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Algumas Patologias Comuns Filipa Sofia Sampaio 2017 Licenciatura em Enfermagem 1 CONTEÚDOS Dislipidemia/Hiperlipidemia ........................................................................................................................................................... 2 Aterosclerose .................................................................................................................................................................................... 7 Obesidade ....................................................................................................................................................................................... 13 Hábitos Saudáveis .......................................................................................................................................................................... 23 Hipertensão ..................................................................................................................................................................................... 24 Angina Pectoris ............................................................................................................................................................................... 37 Enfarte do Miocárdio ...................................................................................................................................................................... 40 Insuficiência cardíaca ..................................................................................................................................................................... 43 Arritmia cardíaca ............................................................................................................................................................................. 49 Doenças tromboembólicas ........................................................................................................................................................... 61 Edema .............................................................................................................................................................................................. 64 Diabetes Mellitus ............................................................................................................................................................................ 67 Doenças Pulmonares Obstrutivas ................................................................................................................................................. 76 Asma ................................................................................................................................................................................................. 77 Bronquite ......................................................................................................................................................................................... 81 Enfisema........................................................................................................................................................................................... 83 Bronquiectasia ................................................................................................................................................................................ 85 Tuberculose ..................................................................................................................................................................................... 85 Vírus da Imunodeficiência Humana e SIDA ............................................................................................................................... 88 edema pulmonar ............................................................................................................................................................................ 94 embolismo pulmonar ..................................................................................................................................................................... 96 Pneumonia ...................................................................................................................................................................................... 97 Modelo Transteórico da Mudança de Comportamento ............................................................................................................ 98 Teoria das Transições ................................................................................................................................................................... 103 2 DISLIPIDEMIA/HIPERLIPIDEMIA Lipoproteínas Tendo em conta que as gorduras são insolúveis em água, não podem ser transportadas sozinhas na corrente sanguínea. Assim, as gorduras são transportadas no sangue por proteínas hidrofílicas que funcionam como veículos de transporte. Os ácidos gordos livres são transportados pela albumina sérica, enquanto que os triglicerídeos e colesterol são transportados por lipoproteínas. Lipoproteína – estrutura/complexo que transporta moléculas lípidicas hidrofóbicas (gorduras) na água, sangue e líquido extracelular. Tem uma camada externa e um centro. o Camada externa Constituída por fosfolípidos e apolipoproteínas As porções hidrofílicas dos fosfolípidos estão orientadas para o exterior e as porções hidrofóbicas/lipofílicas estão orientadas para o interior/centro, em direcção às moléculas lipídicas. As apolipoproteínas ajudam a estabilizar o complexo e fornecem- lhe identidade funcional, determinando se os triglicerídeos e colesterol serão adicionados à lipoproteína ou removidos desta. o Camada interna Constituída por moléculas lipídicas – triglicerídeos e colesterol. São classificadas de acordo com a sua densidade em ULDL/ chylomicrons, VLDL, LDL e HDL. o Maior densidade menor tamanho ; Menor densidade maior tamanho. o ULDL / Chylomicrons – transportam moléculas lipídicas (triglicerídeos e colesterol), provenientes da dieta, dos intestinos (enterócitos) para o fígado, músculo esquelético e tecido adiposo. Têm maior proporção de triglicerídeos. o VLDL – transportam moléculas lipídicas do fígado para o tecido adiposo. Têm maior proporção de triglicerídeos. o LDL – transporta moléculas lipídicas para as células. Têm maior proporção de triglicerídeos. o HDL – apanha/capta as moléculas lipídicas das células e tecidos e levam- nas de volta ao fígado para excreção. São conhecidas como “lipoproteínas boas” porque captam as moléculas lipídicas que se acumulam nos vasos 3 sanguíneos e entregam-nas ao fígado, relacionando-se assim com menor aterosclerose nas paredes arteriais. Têm maior proporção de colesterol. Lipase lipoproteica – Hidroliza os triglicerídeos em lipoproteínas LDL e placas ateromatosas o As LDL são as principais transportadoras de colesterol na corrente sanguínea. o As LDL contêm apolipoproteínas reconhecidas pelos receptores de LDL presentes nas células. Estes receptores são usados durante a absorção do colesterol. A síntese destes receptores de LDL é regulada de acordo com a quantidade de colesterol dentro da célula, de forma que a célula bloqueia a síntese de receptores de LDL se tiver colesterol suficiente e mantém a síntese de receptores de LDL se não tiver colesterol suficiente. o Quando este processo se torna desregulado, moléculas LDL sem receptores começam a acumular-se na corrente sanguínea, sofrem oxidação e são consumidas por macrófagos, que formam células espumosas. Estas células espumosas ficam presas nas paredes dos vasos, retidas por proteoglicanos, e contribuem para a formação da placa ateromatosa.Triglicerídeos Formados por 1 glicerol e 3 ácidos gordos livres. Componentes maioritários dos chylomicrons e VLDL Função – desempenham um papel importante no metabolismo – Quando o corpo requer fontes de energia, a hormona glucagon estimula a desagregação dos triglicerídeos pela lipase para libertar os ácidos gordos livres e o glicerol. A partir do glicerol, ocorre a gliconeogénese no fígado, que consiste na produção de glicose a partir de compostos não açúcares ou não carboidratos. Produção – são sintetizados e armazenados no fígado e tecido adiposo. Colesterol Função – Componente estrutural essencial das membranas celulares, importante para estabelecer uma adequada fluidez e permeabilidade. É também essencial para a produção de ácidos biliares, hormonas esteróides e vitamina D. Produção – Cerca de 20-25% da produção total de colesterol diária ocorre no fígado. 4 É reciclado no corpo. O fígado excreta o colesterol através da bílis no sistema digestivo e cerca de 50% do colesterol excretado é reabsorvido pelo intestino delgado para a corrente sanguínea. O colesterol é necessário para o funcionamento normal da membrana plasmática de células de mamíferos, sendo sintetizado no retículo endoplasmático das células ou derivado da dieta, sendo que na segunda fonte é transportado pela via sanguínea pelas lipoproteínas de baixa densidade e é incorporado pelas células através de endocitose mediada por receptores em fossas cobertas de clatrina na membrana plasmática, e então hidrolizados em lisossomas. O colesterol é sintetizado primariamente da acetil CoA através da cascata da HMG-CoA redutase em diversas células e tecidos. Cerca de 20 a 25% da produção total diária (~1 g/dia) ocorre no fígado; outros locais de maior taxa de síntese incluem os intestinos, glândulas adrenais e órgãos reprodutivos. A maioria do colesterol circulante no sangue é sintetizado através da acetil CoA no fígado e excretado como sais biliares. Apenas uma pequena parte de colesterol sanguíneo é proveniente da dieta, mas dietas ricas em gorduras aumentam a produção de colesterol pelo fígado e os níveis de colesterol sanguíneos. O que é a dislipidemia Dislipidemia, (geralmente por hiperlipidemia ou hiperlipoproteinemia) é um distúrbio nos níveis de lipídios e/oulipoproteínas no sangue. Hiperlipidemia ou dislipidemia significa que há persistentemente uma concentração alta de compostos gordurosos (lípidos), tais como colesterol e triglicerídeos, no sangue. A dislipidemia pode ser divida em três subtipos: Hipercolesterolemia isolada Hipertrigliceridemia isolada Dislipidemia mista (ambos os níveis elevados) Hipertrigliceridemia – aumento dos níveis sanguíneos de triglicerídeos. Causas: Dieta rica em carboidratos e gorduras Idiopática Obesidade Diabetes mellitus e resistência à insulina Consumo de álcool em excesso Insuficiência renal, síndrome nefrótica 5 Predisposição genética Deficiência na lipase lipoproteica Deficiência na lipace ácida lisossomal Alguns medicamentos como estrogénios, hidroclorotiazidas, diuréticos, beta bloqueadores, inibidores de proteases, anticonvulsivantes, medicamentos para o HIV Hipotiroidismo Lúpus sistémico eritematoso Hipercolesterolemia – O termo hipercolesterolemia refere-se a níveis aumentados de colesterol na corrente sanguínea. Condições com elevadas concentrações de partículas LDL oxidadas, especialmente partículas LDL pequenas, estão associadas com a formação de ateromas nas paredes das artérias, uma condição conhecida como aterosclerose, que é a principal causa de doença coronariana cardíaca e outras formas de doença cardíaca. Em contraste, as partículas de HDL (especialmente HDL grandes) têm sido identificadas como um mecanismo pelo qual o colesterol e mediadores inflamatórios podem ser removidos do ateroma. As taxas aumentadas de HDL estão relacionadas a taxas menores de progressão e até mesmo regressão dos ateromas. De forma simplificada, um triacilglicerol é formado pela união de três ácidos graxos a uma molécula de glicerol, cujas três hidroxilas (grupos –OH) ligam-se aos radicais carboxílicos dos ácidos graxos. Causas: Genética Dieta rica em colesterol, gorduras transsaturadas Stress e hormonas – glucocorticoides Hipotiroidismo Medicamentos como anticonvulsivantes, medicamentos para o HIV, etc Consequências As anormalidades nos lipídios e lipoproteínas são extremamente comuns na população geral, e são consideradas um factor de risco altamente modificável para doenças cardiovasculares, devido à influência do colesterol, uma das substâncias lipídicas clinicamente mais relevantes, na aterosclerose. Algumas formas de dislipidemia podem também predispor à pancreatite aguda podendo ate mesmo ser um fator agravante nos casos de embolia pulmonar. A hiperlipidemia está associada 6 a uma tendência aumentada para aterosclerose e doenças associadas com aterosclerose. Tratamento: Objectivos Reduzir risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares como hipertensão, angina pectoris, EAM, insuficiência renal e AVC: o Reduzir processo aterosclerótico o Remover parcialmente material aterosclerótico formado anteriormente O elemento mais importante do tratamento é a mudança no estilo de vida: Redução de peso corporal Aumento da actividade física Cessação tabágica Dieta com quantidades reduzidas de gorduras saturadas Grupos de drogas relevantes: Estatinas Resinas Fibratos Concentrados de óleos de peixe 7 ATEROSCLEROSE O que é aterosclerose Doença inflamatória crónica caracterizada pela formação de ateromas dentro dos vasos sanguíneos. O que é o Ateroma Placa composta por lípidos e tecido fibroso, que se forma na parede dos vasos. O volume dos ateromas aumenta progressivamente, podendo ocasionar obstrução total em algum ponto do vaso. Formação do ateroma Partículas LDL acumulam-se na corrente sanguínea LDL penetram na parede do vaso e atravessam o endotélio, chegando à camada íntima da parede Uma vez dentro da parede endotelial, as partículas LDL tornam-se mais susceptíveis a oxidação por radicais livres. As células endoteliais respondem atraindo glóbulos brancos, como monócitos, fazendo com que estes abandonem a corrente sanguínea e penetrem nas paredes arteriais, transformando-se em macrófagos. Os macrófagos ingerem as partículas de LDL oxidadas e dão origem a células espumosas. Estas células espumosas ficam presas nas paredes dos vasos, retidas por proteoglicanos Estas células espumosas crescem e eventualmente rompem, deixando para trás remeniscentes de membrana celular, materiais oxidados e gorduras (incluindo colesterol) na parede arterial. Isto, por sua vez, atrai mais glóbulos brancos, resultando num efeito bola-de- neve, que inflama a artéria. A presença de placa leva as células musculares do vaso a esticarem e o revestimento endotelial torna-se mais espesso, levando a uma diminuição do lúmen e levando a parede a tornar-se mais endurecida e menos complacente. A placa de ateroma é constituída por 2 camadas: o Capa fibrosa externa, que consiste em várias camadas de células achatadas embebidas numa matriz extracelular de tecido conjuntivo 8 denso ao lado de lâminas de material amorfo, proteoglicanos, fibras de colagéneo e células musculares lisas. o Núcleo interno constituído por células espumosas, íntegras ou rotas, e tecido conjuntivo. No centro da placa fibrosa há uma área de tecido necrótico, debris, cristais de colesterol e de cálcio. Com a evolução do processo ateromatoso, ocorrem diversos eventos Vindos da adventícia, nascem vasos que fazem intensa vascularizaçãoda média e da íntima. Aumenta a deposição de cálcio e células necróticas. Surgem rupturas, fissuras, ulcerações e hemorragias da placa, que pode desprender-se. A exposição da subíntima ulcerada gera a deposição de plaquetas, coagulação sanguínea, trombose e eventual oclusão do vaso. 9 10 11 12 13 OBESIDADE O que é a obesidade Patologia que se caracteriza por excesso de gordura corporal É consequência de um desequilíbrio da homeostasia energética A quantidade de energia ingerida é superior à quantidade de energia despendida. Fisiopatologicamente, a obesidade resulta de um aumento do número e tamanho dos adipócitos. Anatomicamente, a obesidade pode ser classificada com base no número de adipócitos, a distribuição regional da gordura corporal e as características dos depósitos de gordura. Tendo em conta o número e tamanho dos adipócitos, a obesidade pode ser hipertrófica ou hiperplásica: na obesidade hipertrófica, o aumento do tamanho dos adipócitos está associado a uma distribuição essencialmente abdominal da gordura e distúrbios metabólicos como dislipidemia, hipertensão arterial, doenças coronárias, intolerância à glicose, etc. Por outro lado, na obesidade hiperplásica, o aumento do número de adipócitos está associado a casos de obesidade desenvolvidos durante a infância, que tendem a ser severos. Também pode ocorrer em adultos, sendo expectável em adultos cujo IMC é > 40kg/m2. No que diz respeito à distribuição regional da gordura corporal, é importante perceber se a gordura está essencialmente distribuída no tecido subcutâneo ou no compartimento visceral, uma vez que a presença gordura visceral representa um maior risco para a saúde. A gordura subcutânea, correspondendo a cerca de 80% da gordura total do organismo, distribui-se por todo o corpo, enquanto que a gordura visceral está presente principalmente na região abdominal. Avaliação do doente obeso IMC – calculado a partir do peso e altura do indivíduo. A utilização do IMC para avaliar o risco de obesidade é importante, uma vez que providencia uma medida da gordura corporal total mais fiável quando comparada com a medição do peso corporal apenas. 14 Perímetro abdominal e rácio perímetro abdominal/perímetro da anca O excesso de gordura abdominal é um importante fator preditivo do risco associado à obesidade ou excesso de peso. Na prática, para avaliar a medida em que a distribuição da gordura corporal representa um risco para a saúde do doente, são utilizados o perímetro abdominal e/ou o rácio entre o perímetro abdominal e da anca, no entanto, para medir de forma eficaz a gordura visceral, são necessárias a tomografia computorizada e a ressonância magnética. O rácio entre o perímetro abdominal e da anca pode ser calculado dividindo a medida da cintura ou perímetro abdominal pelo perímetro da anca. Este rácio deve ser igual ou inferior a 0,90 nos homens e igual ou inferior a 0,80 nas mulheres, sendo que um rácio igual ou superior a 1,0 é considerado como fator de risco para a saúde. A utilização do rácio entre o perímetro abdominal e da anca não representa uma vantagem em comparação com a utilização do perímetro abdominal apenas. 15 A medição do perímetro abdominal é bastante útil em indivíduos com peso normal ou excesso de peso, não sendo particularmente útil em indivíduos cujo IMC seja igual ou superior a 35 kg/m2. Homens que tenham perímetro abdominal superior a 102 cm e mulheres que tenham perímetro abdominal superior a 89 cm têm maior risco de desenvolver diabetes, dislipidemia, hipertensão e doença cardiovascular devido ao excesso de gordura abdominal. A avaliação do IMC e perímetro abdominal deve ser feita para avaliar inicialmente o indivíduo obeso, mas também para monitorizar a eficácia do tratamento de perda de peso. 16 17 Factores que contribuem para o desenvolvimento de obesidade Fármacos, cessação tabágica, estilo de vida sedentário, dieta, fatores sociais, fatores comportamentais e psicológicos, fatores socioeconómicos e culturais, distúrbios genéticos e congénitos. Estilo de vida sedentário Diminui o dispêndio de energia e predispõe para o aumento do peso. O aumento do IMC é visível em crianças que passam muito tempo a ver televisão. “Ver televisão excessivamente promove o excesso de peso, não só por ser uma atividade passiva, que aflui numa diminuição do gasto energético, mas por existir uma relação entre este fator e a ingestão alimentar. Para além da tendência de se comer em frente ao televisor, os anúncios publicitários alusivos a géneros alimentares, muitos dos quais desaconselhados numa alimentação saudável, impelem para a compra e consumo desses mesmos produtos”. Também os adultos que têm trabalhos mais sedentários e que utilizam o carro para se deslocar no dia-a-dia, por exemplo, estão em maior risco de desenvolver excesso de peso. Tempo de sono Menos tempo de repouso noturno pode expor a criança a fatores que contribuem para o excesso de peso, como a ingestão alimentar durante a noite, visualização excessiva de televisão e menor atividade física. Dieta Assume grande importância na medida em que a relação entre o que é ingerido e o que é gasto pode levar ao aumento de peso. Estudos revelam que a amamentação pode, mais tarde, reduzir a prevalência de obesidade, sendo essa uma das razões pela qual a amamentação deve ser mantida durante pelo menos 6 a 12 meses. Comer em grandes quantidades, excedendo as necessidades energéticas diárias, e uma dieta composta por alimentos com alto índice glicémico, pobre em fibra, rica em calorias, gorduras, sal e açúcar aumenta o risco de obesidade. Também a frequência das refeições é importante – comer poucas refeições por dia predispõe ao aumento de peso, na medida em que os níveis médios de glucose e colesterol no sangue são mais altos em indivíduos que comem poucas refeições, compostas por grande quantidade de comida. 18 Cessação tabágica – A cessação tabágica está associada a um aumento do apetite, aumento da ingestão alimentar, e diminuição do metabolismo basal. Com a cessação tabágica, verifica-se uma melhoria dos sentidos, essencialmente do paladar e do olfato, aumentando o prazer associado ao acto de comer e a ingestão de alimentos, especialmente hidratos de carbono simples e gorduras. Após a cessação tabágica, as concentrações plasmáticas de algumas hormonas sofrem alterações: o Leptina e grelina – principais mediadoras do apetite e da ingestão alimentar. A concentração de leptina aumenta e a de grelina diminui, provocando o aumento do IMC e de gordura corporal. o Adrenalina, noradrenalina e hormonas da tiroide – os seus níveis diminuem, diminuindo o dispêndio de energia em descanso e durante atividade física ligeira. A cessação tabágica altera ainda a homeostasia da insulina, a atividade da lipoproteína lipase, a atividade do Sistema Nervoso Simpático, os níveis de atividade física, as preferências alimentares e o tempo de esvaziamento gástrico. Os fumadores que têm uma alimentação menos saudável e menor atividade física têm sete vezes mais probabilidade de aumentar 5 kg ou mais após a cessação tabágica. A probabilidade de aumentar o peso é maior durante os dois anos seguintes à cessação tabágica, sendo que o peso diminui algum tempo depois. Influência dos pais A ingestão calórica da mãe pode influenciar o tamanho, forma e composição corporal da criança mais tarde. Crianças com mães diabéticas têm maior risco de desenvolver excesso depeso. Crianças com pais obesos têm maior risco de desenvolver obesidade. O controlo excessivo dos pais sobre os comportamentos alimentares das crianças poderá conduzir a que estas crianças sejam menos capazes de se autodisciplinarem no que diz respeito à alimentação, pelo que a OMS alguma flexibilidade por parte dos pais, permitindo às crianças desenvolverem a sua capacidade para autoregular a sua ingestão alimentar. 19 Distúrbios alimentares Distúrbios caracterizados por episódios incontroláveis de ingestão de alimentos, geralmente à noite, também contribuem para a obesidade. Distúrbio de ingestão compulsiva de alimentos – doentes com este distúrbio são frequentemente obesos e podem apresentar-se com outros distúrbios associados à obesidade. Revelam desconforto relativamente à ingestão exagerada de alimentos. Apresentam-se, em comparação com outros doentes obesos que não sofram de distúrbio de ingestão compulsiva de alimentos, sinais de distúrbios gastrointestinais como náuseas, vómitos, dor abdominal, etc. Uma preocupação na utilização de dietas caloricamente restritivas em doentes obesos é que este tipo de restrição pode desencadear um distúrbio de ingestão compulsiva de alimentos nestes doentes. Síndrome de ingestão de alimentos noturna – doentes muitas vezes têm níveis de cortisol elevados durante as 24h. Ao contrário do esperado, nestes doentes, ao fim do dia, não ocorre aumento da melatonina e leptina, o que está associado a distúrbios do sono e consumo de alimentos durante o período noturno. A ingestão de alimentos durante a noite está associada ao aumento do peso. Pessoas obesas com distúrbio de ingestão de alimentos durante a noite têm maior dificuldade em perder peso. Fatores socioeconómicos A obesidade é mais prevalente em grupos com nível socioeconómico e nível educacional do agregado familiar mais baixos, sendo que estes fatores condicionam não só a escolha alimentar, mas também comportamentos como a prática regular de atividade física. Experiências de vida adversas e traumáticas Divórcio, prisão e/ou morte dos pais Viver com pessoas com distúrbios psiquiátricos e/ ou distúrbios aditivos Presenciar e/ou ser vítima de violência doméstica, abuso físico, emocional e/ou sexual, discriminação, etc Períodos críticos para o desenvolvimento de obesidade O excesso de peso pode desenvolver-se em qualquer idade, mas é mais comum em certas faixas etárias, havendo períodos críticos na génese desta doença e das suas complicações: Fase gestacional 20 o O desenvolvimento normal do tecido adiposo inicia-se logo no período intrauterino, durante o qual ocorre hiperplasia (aumento do número) e hipertrofia (aumento do tamanho) dos adipócitos. Primeiros anos de vida o Após o nascimento, durante o primeiro ano de vida, há um aumento do tamanho dos adipócitos, com aumento do IMC. o Entre o primeiro e o segundo ano de vida, o número de adipócitos mantém-se estável e há uma diminuição do tamanho destas células, o que, associado ao facto de a criança continuar a crescer, leva a um aparente emagrecimento. o O IMC diminui desde o primeiro ano de vida até aos 5 ou 7 anos. Período do ressalto adipocitário o Por volta dos 5 a 7 anos há um período de rápido aumento da gordura corporal com aumento do IMC, provocado por hiperplasia e hipertrofia dos adipócitos – período do ressalto adipocitário. o Quanto mais cedo este ressalto ocorre, maior é o grau e a velocidade de deposição de massa gorda e, portanto maior é o risco de excesso de peso mais tarde (as crianças que fazem o ressalto adipocitário antecipadamente ganham até três vezes mais massa gorda e a velocidade de deposição da massa gorda é duas vezes maior do que nas crianças que o fazem tardiamente). o Quanto mais elevado for o IMC da criança, mais cedo ocorrerá o ressalto adipocitário. o A partir deste ponto do ressalto adipocitário, a gordura corporal aumenta, em ambos os sexos, até à puberdade. Puberdade o Na puberdade, devido às alterações hormonais, a gordura corporal continua a aumentar nas raparigas, que têm então maior risco de desenvolver obesidade, e diminui nos rapazes, que têm um aumento da massa magra. Adolescência o Durante a adolescência, para além das alterações na quantidade de gordura corporal, há também alterações na distribuição da massa gorda. A presença de obesidade nestes períodos críticos constitui um fator de risco para a ocorrência de obesidade e das suas complicações na idade adulta. Grande parte das crianças com excesso de peso continua com excesso de peso na idade adulta. 21 As idades entre os 3 e 10 anos de idade representam um período de grande risco para o desenvolvimento de obesidade. Consequências da obesidade A obesidade infantil é um forte preditor de obesidade no adulto Constitui um fator de risco para o desenvolvimento de doenças crónicas na idade adulta, como: o Diabetes o Doença cardiovascular o Dislipidemia o Doença da vesícula biliar o Hipertensão arterial o Aterosclerose o Apneia de sono o Osteoartrite o Algumas formas de cancro Aumento da morbilidade e mortalidade precoce Consequências emocionais/psicológicas o As pessoas obesas são vulgarmente estereotipadas como preguiçosas, com fraco rendimento escolar/profissional e incompetentes o Rejeição pelos próprios companheiros o Bullying o Dificuldades de interação social e relacional, levando a isolamento o Insatisfação com o corpo o Baixa autoestima o Desenvolvimento de distúrbios de comportamento alimentar o Depressão o Ideação suicida Prevenção e tratamento da obesidade Perda de peso A perda de peso é recomendada a indivíduos com IMC igual ou superior a 30 e em indivíduos com IMC entre 25 e 29,9 ou com perímetro abdominal considerado de risco e dois ou mais fatores de risco. Consideram-se fatores de alto risco as doenças ou condições como doença cardiovascular, diabetes tipo 2, apneia de sono, hipertensão, tabagismo, LDL elevado, baixo HDL, intolerância à glicose, história familiar de doença 22 cardiovascular e idade (homens idade igual ou superior a 45 anos, mulheres idade igual ou superior a 55 anos). Uma perda inicial de 10% do peso corporal em 6 meses é o objetivo recomendado. O ritmo de perda de peso deve ser cerca de 0,5 a 1kg por semana. Após 6 meses de terapia para perda de peso, o objetivo deverá ser manter o peso. Após um determinado período de manutenção do peso, poderá ser considerada uma maior perda de peso. Alimentação – dieta com menor teor em gorduras e em calorias A ingestão calórica deve ser reduzida cerca de 500 a 1000 kcal por dia em relação ao nível atual. A dieta deve ser baixa em calorias, mas não demasiado (< 800 kcal). Em geral, dietas com 1000 a 2000 kcal/dia podem ser utilizadas para a maioria das mulheres, e dietas com 1200 a 1600 kcal/dia podem ser utilizadas em homens ou também em mulheres que pesem mais de 75 kg ou que façam exercício. Apesar de a gordura ser uma das fontes ricas em calorias, reduzir o teor de gordura da dieta sem reduzir as calorias ingeridas não irá produzir perda de peso adequada. A ingestão de gordura deve ser igual ou inferior a 30% das calorias totais. (National Institutes of Health, 2000) Exercício/Actividade física No doente obeso, a actividade física deve ser aumentada lentamente e com cuidado, para evitar lesões. Atividades como caminhada, dança, jardinagem, desporto individual ou de grupo podem ajudar a satisfazer este objetivo. O objetivo deverá ser aproximadamente 30 min ou mais de atividade física com intensidade moderada na maioria ou, preferencialmente, todos os dias da semana. Menos comportamentos sedentários Métodos farmacológicos Poderá ser útil em doentes de alto risco. Se as alterações no estilo de vida não promoverem perda de peso após 6 meses, a terapia farmacológica pode ser considerada. 23 Está atualmente limitada a sua utilização em doentes com IMC igual ou superior a 30 ou doentes com IMC igual ou superior a 27 que tenham fatores de risco ou doenças concomitantes. Se o doente não perdeu 2 kg após 4 semanas, é pouco provável que beneficie do tratamento com fármacos. Terapia comportamental É particularmente útil como terapia adjuvante das outras terapias como a atividade física e a dieta, aumentando a eficácia e durabilidade dos resultados das mesmas. Estratégias comportamentais incluem, por exemplo, autovigilância, gestão do stress, controlo de estímulos, resolução de problemas, suporte social, restruturação cognitiva, etc. Cirurgia para perda de peso É uma opção viável para doentes que tenham obesidade severa (IMC igual ou superior a 40) ou IMC igual ou superior a 35 que tenham fatores de alto risco. A cirurgia de perda de peso promove perda de peso significativa por 5 anos ou mais na maioria dos doentes. HÁBITOS SAUDÁVEIS Alimentação Saudável Dieta equilibrada e variada que vai de encontro às necessidades de cada pessoa, nomeadamente, peso, sexo, idade e estilo de vida. Adoptar alimentação saudável não implica fazer uma alimentação restritiva ou monótona, mas sim variada, uma vez que diferentes alimentos contribuem com diferentes nutrientes. Nº de refeições por dia o Tomar sempre pequeno almoço o Deve ser 5 a 6 refeições por dia, de 3 em 3 horas Composição da alimentação o Aumentar consumo de frutas e legumes – 5 porções de frutas e legumes por dia (300 a 4000 gr por dia) o Aumentar consumo de alimentos ricos em fibra (frutas, legumes, cereais integrais, feijão, frutas secas) o Aumentar consumo de peixe, carnes brancas, alimentos menos processados 24 o Aumentar consumo de água – deve ser 1,5l por dia (aprox. 8 copos) o Utilizar azeite em vez de óleo o Diminuir consumo de alimentos hipercalóricos o Diminuir consumo de gordura – consumir menos alimentos ricos em gorduras como fast food, fritos o Diminuir consumo de sal – não deve exceder os 5 gr por dia o Diminuir consumo de açúcar – não deve exceder os 50gr por dia (12 colheres de café) o Diminuir consumo de álcool – não deve exceder os 20 a 30gr diários no homem (2 copos de vinho) e os 10 a 20 gr diários na mulher (1 copo de vinho). Semanalmente, os homens não devem ingerir mais do que 140gr e as mulheres mais do que 80gr Atenção aos sumos ou refrigerantes – 1 Iced Tea de limão, com 330 ml, tem 13 gr de açúcar. 1 compal light com 330 ml tem 13 gr de açúcar. 1 compal com 330 ml tem 31 gr de açúcar. 1 sumol, pepsi ou 7up com 330 ml tem 35 ou 36 gr de açúcar. Etc, etc. Exercício/ Actividade física 4 a 7 vezes por semana, durante 30 a 60 minutos, de acordo com a condição física da pessoa. HIPERTENSÃO Fisiopatologia – Regulação da Pressão Sanguínea A pressão sanguínea é determinada pela resistência vascular periférica e volume de sangue circulante. As arteríolas são a parte mais importante do sistema cardiovascular na regulação da pressão sanguínea. Têm músculo liso circular (em forma de anel) nas suas paredes. Quando estes músculos contraem, as arteríolas contraem (vasoconstrição) e a resistência ao fluxo sanguíneo aumenta. O coração tem, então, que bater com mais força para empurrar o sangue ao longo dos vasos sanguíneos, e a pressão arterial aumenta. Aumento do [Ca2+]intracelular vasoconstrição Aumento do [GMPc]i, [AMPc]i e diminuição do [Ca2+]i vasodilatação 25 Determinantes do volume vascular O músculo liso vascular é controlado por: Mediadores secretados por nervos simpáticos Mediadores secretados pelo endotélio vascular Hormonas circulantes Permeabilidade capilar e filtração de fluidos Sensores e sinais de volume Regulação do tónus vascular e da pressão arterial – ocorre principalmente através de: Sistema nervoso autónomo – nas grandes artérias perto do coração (arco aórtico e artéria carótida esquerda) e no ventrículo esquerdo, há receptores de pressão (barorreceptores) que monitorizam a pressão sanguínea. Por exemplo, quando há um aumento rápido na pressão sanguínea, este aumento vai ser percebido pelos barorreceptores (à medida que as paredes das artérias e do ventrículo esquerdo distendem mais do que o habitual). Potenciais de acção são transmitidos para o centro cardiovascular na medula. Isto resulta numa diminuição da frequência cardíaca, diminuição da força de contracção e inibição da vasoconstrição. Assim, a pressão sanguínea regressa ao normal. Também a inervação simpática renal influencia a regulação do volume: aumenta a produção de renina (activação beta 1 nas células mesangiais justaglomerulares) e controla a vasoconstrição das arteríolas aferentes e eferentes renais. Endotélio vascular – o endotélio vascular actua não só como barreira passiva entre plasma e líquido extracelular, mas também como fonte de numerosos e potentes mediadores, que controlam a contracção da musculatura lisa subjacente e influenciam a função plaquetária e das células mononucleares. Os vasoconstritores também causam mitogénese do músculo liso, enquanto que os vasodilatadores inibem a mitogénese. o Prostaciclina (vasodilatador), óxido nítrico (NO, vasodilatador), peptídio natriurético C (vasodilatador), adrenomedulina (vasodilatador), angiotensina II (vasoconstritor), endotelina (vasoconstritor), ácidos epoxieicosatrienoicos (vasodilatador), peróxido de hidrogénio (vasodilatador), monóxido de carbono (vasodilatador), sulfeto de hidrogénio (vasodilatador). Peptídeos natriuréticos o Libertados das aurículas (peptídeo natriurético A), ventrículos (peptídeo natriurético B) e endotélio (peptídeo natriurético C) em resposta a 26 sobrecarga de fluidos. Tem efeitos nos sistemas cardiovascular, renal e SNC: Relaxamento vascular (aumento de GMPc) Aumento da permeabilidade capilar (diminuição do volume intravascular) Aumento da TFG (taxa de filtração glomerular) e natriurese (antagonismo da ADH e da reabsorção de sódio) Diminuição da percepção de sede e do tónus simpático Sistema renina-angiotensina-aldosterona – os rins contribuem para a regulação da pressão sanguínea alterando o grau de vasoconstrição e o volume de sangue circulante. Por exemplo, quando a pressão sanguínea desce, a estimulação simpática do rim controla a vasoconstrição das arteríolas aferentes e eferentes renais e aumenta a produção de renina (activação beta 1 nas células mesangiais justaglomerulares), que vai metabolizar o angiotensinogénio (produzido no fígado) em angiotensina I. A ECA (enzima de conversão da angiotensina) metaboliza a angiotensina I em angiotensina II. o A angiotensina II tem os seguintes efeitos: Vasoconstrição arteriolar, que resulta num aumento da pressão sanguínea. Aumenta a actividade simpática Aumenta a reabsorção tubular de sódio e cloro e excreção de potássio e retenção de água. Estimula as glândulas adrenais a aumentar a libertação de aldosterona. A aldosterona aumenta a reabsorção de sódio da urina para o sangue. Juntamente com o sódio, é reabsorvida água. Desta forma, o volume de sangue circulante aumenta, produzindo um aumento da pressão sanguínea. Estimula o lobo posterior da glândula pituitária a secretar ADH (vasopressina, hormona antidiurética humana), que provoca vasoconstrição periférica (receptores V1) e reabsorção de água no túbulo colector renal (receptores V2). Receptores AT1 – vasoconstrição, secreção dealdosterona, prostaglandinas, vasoconstrição, crescimento, proliferação, produção de matriz. Receptores AT2 – diminuição do crescimento, apoptose, diferenciação, vasodilatação. Faz um contrabalanço dos efeitos AT1 e está presente em desenvolvimento fetal e situações patológicas. 27 Controlo da produção de renina é feito por sensores de pressão nas arteríolas aferentes, activação simpática beta 1 e feedback tubuloglomerular. 28 29 30 O que é a pressão arterial Quando o coração bate, ele contrai e bombeia sangue pelas artérias para o resto do corpo. Esta força cria uma pressão sobre as artérias, chamada pressão arterial sistólica. Quando o coração relaxa, entre um batimento e outro, há uma pressão nas artérias que se chama pressão arterial diastólica. A pressão arterial varia ao longo do dia e depende das respostas às atividades diárias bem como às emoções. Assim, esta é considerada uma doença crónica, na qual está presente elevados níveis de pressão sanguínea nas artérias. Medição da pressão sanguínea A medição da PA deve ser realizada: o Em ambiente acolhedor e calmo; o Sem pressas o Após 5 ou 10 minutos de descanso o Com a bexiga vazia o Não ter fumado, ingerido estimulantes tais como o café nem feito exercício na hora anterior ou pelo menos nos últimos 30 minutos. o Com a pessoa sentada e relaxada, com as costas e os braços devidamente apoiados e com o braço desnudado e ao nível do coração. o Usando braçadeira de tamanho adequado o A medição deve ser feita no membro superior em que foram detetados valores mais elevados da PA em consultas anteriores. Em cada consulta deve medir-se a PA pelo menos duas vezes com um intervalo mínimo entre elas de um a dois minutos. Considerar uma terceira medição se houver uma grande discrepância entre os dois valores iniciais medidos e assinalar essa diferença no processo clínico Registar no processo clínico o valor mais baixo registado da PAS e da PAD, o braço em que foi medida, a braçadeira utilizada, a hora da medição e, alguma circunstância particular, como stress, febre ou agitação. O que é a Hipertensão – pressão arterial mais elevada do que o normal/adequado. Considera-se que um indivíduo é hipertenso quando Tem uma pressão arterial repetidamente superior ou igual a 140mmHg para a sistólica e/ou 90mmHg para a diastólica. (Só podemos afirmar que uma pessoa é hipertensa quando a sua pressão arterial apresenta o resultado igual ou superior a PAS140/PAD90 em 2 consultas diferentes, com um intervalo mínimo de 1 semana. Isso porque uma alteração pode acontecer em situações de 31 estresse ou exercício intenso, mas quando a pressão é alta mesmo se a pessoa estiver relaxada, é sinal de um quadro crónico). Para certos doentes, como os diabéticos ou renais ou já com doença cardiovascular, recomenda-se que tenham valores inferiores a 130/80mmHg. Todos os doentes com HTA grau 3, assim como todos os doentes com grau 1 e 2 com risco cardiovascular (CV) alto ou muito alto, são candidatos a tratamento farmacológico precoce. Causas de HTA 90 a 95% dos casos – não há causa orgânica, sendo causada por: o Predisposição genética/hereditariedade o Factores internos de risco Idade (mais comum em idade > 60 anos) Género e etnia (mais comum em homens e indivíduos de cor negra) o Factores externos de risco Dislipidemia – Hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia Alimentação Composição – consumo excessivo de gorduras, sal e açúcares (o alto consumo de açúcares adicionados na dieta pode provocar aumento de 7mmHg/5mmHg na pressão sanguínea; o alto consumo de sal/sódio pode provocar aumento de 4mmHg/2mmHg na pressão sanguínea). Número de refeições Consumo de álcool Tabagismo Sedentarismo 32 Obesidade Stress Uso de anticoncepcionais 5 a 10% dos casos – são provocados por doenças orgânicas ou distúrbios hormonais (distúrbio da tiróide, suprarrenal, etc). Sintomas de HTA Cefaleias Tonturas Hemorragias nasais (epistaxis) Visão turva Zumbido no ouvido Dor no peito Consequências da HTA – A pressão arterial persistentemente elevada pode provocar: Danos nos vasos sanguíneos,principalmente dos principais órgãos vitais do organismo tais como o coração, cérebro e rim. Remodelação das artérias – a remodelação das artérias em resposta à elevação da pressão arterial reduz a proporção entre diâmetro do lúmen e espessura da parede e aumenta a resistência vascular periférica. Maior predisposição para aterosclerose. Hipertrofia do ventrículo esquerdo – como a hipertensão exige um maior esforço por parte do coração, pode levar a uma hipertrofia ventricular e, posteriormente, a uma dilatação. Insuficiência cardiaca Insuficiência renal Angina de peito AVC EAM Tratamento Objectivo do tratamento – reduzir o desenvolvimento de uma doença mais séria em: Coração (angina pectoris, EAM, arritmias e insuficiência cardíaca) Vasos sanguíneos (desenvolvimento aterosclerótico) Sistema nervoso central (AVC com hemorragia e trombose) Rins (insuficiência renal). 33 Mecanismos do tratamento As drogas utilizadas no tratamento da hipertensão atingem os seus efeitos através de um ou mais dos seguintes mecanismos: Redução do débito cardíaco Redução da resistência no sistema vascular, causando dilatação dos esfíncteres précapilares Redução do volume de sangue circulante Aumento da acumulação de sangue no lado venoso do circuito (tratamento de emergência). Grupos de drogas relevantes Diuréticos tiazidas B-bloqueadores IECAs Bloqueadores dos receptores de angiotensina II Bloqueadores dos canais de cálcio Metas tensionais TA <140/90mm Hg em todos os doentes; TA <130/80mm Hg nos doentes de alto risco. Em ambos os casos deverá tentar alcançar-se o menor valor possível com conservação de uma boa qualidade de vida; Insistir no controlo sistólico que é mais difícil de alcançar sobretudo em doentes diabéticos ou nos idosos; Controlar precocemente a TA antes de se desenvoverem lesões cardiovasculares. As medidas não farmacológicas que demonstram eficácia para diminuir a TA ou o risco Cardiovascular são: Deixar de fumar (tabaco está associado a maior risco cardiovascular) Redução e estabilização do peso corporal; Redução do consumo exagerado de álcool; Exercício físico Redução do consumo de sal; Aumentar o consumo de frutas e de verduras e reduzir as gorduras saturadas. 34 Importante Salientar que o objectivo não é apenas o controlo da pressão sanguínea, mas sim reduzir o risco cardiovascular, a morbilidade e mortalidade. 35 36 Autovigilância da pressão sanguínea Importância/ vantagens da autovigilância da pressão arterial Maior envolvimento e compromisso da pessoa na gestão da sua doença e maior adesão terapêutica A pressão sanguínea sofre alterações ao longo do dia e é influenciada por vários fatores, tais como a alimentação, o stress, o exercício físico e a medicação. A possibilidade de medições frequentes ao longo do dia e durante vários dias, semanas ou meses, dá oportunidade à pessoa de perceber o que pode provocar alterações na sua PA e qual a melhor maneira para a controlar. Melhoria do controlo das taxas de hipertensão Permite estabelecer um perfil tensional da pessoa mais fidedigno, visto que, muitas vezes, em contexto de consulta, os valores de PA podem estar alterados. Método cómodo e de baixo custo A avaliação da Pressão arterial deve ser realizada: Em ambiente acolhedor e calmo Sem pressas Após 5 ou 10 minutos de descanso Com a bexiga vazia Não ter fumado, ingerido estimulantes tais como o café nem feito exercício na hora anterior ou pelo menos nos últimos 30 minutos. Com a pessoa sentada e relaxada, com as costas e os braços devidamente apoiados e com o braço desnudado e ao nível do coração. A avaliação deve ser realizado no membro superior em que houve um registo de valores mais elevados de PA. Esta avaliação deve ser feita pelo menos 3 a 4 dias por semana, preferencialmente durante 7 dias consecutivos, de manhã e à tarde, sendo que em cada avaliação devem ser feitas 2 medições, com intervalos de 1 a 2 minutos. Consulta da HTA Objectivos Vigiar, aconselhar e educar o doente com Hipertensão Arterial, seus familiares e outros cuidadores; Promover a aceitação do estado de doença; Promover a auto-vigilância; 37 Promover a gestão e adesão ao regime terapêutico; Apoiar o desenvolvimento de competências de auto-controlo da doença crónica; Identificar factores de risco cardiovascular e actuar no sentido de os minorar/ eliminar; Referenciar para cuidados especializados, sempre que necessário, com acompanhamento simultâneo da situação e recepção de retorno, em continuidade de cuidados. A consulta de vigilância do doente hipertenso é multi-profissional (médico e enfermeiro de família) e pode ser agendada pela equipa de saúde ou pelo utente. De acordo com as orientações técnicas da Direcção Geral de Saúde, a periodicidade recomendada destas consultas é de 6/6 meses (num total de 2 consultas por ano), porém é variável de acordo com o controlo tensional do utente. Actividades Avaliar pressão sanguínea Avaliar peso/ IMC Medir perímetro abdominal Avaliar o conhecimento do cliente sobre a doença – o que é, sintomas, consequências, como gerir, etc. Avaliar a adesão ao regime medicamentoso – toma consoante a prescrição, à hora certa, não esquecendo. Avaliar a adesão ao regime dietético Avaliar a adesão ao regime de exercício Avaliar a autovigilância da pressão arterial – realiza autovigiância pelo menos 3 a 4 dias por semana o Verificar se o cliente realiza autovigilância da pressão arterial o Avaliar o conhecimento sobre autovigilância da pressão arterial ANGINA PECTORIS Fisiopatologia Angina pectoris é uma dor no peito atribuível a uma disparidade entre a necessidade de O2 do coração e a capacidade das artérias coronárias para suprir essas mesmas necessidades, fornecendo ao tecido cardíaco sangue oxigenado. A dor tem distribuição característica no peito, membro superior, pescoço e mandíbula e é 38 ocasionada por esforço físico, frio ou agitação. O endurecimento das artérias comprime as artérias coronárias e limita o fluxo sanguíneo do coração. Os sintomas começam por ser percebidos na presença de esforços, mas podem também estar presentes em repouso, numa fase mais avançada da doença. É possível que o mesmo mediador que causa vasodilatação coronária seja responsável, em concentrações mais altas, por iniciar a dor. Possíveis candidatos de factores químicos libertados pelo músculo isquémico responsáveis pela dor são K+, H+ e adenosina. A isquemia causa sobrecarga celular de Ca2+ e pode levar a morte celular e arritmias. A isquemia coronária geralmente decorre de aterosclerose e causa angina. Isquemia súbita geralmente é causada por trombose e pode resultar em EAM. O espasmo coronário também pode causar angina (angina variante). Angina estável – precordialgia previsível pelo esforço físico. Produzida por um aumento da demanda sobre o coração e causada por um estreitamento fixo dos vasos coronários, quase sempre por ateroma. Angina instável – dor ocorre com cada vez menos esforço físico, culminando em dor em repouso. A patologia é semelhante à envolvida no EAM, com trombo de plaquetas e fibrina associado a uma rotura da placa ateromatosa, mas sem oclusão completa do vaso. Artérias Coronárias – As artérias coronárias são os vasos responsáveis pela chegada de oxigénio e outros nutrientes ao músculo cardíaco (miocárdio). Esse suprimento é contínuo e deve adaptar-se às exigências do coração, variando se o indivíduo está em repouso ou sob stress físico (exercício) ou emocional. As artérias coronárias têm origem na porção inicial da aorta (grande artéria) e são chamadas artéria coronária direita e artéria coronária esquerda. A artéria coronária esquerda, na grande maioria dos casos, é subdividida em dois ramos: a artéria descendente anterior (DA) e artéria circunflexa (CX), que se subdividem em ramos menores. A artéria coronária direita também se subdivide em ramos, porém de menor magnitude que os ramos da coronária esquerda. Cada uma das artérias coronárias irriga a sua parte do coração e normalmente há pouca conexão entre elas. Esta pobre conexão é exacerbada pela presença de ramos finais das artérias. Factores fisiológicos que regulam circulação coronária: Factores físicos – Na sístole, as artérias coronárias são comprimidas pela contração do músculo cardíaco, reduzindo a circulação coronária durante esta fase. Durante a diástole, quando o músculo cardíaco relaxa, a circulação 39 coronária é restabelecida – é sobretudo durante a diástole que se dá a circulação coronária e, portanto, a irrigação e oxigenação do tecido/músculo cardíaco. Um aumento na frequência cardíaca (taquicardia) diminui a duração da diástole, diminuindo o período disponível para a circulação sanguínea coronária, diminuindo o período disponível para a perfusão do miocárdio. Controlo vascular por metabólitos/mediadores – uma alteração no padrão dos metabólitos produzidos pelas células miocárdicas controla o estado dos vasos sanguíneos, sendo a adenosina uma candidata popular a metabólito dilatador. Controlo neural e humoral – os vasos coronários dispõem de densa inervação simpática. Os grandes vasos coronários possuem receptores A-adrenérgicos que medeiam a vasoconstrição, enquanto que os vasos menores possuem receptores B-adrenérgicos, que medeiam a vasodialatação. Objectivo do tratamento Reduzir a dor Melhorar tolerância ao exercício Reduzir possibilidade de desenvolvimento de arritmias sérias e enfarte agudo do miocárdio. Mecanismos do tratamento – O tratamento pretende compensar a disparidade entre necessidade de O2 e fornecimento de O2 do músculo cardíaco das seguintes formas: Melhorando o fluxo sanguíneo para o miocárdio Reduzindo a carga do coração de forma a que o consumo de O2 seja menor (reduzindo a força de contracção do coração, reduzindo a pressão sanguínea ou reduzindo a frequência de contracção). Grupos de drogas relevantes Nitratos orgânicos B-bloqueadores Bloqueadores dos canais de cálcio Juntamente com tratamento da doença ateromatosa subjacente, geralmente com estatina e profilaxia contra trombose com antiagregante plaquetário, geralmente aspirina. 40 ENFARTE DO MIOCÁRDIO Fisiopatologia O enfarte do miocárdio ocorre quando uma artéria coronária é bloqueada por um trombo e a área do coração irrigada por essa artéria perde o suprimento sanguíneo de tal forma que o tecido morre por deficiência de oxigénio. Quanto mais acima ocorrer o bloqueio da artéria coronária, maior será a área afectada. Um enfarte do miocárdio pode ser consequência de uma arteriosclerose progressiva, mas pode também surgir sem aviso devido a uma trombose numa artéria coronária com apenas ligeiro grau de endurecimento das artérias. O processo arteriosclerótico é influenciado pelos níveis plasmáticos de colesterol e outros lípidos. Fumar, consumir grandes quantidades de gorduras saturadas, excesso de peso e pouco exercício físico aumentam a formação de placas ateroscleróticasnas artérias. O enfarte do miocárdio pode desencadear arritmias e insuficiência cardíaca aguda. Possíveis candidatos de factores químicos libertados pelo músculo isquémico responsáveis pela dor são K+, H+ e adenosina. A isquemia causa sobrecarga celular de Ca2+ e pode levar a morte celular e arritmias. A célula miocárdica normal permite a entrada de uma quantidade limitada de iões sódio, o que conduz a uma despolarização controlada. A célula miocárdica isquémica permite a entrada rápida de iões sódio, fazendo com que despolarize muito mais rapidamente do que o normal e começe a disparar espontaneamente (cria um pacemaker ectópico), resultando numa arritmia. A parte do miocárdio lesionada será substituída por tecido conjuntivo. O tecido conjuntivo não contrai, pelo que uma parte do miocárdio perde a sua capacidade de contrair. Se o dano for grande o suficiente, pode gerar-se insuficiência cardíaca. Se o enfarte ocorrer numa área importante para a transmissão de potenciais de acção (como o septo ventricular), pode conduzir a arritmias. Se os músculos papilares do coração forem afectados, os cordões fibrosos que seguram as válvulas na sua posição correcta perdem a sua ligação à parede ventricular, fazendo com que as válvulas entre as aurículas e os ventrículos falhem, causando insuficiência cardíaca potencialmente fatal. Objectivo do tratamento: Suprimir a dor 41 Limitar o tamanho do enfarte Reduzir risco de desenvolvimento de complicações O tratamento difere entre a fase aguda e a fase pós-enfarte. A formação de trombo ocorre em todos os enfartes. Se o ECG mostrar sinais claros de enfarte, tratamento trombolítico (dissolução do trombo) pode ser administrado se não tiverem passado mais de 8h desde o início da sintomatologia. É importante tratar as sequelas agudas – dor, ansiedade, náusea, inquietação, arritmia, hipotensão, insuficiência cardíaca exacerbam a situação. Grupos de drogas relevantes: Trombolíticos Caso possível angioplastia é mais eficaz do que fármacos trombolíticos Antiagregantes plaquetários Analgésicos, ansiolíticos, antieméticos, para prevenir dor e reduzir actividade simpática excessiva B-bloqueadores IECAs Diuréticos Nitratos orgânicos Bloqueadores dos canais de cálcio 42 43 INSUFICIÊNCIA CARDÍACA Fisiopatologia Insuficiência cardíaca = incapacidade do coração para exercer a sua função contráctil/de bombeamento ou no seu relaxamento. O problema consiste, então, numa função sistólica deficiente (insuficiência sistólica) ou função diastólica deficiente (insuficiência diastólica). A insuficiência sistólica tem como principais causas perdas de tecido muscular pós-enfarte e hipertensão arterial durante muitos anos, válvulas cardíacas danificadas e arrtimias. A anormalidade subjacente fisiológica é um débito cardíaco inadequado para satisfazer as demandas metabólicas do organismo, de início durante o exercício e, progressivamente, também em repouso. Pode ser causada por doença do próprio miocárdio (ex. Doença de artéria coronária) ou por factores circulatórios (aumento da pré-carga com sobrecarga de volume ou aumento da pós-carga com sobrecarga de pressão). Quando o débito cardíaco é insuficiente para satisfazer a demanda metabólica, ocorre aumento do volume de líquido, em parte porque o aumento da pressão venosa causa aumento da formação de líquido nos tecidos, e em parte porque a redução do fluxo sanguíneo renal activa o sistema renina-angiotensina- aldosterona, causando retenção de Na+ e água. A insuficiência cardíaca pode desenvolver-se gradualmente ou ocorrer agudamente. A insuficiência cardíaca pode pode afectar o ventrículo esquerdo, direito, ou ambos. Tendo em conta que o ventrículo direito e o ventrículo esquerdo bombeiam sangue para a circulação pulmonar e circulação sistémica, respectivamente, os sintomas serão diferentes, dependendo do local da insuficiência. IC do ventrículo direito – O ventrículo direito recebe sangue da aurícula direita, que recebe o retorno venoso. Se a função de bombeamento do ventrículo direito estiver reduzida, o sangue ficará congestionado nas veias. Devido à congestão, o volume e a pressão no ventrículo vai aumentar. O aumento da pressão viaja para trás, para as grandes veias e para os capilares venosos, e o plasma pode então vazar da corrente sanguínea para os tecidos. Se o vazamento de plasma para os tecidos for maior do que a quantidade de plasma drenado pelos vasos linfáticos, pode desenvolver-se edema. Devido à gravidade, a insuficiência cardíaca do lado direito causará edema nas extremidades inferiores, podendo afectar também órgãos internos. Sinais e 44 sintomas: sentimento de peso e edema nas pernas, aumento do peso e pressão abaixo do arco das costelas do lado direito (congestão do fígado). IC do ventrículo esquerdo – O ventrículo esquerdo recebe sangue da aurícula esquerda, que recebe sangue dos pulmões. Se a função de bombeamento do ventrículo esquerdo estiver inibida, o sangue irá acumular-se para trás, em direcção aos pulmões. Dependendo de quão pronunciada é a insuficiência, pode originar desde uma dispneia até um edema pulmonar. Sinais e sintomas: respiração profunda,esforçada, audível, tosse e respiração borbulhante. O edema alastra-se sobre a base dos pulmões numa pessoa em pé, e ao longo dos pulmões numa pessoa em posição supina. À medida que a insuficiência cardíaca esquerda se desenvolve, a insuficiência cardíaca direita irá desenvolvendo-se gradualmente. Em ambas IC esquerda e IC direita são comuns a fadiga e baixo limiar de exaustão. Insuficiência cardíaca congestiva o Incapacidade cardíaca para perfundir adequadamente tecidos e órgãos distais: Diminuição do fluxo de sangue >> congestão venosa Aumento do volume plasmático o Congestão – aumento da formação de edema (edema pulmonar) onde o aumento da pressão venosa provoca o aumento da pressão hidrostática que favorece a transudação do fluido para o espaço intersticial. A capacidade do coração bombear sangue é controlada por: Frequência cardíaca, Pré-carga (pressão exercida pelo sangue no músculo ventricular, no fim da diástole), Pós-carga (resistência contra a qual o ventrículo esquerdo bombeia o sangue para a artéria aorta), Contractilidade das células do miocárdio. Pré-carga e pós-carga – Normalmente,os ventrículos ejectam o volume de sangue equivalente àquele que receberam. Um aumento da pré-carga (aumento da pressão de enchimento cardíaco) pode ser causado por um aumento do volume sanguíneo ou por venoconstrição, e aumenta o volume diastólico final ventricular. Isto aumenta o volume sistólico e, por isso, aumenta o débito cardíaco e a pressão arterial média. Um aumento 45 na pré-carga distende/estica o miocárdio, resultando num maior volume ventricular e, assim, numa situação de enchimento mais favorável. Em insuficiência cardíaca grave com perda de contractilidade, a capacidade de aumentar a função de bombeamento aumentando a distensão do miocárdio é totalmente utilizada, e um aumento continuado da pré-carga resulta numa maior congestão das veias. O aumento da pós-carga é causado pela constrição dos vasos e maior resistência vascular. O volume diastólico e, por isso, o trabalho para o batimento ficam inicialmente inalterados, mas o trabalho de batimento constante contra uma resistência vascular aumentada reduz o volume sistólico e, portanto, aumenta o volume diastólico final. Isto, por sua vez, aumenta o trabalho de batimento até que o estado de equilíbrio seja restabelecido. Como acontece com a pré-carga aumentada, o trabalho cardíaco e o consumo cardíaco de 02 aumentam. Na insuficiência cardíaca, o corpo redistribui o sangue que ocoração consegue bombear de maneira a que seja preservada a irrigação sanguínea de órgãos vitais. Isto ocorre porque artérias em alguns tecidos contraem (vasoconstrição), resultando numa maior resistência contra o sangue que abandona o coração e um aumento crónico da pós-carga que estimula a hipertrofia do miocárdio. Nesta situação, o coração é fortemente estimulado por activação simpática. No tratamento da insuficiência cardíaca, é importante reduzir a pré-carga e reduzir a pós-carga. Uma pós-carga elevada é consideravelmente mais exigente energeticamente do que uma pré-carga elevada, principalmente quando o suprimento sanguíneo do próprio coração está comprometido. Controlo autónomo do coração – as divisões simpática e parassimpática do SN exercem, independentemente, um efeito tónico sobre o coração em repouso. Influenciam cada um dos aspectos da função cardíaca – frequência, ritmo, contracção, metabolismo e fluxo sanguíneo do miocárdio. Sistema simpático – efeitos resultam da activação dos receptores B1- adrenérgicos pela adrenalina e noradrenalina. o Aumenta formação de AMPc e aumentam correntes de Ca2+ o Aumenta a força de contracção (efeito inotrópico positivo) o Aumenta frequência cardíaca (efeito cronotrópico positivo) o Aumenta o automatismo o Facilita a condução no nó AV o Repolarização e restauração da função após despolarização cardíaca generalizada 46 o Redução da eficiência cardíaca (consumo de O2 aumenta mais que o trabalho cardíaco) Sistema parassimpático – efeitos resultam da ocupação dos receptores muscarínicos (M2) da acetilcolina. o Diminui formação de AMPc e abre os canais de K+ o Diminui a frequência cardíaca (efeito cronotrópico negativo) o Diminui a força de contracção (somente nas aurículas) o Diminui o automatismo o Inibe a condução no nó AV Causas da insuficiência cardíaca: Aguda – pode ocorrer em associação com enfarte do miocárdio, defeitos valvulares, hipertensão de rápida progressão e embolia pulmonar. Crónica – observada como resultado tardio de pequenos enfartes, defeitos valvulares progressivos e hipertensão progressiva. Todas as situações que colocam stress na circulação - stress mental ou físico, infecção com pirexia, anemia ou arritmias – podem ser factores desencadeantes de insuficiência e devem ser tratados se o coração mostrar uma pobre função de bombeamento. Objectivo do tratamento: Melhorar a função de bombeamento Aliviar sintomas Melhorar tolerância ao exercício Reduzir frequência de exacerbações agudas Reduzir mortalidade Mecanismo do tratamento – os objectivos do tratamento podem ser alcançados das seguintes formas: Reduzindo a pós-carga, reduzindo reistência na circulação (drogas vasodilatadores) Pré-carga e volume circulante de sangue (diuréticos) Fortalecer a força de contracção do coração (drogas inotrópicas positivas) 47 Grupos de drogas relevantes: Diuréticos (reduzem volume de sangue circulante) IECAs ou inibidores dos receptores de angiotensina II (vasodilatação no lado arterial e redução do volume de sangue circulante) Nitrato de glicerol, mono e dinitrato de isossorbida (vasodilatação no lado venoso) Glicosídeos (drogas inotrópicas positivas) Antagonistas da aldosterona (reduzem volume de sangue) B-bloqueadores (vasodilatação no lado arterial através de reduzida actividade no sistema nervoso simpático). 48 49 ARRITMIA CARDÍACA Fisiopatologia Características electrofisiológicas do miocárdio As células cardíacas devem a sua excitabilidade eléctrica a canais da membrana plasmática sensíveis à voltagem selectivos para vários iões – Na+, K+, e Ca2+. As características electrofisiológicas do músculo cardíaco que o distinguem de outros tecidos excitáveis são: Actividade de marca-passo Ausência de corrente de Na+ rápida nos nós SA e AV, onde a corrente lenta de entrada de Ca2+ inicia os potenciais de acção Potencial de acção prolongado (plateau) e período refractário longo Influxo de Ca2+ durante o plateau. A coordenação da contracção cardíaca é efectuada por um sistema de condução especializado. Os impulsos que resultam em batimentos cardíacos são sinais eléctricos espontâneos que são criados no coração. Os impulsos são desencadeados pelo nodo sinoauricular e são conduzidos em sequência, através das aurículas, nó auriculoventricular, feixe de His, fibras de Purkinje e ventrículos. Os impulsos gerados no nodo sinoauricular e conduzidos desta forma caracterizam o ritmo sinusal fisiológico. Quaisquer outros ritmos gerados são denominados arritmias. Impulsos eléctricos espontâneos podem ocorrer noutros lugares do músculo cardíaco. O coração, no entanto, tem um arranjo hierárquico no qual a taxa mais rápida de impulso espontâneo ocorre no nodo sinoauricular. A taxa de contracção também é influenciada por impulsos do SNC e hormonas de stress. Numa doença cardíaca, este arranjo hierárquico pode ser perturbado e o sistema de condução danificado. Isto aumenta o risco de arritmias. A isquemia no músculo cardíaco, insuficiência cardíaca, doenças febris, esforços físicos e mentais, distúrbios electrolíticos, uso de drogas e uso excessivo de café, tabaco e álcool são exemplos de condições que podem desencadear arritmias. Origem dos ritmos cardíacos – se o impulso é originado no nó sinoauricular, é gerado um ritmo sinusal. Se o impulso começa em algum outro lugar da aurícula, é gerado um ritmo auricular/atrial. Se o impulso começa no nó auriculoventricular, é gerado um ritmo auriculoventricular. Se o impulso começa no ventrículo, é gerado um ritmo ventricular. Ritmos gerados no nó sinoauricular, aurícula ou nó auriculoventricular são chamados ritmos supraventriculares, que se distinguem dos ritmos ventriculares. 50 Ritmo sinusal – No ritmo sinusal, um impulso começa no nodo sinoauricular e espalha-se ao longo dos músculos auriculares, fazendo com que os músculos auriculares contraiam e bombeiem sangue para dentro dos ventrículos. O impulso segue para o nodo auriculoventricular e é conduzido do feixe de His para as fibras de Purkinje. Quando o impulso atinje as fibras de Purkinje, os ventrículos contraem. Devido ao facto de o sinal se atrasar durante a passagem do nodo auriculoventricular, as aurículas contraem antes dos ventrículos, produzindo uma função de bombeamento óptima. O músculo cardíaco contrai de uma forma rítmica, sincronizada. Em arritmias cardíacas sérias, a função de bombeamento torna-se reduzida, porque as contracções se tornam demasiado desorganizadas, o tempo de enchimento torna-se muito curto, ou há demasiado tempo entre cada batimento cardíaco. Interacção entre aurículas e ventrículos – se cada impulso gerado nas aurículas for conduzido para os ventrículos, as aurículas e os ventrículos irão bater sincronizadamente e com a mesma frequência/ritmo. Se a frequência for maior que 200bpm, o nodo AV vai ter dificuldade em conduzir todos os impulsos para os ventrículos, e alguns impulsos são bloqueados. O bloqueio pode ser regular/uniforme – um em cada dois impulsos é bloqueado ou um em cada três impulsos é bloquado – ou não uniforme , como no flutter e fibrilhação auricular. No bloqueio total, as aurículas e os ventrículos batem assincronizadamente e com diferentes ritmos, havendo dissociação entre eles. Arritmias ventriculares – ritmos gerados nos ventrículos provocam contracções menos bem coordenadas do que ritmos gerados no nodo SA e causam pior função de bombeamento. Ritmos de batimento baixos ou altos são tanto mais perigosos quanto mais próximos dos extremos, porque o débito cardíaco diminui. Na bradicardia, o débito cardíaco diminui porque há poucos batimentos por minuto – o ponto extremo aqui é a assístole, em quenão há impulso e, portanto, não há contracção. Na taquicardia ventricular ou fibrilhação ou flutter ventricular, os músculos irão contrair tão rapidamente que o sangue não consegue encher o ventrículo entre as contracções – aqui o ponto extremo é a fibrilhação ventricular, que resulta numa paragem circulatória imediata. As arritmias ventriculares requerem sempre tratamento se persistirem. Batimentos ectópicos que aparecem espontaneamente com batimentos normais raramente requerem tratamento com drogas. 51 Sistema de condução cardíaco – Despolarização e repolarização da célula do miocárdio Em todas as células vivas, a diferença de potencial de acção pode ser medida através da membrana celular. As células são carregadas negativamente no interior e carregadas positivamente no exterior. Em algumas células, como as células nervosas ou do coração, este potencial membranar pode ser alterado pelo fluxo iónico que atravessa rapidamente a membrana através de canais iónicos. A célula fica despolarizada e depois volta a repolarizar. As drogas antiarrítmicas agem influenciando as correntes iónicas. As células no sistema de condução cardíaco têm tendência para desporalização espontânea. Em caso de doença ou outras mudanças bioquímicas no coração, aumenta a tendência para a geração de impulsos espontâneos em outros locais que não o sistema de condução. A despolarização do coração é o evento iniciador da contracção cardíaca. As correntes eléctricas que se espalham ao longo do coração são produzidas por 3 componentes: células pacemaker, tecido de condução especializado, e músculo do coração (miocárdio). O estímulo de despolarização origina-se no nó SA (colecção de células pacemaker, que disparam espontaneamente, automaticamente. Pacemaker dominante do coração, localizado na porção superior da aurícula direita. Frequência intrínseca de 60-100bpm). A onda de despolarização espalha-se pelas aurículas esquerda e direita, originando a contracção auricular, percorrendo as vias internodais (entre o nó SA e o nó AV) em direcção ao nó AV. No nó AV (frequência intrínseca 40-60bpm), a condução é mais lenta e o impulso atrasa-se ligeiramente, e a contracção auricular é completada. A onda de despolarização procede então para o feixe de His (localizado abaixo do nó AV) e divide-se em dois ramos/vias – ramos esquerdo (conduz impulsos para ventrículo esquerdo) e ramo direito (conduz impulsos para o ventrículo direito). Depois, o impulso percorre estes dois ramos ao longo do septo interventricular e até à base do coração, onde os ramos se dividem nas fibras de Purkinje (fibras que propagam os impulsos rapidamente pelas paredes ventriculares. Localizadas nos terminais dos ramos do feixe de His. Frequência intrínseca 20-40bpm). Aqui, a onda de despolarização distribui-se para as paredes ventriculares e inicia a contracção ventricular. Potencial de acção do nó SA versus Potencial de acção das células ventriculares – Os potenciais de acção cardíacos são notavelmente mais longos do que o dos nervos ou dos músculos esqueléticos, com duração de quase meio segundo. Os potenciais de acção cardíacos prolongados proporcionam a despolarização sustentada e contracção necessárias para esvaziar as câmaras cardíacas. As células do nó 52 sinoauricular (SA) regulam o ritmo do coração em frequências cardíacas em repouso normais situadas entre 60 e 100 batimentos/min., enquanto as células musculares ventriculares coordenam a contracção que ejecta sangue do coração. Potencial de acção do nó SA As células do nó SA disparam espontaneamente num ciclo definido por três fases – fase 4, fase 0 e fase 3. Fase 4 – despolarização espontânea lenta, produzida por uma corrente marcapasso de entrada (If). Essa despolarização espontânea é responsável pela automaticidade do nó SA. Os canais que transportam a corrente marcapasso (If) são activados durante a fase de repolarização do potencial de acção anterior. São canais catiónicos não selectivos, embora a maior parte da corrente marca passo seja transportada por iões sódio (Na+). As células do nó SA são lentamente despolarizadas pela corrente marcapasso, que consiste em um fluxo de iões sódio (principalmente) e cálcio para dentro da célula. Esta despolarização lenta ocorre até atingir o potencial limiar. Fase 0 – despolarização mais rápida mediada por canais de cálcio (Ca2+) regulados por voltagem e altamente selectivos. Quando a despolarização lenta atinge o potencial limiar, os canais decálcio regulados por voltagem abrem. Fase 3 – os canais de cálcio fecham-se lentamente e ocorre abertura dos canais selectivos de potássio, resultando em repolarização da membrana. Quando o potencial de membrana repolariza para cerca de -60mV, a abertura dos canais If é desencadeada e o ciclo começa novamente. Potencial de acção das células ventriculares Ao contrário das células nodais SA, os mióciotos ventriculares não sofrem despolarização espontânea em condições fisiológicas. Em consequência, o potencial de membrana do miócito ventricular em repouso permanece até que a célula seja estimulada por uma onda de despolarização iniciada pelas células marcapasso adjacentes. As cinco fases do potencial de acção dos miócitos ventriculares são numeradas de 0 a 4. Fases da despolarização e repolarização da célula do miocárdio: Fase 0 – fase de despolarização rápida – o potencial de membrana (voltagem intracelular normalmente negativa, -85mV) alcança um limiar de disparo crítico (cerca de -60mV), os canais de sódio dependentes de voltagem abrem e ocorre 53 um rápido influxo de sódio. A rápida corrente de entrada de sódio para dentro da célula é grande o suficiente para produzir uma despolarização regenerativa (tudo ou nada) da célula, e a voltagem intracelular altera-se rapidamente de negativa para positiva. Apesar de ser grande, o aumento da condutância de sódio durante a fase 0 dura apenas 1-2 milissegundos, e depois os canais de sódio fecham/inactivam. Fase 1 – fase de repolarização parcial – Os canais de sódio fecham/inactivam e o fluxo de iões de sódio para dentro da célula diminui acentuadamente. Estes canais de sódio não abrem até algum tempo depois da fase 3 – este período durante o qual os canais de sódio não voltam a abrir chama-se período refractário, durante o qual a célula não pode gerar novos potenciais de acção, e serve como mecanismo protector para assegurar ao coração um tempo suficiente para a ejecção do sangue das suas câmaras. Simultaneamente, começa um fluxo lento de iões potássio para fora da célula. Fase 2 – fase de plateau – a diferença de potencial mantém-se estável durante um período de tempo. Os canais de cálcio dependentes de voltagem abrem. Iões de potássio fluem lentamente para fora da célula, enquanto iões de cálcio fluem lentamente para dentro da célula. Fase 3 – fase de repolarização – a diferença de potencial desce rapidamente até um valor abaixo do valor inicial antes da despolarização. A entrada de iões de cálcio para a célula pára, e a saída de iões de potássio para fora da célula continua até que cessa no fim desta fase. O potencial membranar é restaurado, ocorrendo a repolarização. Fase 4 – fase de repouso – potencial de marcapasso – despolarização calma/gradual durante a diástole – há poucas correntes iónicas. A diferença de potencial desvia-se em direcção ao valor limiar no qual um novo potencial de acção será gerado. 54 Controlo autónomo do coração – as divisões simpática e parassimpática do SN exercem, independentemente, um efeito tónico sobre o coração em repouso. Influenciam cada um dos aspectos da função cardíaca – frequência, ritmo, contracção, metabolismo e fluxo sanguíneo do miocárdio. Sistema simpático – efeitos resultam da activação
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