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L)isciplina de liistoria da TecnologidTodas as licenciaturas Professora 1Ioutc)ra Maria Paula DiogoISACSA-SE IFC METODOLOGIA E CONCEITOS OBJECTO DA HISTÓRIA DA TECNOLOGIA Os padrões culturais contemporâneos incorporam os valores da tecnologia como parte integrante da própria definição do conceito de humanidade. Esta noção de um quadro tecnológico profundamente actuante no interior de um complexo civilizacional desenvolve-se, de forma mais acentuada, a partir do processo de industrialização do século XVIII, identificando, num primeiro momento, as relações entre o crescimento económico e o potencial técnico e penetrando, posteriormente, a própria estrutura mental e conceptual da sociedade. Esta rede complexa de interrelações e de interdependências entre o aparelho tecnológico e a dinâmica global do todo social, suscita, em temos metodológicos, um conjunto de abordagens que podemos estruturar em torno de dois polos básicos: privilegiar de uma análise fundamentalmente operativa, cujos centros conceptuais são as noções de artefacto e prática técnicos, associando-se a mudança tecnológica com novos maquinismos; os elemento cognitivos e socio-económicos aparecem enquanto acessórios deste processo. compreender a tecnologia enquanto fenómeno cognitivo e eminentemente social, numa teia social, económica e política, centrando-se numa abordagem epistemológica em torno da natureza do conhecimento tecnológico, da sua produção por uma comunidade especializada e das suas funções enquanto Disciplina de 1 Iistoria da TecnologiaPTodas as Iicmciaturas Professora Iloutwa Maria l'aula DiogdSACS.4-SIIFC 2 elemento económico, social, político e cultural. Os produtos técnicos, são vistos, pois, não como um fim em si, mas como um meio para a compreensão de uma realidade mais vasta e complexa. E claro que estas duas grandes vertentes de investigação não se excluem mutuamente; em todos os trabalhos na área da história da tecnologia é bem patente a consciência desta articulação bipolar" o lado técnico das técnicas e a componente civilizacional da actividade técnica. Contudo, a diferente focalização das suas estruturas de abordagem naquele eixo dicotómico coloca questões diferentes nos níveis da metodologia, da direcção das problemáticas e das fontes. A própria definição dos conceitos de invenção e de inovação reveste-se de dificuldades, na medida em que o contorno das suas fronteiras é muito ténue. A sua capacidade operativa na análise da mudança tecnológica tem sido largamente influenciada pela sua utilização nos campos da economia e da sociologia. Embora de uma forma necessariamente esquemática, parece possível constituir dois pares de associação fundamentais: invenção-ideia e inovação-uso. Desta forma, torna-se possível identificar a componente criativa da invenção, cuja consequéncia material é um novo artefacto tecnico (novo, no sentido de aquilo que anteriormente não existe sob aquela forma, não execluindo, portanto, as possíveis ligações de tipo cumulativo) e a vertente produtivalcomercial da inovação, em que o artefacto se transforma em objecto público, social. Disciplina dc 1Iistc)ria da Tecnologiall'odas as liçenciaturai l'r-otèsiora Iloiitora Maria Paula DiogolSACSA-SI11.C O acto de inventar, entendido enquanto um acto criativo, reveste-se de muitas dificuldades em termos de uma análise; a construção de uma "teoria da invenção" não é possível, na medida em que nela intervêm factores extremamente diversificados, ora individuais ora sociais, que motivam percursos muito diferentes para a invenção. Têm-se, no entanto, procurado identificar alguns elementos recorrentes: o estímulo social da necessidade, a existência de um meio receptivo a mudança, a capacidade de acesso a informação (educação, experiência, conhecimentos acumulados eom outros exemplos), o peso do reconhecimento no interior de uma comunidade especifica. A inovação é um processo de características eminentemente sociais, englobando componentes dos mundos económico, social e cultural. Do ponto de vista económico, a inovação técnica corresponde a uma resposta a uma modificação das condições do mercado (e, por extensão, das relações entre a procura e a oferta), resposta esta capaz de produzir mudanças na combinação dos factores produtivos (capitalltrabalho). No plano social e cultural, a inovação associa-se, por um lado, as necessidades sociais e, por outro, a existência de grupos activos de agentes do progresso tecnológico, nomeadamente os empresários (na área económica) e os engenheiros (no sistema técnico) estimulados por um meio receptivo à mudança. Ao conceito de inovação liga-se a problemática da difusão tecnológica, aspecto particularmente importante para o caso português, na medida em que, enquanto país periférico, nos confrontamos com a questão da importação de tecnologia externa. Ilisciplina de 1 hstoria da 'l'ecnologiaflodas as licenciaturas l'rofcsscra Doutora Maria l'aula Diogo/SACSA-SHFC A capacidade de integração e assimilação da inovação (quer directamente, quer por canais de difusão) está intimamente ligada ao tipo de estruturas económicas, sociais e culturais da área receptara. Os agentes de difusão da nova tecnologia podem agrupar-se em três grupos: agentes individuais (artífices especializados detentores de um novo saber) agentes institucionais (sociedades, jornais, enciclopédias) agentes econórnicos (exportação de equipamento e de técnicos a ele associados). A eficácia de funcionamento destes canais difusores depende, tal como acontece para o próprio processo de industrialização, das condições específicas da área que funcionará como "recipiente" da nova tecnologia: factores econórnicos e sociais (nível da procura, capitais acumulados, custo da mão-de-obra, adequação dos recursos naturais, infraestruturas de apoio, custo global da mercadoria produzida e sua competitividade no mercado) factores políticos (empenhamento de políticas governamentais) factores culturais (existência de conhecimentos técnicos e científicos sedimentados, condições de desenvolvimento de aptidões técnicas entre os utilisadores, nomeadamente ao nível da aprendisagem formal, resistências valorativas face ao novo). MUDANÇA TECNOLÓGICA Em 1962, Thomas Kuhn publica The Structure of Scientific Revolutions, uma obra fundamental para a reflexão sobre o peso e o papel Disciplina de Historia da Tecnologia/Todas as lictmciatura:, I'rofessora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SI F C da continuidade e da descontinuidade na mudança dos sistemas cognitivos. Embora a tese de Kuhn se refira especificamente a estrutura científica, os conceitos de paradigmalciência normallruptura vão impulsionar o debate na história da tecnologia em torno das relações entre diferentes quadros técnicos. Encontramo-nos ainda hoje em plena reflexão sobre as diversas opções de análise face ao evoluir do meio tecnológico. Uma parte muito significativa de autores, desde os clássicos A.P. Usher e S.C. Gilfillan até aos mais recentes M. Daumas, G. Basalla, R.A. Buchanan e C. ~reeman*, tem defendido uma opção de tipo continuista, embora as suas análises apresentem diversas matizes de combinação dos conceitos de evolucionismo, conhecimento cumulativo, invenção individual e aceleração. A oposição ao modelo kuhniano apoia-se numa interpretação da tecnologia enquanto, fundamentalmente, um corpo material: o facto de estarmos perante objectos tri-dimensionais (e não estruturas mentais cognitivas) justifica a resistência a uma mudança abrupta característica da descontinuidade. Apesar de se considerar indiscutível que o sistema tecnológico tem características, ao nível da materialidade, que impedem uma aplicação linear do modelo de Kuhn, parece, contudo, possível e desejável manter em aberto ahipótese da discontinuidade. É evidente que esta abordagem pressupae um entendimento da tecnologia, não predominantemente em termos do objecto técnico, mas, principalmente, como um sistema mais lato, no qual o elemento cognitivo, isto 6 a produção do saber técnico, desempenha um papel relevante. Trata-se de diferenciar o momento em que a influência cumulativa anterior é superada por uma 1)ixiplina de flistoria da Tecnologiairodas as lic~mciaturas Professora Iloutora Maria Paula IIiogolSACSA-SIW postura genuinamente nova que, não excluindo a herança de opções técnicas que a precedem, dela se diferenciam, configurando um sistema técnico diferente, autónomo. É verdade que o totalmente novo não existe em termos tecnológicos: é sempre possível encontramos elementos pontuais de técnicas anteriores nas novas propostas; o peso da experiência, de tudo aquilo que já se sedimentou e cristalizou sob a forma de anteriores sistemas técnicos (em termos de conhecimentos e de artefactos) é importante; contudo, a descontinuidade não pressupõe o apagar do passado, mas antes a presença de novas atitudes, de novas formulações de respostas aos problemas técnicos. Embora haja alguns casos muito interessantes de aplicação do modelo de Kuhn a história das tecnologias, os conceitos kuhnianos de "ruptura" , de "paradigma" e de "incomensurabilidade entre paradigmas" põe, de facto, alguns problemas metodológicos quando aplicados à tecnologia: por um lado, e tal como o referiram os partidários da visão continuista, não há um corte radical entre diferentes sistemas técnicos e, por outro, a coexistência entre eles é possível quer em termos da prática (sua utilização no sector produtivo) quer mesmo no interior da comunidade técnica. Pensar o problema da descontinuidade na sucessão dos sistemas técnicos não se esgota, contudo, no modelo de Kuhn. Este baseia-se, em termos diacrónicos, no conceito de sucessão; é precisamente esta noção de linearidade, de sequência de blocos separados, que encontra dificuldades quando transposta para o meio técnico. Ao contrário, o modelo alternativo proposto por I. Lakatos e apoiado por P. ~ e ~ e r a b e n d ~ propõe o conceito de co-presença, de "justaposição" de projectos de investigação. Um sistema técnico é substituido por outro quando atinge o seu limite estrutural, ou seja na parte final do seu período llisciplina de TIistOria da TecnologiaíTodas as licenciaturas Professora Iloutora Maria Paula DiogoJSACSA-SEiE'C de expansão, quando se esgotam as possibilidades de aperfeiçoamento (em termos técnicos e produtivos); contudo, a presença deste novo sistema tecnológico não exclui as soluções adoptadas anteriormente, que podem persistir durante um largo período. Um sistema tecnológico funciona numa dupla dimensão de teoriatprática, cuja interacção não se pode definir em termos sequenciais. As relações entre ciência e técnica são complexas e modificam-se profundamente no tempo; tratam-se de duas áreas autónomas em constante diálogo, cuja interacção se faz em termos dialéticos e não hierárquicos. 0 s estudos sobre a influência da ciência em momentos de mutação cruciais, como por exemplo a expansão técnica durante a revolução industrial inglesa, são contraditórios, opondo teses eminentemente empiristas a interpretações que acentuam as relações existentes entre os produtores do saber técnico e os cientistas. Embora na sociedade contemporânea as relações entre ciência e tecnologia ou, se quisermos, entre investigação fundamental e aplicada, sejam muito profundas, este relacionamento não é válido em outros períodos históricos. A tecnologia anterior ao Renascimento desenvolve-se alheada da ciência; o Renascimento irá introduzir algumas rotas de ligação que virão a ser retomadas e largamente ampliadas nos séculos XIX e XX com o desenvolvimento de indústrias (como a química, a eléctrica, a electrónica e microelectrónica) baseadas no conhecimento científico. Entre os séculos XVI e XIX, a intensidade dos contactos entre as duas áreas é muito variável, permitindo situações muito diversificadas no interrelacionamento entre ciência e tecnologia. Disciplina de 1 IistOria da IecnologiaíTodas as licenciaturas 13ufessora Lloutora Maria Paula IIiogolSACSA-SIiFC Contudo, a tecnologia deve ser sempre entendida enquanto um conhecimento específico, algumas vezes gerado a partir da ciência, outras vezes resultante da sua própria lógica interna. A estrutura tecnológica é, fundamentalmente, formada por ideias; os objectos técnicos, os artefactos, constituem apenas a parte visível dessas respostas cognitivas. Assim, a questão da mudança tecnológica tem de ser entendida como um fenómeno de mudança na estrutura do conhecimento, no qual participam, primeiro, a comunidade que produz e gera esse tipo de conhecimento e, depois, os meios económico, social e político envolventes. -- I Cf. M. Daurnas, "L'Histoire des Techniques: son objet,ses limites, ses méthodes", Revue dfHistoire des Science, 1969 (tomo XXII), pp.5-32. Cf. A.P. Usher, A History of Mechanical Inventions, Cambridge (Mass.), Harvard University Press, 1954 (2.edição)(l. edição de 1929); S.C. Gilfillan, Inventing the Ship, Chicago, Follett, 1935 e The Sociology of Invention, Chicago, Follett, 1935; M. Daumas, "Introdução", Histoire Générale des Techniques, Tomo I11 (L'expansion du machinisme), Paris, P.U.F., 1968 e "L'Histoire des Techniques: son objet, ses limites, ses methodes", Revue dlHistoire des Sciences, T.XXI1, 1969; C. Freeman, J. Clarke c L. Soete, Unemplopent and Technical Innovation, Londres, Frances Pinter, 1982; S. Kuznets, Economic Change: Selected Essays, Londres, Heinemann, 1974, G. Basalla, The Evolution of Technology, Cambridge, Cambridge University Prcss, 1988, R.A. Buchanan, The Structure of Tehnological Revolution, Bath, Centre for the History of Technology, Science and Society, 199 1. I. Lakatos, "Falsification and the Methodology of Scientific Research Prograrnrnes" in I. Lakatos e A. Musgrave (eds), Criticism and the Growth of Knowledge, Londres, Cambridge Univ. Press, 1970, pp.91-196; P. Feyerabend, "Consolations for the Specialist" in I. Lakatos e A. Musgrave (eds), Criticism and the Growth ofklnowledge, Londres, Cambridge Univ. Press, 1970, pp. 197-230. REFLEXÕES EM TORNO DA HISTÓRIA DA TECNOLOGIA METODOLOGIA E CONCEITOS 1. Como definir o obiecto da História da Tecnologia? conjunto de /sistema cognitivo I 1 o objecto / o maquinismo * natureza do conhecimento técnico * comunidade produtora do saber técnico * relações com o todo social 2. Como definir o suieito da História da Tecnologia? 1 a kombidade de produtores técnico4 a inve ção como acto criativo de um indivíduo " J, a invenção como corolário de um trabalho colectivo que se cristaliza num indivíduo 3. A mudança na História da Tecnologia . Modelo kontinuísta) Modelo bescontinuístd A Sucessão Justaposição 4. As relações Ciência e Tecnologia Disciplina: História da Tecnologia Tecnologia e Progresso Maria Paula Diogo "-Oh Jacinto, para que servem todos estes instrumentozinhos? Houve já ai um desavergonhado que me picou. Parecem perversos ... São úteis? Jacinto esboçou, com languidez, um gesto que os sublimava. Providenciais, meu filho, absolutamente providenciais (...)!" Eça de Queirós, As Cidades e as Serras "lt was on a dreary night of November, that I beheld the accomplishment of my toils. With an anxiety that almost amounted to agony, I collected the instruments of life around me, that might infuse a spark of being into the liveless thing that lay at my feet. It was already one in the moming; the rain pattered dismally against the panes, and my candle was nearly burnt out, when, by the glimmer of the half-extingueshed light, I saw the dull yellow eyeof the creature open;" Mary Shelly, Frankenstein A ideia de progresso incorpora a nossa matriz civilizacional desde o Renascimento. As civilizações clássicas percepcionavam-se a si próprias como degradações face a estádios anteriores de grandiosidade: toda a mitologia grega sustenta a existência de tempos heroicos e felizes num passado inacessível. Na grelha conceptual da Idade Média o conceito de mudança está ausente, não sendo esta conhecida ou desejada. A própria eternidade (para a qual a vida terrena constitui um estádio em trânsito) é pensada em termos de um estrutura hierárquica e imutável I. O Renascimento introduz a ruptura face a ideia estática e ciclíca medieval, operando uma rotação do centro intelectual, que se desloca de um eixo eminentemente teológico para um quadro antropocêntrico, cuja base explicativa assenta num modelo causalista. Esta nova visão do mundo privilegia a ciência como elemento central do pensamento, associando, assim, a vivência humana o princípio do progressivo. Não estamos ainda perante um pensar do tempo histórico sob a forma de progresso, mas fundamentalmente na presença de um tipo de pensamento que comporta a noção de renovação e de melhoria2. Por outro lado, no decorrer do século XVI, a importância do saber prático, o peso das coisas técnicas, assume uma dimensão nova, alterando o seu relacionamento com as formas culturais institucionalizadas. Assim, a associação de indignidade ao trabalho prático (tendo como contraponto a de dignidade das actividades contemplativas e liberais) e a concepção do saber como secreto e restrito a uma elite, são questionadas, quer por homens não letrados ligados a um saber empírico (ou seja, sem uma formação académica), quer pelos próprios humanistas. A construção da matriz cultural moderna, assente numa nova valoração dos procedimentos teórico e prático do conhecimento e, portanto, na concepção de uma ciência ligada a experiência e ao mundo real, torna-se um passo fundamental na definição do conceito de progresso que encontraremos no século seguinte. A consciência da importância da dimensão prática do saber enquanto forma de acesso ao conhecimento da natureza, é decisiva na ruptura com os quadros cognitivos clássico e medieval. O conceito de progresso torna-se mais claro no decorrer de um debate que, sob diversas formas, percorrerá os séculos XVI (segunda metade) e XVII, confrontando os "modernos" e os "antigos", numa tentativa de libertação da nova sociedade dos fantasmas da civilização clássica. Os partidários da superioridade dos modernos apoiam a sua posição em dois pontos básicos: a destruição da concepção clássica do mundo através de uma nova imagem espacial formada a partir das descobertas geográficas, em que o conceito tradicional da cidade como unidade fulcral do espaço perde importância em favor de uma ideia de mundialização e, o que nos interessa particularmente, a afirmaçiío do conceito de progresso fundada a partir evolução técnica. A consciência do poder dos modernos, traduzido através das suas capacidades de compreensão do mundo e de intervenção na natureza e na sociedade, altera profundamente a dialética do imaginário temporal: a "Idade de Ouro", colocada tradicionalmente num tempo passado, desloca-se para o presente; a noção de progresso toma-se o eixo orientador no novo sistema cultural, sendo a componente tecnológica um elemento fundamental Com o Novum Organum (1620) de Francis Bacon, a ideia de progresso liga-se explicitamente à de crescimento científico e técnico, introduzindo um quadro conceptual radicalmente novo: a cultura assente em elementos retóricas e literários, Bacon propõe uma grelha de conhecimento alternativa, baseada na articulação das dimensões técnica e científica. A característica fundamental desta nova matriz cognitiva é a sua capacidade de progredir: "( ...) nas artes mecânicas, que se fundam na natureza e na luz da experiência, vemos suceder o contrário (face às formas culturais tradicionais): elas (...) como se penetradas por um espírito vital, continuamente crescem e progridem: antes toscas, depois convenientes, enfim refinadas, sempre pr~gredindo."~ A nova postura proposta por Bacon esboça a projecção do conceito de progresso sobre, não apenas o presente, mas também o futuro; o progresso não se encerra no que foi alcançado, antes implica a procura para chegar ao que ainda não sabemos (em relação a ideia aristotélica do conhecimento acabado em que o que não é conhecido é remetido para o domínio do não-possível o carácter inovador da tese baconiana é extremamente claro). Englobando sucessivas novas contribuições na linha aberta por Bacon - Descartes, Pascal, Leibniz e Locke - a noção de progresso é claramente assimilada para os padrões mentais europeus com a célebre Querelle des Anciens et des Modemes (1688-97), corolário da controvérsia sobre a oposição entre os "Modernos" e os "Antigos" iniciada no século anterior. Embora a "querelle" se centrasse directamente sobre as questões no campo da literatura e da poesia, na verdade os problemas por ela postos ecoam todo um conjunto de modificações de posturas mentais que se vinham desenvolvendo ao longo dos últimos cem anos, em especial face aos papéis da indústria, da ciência e da técnica, cristalizando a visão seiscentista da modemidade e do progresso. A polémica entre o antigo e o novo e a reflexão sobre o significado e a substância do conceito de progresso, assume em Inglaterra características diferentes, na medida em que, partindo de uma forte tradição baconiana, todo o debate se estruturará em torno das ligações entre a ciência, a técnica e o progresso, afastando da polémica os campos da oratória e da estética. A questão do progresso definia-se na área das invenções, da observação e da experiência. Neste sentido, a defesa da superioridade dos modernos assenta explicitamente nas suas conquistas científicas e técnicas, assumidas enquanto elementos identificativos do progresso da humanidade O século XVIII consolida e difunde esta nova visão sobre a natureza e as componentes do progresso, assente na capacidade de compreender o mundo, de o interpretar cognitivamente, em função de um elemento essencial - a razão. A associação entre as noções de felicidade e de progresso, articulando-se este num duplo eixo ciência-técnicalsocial-político, está bem evidente na obra de D'Alembert, Montesquieu, Voltaire, Helvétius, Condillac e do Barão d' HOI bach4. As obras dos enciclopedistas desempenham um papel fulcral na assimilação, por parte da consciência europeia, da noção de progresso como elemento integrante da histbria humana. A par deste processo de sedimentação, o século XVIII contribui de forma inovadora na arquitectura do conceito de progresso, através dos trabalhos de Kant, Turgot e Condorcet, cujas reflexões virão a constituir um referencial na ideologia do progresso do século XIX. Kant, ao contrapor o conhecimento empírico à ideia do absoluto, constitui uma reserva do ideal, da perfeição, permitindo a definição de uma rota evolutiva que caminha no sentido desse inacessível; no plano diacrónico, a sociedade tem como objectivo final o atingir de uma estrutura política perfeita. Esta capacidade para o progresso, intrínseca à humanidade (considerada como uma disposição moral), torna-se evidente através da própria história, citando Kant, como exemplo, a Revolução Francesa. Com Condorcet, o conceito de progresso incorpora uma nova dimensao de materialidade. O Esquisse d'un tableau histonque des progrès de I'esprit humain (1795) constitui a síntese de uma nova forma de compreender a sociedade humana, em termos da sua evolução, assente numa absoluta confiança na força irresistível e positiva do progreso, entendido este como uma emanência do racionalismo e da ciência. A sociedadehumana é vista por Condorcet como uma massa orgânica em evolução, caminhando desde a infância até à maturidade, percorrendo uma escala ascendente, em que os diversos estádios se interligam através de faixas transitórias. Estes momentos de passagem são entendidos, não como regulares e mecânicos, mas como períodos de confronto entre grupos de interesses opostos. O papel de vanguarda neste impelir da humanidade para um ordem melhor cabe aos cientistas, grupo detentor dos princípios e da prática da racionalidade. Esta ideia de uma classe liderante formada por especialistas (e não por políticos, por "homens de estado"), será extremamente importante na concepção europeia moderna do progresso, configurando o " mito da caixa preta", metáfora de um conhecimento detido e manipulado apenas por alguns (os especialista, os "feiticeiros" da contemporaneidade). O século XIX irá reformular a estrutura interna do conceito de progresso transferindo para o seu centro a componente tecnológica. Esta passagem de uma dimensão fundamentalmente ligada as ciências puras para um universo assente na prática, está na base de uma profunda alteração da forma como o homem percepciona a sua relação com o mundo exterior e como formula a sua experiência cognítíva. A máquina, o objecto tecnico, a capacidade de agir efectivamente sobre o natural, toma-se um elemento crucial da cultura e do imaginário oitocentista, repercurtindo e repercurtindo-se nas estruturas socio- económicas industriais. O primeiro momento teórico significativo desta rotação no centro do conceito de progresso é a obra de Saint-Simon. Saint-Simon vive na ante-câmara de uma época de profunda mutação: o processo de industrialização inglês ainda se encontrava numa fase inicial, a França apenas dava os seus primeiros passos na sentido da introdução sistemática de uma tecnologia industrial e a restante Europa pertencia ainda a um espaço económico, social e político tradicional. Contudo, Saint-Simon tem uma percepção extremamente clara do papel da indústria na emergência e configuração de uma nova sociedade - a sociedade industrial - que por ele 6 concebida como portadora dos elementos de progresso necessários à felicidade humana. Neste sentido, afirma: "ln the new political order, social organization will have for its sole and permanente purpose the best possible use for the satisfaction of human needs of all the knowledge acquired in the sciences, the fine arts, and the indu~try."~ O mito da Idade de Ouro é, uma vez mais, transformado: é o futuro (e já não o passado, como nos clássicos e medievais, nem o presente, como nos modernos) que se identifica com uma era da felicidade e da abundância; o presente de Saint-Simon é um momento de passagem, na rota imparável do progresso, para a construção de uma sociedade ideal. Este futuro desenha-se no interior da sociedade industrial, através dos avanços da ciência e das técnicas; assim, Saint-Simon identifica, no plano do real, os elementos definidores da sociedade perfeita. A máquina assume-se numa nova dimensão, não apenas como um objecto, mas como símbolo de um quadro tecnológico radicalmente diferente, quer quantitativa quer qualitativamente, ele próprio vector de definição da nova sociedade. A ideia de vanguarda orientadora proposta por Condorcet, é retomada por Saint-Simon e adaptada à nova matriz industrial: o especialista, o profissional, desdobra-se no sentido de cobrir as áreas do saber teórico (cientistas e engenheiros), da aplicação prática (engenheiros e industriais) e da expressão (artistas). Pela importância do elemento técnico associado a uma ideologia industrializante (modelo que orientará o século XIX europeu) o saintsimonismo foi considerado como a "religião dos engenheiros"' tendo como "catedral" a École Polytechnique. A associação dos conceitos de progresso e de industrialização que vimos em Saint-Simon torna-se axiomática quando analisamos o século XIX. De facto, tal como já referi acima, Saint-Simon dera um corpo a ideia abstracta de progresso e essa vertente material tornou-se omniscente: para o século XIX o crescimento tecnológico identifica-se com o crescimento da própria humanidade. O que é particular ao século XIX em termos da sua relação com o conceito de progresso é, por um lado, a sua integração no quotidiano mental e cultural (deixando de pertencer exclusivamente ao universo conceptual dos intelectuais) e, por outro, a sua objectualização (a máquina). Este processo de massificação da temática do progresso acentua o estatuto de inevitabilidade da evolução, pensada num quadro temporal linear e contínuo6. Todo o século XIX e o primeiro quartel do século XX interpreta o progresso como uma função do crescimento técnico e económico, projectando as suas aspirações de felicidade num imaginário tecnológico que se identifica com o próprio exercício do poder. O elemento técnico constitui-se como o meio, o veículo, através do qual a estrutura cognitiva do universo científico penetra e interage no mundo social. A fé na ciência transmuta-se, na realidade, para uma crença no poder da técnica, ou seja na capacidade efectiva de resolver os problemas. É neste quadro de apropriação do saber técnico utilizável que podemos compreender a questão da valoração do sistema tecnológico. O século XIX tem uma visão claramente optimista da tecnologia na medida em que ela potencializa um progresso material conotado positivamente. A máquina funciona, física e metaforicamente, como o centro do sistema técnico, permitindo o acesso as dimensão quantitativa e qualitativa presentes no conceito de progresso. O número e a heterogeneidade dos objectos tkcnicos (do telefone a fábrica, do elevador a locomotiva) configura, num primeiro plano, uma nova realidade ao nível da produção e do consumo e, num plano simbólico, identifica a capacidade do homem de dominar o espaço e o tempo de uma forma totalmente nova. Quando o Jacinto de A Cidade e as Serras identifica a civilização com a técnica - "Só o fonógrafo (...) me faz verdadeiramente sentir a minha superioridade de ser pensante e me separa do b i ~ h o . " ~ não são apenas os objectos que se referenciam, mas todo um quadro cultural estruturado a partir da identificação da tecnologia com a felicidade humana. As exposições industriais que se realizam na Europa a partir de meados do século XIX ecoam, através do êxito que obtêm, essa importância do elemento tecnológico na sociedade contemporânea, quer em termos materiais quer no plano mental; a literatura tecnológica ligada a ficção encontra um forte apoio no público - basta lembramo-nos das obras de Júlio Verne (Viagem ao Centro da Terra, 20 000 Léguas Submarinas) e de H.G. Wells (A Máquina do Tempo) - ao evocar, sob diferentes perspectivas críticas, a capacidade do homem de actuar sobre as leis da natureza. Neste sentido, o imaginário oitocentista e do princípio do nosso século materializou o conceito de progresso na máquina, e, através dela, impregnou-o das noções de movimento, de velocidade e de mudança O caminho de ferro assume, neste contexto, um papel de grande importância, incorporando de forma particularmente evidente os elementos tecnológicos e a noção de progresso. Em toda a Europa, o debate em torno da implementação das linhas férreas se assumiu como a oposição entre os partidários da "ordem antiga" e os da "nova ordem". Até I Guerra Mundial, apenas alguns intelectuais levantaram dúvidas sobre este optimismo acrítico; o mito de Frankenstein, que retoma, na essência, o mito grego de Prometeu, ou seja a punição pela apropriação pelos homens de algo que pertence aos deuses, permaneceu adormecido. Contudo, ocasionalmente era acordado, como, por exemplo, por Rousseau no século XVIII e por Nietzsche no século XIX. Para Rousseau, a tecnologia é corruptora doshomens, privando-os da sua inocência: em vez de actuar como um elemento constitutivo da felicidade, o progresso técnico impede a sua realização efectiva; em Nietzsche a noção do não-racional, do não-mecânico choca a idolatrização da máquina característica do seu século (a máquina, o homem-máquina, a sociedade-máquina, o universo-máquina). Num outro plano, escritores como H.G. Wells, cujas obras, como vimos, desempenhavam um papel relevante na massificação de uma cultura tecnológica, abriam os seus textos a uma possível leitura crítica desse futuro povoado de máquinas. No período entre guerras e durante a II Guerra Mundial, operou-se uma mudança radical na visão sobre o sistema tecnológico, construindo-se um discurso profundamente pessimista apoiado, por um lado, na vertente militar das aplicações técnicas (Hiroxima tornava-se um paradigma de uma técnica belicista) e, por outro, na identificação do sistema tecnológiw como aparelho ideológico repressivo. A chamada de atenção para o perigo de um crescimento do potencial técnico em função das aspirações de domínio pela força militar, num clima marcado, primeiro pela II Guerra Mundial e, depois, pela guerra fria, apoia-se, fundamentalmente, na própria comunidade científica e de tecnólogos: Einstein escreve, em 1945, ao Presidente norte-americano Roosevelt, no sentido de alertar para as consequências da utilização da bomba atómica (duplo tecnológico das investigações nucleares); Openheimer, ao assistir a primeira experiência nuclear, cerca de um mês antes do lançamento da bomba, disse: "I am become death, the Shatterer of ~ o r l d s " ~ . O problema da ética torna-se um elemento central na produção dos discursos e das práticas das comunidades científica e tecnológica; o conceito de humanismo redimensiona-se a luz de um novo tempo em que a ciência e a tecnologia perderam a sua inocênciag. Por outro lado, a projecção do sistema técnico num aparelho ideológico opressor, regido apenas por leis de dominação e de eficácia, tem sido sustentada por sociólogos como Lewis Mumford e Marcuse, tendo integrado o nosso universo cultural sob a forma literária do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley e do 1984 de George Orwell. Vivemos hoje na consciência do confl icto intrínseco ao progresso: substituímos a crença num progresso triunfal ou num crescimento fatal, pela interrogação crítica do nosso espaço mental, pelo desejo, mesmo que assumidamente utópico, de reconstrução de um universo reconciliado com seu projecto cognitivo; pensar de novo o papel da ciência e da tecnologia, não como discursos redutores da especificidade humana, mas como meios para a consubstanciar na sua totalidade. Esta concepçao medieval do mundo humana é espelhada na concepçao dos cosmos: o universo medievel é fmito, fechado e profundamente hirarquizado, quer em termos da posipao fisica dos seus elementos , quer no seu peso valorativo. Neste sentido cf. A. Koyré, Do Mundo Fechado ao Universo Injinito, Lisboa, Gradiva, s.d. e Études dzistoire de la Pensée Scientgque, Paris, Gallirnard, 1985. Garcia Morente afirma: "O que o despertar da Renascença traz ao mundo europeu é, antes de tudo, uma sensaçao de sensaboria, um inquietude, um a B de variaçao e de expansao. (...) Os homens da Renascenpa, no alvor da modernidade, creêm que pode e deve estabelecer-se uma melhor ordem de coisas, tanto na ciência como na vida, na arte como na política e na religiao.", Garcia Morente, A Crença no Progresso, Lisboa, Seara Nova, 1936,p.12. Bacon, Novum Organum, 1620, in R.L.Ellis ,J. Spedding, D.D. Heath (eds), The Works ofFrancis Bacon, Londres, 1 8 57 -74, Vo1.7, I, PP.45 7-8 ("De augmentis"), citado por Paolo Rossi, Op. Cit. p.76. D'Alembert, Discours Preliminaire (introduçao a Enciclopédia), Montesquieu, L'Esprit des Lois, Voltaire, Essais sur les Moeurs et I'Esprit des Nations, Helvétius, De llEsprit, Condillac, Traité des Septimes e Barao d'Holbach, Système de la Nature (sem dúvida a obra mais radicalmente materialista dos filósofos iluministas), todas obras da segunda metade do século XVLII. Na oposiçao desta linha dominante sobre o progresso encontramos Rousseau e o mito do "bom selvagem" (Rousseau, Discours sur les Arts et les Sciences) e também, embora de uma forma muito mais moderada, Diderot com a sua crítica a identivicaçao do progresso com o luxo material (Diderot, Pensées Philsophiques). Saint-Simon, Oeuvres, citado por Sidney Pollard, The Idea of Progress, Londres, C.A. Watts, Co.Lda., 1968, p.105. A ideia do contínuo na evoluçao é bem clara nas palavras de: "( ...) conceber cada um destes estados sociais consecutivos como o resultado necessário do precedente e o motor indispensável do seguinte (...)", A. Comte, Cours de philosophie positive, in Patrick Gardiner, op. cit., p. 100. Por outro lado a noçao de inevitabilidade integra numerosos elementos da visao popularizada de Darwin e da evoluçao das espécies. Desta aproximaçao do mundo social e biológico (via Darwin) é exemplar a obra de Herbert Spencer (cf. H. Spencer, The Principles o f Sociology, 1876-97. " Eça de Queirós, A Cidade e as Serras, (1 90 I), Lisboa, Livros do Brasil, s.d., pp. 19-20. Toda esta obra de Eça de Queiroz é extremamente rica em referência sobre a v iao do início do século sobre as relaçoes entre a ciência, a técnica, a civilizaçao e o progresso, sintetizadas de forma brilhante na célebre equaçao Suma ciência x = Suma felicidade Suma potência (Eça de Queirós, Op.Cit., p. 17). 8 A frase de Openheimer é uma citaçao do Bhagavad-Gita, um dos livro sagrado do hinduísmo. Sobre a posiçao de Einstein cf A.M. Nunes dos Santos (int. sel. e notas) Refexoes, encontros e dialogos com Albert Einstein e Homenagem a Albert Einstein - Testemunhos e controvérsia. Cf por exemplo, A.M. Nunes dos Santos, C. Auretta, J.L. Câmara Leme, A Responsabilidade do Cientista e outros Escritos, Lisboa, Publicaçoes D. Quixote, 1992. As questoes éticas da ciência e da tecnologia poe-se hoje com grande acuidade no campo da biologia e da genética; em termos da percepçao pública deste tipo de problemas, o cinema tem desempenhado um papel fulcral, a imagem do que acontecera no h a l do século XiX e princípio do nosso século com a literatura, através de obras como Blade Runner ou os dois filmes da série The Terminator. TECNOLOGIA E PROGRESSO 1. A imutabilidade do mundo medieval e a noção de recapitulação; ausência do conceito de mudança. 2. Renascimento: a introdução dos conceitos de renovação e de melhoria, ligados ao novo quadro conceptual assente num modelo causalista. valorização do saber prático e, por extensão, técnico preocupação em harmonizar os saberes teórico e prático, reconhecendo as suas especificidades 3. O debate entre os Antigos e os Modernos (séculos XVI e XVII): a defesa da superioridade dos Modernos com base na evolução técnica. 4. O Iluminismo e o domínio da razão (século XVIII): associação das noções de razão-felicidade-progresso. 5. Kant e a capacidade intrínseca da humanidade para progredir; a rota para a perfeição inacessível. 6. Saint-Simon e a "materialização" do conceito de progresso 7. O século XIX e a fé no poder ilimitado da ciência e da técnica para alcançar a sociedade perfeita; a máquina omnipresente; a visão optimista do mundo técnico. 8. O século XX: do pessimismo das duas guerras mundiais a atitude de aceitação crítica. Disciplina de História da Tecnologia Professoríi Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC APONTAMENTOSGUIA PARA A MATÉRIA 1. Primeiros gestos técnicos A história da técnica começa com as comunidades de Homo Habilis (há cerca de 2 500 000 anos), em que, pela primeira vez, encontramos a acção propositada, intencional, do homem sobre um elemento existente na natureza (primeiro a pedra (silex), depois outros materiais como o osso,o chifre, a madeira), de forma a transformá-lo para um fim específico. Cria- se, pois, o artefacto. Com a revolução neolítica --, sedentarizaçãcr-, economia produtora agricultura e pastoreio Novas técnicas .1 da pedra lascada (Paleolítico e Mesolitico) a pedra polida objectos especializados de trabalho da terra técnicas do fogo: cerâmica, metal técnicas do quotidiano: tecelagem, mobiliário O final do neolítico assiste a grande revolução urbana na zona do crescente fértil, que se traduz no nascimento dos grandes impérios pré-clássicos, nomeadamente Egipto [e Mesopotâmia] b técnicas "leves": escrita; cálculo numérico I técnicas "pesadas": grandes construções: pirâmides; canais de irrigação e diques r* . tecnicas de construção: limos; plano inclinado; alavanca; formas geométricas estáveis (pirâmides, trapézios) resolução empírica e singular dos problemas => a técnica não apenas em termos operativos, mas como elemento estruturante e fundamental do império Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Mana Paula DiogoISACSA-SHFC As civilizações clássicas: Grécia e Roma (ex: Heron de Alexandria): relógio elemento I Iúdico I J I mecani mo automáticos t em termos de técnicas" pesadas": complexificação dos "estaleiros1': de construção x: Amhytas de Tarento) I s de elevação I parafus e roldana + gruas, guinchos I. sistem complexos de alavancas e a matemática ao serviço da técnica (ex: Arquimedes) 1 e a importância técnicas "pesadas": as técnicas de construção I aperfeiçoamento de sistemas construtivos anteriores, com base no arco: abóbodas, cúpulas e arcadas aperfeiçoamento de técnicas e instrumentos de engenharia: estudos de orografia e de topografia; técnicas de terraplanagem e de embasamento; invenção das cofragens e cimbres; uso dos grampos de metal para fortalecer as juntas H novos materiais, mais econórnicos e fáceis de trabalhar: os opus, nomeadamente o opus caementicium (cal, areia, pequenos pedaços de calcário, pozolana, cascalho e restos de materiais cerâmicos), semelhante ao cimento novas ideias técnicas: normalização, construção por módulos pré-fabricados; conceito de "texto técnico" 3 a técnica não apenas em termos operativos, mas como elemento estruturante e fundamental do império romano: estradas, pontes, aquedutos, urbanismo (ex: Vitruvius e o tratado De Architectura) Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Pada DiogoISACSA-SHFC 3 A civilização romana permite analisar a confluência de duas atitudes quase antagónicas que predominam, uma no Egipto e, outra, na Grécia: do Egipto, Roma herdou o interesse pelas tecnologias pesadas e a sua necessidade como pilar estrutural do seu império; da Grécia, a civilização romana, bebeu a importância dos conhecimentos abstractos para a resolução das questões técnicas. 3. Idade Média No período medieval dois grandes tipos de evolução técnica: um orientado fundamentalmente em torno de questões materiais, englobando o conjunto de modificações as quais é reconhecível uma utilidade no plano económico (dominantes entre os séculos V e XI); por outro lado, este tipo de inovações desenvolvem-se a partir da própria prática, muitas vezes da experiência quotidiana, não envolvendo uma componente de reflexão teóricalabstracta. \ um orientado fundamentalmente em torno de questões simbólicas (poder, religiosidade), englobando o conjunto de modificações sem utilidade económica directamente reconhecível (dominantes a partir do século XII) [cf. esquema de A Pacey, The Maze of Ingenuity, p.281; por outro lado, a resolução deste tipo de questões implica uma acção conjunta de conhecimentos científicos (nomeadamente de geometria, matemática e física) e especificamente técnicos (nomedamente os dos mestres-pedreiros) \ * Até ao sec. XII \ as modificações na agricultura (sec.X) \ substituição do arado pela charrua \ novo método de atrelagem \ afolheamento trienal \ a importância do moinho como elemento central de um sistema energético \ desenvolvimento de maquinaria ligada aos têxteis (teares, fiação) a importância da metalurgia, impelida pela procura de objectos de metal (cf. agricultura, meMnica, . . . ) a retoma da actividade mineira * Sec. XII-XV: modificação da estrutura económica e social Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC Contexto: secs. XII-XIII : melhoria alimentar; melhoria dos transportes; retoma comercial; crescimento das cidades; primeiras universidades i. A construção das grandes catedrais Questões técnicas fundamentais: ao longo do sec. XI: substituição dos tectos em madeira por abóbadas em pedra, usando a pedra aparelhada sem argamassa; fortes pilares interiores, no alinhamento dos contrafortes exteriores que sustentavam as pressões sec. XII: a importância simbólica da verticalidade a introdução do arco em ogiva e a fragmentação da abóbada com base na cruzaria de ogivas: possibilidade de cobrir espaços mais amplos redistribuição das forças: pilares de sustentação mais leves, pela sua multiplicidade; um novo tipo de contraforte (o botaréu) e os arcobotantes (que transferiam oas pressões das abóbadas mais altas para os botaréus e destes para os alicerces do chão. A resolução deste tipo de problemas técnicos passa pelo domínio simuitâneo de questões do saber teórico (áreas da física, da geometria e da matemática) e do saber prático (experiência empírica dos mestres-pedreiros), aliando, pois, a ciência a técnica. =. É na resolução dos problemas postos pela arquitectura gótica que se centra uma das principais áreas de vanguarda do desenvolvimento técnico, quer no plano operativo (resolução efectiva dos problemas), quer no plano cognitivo (desenvolvimento de um corpus de conhecimento técnico) o que é bem evidente na importância que o projecto e os tratados assumem neste período (ex: Villard de Honnecourt) É precisamente neste contexto que o trabalho manual se valoriza, abrindo as portas para um novo estatuto social para os detentores e manipuladores do(s) sab(es) técnico(s); estamos na "pré-história" do engenheiro moderno. 2. O desenvolvimento do interesse pela mecânica - os relógios de pesos, a regularidade do tempo e o seu estatuto público; o movimento perpétuo e o magnetismo (ex: Pierre de Maricourt) Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC 4. O Renascimento O Renascimento é um período riquíssimo, quer no plano da tecnologia, quer no da ciência, tornando-se mais acentuado, por um lado, a importância da ciência na resolução de problemas técnicos e, por outro a importância da técnica como forma/método de compreender e dominar o mundo. Sendo impossível percorrer, no âmbito desta disciplina, toda a multiplicidade renascentista, optamos pela análise de quatro aspectos paradigmáticos, cristalizados em três figuras: 1. Leonardo da Vinci: a importancia da observação e da experimentação a minúcia da observação e do registo como elementos- base do projecto, da hipótese = a experimentação na prática da hipótese: os mecanismos: armasa de guerra e de voo um primeiro olhar sobre "tecnologias domésticasJJ 2. Francis Bacon: o profeta da tecnologia formalização de um programa de implementação da ciência e da tecnologia na Europa: > critica o saber clássico > critica os quatro obstáculos ao conhecimento (psicológicos, educacionais e sociais, sistemas de pensamento fechados e questões de comunicação e circulação do saber) propõe uma nova metodologia: o causalismo = afirma a existência de invenções empíricas e invenções baseadas na ciência - a autonomia do pensar e do fazer técnicos concebe o conhecimento como forma de dominar a natureza - o conceitode "ciência útil" = as obras cruciais do programa baconiano: Novum Organum e New Aflantis Nota: Bacon participa na Querelle entre os Antigos eos Modernos, pelo lado destes [cf. apontamentos sobre o conceito de progresso e tecnologia] 3. Galileu: a matemática e a física na tecnologia dois pressupostos fundamentais: a matemática é o alfabeto do universo; as leis da natureza são simples e matemáticas (tradição grega via Arquimedes); assim, a Disciplina dc História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC resolução das questões técnicas passam pela aplicação das leis científicas vindas da matemática e da física na área tecnológica, temos quatro áreas de contribuição de Galileu I. estudo do movimento e conceito de atrito + balística; técnicas militares 2. a concepção e construção de instrumentos científicos: telescópio, pêndulos associados aos relógios, termómetros 3. novo conceito de máquina e de critérios de eficácia P máquina não como um objecto que engana pontualmente a natureza, mas sim que aplica as forças da natureza de forma mais eficaz e rentável P eficácia = total do trabalho realizado tempo de realização O funcionamento de uma máquina (= agente + mecanismo) equivale a um sistema de alavancas, em que, numa situação de perfeição, não existe diferença entre a força de equilíbrio e a força necessária ao movimento ( A x AC = B x BC, sendo A e B corpos; C o fulcro da alavanca e AC e BC o espaço entre de A e B ao fulcro). Sendo, pois, os produtos iguais , se soubermos a força de uma agente, podemos calcular o peso que pode suportar, ou seja o trabalho aplicável a uma máuina perfeita. A eficiência real de uma máquina baseia-se, pois, na relação trabalholforça, que permite contabilizar os efeitos da fricção. P A aferição da de uma máquina passa a fazer-se, pois, não por critérios qualitativos, mas sim quantitativos. A máquina não é um objecto singular; partilha, sim de leis de funcionamento gerais, traduzíveis na eficiência da aplicação de uma força [Nota: a uniformização da medida de eficiência só acontece em 1784, com James Watt e a unidade cv] 4. estudos nos campos da resistência de materiais (questões das secções e das dimensõos) e da dinâmica. 4. o engenheiro-tipo do Renascimento novo estatuto intelectual: domínio da geometria e da álgebra + prática de trabalho de campo tradição e inovação nas escolas germânica e italiana: mecanismos militares e civis; armas; fortificação Disciplina de Histona da Tecnologia Professora Doutora Mana Paida DiogoISACSA-SHFC a importância da exploração de minas e da evolução da metalurgia, no plano teórico (a terminologia) e prático (ex: os Tratados (os "De Res Metallica" de Georg Bauer Agricola) . Dois outros aspectos são fundamentais para compreender a forte e rápida implementação e difusão da técnica a partir do Renascimento: a perspectiva como forma de representação rigorosa: o desenhar de uma máquina de tal forma que ela poderia ser replicada num outro lugar a imprensa, como sistema técnico crucial na circulação dos novos saberes (Jean Gutenberg, tipografia, cerca de 1450) Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC 5. O período das Luzes A segunda metade do século XVII e primeira metade do século XVIII são cerca de cem anos de maturação técnica; contudo a importância do elemento técnico acentua-se no plano ideológico, uma vez que o meio técnico toma possível o conceito de uma ciência que domina a natureza (cf. Descartes). O século XVIII, globalmente conhecido como o período do Iluminismo (ou o Século das Luzes), integra no plano filosófico e no mundo cultural a importância da ciência e da tecnologia. Na linha de Francis Bacon (cf. apontamentos anteriores), os filósofos iluministas (como, por exemplo, em França, D' Alembert, Voltaire, Diderot, La Mettrie, na Alemanha, Kant e, na Grã-Bretanha, Hume) defendem a razão como elemento fundamental da felicidade humana. O conceito de razão identifica-se, evidentemente com as práticas científica e tecnológica. Assim, a felicidade humana passa a identificar-se, ela própria, com a ciência e a tecnologia (cf. apontamentos Tecnologia e Progresso). É, aliás, para levar a prática esta triologia (felicidade/ciência/tecnologia) que surge a Encyclopédie (28 volumes profusamente ilustrados, publicados entre 1751 e 1772, sob a direcção de Diderot e de D' Alembert, e que constitui o paradigma de todas as enciclopédias posteriores) cujo objectivo era, precisamente, reunir em artigos sucintos e claros, escritos por especialistas, o conhecimento das várias áreas do saber, permitindo a todos (ou seja, aos não-especialistas) o seu acesso. Aspectos técnicos fundamentais 1. técnicas militares (balística; montagem de peças de artilharia) 2. os mecanismos: autómatos, jogos de água e outros mecanismos; mecanismos aplicados aos têxteis 3. interesses científicos, aplicações técnicas: ar e electricidade 4. técnicas do quotidiano: a vulgarização do vidro Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC 1. Técnicas militares sedimentação dos conhecimentos desenvolvidos durante o Renascimento, sobre velocidade, aceleração e resistência (cf. Galileu), de forma a torná-los procedimentos de rotina a balística torna-se uma área privilegiada de intervenção da engenharia: publicação de vários tratados, dos quais o mais importante é o de Niccolo Tartaglia importância da normalização: ex: os calibres das armas e as diversas peças constitutivas das armas 2. Mecanismos: P mecanismos aplicados aos têxteis, que levam a um aumento significativo na produção têxtil introdução da lançadeira mecânica, por John Kay, em 1733 outros mecanismos sucedem-se a lançadeira mecânica, permitindo uma rentabilização dos novos mecanismos (sistema técnico; cf. Leis de Kranzberg): ex: a Jenny, de Hargraves (1764), a Waterframe, de Arkwright (I 769) P autó atos, jogos agua e outros mel T função Iúdica, "maravilhamento" anismos sentido renasceitista produção de efe no título as palav-as tradição que se nos mecanismos importância: mecanismos ex: os autómatos perante a "magia natural" (no r identifica este termo com obras sobre mecanismos têm do termo, qi tos, pelo que muitas Magiae Naturallis 'ilia nos autómatos d de relógios da Idade desenvolvimento de de Vaucanson I Grécia clássica (cf. Heron) e Média proficiência na área dos Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Mana Paida DiogoISACSA-SHFC 1 (jogos de água) a importância dos jardins, que si artificial e perfeitamente controlad natureza a água é um elemento-chave dos decorativo, em cascatas e fontes e, água que, de surpresa, atingiam associa-se a música aos repuxos, importância: a manutenção dos rr funcionamento dos jogos de águ;~, deste período rotinar e desenvolver área ex: a máquina de Marly e o palácio (outros mecanismos) tradição que se filia nos mecanismos de relógios da Idade Média, a qual se junta, nos séculos XVII e XVIII, o interesse crescente pela medição e a precisão importância: sedimentação de conhecimentos na área dos mecanismos e desenvolvimento de novas aplicações na área dos instrumentos exoS: a balança de Gilles Roberval (1669); o relógio de pêndulo de Huygens (cerca de 1650) e o de George Graham (1721), este apenas com uma variação máxima de um segundoldia; as máquinas de calcular mecânicas: a máquina de Schickard (1623), para adição e subtracção; a máquina de Pascal (1645), também para adição e subtracção, com uma versão comercial (a Pascaline); a máquina de Leibniz (finais de século XVII), para as quatro operações aritméticas. bolizam, na sua organizaçãoas , o triunfo do homem sobre a ardins, aparecendo, no plano no plano Iúdico, em jactos de pessoas; em alguns casos, a!ravés de caixas de ar. ecanismos que asseguram o permitirá aos engenheiros os seus conhecimentos nesta Je Versailhes (França) .c Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC 3. interesses científicos, aplicações técnicas P electricidade demonstrações públicas de grande sucesso no âmbito do galvanismo (ex. em França, com o Abade Nollet); importância: aproximação do público a ciência e aos procedimentos técnicos experiências de Benjamin Franklin, quer em termos teóricos (a construção de uma teoria geral da acção eléctrica, a introdução de conceitos de +I-, positivolnegativo, carga, bateria) quer práticos (estudo das descargas eléctricas e invenção do pára-raios); importância: torna visível, em termos do público, a importância da ciência e da técnica como forma de melhorar as condições de vida > ar e vácuo experiências sobre o ar (ex: os hemisférios de Magdeburgo); a questão da pressão atmosférica (Huygens, Papin e Leibniz) 1 as primeiras máquinas a vapor - máquinas atmosféricas, que utilizam não a pressão do calor no ciclo motor, mas sim a acção I da pressão do ar sobre o pistão na fase de condensação exos: 1 Savew: a máquina "amiga do mineiro" (para bombear água das minas) (1698), que será aperfeiçoada pelo português Bento de Moura Portugal Papin: a máquina a vapor experimental (1707); vapor produzido no cilindro por uma caldeira móvel Newcomen: a máquina a vapor como objecto técnico (1712 ); vapor injectado no cilindro por uma caldeira exterior Watt: a primeira máquina a vapor realmente utilizável no plano económico (1 770); condensador separado 4. técnicas do quotidiano: a vulgarização do vidro Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Mana Paula DiogoISACSA-SHFC 6. Revolução Industrial - a Civilização Industrial A revolução industrial (a partir da segunda metade do século XVIII) alicerça definitivamente o domínio da técnica como pilar da economia europeia e, por extensão mundial. Os objectos técnicos multiplicam-se e são a base de toda a estratégia de desenvolvimento. Entramos na era industrial. Aspectos técnicos fundamentais 1. energia 2. maquinaria 3. sectores de ponta 4. revolução nos transportes 1. energia (ordem cronológica) novas fontes energéticas -+ novos tipos de energia + novas utilizações (ver esquema de transmissores de energia) da madeira a hulha: a necessidade de alimentar os altos fornos, ou seja a questão das temperaturas possíveis de alcançar e manter os combustiveis líquidos: gasolina e óleos pesados a electricidade: energia "impalpável"; inicia um novo tipo de relacionamento entre energia e unidade consumidora, ao introduzir a possibilidade de transmitir a energia a grandes distâncias (conceito de rede) e ao permitir grandes modelações no fluxo energético; a construção de centrais eléctricas intensifica-se a partir de 1880 2. maquinaria (ordem cronológica) vapor e energia hidraulica P modelo inglês: a opção pela máquina a vapor a importância dos recursos minerais as primeiras máquinas a vapor atmosféricas (Savery e Newcomen) Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Mana Paida DiogoISACSA-SHFC motores eléctricos o dínamo de Gramme e a criação de um gerador eficaz de corrente eléctrica contínua (1 871 ) o transformador (1880) e a adopção da corrente eléctrica alternada primeiros usos massivos ligados a iluminação em termos industriais, a electricidade modifica a organização da cadeia produtiva, passando a associar a cada máquina um motor; implica o conceito de distribuição em rede 3. sectores de ponta (ordem cronoiógica) a indústria têxtil tradição de desenvolvimento ao nível dos teares e das manufacturas têxteis no caso inglês, situação muito favorável devido a abundância de matéria-pima e de mão de obra (resultado da revolução agrícola inglesa que precedeu o arranque industrial) emprega baixa tecnologia, o que, por um lado, não implica grandes investimentos de capitais e, por outro, permite o uso de mão-de-obra não especializada aumento do ritmo de produção devido a introdução de novos dispositivos técnicos (a lançadeira mecânica de John Kay, a spinning-jenny de James Hargreaves (1 765) e a a water-frame de Richard Arkwright (1 767) da metalurgia à siderurgia (do ferro ao aço) a importância dos altos-fornos problema da resistência dos materiais: do protótipo a realidade; a transposição da escala: contribuições de Buonaiuto Corini (diferenças de peso dos materiais) e de Galileu (resistência a quebra) Disciplina de História da Tecnoiogia Professora Doutora Maria Paula Diogo/SACSA-SHFC a construção de máquinas mais resistentes, logo passíveis de suportarem maiores débitos energéticos o fabrico do aço: as experiências de Krupp (aço muito caro); o conversor de Bessemer (produzir mais e a menor preço); os afinamentos de Thomas e de Gilchrist a importância do ferro e do aço como elementos arquitectónicos e de engenharia: a arquitectura do ferro e os promeiros arranha-céus novas indústrias com forte intervenção científica ex: a química industrial 4. revolução dos transportes de pessoas, bens e sinais linhas férreas, estradas, canais, pontes, comboio, automóvel, ... telégrafo, telefone, . .. 1 7. A CivilizaçBo Industrial: o século XIX I século XIX, tem uma fé que poderíamos designar de quase acrítica, na capacidade da técnica resolver todos os problemas da humanidade e de intervir decisivamente no aumento dos níveis de bem estar da população em geral. De facto, o século XIX integra o meio técnico no plano do senso comum. > os objectos técnicos transformam o quotidiano (electrodomésticos) e modificam a percepção do espaço e do tempo P os espaços de vivência modificam-se: as cidades crescem horizontal e verticalmente (ex: centros1 subúrbios; arranha-céus); os hábitos de consumo Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC alteram-se (ex: os "grands magasins"); a gestão do tempo modifica-se P as grandes exposiçaes universais permitem, a par de objectos como o comboio, o telégrafo, o elevador, visualizar o poder da técnica podemos designar o século XIX como a idade da ciência e da técnica > os centros de investigação diversificam-se (ex: EUA, Alemanha) > exploram-se novos domínios tecnológicos P o objectivo da ciência e da técnica é intervir em toda a sociedade e não apenas no sector produtivo P a percepção do mundo exterior altera-se em função de um olhar técnico (ex: a fotografia, o cinema) P os conceitos de medição e de quantificação tornam-se axiais no plano dos valores a figura do engenheiro torna-se o centro da civilização industrial: a tradição prática inglesa e o formalismo educativo francês - a "workshop cultureJJ versus as "Grandes €coles"; a profissionalização do engenheiro não-militar e as associações profissionais. 8. O século XX: produção em massa e globalização Algumas linhas de reflexão 1. Características das tecnologias do século XX: a) a institucionalização do processo inventivo: a figura do inventor Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Maria Patda DiogoISACSA-SHFC individual é substituída claramente pelas equipas de investigação (processo iniciado no século XIX); b) a relação tecnologia-investimento-inovação como eixo crucial da resolução dos chamados "problemas cruciais"; forte relação indústria/universidades (tecnologias de forte I&D, ou seja, research intensive") c) o carácter contagiante, tentacular, "horizontal" das novas tecnologias: do nichotécnico para o tecido tecnológico e para a sociedade em geral; d) uma nova relação entre produção de tecnologia e consumo de tecnologia: o carácter mediador do botão (não é necessário compreender os fundamentos científicos e tecnológiws de um aparelho para o utilizar) e) exemplos paradigmáticos de tecnologias do século XX: * o motor de combustão interna: os casos do automóvel e do avião; * a indústria química, nomeadamente os novos materiais; * electricidade e electrónica: o carácter utilitário da electricidade; a revolução electrónica: os semicondutores e o computador. 2. energias: a importância da electricidade; mais recentemente a energia nuclear e as energias alternativas 3. produção em massa: primado do utilitarismo: a tecnologia como a grande fonte do "bem social" (qualidade de vida e bem estar) a democratização do objecto (questões relacionadas: seriação, estandartização, linhas de montagem); o exemplo do modelo T da Ford Discipliiu de História da Tecnoiogia Professora Doutora Maria Paula DiogoISACSA-SHFC opções para o binómio qualidadelquantidade: o design industrial: criação de uma "estética da era da máquina" a tecnologia doméstica: nova gestão do tempo privado 4. o modelo da ciência e da tecnologia planificadas; relações ciêncidtecnologidsociedade grupo de Bemal: o retomar das teses de Francis Bacon no século XX: a ciência e a técnica como motores de mudança na sociedade e, se bem planeadas, como resolução deos problemas da sociedade contemporânea sucesso dos "projectos de investigação orientados": competitividade, colaboração e estímulo em ambientes "fechados"; os exemplos de Los Alamos e de Silicon Valley Big Science e Big Technology: políticas científicas e tecnológicas, que exigem grandes investimentos públicos, levando a necessidade de uma justificação política de tipo nacionalista: os exemplos dos projectos ligados a defesa e a conquista do espaço. O perigo de uma ciência e tecnologia autistas. A produção e o manuseamento do "conhecimento codificadoJ' e o controle social da tecnologia: risco e incertezdconfiança e pericialidade Globalização: a interdependência da economia mundial na teoria do sistema-mundo; as tecnologias de comunicação e a importância da ordem mundial da informação. Expansão industrial e intervenção tecnológica na natureza: as ameaças ao meio-ambiente global. Algumas opções alternativas: para uma nova economia - o Small is Beautiful de Fritz Schumacher; para uma nova vivência urbana - arquitectura e engenharia civil no projecto de Buckminster Fuller e no Foster Studio; para uma nova relação Disciplina de História da Tecnologia Professora Doutora Mana Paula DiogoISACSA-SHFC tecnologialambiente - o Whole Earth Catalog e os grupos políticos "verdes". 5. as novas vanguardas técnicas os materiais sintéticos e as novas combinações: o exemplo dos plásticos a transmissão de informação - a electrotecnia e a informática: tubos de vácuo transístor (1 948), inventado por Bardeen, Brattain e Shockley, investigadores dos Laboratórios Bell; baseado nas características dos semicondutores, que permitem realizar as tarefas dos tubos de vácuo (reenvio, amplificação e modulação de sinais eléctricos) com dimensões muito mais pequenas, fiabilidade superior e custos consideravelmente menores circuitos integrados (1958), inventado por Kilby, investigador da Texas Instruments; utilização do silício miniaturização: o trabalho dos investigadores dos Laboratórios Bell e investigadores de Silicon Valley do ENIAC ao computador pessoal: do público ao privado a World Wide Web biotecnologia 6. CiQncia, Tecnologia e Responsabilidade Social AS "LEIS DE KRANZBERG" laLei: A tecnologia não é boa, nem má e também não é neutra A tecnologia interage, necessariamente, com o complexo civilizacional em que se move. Contudo, os resultados desta interacção diferem em função dos contextos económicos, sociais, políticos, culturais, demográficos e temporais específicos 2aLei: A invenção é a mãe da necessidade Todas as invenções, para se tomarem realmente eficazes e eficientes, requerem o desenvolvimento de tecnologias auxiliares. 3aLei: A tecnologia desenvolve-se em "pacotes" Os mecanismos são sistemas, ou seja são estruturas coerentes compostas por componentes interactivos. 4aLei: As políticas tecnológicas são decididas, prioritariamente, com base em critérios não-técnicos Apesar do peso da consultadoria técnica a cargo de peritos, as decisões sobre o desenvolvimento elou uso de uma determinada tecnologia, faz-se, fundamentalmente, em função de critérios que são exteriores a própria tecnologia SaLei: Toda a História é importante, mas a História da Tecnologia é a área mais relevante As características da sociedade contemporânea, marcada pelos processos de globalização, colocam a tecnologia como seu pilar fundamental. Conhecer os seus mecanismos e funções, torna-se, pois, crucial. GaLei: A Tecnologia é uma actividade humana; a História da Tecnologia também A tecnologia é um facto social, pelo que tem de ser compreendida sempre no contexto de um "caldo" civilizacional mais vasto. Assim, apesar de ser possível falar-se de um "determinismo tecnológico", as escolhas são, em última instância. humanas.
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