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Linguística II – 2016.1 Guia de estudos AP3 – Aulas 1-20 – AULA 1 – 1) Em que medida a linguagem pode ser caracterizada como um fenômeno cognitivo? O termo cognição diz respeito a tudo que se relacione a aquisição, estocagem, recuperação e uso de conhecimento. A linguagem – junto com outros fenômenos tais como percepção, atenção, memória, conceitos, crenças, raciocínio, emoções, etc. – faz parte da nossa cognição. Podemos caracterizar a linguagem como um fenômeno cognitivo na medida que ela é um tipo de conhecimento específico (tácito, implícito e inconsciente) a ser adquirido e, ao mesmo, permite que novo conhecimento possa ser construído e transmitido. Denominamos esse conhecimento da língua conhecimento linguístico ou competência linguística. – AULA 2 – 2) O que se entende por modularidade da mente e como podemos relacionar essa noção com a ideia de modularidade da linguagem? O conceito de modularidade da mente – cunhado pelo filósofo e psicolinguista Jerry Fodor – faz referência à ideia segundo a qual a mente humana seria constituída por diversos compartimentos ou módulos especializados para a execução de tarefas específicas. Nessa perspectiva, o que chamamos de inteligência seria, de fato, um conjunto de inteligências especializadas e autônomas (envolvendo aspectos tais como a linguagem, a visão, a memória, a percepção espacial, as relações lógico-matemáticas etc.). A ideia de modularidade se opõe à perspectiva generalista ou da uniformidade da mente (também chamada de mente holista ou inteligência única), que concebe nossa inteligência como um todo indivisível. O sistema linguístico pode ser caracterizado como um módulo cognitivo autônomo na medida que desempenha uma tarefa cognitiva específica. Módulos mentais podem ser organizados em outros módulos menores (módulos internos ou submódulos). No que diz respeito ao módulo da linguagem, essa última ideia é bastante útil para explicarmos o fato de que o nosso conhecimento linguístico é, na verdade, um conjunto de conhecimentos especializados e relativamente independentes entre si. Os submódulos linguísticos são: o módulo fonológico, o módulo morfológico, o módulo lexical, o módulo sintático, o módulo semântico e o módulo pragmático. 3) Casos de pessoas que apresentam dissociações no desenvolvimento de aspectos cognitivos diversos (linguísticos ou não) fornecem evidência que permite rejeitar uma hipótese generalista da inteligencia. Especificamente no que diz respeito ao desenvolvimento linguístico, o comprometimento de um aspecto com preservação dos restantes, constitui evidência favorável para a hipótese da existência de submódulos nos sistema cognitivo da língua. Como podemos explicar as ideias anteriores? Além de ser um módulo mental, a linguagem é constituída por módulos internos, os submódulos. Casos atípicos de aquisição da linguagem que mostram dissociações entre diferentes aspectos linguísticos (bom domínio de um aspecto juntamente com o comprometimento de outro) podem ser tomados como evidência da existência de módulos específicos e relativamente independentes. Casos como os de Chelsea e Genie (que mostram um bom desenvolvimento lexical, semântico e pragmático combinado com um comprometimento da sintaxe) e de Antony (que apresenta sintaxe, morfologia e fonologia bem preservadas a despeito de problemas pragmáticos e semânticos) sugerem que o conhecimento linguístico estaria organizado em frações que podem ser individualmente afetadas. – AULA 3 – 4) Porque a criatividade é considerada uma propriedade crucial das línguas naturais? A criatividade – ou seja, a capacidade de criar e compreender novas frases diferentes daqueles que já produzimos ou já ouvimos – é o que distingue as línguas humanas dos sistemas de comunicação animal. Diferentemente dos animais treinados para utilizar uma linguagem natural, cada frase que proferimos ou ouvimos é sempre uma criação inédita e única, e não uma repetição de algo guardado em nossa memória de maneira passiva. A produtividade – ou seja possibilidade de sempre falar “coisas novas” (o ineditismo do uso da linguagem) – está garantida em boa medida, pelo uso infinito de meios finitos. Isto é, temos um número finito de palavras ou itens no nosso léxico e um número finito de regras para combinar esses elementos, mas a aplicação dessas regras não tem limites a priori (é recursiva). Nesse sentido, podemos dizer que termos como “recursividade”, “produtividade”, “ineditismo”, “infinitude discreta” e “uso infinito de recursos finitos” são termos quase-sinônimos de criatividade. – AULA 4 – 5) O que seria a hipótese inatista para a aquisição da linguagem? A hipótese inatista é a resposta que a linguística gerativa apresenta ao problema de Platão. Segundo essa hipótese, os seres humanos são capazes de adquirir uma (ou mais) línguas naturais porque estão geneticamente pré-programados para isso. De acordo com essa hipótese, o ser humano é capaz extrair dos dados da sua experiência a informação necessária para construir uma competência linguística porque essa é uma dotação genética de nossa espécie. O inatismo linguístico sustenta a tese de que a predisposição para a linguagem é inata, ou seja, uma característica biológica da espécie. No contexto da linguística gerativa, utiliza-se o termo faculdade da linguagem para fazer referência à dotação biológica que a espécie humana possui para a aquisição e o uso de pelo menos uma língua natural. Essa faculdade inata possibilitará à criança analisar os estímulos da língua do ambiente (a língua-E) de forma a construir uma competência linguística (a língua-I). A hipótese inatista apresenta duas versões, uma fraca e uma forte. A versão fraca da hipótese, rejeita a ideia de que todas as informações linguísticas que tornam a aquisição da linguagem possível estejam pré-detalhadas e assume que os princípios linguísticos emergem durante o processo de aquisição da língua do ambiente. – AULA 5 – 6) Em que consiste a Teoria de Princípios e Parâmetros? A Teoria de Princípios e Parâmetros (P&P) foi formulada na década de 1980 no contexto da linguística gerativa e, basicamente, visa a explicar como é a GU. De acordo com essa teoria, a GU está composta por dois conjuntos de informações, os Princípios e os Parâmetros. Os princípios são responsáveis pelas semelhanças que as línguas compartilham entre si; já os Parâmetros estão vinculados às possíveis diferenças entre as línguas naturais. Assim, a GU deve ser compreendida essencialmente como um conjunto de regularidades gramaticais universais (Princípios) e um conjunto limitado de variações linguísticas possíveis (Parâmetros). A teoria de P&P estabelece que uma língua-I qualquer é o resultado da articulação entre um conjunto de Princípios universais e um conjunto de Parâmetros formatados pela experiência de um indivíduo. Há um grande número de Princípios da GU tais como: o Princípio da Subordinação, o Princípio da Dependência de Estrutura e o Princípio da Correferência. No que diz respeito aos Parâmetros, temos o Parâmetro do Sujeito Nulo, o Parâmetro do Núcleo, o Parâmetro QU-, dentre outros. Cada um desses Parâmetros determina propriedades sintáticas específicas de uma língua. 7) Explique e exemplifique o Parâmetros do Sujeito Nulo ? O Parâmetro do Sujeito Nulo quando marcado como positivo gera línguas [+sujeito nulo] , quando marcado como negativo gera línguas [-sujeito nulo]. As línguas portuguesas e espanholas são [+ sujeito nulo], pois há a possibilidade de não realizar esses sujeitos foneticamente, como em “choveu ontem” ou “ayer llovió, e o mesmo acontece com o espanhol. Já o inglês e o francês são línguas [- sujeito nulo], pois exigem a realização fonética dos mesmo, como em : “it rained yesterdey” ou “Il a plu hier”. Caso os sjueitos “il” ou “it” não fossem explicitados, a sentença seria agramatical. O mesmo acontece com os objetos. Em português, o objeto pode não ser realizado, como em “Você viu Maria?” “ Sim, vi”, a resposta é gramatical, mesmo sem o objeto, porque o português é também [+ objeto nulo]. Já em espanhol, isso não ocorrer, pois é uma língua [- objeto nulo]. Em espanhol, se o objeto for omitido, a sentença será agramatical. – AULA 6 – 8) A que refere o termo “arquitetura da linguagem”? O termo “arquitetura da linguagem” refere à forma na qual as línguas naturais estão organizadas no conjunto das faculdades cognitivas humanas. Estudar a arquitetura da linguagem é compreender como a linguagem se estrutura e funciona no interior da mente humana. – AULA 7 – 9) Em que consiste o traço de seleção de um item e como essa noção se relaciona com os conceitos de predicador e argumento? Outro tipo de traço formal diz respeito às propriedades de seleção de determinado item. Certos itens apresentam a possibilidade de selecionar outro(s) item(ns) com os quais vão obrigatoriamente compor a estrutura de uma frase. Quando um item possui traços de seleção, dizemos que ele é um predicador (ele pode selecionar outros itens para compor uma estrutura). Já os elementos que são selecionados por um predicador são chamados argumentos. Um verbo (V) como comprar, na frase João comprou uma casa, é um predicador com dois argumentos (João e a casa), já um verbo como colocar em Marcelo colocou o dinheiro na poupança, seleciona três argumentos (Marcelo, o dinheiro e na poupança). – AULA 8– 10) Que são os papeis temáticos e qual é sua relação com a grade temática de um predicador? Uma propriedade dos predicadores é a sua capacidade de atribuir valores semânticos a seus argumentos. Os significados atribuídos aos argumentos são denominados papéis temáticos (papéis-θ, com a letra grega “theta”). A grade temática diz respeito aos traços que determinam que interpretações semânticas (ou papéis temáticos) devem ser associadas a cada um dos argumentos de um predicador (agente, paciente, tema, alvo, instrumento, são alguns dos papeis temáticos que podem ser atribuídos pelos predicadores – lembrando que nem todo predicador atribui todos os papeis possíveis). 11) Quais são as subcategorias dos predicadores verbais? Uma subcategoria é uma categoria dentro de outra categoria. Lembrando que V é uma categoria gramatical, as subcategorias de V dizem respeito às diferentes subclasses de verbos lexicais que existem nas línguas naturais. Predicadores verbais podem ser agrupados em três subcategorias: verbos transitivos, verbos inergativos e verbos inacusativos. Os transitivos incluem os predicadores verbais que selecionam argumento externo e um ou dois argumentos internos. Os inergativos são a subcategoria de verbos que selecionam apenas argumento externo e os inacusativos selecionam apenas argumento interno. – AULA 9 – 12) Porque a recursividade é considerada uma propriedade fundamental das línguas humanas? A recursividade está relacionada com a possibilidade de uma operação computacional (por exemplo, a combinação - MERGE), ser acionada um número ilimitado de vezes. O Sistema Computacional permite que um sintagma X seja inserido numa outra concatenação, a qual formará o novo sintagma Y que pode ser inserido numa nova computação e gerar Z – e assim por diante, ao infinito (Exemplos: O Paulo disse que a Maria acha que a Priscila pensa que a prova será fácil; O vestido de renda da amiga da namorada do Guilherme estava na promoção). A recursividade das línguas naturais é considerada uma propriedade universal e fundamental já que garante a criatividade e produtividade linguística (basta adicionar um sintagma para termos uma sentença nova). Entretanto, estudos recentes, conduzidos principalmente pelo norte-americano Daniel Everett, têm questionado a universalidade da recursividade. Segundo ele, pelo menos uma língua humana parece não possuir essa propriedade: o pirahã. A afirmação de Everett tem sido contestada por outras pesquisas que afirmam que, como qualquer outra língua natural, o pirahã também tem recursividade. – Exercícios sobre as aulas 7, 8 e 9 – 13) Explique porque as seguintes construções – consideradas fora de contexto discursivo – são agramaticais. a) * Mariana emprestou. O predicador pede três argumentos. b) * A menina tomou a sopa a colher. O predicador pede dois argumentos e não três – neste caso, a frase seria gramatical se no lugar de um terceiro argumento houvesse um adjunto do tipo “com a colher”. c) *O livro rosnou. O verbo rosnar não apenas seleciona um argumento externo, mas especifica que esse argumento deve carregar o traço semântico [+ animado]. O SN o livro não satisfaz esse requisito. d) *O coração da mocinha esmigalhou ao ver a cena. O verbo esmigalhar não apenas seleciona um argumento externo, mas especifica que esse argumento deve ser passível de sofrer tal processo, além de carregar o traço semântico [-animado]. O SN o coração da mocinha não satisfaz esse requisito. 14) Determine a estrutura argumental dos predicadores das sentenças abaixo. a) A candidata engoliu a notícia da sua desclassificação. Engolir (categoria V – o predicador seleciona dois argumentos) b) A destruição da usina foi a notícia do dia. Destruição (categoria N – o predicador seleciona um único argumento) c) O tribunal foi contrário ao pedido. Contrário (categoria A – o predicador seleciona dois argumentos) d) O atleta abandonou a competição. Abandonar, no sentido de desistir (categoria V – o predicador seleciona dois argumentos) c) A mulher abandonou o cachorro na rua. Abandonar, no sentido de largar/soltar (categoria V – o predicador seleciona três argumentos) 15) Descreva a grade temática dos itens abaixo. a) Costurar. Seleciona dois argumentos. O argumento externo recebe o papel de agente, o argumento interno recebe o papel de tema. b) Florescer. Seleciona um argumento, neste caso o argumento interno, que recebe o papel de tema. 3) Nadar. Seleciona um argumento, neste caso o argumento externo, que recebe o papel de agente. 4) Guardar. Seleciona três argumentos. O argumento externo recebe o papel de agente, um dos argumentos internos é o tema e outro o locativo. 16) Identifique as subcategorias dos predicadores e justifique sua resposta. a) Envelhecer Inacusativo – um único argumento interno. b) Encontrar Transitivo – dois argumentos, externo e interno. c) Sorrir Inergativo – um único argumento externo. d) Esconder Transitivo – dois argumentos, externo e interno. d) Convidar. Transitivo – três argumentos, um externo e dois internos. e) Ronronar. Inergativo – um único argumento externo. f) Falir. Inacusativo – um único argumento interno. -Aula 10- 17 a) Qual é a instância que se localiza entre o léxico e o sistema computacional? Explique-a. A numeração. Ela é uma entidade psicológica que corresponde aproximadamente ao nosso planejamento de fala. É a compilação dos conjuntos de instruções que serão retirados para uma derivação. b) Desenhe as árvores das sentenças abaixo: a) Maria acalmou o cachorro. b) O cachorro acalmou. c) Rita disse que Maria acalmaria o cachorro. d) Quem acalmou o cachorro? 18) A Aquisição da Linguagem pode ser caracterizada como um fenômeno cognitivo e social complexo. Diferentes perspectivas teóricas buscam dar conta dessas duas dimensões do processo de aquisição. Desenvolva essa afirmação. A aquisição da linguagem envolve tanto um processo cognitivo de formação de regras abstratas (construção de uma gramática), quanto o desenvolvimento de habilidades de expressão e comunicação. Enquanto as primeiras são adquiridas pela simples exposição à língua em questão, as segundas dependem em boa medida da interação social. Existem diversas abordagens teóricas para tentar dar conta do complexo processo de aquisição. Como acontece nos estudos sobre a linguagem de um modo geral, também no caso da aquisição cada teoria prioriza algum aspecto específico em detrimento dos outros. Assim, encontramos a teoria gerativista cujo foco é a aquisição da gramática por parte da criança e abordagens sociointeracionistas que centram seu interesse em aspectos sociais e interacionais da linguagem. Ambas as perspectivas estudam o processo de aquisição, mas os objetivos específicos são diferentes em cada caso. -AULA 12- 19) O desenvolvimento linguístico apresenta aspectos universais ou compulsórios e aspectos idiossincráticos, peculiares a cada indivíduo. Desenvolva essa afirmação. É possível constatar que, partir de experiências diferentes, todos os membros de uma comunidade linguística – após o processo de aquisição ser completado – falam uma mesma língua. Esse fato sugere que, por mais distintas que tenham sido nossas experiências no desenvolvimento linguístico, haveria uma série de semelhanças marcantes entre nossas trajetórias. A ideia da universalidade remete, por sua vez, à ideia das fases na aquisição da linguagem: uma vez que as fases existem, toda criança não só passaria por elas, mas também passaria aproximadamente na mesma faixa etária e numa ordem semelhante. As fases podem ser definidas como etapas dentro de um quadro maior que a criança deveria cumprir em determinada época da vida. Alguns exemplos de fases universais pelas quais todos os bebês têm que passar são: a etapa do balbucio durante a qual as crianças testam um extenso inventário de distinções sonoras e suas combinações para, mais tarde, restringir o que elas vão usar. (dependendo da língua em processo de aquisição), a ordem na aquisição dos fonemas, a fase de uma palavra, de duas palavras de enunciados maiores, etc. O processo de aquisição é, no entanto, bastante complexo e envolve aspectos cognitivos e sociais. É graças a essas características que encontramos também algumas exceções, idiossincrasias, que geram certas particularidades mais ou menos individuais (palavras ou expressões aparentemente “inventadas”). Contudo, essas diferenças ficam por conta das peculiaridades cognitivas e sociais do processo e não teriam influência significativa no desenvolvimento linguístico. -AULA 13- 20) Em que consiste o chamado Período Crítico da aquisição da linguagem? De acordo com a hipótese inatista, existiria um componente inato, específico para lidar com a linguagem. De acordo com essa mesma hipótese as fases e regras universais estariam previstas a partir do componente inato, sendo uma questão de tempo sua concretização. Haveria então uma programação biológica para a aquisição da linguagem: fases e regras estão previstas; a trajetória linguística da criança também está pré-estabelecida e tudo isso vai “acontecer” em um determinado período, dadas certas condições biológicas e ambientais. A esse período, foi dado por Eric Lenneberg o nome de Período Crítico e pode ser caracterizado como um período de início, formação e conclusão do desenvolvimento linguístico; uma “janela temporal” da programação biológica para a aquisição da linguagem. Considera-se o início como sendo o nascimento da criança, a formação como sendo o tempo em que ela está exposta à linguagem na infância e a conclusão como sendo o momento em que ela internaliza uma gramática (sistema de regras) da língua com a qual tem contato. Assim, durante esse período crítico, a criança deve estar em condições biológicas e ambientais minimamente necessárias para que esse processo dê certo. Se não estiver, a aquisição da linguagem não se dará de forma satisfatória. Estima-se que o período crítico encerraria por volta do começo da puberdade e esse fato estaria relacionado com as mudanças hormonais (principalmente no nível cerebral) que caracterizam essa etapa da vida. -AULA 14- 21) Identifique as principais características das línguas de sinais e correlacione as características do processo de aquisição de línguas orais e de sinais. As línguas de sinais apresentam um conjunto de características fundamentais compartilhadas com as línguas orais. Os sinais utilizados pelos falantes surdos não são gestos e podem ser definidos como signos linguísticos na medida que guardam uma relação de arbitrariedade entre forma e sentido. Línguas de sinais apresentam ainda uma estrutura própria, regras de boa formação de sentenças e os mesmos níveis linguísticos encontrados em línguas orais: fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática. No que diz respeito à aquisição de línguas de sinais, tem sido observado que o processo é bastante semelhante ao verificado nas línguas orais. Bebês surdos expostos desde cedo a uma língua de sinais passam por fases bem similares às observadas nos bebês ouvintes. Existem porém, algumas situações em que o contato de uma criança surda com uma língua de sinais pode ser enquadrado num processo de aprendizagem (e não de aquisição). O primeiro fator que pode levar uma criança surda a aprender e não adquirir uma língua de sinais é a ausência de contato com uma língua de sinais desde sua tenra infância. Outra situação na qual encontramos um processo de aprendizado são os casos nos quais é decidido que a criança surda aprenda o português (uma língua oral) no lugar de uma língua de sinais. Temos então uma situação caracterizada como oralismo, na qual o processo natural de aquisição de uma língua é substituído pelo aprendizado de uma língua oral. Crianças surdas que não têm contato com uma língua de sinais em sua infância correm o risco de perder o limite do período crítico para aquisição. Nesse caso, o máximo que conseguirão fazer é utilizar os sinais tardiamente aprendidos mesmo que fluentemente, mas através de um processo consciente e demorado, fruto de um processo de aprendizado. -AULA 15- 22) Os animais possuem sistemas de expressão e comunicação. Há, contudo, diferenças estruturais sistemáticas entre a “linguagem animal” e a linguagem humana. Desenvolva essa afirmação. Várias espécies apresentam um conjunto de meios de expressão que podemos definir como “sistemas de comunicação” – sendo alguns deles bastante sofisticados: abelhas fazem uma espécie de “coreografia de voo” para a localização do alimento, golfinhos são capazes de realizar tarefas mediante comandos verbais ou gestuais e alguns tipos de macacos utilizam gritos ou chamadas distintas para identificar os predadores. Há, contudo, diferenças estruturais e sistemáticas entre as linguagens animais e as línguas humanas. Os conceitos de Faculdade de Linguagem em Sentido Amplo (FLA) e restrito (FLR), propostos por Hauser, Chomsky & Fitch (2002), podem nos ajudar a entender melhor essas diferenças. A FLA envolveria os traços que existem em comum entre os sistemas de comunicação animal e as línguas naturais: servem para a comunicação, utilizam algum aparato fisiológico, possuem unidades que transmitem informação. Já a FLR, representaria aquilo que seria único à espécie humana: a capacidade de utilizar a linguagem de forma criativa em virtude da propriedade da recursividade linguística. -AULA 16- 23) É possível encontrar um desempenho linguístico normal em condições cognitivas fora do normal? Situações que envolvam um desenvolvimento normal da linguagem independentemente de um desenvolvimento anormal de habilidades cognitivas podem ser encontradas no caso da síndrome de Down e da síndrome de Williams. Em ambos os casos temos condições cognitivas fora do normal, evolvendo um QI baixo, mas um desempenho linguístico normal. -AULA 17- 24) A aquisição da linguagem envolve aspectos fonológicos, lexicais, morfossintáticos e semântico- pragmáticos. Mencione alguns exemplos desses aspectos diversos que podem ser observados no estudo do processo de aquisição. No que diz respeito à fonologia, podemos observar que existem estágios de aquisição de segmentos e de sílabas. Dentre os primeiros sons que a criança adquire temos os sons /p/, /t/ e /k/ (o “c” de “casa”). Já outros sons como /l/ e o “lh”, /r/ e do /R/ (o “rr”) resultam mais difíceis. No que tange às sílabas, as que são formadas apenas por vogal já aparece cedo para as crianças, assim como sílabas formadas por consoante + vogal. No seguinte estágio, encontramos sílabas terminadas por consoante (“mar”) e semivogais (“pai”). Por fim, a união é interrompida por uma outra consoante: temos assim os encontros consonantais com /l/ e /r/ (“flor” e “três”, por exemplo); uma sílaba assim é estruturada como consoante-consoante-vogal. Essas constatações permitem entender melhor porque as crianças em fase de aquisição fazem certas trocas de sons, mas não qualquer uma. Com relação ao léxico, é possível observar que as primeiras palavras utilizadas pelas crianças são substantivos. Posteriormente, começam a ser incorporados os verbos e, apenas mais tarde, vão aparecer outros tipos de palavras: adjetivos, preposições, artigos, e daí por diante. É importante salientar que a atividade de nomear – que é a função essencial da classe dos substantivos ou nomes - aparece em primeiro lugar. Os verbos, por sua vez, fazem referência a acontecimentos, eventos que têm lugar no tempo, diferentemente dos substantivos. Embora haja uma preferência inicial pelos substantivos e verbos, isso não significa que a criança não utilize outras classes de palavras. Ou seja, a ordem não é imutável e pré-estabelecida. A palavra “não”, por exemplo, é bem comum e surge logo no começo do trajeto linguístico da criança. Outro aspecto interessante, diz respeito ao fato de que muitas vezes a criança utiliza um tipo de palavra valendo por todas de que ela precisa (Exemplo: “Bó” por “Quero a bola” ou “Me dá a bola”. Palavras não referenciais, tais como artigos, pronomes e proposições, parecem ser adquiridas um pouco mais tardiamente. Crianças pequenas prestam atenção a partes das palavras, mas não a qualquer parte, mas aquelas que trazem um pouco do significado total. Podemos afirmar que crianças, mesmo pequenas, têm habilidades para lidar com as palavras, suas partes e seus significados. No que tange à sintaxe, as crianças possuem conhecimentos sobre estruturas da língua que estão adquirindo. Assim, elas são capazes de reconhecer que uma estrutura está mal estruturada. Ao mesmo tempo, em termos sintáticos, certos tipos de frases podem ser bastante complexas para as crianças. Frases na voz passiva, com sujeito reversível, do tipo “A menina foi beijada pela mãe” são um exemplo de estrutura que não é bem compreendida pelas crianças (embora elas mesmas sejam capazes de falar frases desse tipo). O caso das orações relativas é outro exemplo de sentenças problemáticas. Por último, com relação aos aspectos semântico-pragmáticos, a criança não apenas precisa conhecer o significado das palavras, mas também precisa compreender as relações que existem entre os significados das palavras e das frases. Além disso, muitas vezes o contexto é fundamental para que certas expressões possam ser corretamente entendidas. Ou seja, a criança precisa aprender a lidar com essas situações também. Inicialmente, estabelecer essas conexões pode ser complicado e difícil e a criança vai demonstrar dificuldade para entender certos contextos semânticos. O completo domínio das nuances semântico-pragmáticas só se dá mais tardiamente e, até mesmo falantes adultos podem apresentar algumas dificuldades com certos significados não literais: ironia, sarcasmo, metáforas, etc. -AULA 18- 25) Em que consiste a situação linguística conhecida como pidgin e como esse fenômeno se relaciona com o crioulo? Relacione esses dois fenômenos linguísticos com o processo de aquisição de uma língua natural. O pidgin é o resultado do contato de duas (ou mais) línguas. Esse contato acontece por algum motivo social ou político; temos um exemplo na chegada dos portugueses no Brasil. Pidgin cumprem uma função comunicativa: permitir que dois povos se compreendam. Seguindo com o exemplo do acontecido no Brasil, sem o pidgin (no caso a chamada Língua Geral, que continha elementos do português e do tupi), não haveria possibilidade de comunicação entre os portugueses e dos índios devido à distância entre as línguas. A “mistura” torna a comunicação viável e um efeito colateral desse objetivo é a simplificação das estruturas que constituem o pidgin. Esse efeito, que pode ser visto de modo negativo por um lado, pode trazer o benefício da facilidade da aprendizagem do pidgin por novos falantes: quanto mais simples em estrutura e vocabulário, mais fácil de aprender e de ser difundido. Um pidgin muito difundido começa a extrapolar as funções de comunicação entre dois povos e pode passar a cumprir outras funções. Um espaço ganho por um pidgin difundido é a família: se há contato duradouro entre os povos, se não há necessidade de que as línguas que deram origem ao pidgin sejam utilizadas em situações informais, então o pidgin pode expandir seus espaços. Nesse tipo de situação, quando crianças travam contato com o pidgin como único sistema linguístico disponível, elas reorganizam esse sistema. Em outras palavras, crianças expostas a um pidgin tornam as estruturas e vocabulários simplificados em sistemas complexos e ampliados. Esses sistemas linguísticos completos, derivados do pidgin recebem o nome de crioulos. O Tok Pisin (Papua Nova Guiné) e o Papiamentu, falado no Caribe, são alguns exemplos desse fenômeno. Esses dois fenômenos podem ser relacionados com o processo de aquisição de uma língua natural na medida que o elemento-chave para a transformação de um pidgin em um crioulo não é sua expansão e, sim, o fato de o pidgin servir de sistema base para a criação de um novo sistema linguístico gerado e criado pelas crianças. Em outras palavras, enquanto um adulto aprendendo um pidgin para utilizá-lo em situações específicas (comércio, por exemplo) terá facilidade e não alterará esse pidgin; uma criança adquirindo um pidgin está transformando-o em seu sistema linguístico, sua língua materna. Dessas duas situações, podemos extrair a seguinte conclusão: o aprendizado possuirá limites que não se aplicam na aquisição; pidgin e crioulo são mais uma amostra de como os processos de aquisição e de aprendizagem de uma língua estrangeira são distintos. -AULA 19- 26) Desenvolva brevemente as principais características das três situações atípicas que envolvem crianças no desenvolvimento da linguagem estudadas: gagueira, déficit especificamente linguístico e dislexia. O tipo de gagueira mais estudado e considerado por fonoaudiólogos pode ser caracterizado como um problema na atividade de dar início a uma palavra, gerando repetições de sons ou sílabas, sendo que a causa desse problema tem raízes neurológicas e fisiológicas. Atualmente, uma hipótese linguística bastante aceita localiza o problema da gagueira em um momento do processamento da produção da linguagem, especificamente no componente que cuida de organizar os sons das palavras. O quadro denominado déficit especificameão, neurológicos, psicológicos e com QI considerado normal, mostram um desfasagem no desenvolvimento da linguagem quando comparadas com crianças sem problemas na mesma faixa etária. O diagnóstico do DEL é bastante complicado já que é realizado com base no critério de exclusão, ou seja, se a criança não apresenta nenhum dos problemas anteriormente mencionados, mas seu desenvolvimento linguístico é atípico, então ela muitas vezes é considerada como portadora de DEL. Esse tipo de diagnóstico traz dificuldades na medida que o DEL, ao envolver a linguagem, pode acabar envolvendo outras áreas, outros componentes da mente, como memória, raciocínio, etc. Pesquisas apontam que o DEL pode ter uma origem genética. O elemento central caracterizador da dislexia é a inabilidade de fazer a combinação correta de letras em uma palavra. Para uma criança ler corretamente a palavra “prato” é necessário juntar as letras “p”,“r”, “a”, “t” e “o” uma por uma. Imagine que uma parte do cérebro é responsável pela ordenação dessas letras e que essa parte pode apresentar um defeito. O resultado pode ser a união das letras mas em ordens diferentes: de “prato”, a criança poderia ler “parto” ou “porta”. Esse é o elemento central da dislexia, mas pode haver outros que acompanham certos casos mas não todos os casos. Em particular, a leitura de palavras isoladas (fora de contexto), raras, e em voz alta, é uma atividade difícil para as crianças disléxicas. Embora um leitor proficiente não siga um processo de leitura letra por letras (mas por segmentos maiores), a leitura por blocos, não é um fato que pertença aos momentos iniciais do aprendizado da leitura. Começamos aprendendo a ler letra por letra e mais tarde passamos a não precisar mais desse mecanismo e o substituímos por outro, o da leitura por blocos. Esses três fenômenos envolvem situações de desenvolvimento linguístico atípico. A gagueira está relacionada à produção da linguagem, a dislexia a um tipo específico de compreensão da linguagem escrita (a leitura) e o DEL tem um de caráter mais geral. Todos eles, embora se restrinjam ao componente da linguagem, têm repercussões na vida social de quem possui algum desses distúrbios. -AULA 20- 27) O que é a afasia? Explique brevemente em que consistem os tipos de afasia estudados no curso. A afasia envolve o deterioro ou comprometimento das habilidades linguísticas decorrente de uma lesão cerebral. Os motivos dessa lesão podem ser variados (traumatismo craniano, acidente vascular cerebral, doenças infecciosas como a meningite, etc.). Pacientes com lesão em áreas do cérebro responsáveis pela linguagem são chamados de afásicos. Segundo uma definição geral, a afasia de Broca envolve problemas na produção da linguagem, com preservação das restantes faculdades mentais. Pacientes com esse tipo de afasia apresentam problemas na construção de frases, mas são capazes de articular corretamente os dias da semana ou os meses do ano. A área do cérebro afetada corresponde a uma pequena área, a terceira circunvolução frontal do hemisfério esquerdo, chamada área de Broca em homenagem ao seu descobridor. Inicialmente, foi proposto que essa área seria a responsável pela articulação da linguagem. A chamada afasia de Wernicke, por sua vez, pode ser caracterizada por uma fala fluente, mas desprovida de sentido como resultado da falta de compreensão daquilo que é dirigido a esses pacientes. O local da lesão cerebral nesses casos é a parte posterior do lobo temporal esquerdo. Por ter sido descoberta por Wernicke, essa área ganhou seu nome e ficou conhecida como a área que sedia a compreensão da linguagem. Neste caso, aparentemente, as conexões entre conceitos e sons estão danificadas e por esse motivo os afásicos de Wernicke não só não compreendem o que lhes é dito, mas também produzem frases sem sentido. A anomia se caracteriza por problemas na nomeação fora isso, o afásico anômico possui fala fluente e níveis normais de compreensão. Pacientes anômicos podem nomear um lápis como “caneta”, um galo como “pato”, e daí por diante, apesar de nomear os objetos de forma errada eles não confundem os objetos entre si. Os erros encontrados nesses pacientes possuem uma explicação semântica (palavras de um mesmo campo semântico) ou fonológica (em vez de “lápis”, dizem “lata, laranja, lava”, palavras com alguns sons parecidos com os da palavra alvo). Um outro tipo é a chamada afasia de condução. Esse tipo de afasia recebe esse nome, pois se acredita que pessoas com esse problema não conseguem conduzir uma informação armazenada para a sua posterior articulação. O problema de um afásico de condução é não ser capaz de repetir sequer uma sequência de duas palavras como “casa, bola”. Os sons dessas palavras são armazenados em sua memória de curto prazo, mas não são passados para a articulação, perdendo-se no meio do caminho. O último tipo de afasia estudado é o agramatismo. Esse tipo de afasia parece afetar diretamente a competência linguística, produzindo uma alteração na capacidade de análise sintática, gerando construções frasais pobres e compreensão seletiva baseada em apenas em pistas semânticas. Agramáticos não produzem orações subordinadas nem interrogativas complexas e não compreendem frases que apresentam divergência de ordem canônica ou de atribuição de papel semântico a seus componentes.
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