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Antonio Bandeira e suas poéticas figurações do abstrato

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NP 1 – 1ª CHAMADA – CCG – 2016.2 – ESTÉTICA E LINGUAGEM 
13/9/2016 – PROFESSORA AILA SAMPAIO
ALEX NUNES BARROSO – 1612028/6
Antonio Bandeira e suas poéticas figurações do abstrato
Ninguém imaginou que da Rua Santa Isabel, no Centro de Fortaleza, sairia 
um dos mais importantes pintores brasileiros do período pós-Segunda Guerra Mundial. 
Pelo reluzir dos metais em fundição, o pequeno Bandeira vislumbrava um universo de 
possibilidades ainda desconhecidas pelos cantos da Fundição Santa Isabel, de 
propriedade do seu pai. Subvertendo a tradição de pôr as luvas do ofício hereditário, 
preferiu apreciar o azular do céu, o vermelhar do fogo e dos Flamboyants, para misturá-
los em suas aulas de desenhos postais com Dona Mundica. Com os ares da Semana de 
Arte Moderna de 1922 brisando os trópicos cearenses, Antonio Bandeira nasce e 
atravessa o período entreguerras, rabiscando um caminho singular do seu olhar, pelas 
praias de verdes mares de uma cidade nordestina em crescente urbanização. Com o 
mundo ainda em guerra, vivenciou intensamente as movimentações das Artes Plásticas 
de Fortaleza na década de 1940, participou da fundação de associações de artistas, 
realizou diversos salões de pintura em parceria com importantes nomes alencarinos 
como: Aldemir Martins, Raimundo Cela, Mario Baratta e tantos outros, mas somente em 
1945 teve seus quadros expostos fora de sua cidade natal, na Galeria Askanasy no Rio 
de Janeiro, conquistando assim um reconhecimento nacional. Logo foi agraciado, no 
mesmo ano, com uma bolsa de estudos em artes plásticas na França. 
Até sua ida a Paris, suas pinturas eram predominantemente figurativas, 
verdadeiras representações de suas andanças e suas vivências pela poética das cores e 
das formas. Na Academia de La Grande Ghaumière, seus traços ganharam subjetividade, 
perderam a forma, suas matizes se borraram em espectros aquarelados de ondas 
empíricas, a abstração tomou corpo no fluir do seu instinto de ave de arribação, saltando 
das molduras um infinito de sensações e, tendo sido assim, até a última pincelada de sua 
vida, que possivelmente foi horas antes do seu internamento na Clínica Vitor Masse, no 
dia seis de outubro de 1967 em Paris. 
Dentre os grandes nomes da história da arte expostos na Coleção Airton 
Queiroz, o cearense de cavanhaque branco e sangue indígena me tocou pela sua luta, 
pela imposição de sua personalidade artística em um mundo marcado pela dominação 
das elites, além do seu caráter de um filho inconsciente de Ogum na preservação e 
defesa dos seus. Escolher o cearense Antonio Bandeira para resenhar foi o mesmo que 
descobrir um novo mundo que habitava dentro de mim. Minha identificação com sua 
sensibilidade estética mesclada aos seus costumes fortalezenses de ser me fizeram abrir 
outras interpretações possíveis da pintura, me fizeram compreender, ainda mais que as 
artes não precisam necessariamente estar no campo do explicito; o implícito me fez 
disparar camadas emotivas na obra abstrata de Bandeira, me levando a imaginar quais 
rumos podem levar o pensamento do artista. 
Em uma parede toda sua, Bandeira divide a ala da Abstração Informal da 
Exposição com duas grandes personalidades do abstracionismo brasileiro, os imigrantes 
nipônicos naturalizados brasileiros Manabu Mabe (1924-1997) e a também escultora 
Tomie Ohtake (1913-2015). São seis obras de períodos diferentes, 1950, 1956, 1957, 
1961, 1962 e 1964, mas que podem remeter a um mesmo pensamento geográfico do 
pintor, que nesses catorze anos se dividiu principalmente entre Fortaleza, Rio de Janeiro 
e Paris.
 
Na primeira tela em tinta óleo colada em cartão, nomeada Composição 
Abstrata, o azul e o vermelho se contrastam entre linhas pretas, que raspam por entre as 
várias camadas e sentidos da tela, algumas aparentemente suaves, outras mais rígidas, 
sugerindo um crepúsculo em meio ao caos das grandes cidades, talvez um presságio do 
fim repentino do trio Banbryols, que formou com os pintores abstracionistas Camille Bryen 
(1907-1977) e Wols (Wolfgang Schultz), sendo este último seu mestre maior declarado, 
que cometeu suicídio em 1951. 
Já na segunda obra, Bandeira nomeia de La Ville Fonderie, trazendo 
também variações das cores azul, preto e vermelho, esta última mais predominante, além 
de muito marrom, que forma todas as bordas do quadro, sugerindo um paralelo entre a 
fusão dos metais da fábrica Santa Isabel em Fortaleza e a Rue de La Fonderie, no centro 
histórico da cidade de Toulouse na França, nome dado à rua pelo pintor Vergner em 
memória a uma fundição que fabricava canhões durante a Revolução Francesa, em 1794. 
A terceira chama-se Paisagem de Neve. Nesse trabalho, o azul ganha 
destaque e o vermelho aparece timidamente como raios isolados de sol, as linhas pretas 
cada vez mais agressivas “rasgando” a tela em todos os sentidos e criando uma textura 
que salta aos olhos. Talvez sua estadia em Nova Iorque para a primeira exposição 
individual fora do Brasil e da França tenha lhe inspirado a representar o inverno da cidade 
com suas árvores secas e o seu pôr-do-sol gelado. 
Nas três primeiras telas, temos a presença marcante da técnica tachismo 
como plano de fundo, mas nenhuma é tão visível como a quarta obra, que o artista 
nomeou de Comme des Cerisiers au Printemps, ou seja, Como cerejeiras na primavera, 
pintada a óleo e cheia de pequenas contas de vidro espalhadas ao centro, dando um 
relevo além da tinta, onde as linhas brancas e os tons de cinza se destacam, mas sem 
deixar escapar os degradês de vermelho, mesmo que em menor escala, talvez tentando 
traduzir em pintura o poema “Quero fazer contigo o que a primavera faz com as cerejas”, 
de Pablo Neruda. Com um olhar mais atento e a poucos metros de distância, é possível 
traçar em todas as seis obras uma certa cartografia dos afetos de Bandeira, onde suas 
linhas emulam plantas baixas das cidades por onde traçou sua boemia e lirismo. 
A quinta tela de Bandeira na Exposição intitulada “A Catedral”, foi, sem 
dúvida, a que mais me afetou, uma representação quase que surrealista e minimalista ao 
mesmo tempo da Catedral de Notre Dame de Paris, em que aos olhos locais podemos 
perfeitamente associá-la à Catedral de Fortaleza, já que ambas trazem o estilo gótico. O 
vermelho dessa vez não se apresenta, já o branco, o preto, o cinza e o azul permanecem, 
esta última mais na superfície, o que ao meu ver representa um leve toque noturno. 
E, para completar sua parede, uma tela de 162,5 x 130,5 cm também 
intitulada Composição Abstrata, a maior dentre as suas. Nela percebemos pinceladas 
mais extensas e mais largas de preto e de branco, tachismo de azul e cinza que se 
deixam escorrer, talvez como lágrimas de uma ditadura que se instalara no mesmo ano 
no Brasil. 
Apesar de todas as suas obras na Exposição Coleção Airton Queiroz serem 
em tinta óleo, Antonio Bandeira muito produziu com guache, nanquim, têmpera, em papel, 
couro, cartão, dentre tantas outras superfícies. Sua variedade de técnicas foi reconhecida 
e admirada pelos principais artistas do século XX, como bem citou a escritora Almerinda 
da Silva Lopes, “Bandeira procurava ampliar as possibilidades do laboratório pictórico e 
definir as bases de sua linguagem expressiva”. Se vivo fosse por mais duas décadas, 
talvez tivesse se tornado um dos maiores nomes da pintura abstrata mundial, ao lado de 
Wassily Kandinsky (1866-1944), Paul Klee (1879-1940), Piet Mondrian (1872-1944), 
dentre tantos outros que traziam consigo uma arte que fala mais de dentro pra fora do que 
o inverso. Bandeira deixa em seu legado uma boemia parisiense mais cearense e um 
Ceará mais poético por meio de suas abstrações figurativas, líricas, informais, 
expressionistas e porque não surreais, fauvistas e cubistas, já que sua sensibilidade 
cosmopolita não conseguiu se frear por barreiras nem fronteiras e, assim, misturar em 
uma mesma paleta arte, pensamento e emoção.
Referências
- CARVALHO, Gilmar de. Antônio Bandeira: e a poética das cores / organização Gilmar de Carvalho. 
Fortaleza: Edições UFC, 2012.
- BANDEIRA, Antonio 1922-1967. Rio de Janeiro: Edições Pinakotheke, 2006.
- Vídeo da série Os Cearenses, direção Paulo Maranfon, 36’32”, 2013. Disponível em: 
https://www.youtube.com/watch?v=qAo49oETHOM
- Programa de TV De Lá Pra Cá, direção Ancelmo Gois, 25’, 2012. Disponível em: 
https://www.youtube.com/watch?v=PTxiHzZejNY

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