricos menos utilizados. O primeiro deles é a medida de homoplasia (h), que expressa o número de passos excedentes do mínimo (para cada caráter ou para o cladograma). Considerando os símbolos utilizados previamente, temos que: h=s-m. Por sua vez, o chamado coeficiente de distorção (cd) foi proposto por Farris (1973) como: cd=h/(g-m). O índice de retenção é algebricamente obtido ao se fazer o complemento de cd, como 1-cd, ou 1-[h/(g-m)] ou 1-[(s-m)/(g-m)], que é igual a (g-s)/(g-m). Repare que como o índice de retenção é o complemento do coeficiente de distorção, então ir+cd=1. No exemplo acima, o cd do caráter A é 1 e o do caráter B é 0.33. O artifício da complementaridade é utilizado para que os valores assumidos pelo ir variassem na mesma direção do ic (quanto mais homoplasia, menor o valor numérico do índice). Literatura Citada:
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