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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ CAMPUS UNIVERSITÁRIO DO TOCANTINS/CAMETÁ NÚCLEO UNIVERSITÁRIO SÉRGIO MANESCHY/MOCAJUBA FACULDADE DE LINGUAGEM CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS LÍNGUA PORTUGUESA RAFAEL DUTRA DIAS Uma Análise do Discurso de Mocajubenses Acerca da Participação Feminina na Política Municipal de Mocajuba – Pará – Amazônia Mocajuba - PA 2017 RAFAEL DUTRA DIAS Uma Análise do Discurso de Mocajubenses Acerca da Participação Feminina na Política Municipal de Mocajuba – Pará – Amazônia Orientador: Prof. Dr. Doriedson do Socorro Rodrigues. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Letras, habilitação em Língua Portuguesa, da Faculdade de Linguagem, Campus Universitário do Tocantins/Cametá, Universidade Federal do Pará, como requisito parcial à obtenção do título de Licenciado em Letras Língua Portuguesa. Mocajuba - PA 2017 RAFAEL DUTRA DIAS Uma Análise do Discurso de Mocajubenses Acerca da Participação Feminina na Política Municipal de Mocajuba – Pará – Amazônia Banca examinadora: _____________________________________________________ Prof. Dr. Doriedson do Socorro Rodrigues (Orientador). UFPA, Campus de Cametá. _____________________________________________________ Prof. Eder Jacson Dias Pereira1 – Membro da Banca. _____________________________________________________ Prof. MSc. Psicólogo Carlos Alberto Amorim Caldas2 – Membro da Banca. Mocajuba – PA 2017 1 Mestrando PPGDUC/CUTINS/UFPA – Membro da Banca. 2 CUTINS/UFPA – Membro da Banca. P á g i n a | iv DEDICATÓRIA Este trabalho é dedicado aos meus pais, Raimundo Furtado Dias e Maria Antonete Dutra Dias, por serem os principais incentivadores dessa conquista; pelo suporte e também pela motivação que ambos deram e ainda dão a minha vida educacional. P á g i n a | v EPÍGRAFE ―Mulheres na política: independente da sigla partidária também são exemplos de ousadia, superação e de transformação; e não devem servir de objeto, mas de inspiração e motivação, para os homens.‖ Sunamita de Carvalho P á g i n a | vi AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, que me tem dado saúde, proteção e sustentação até aqui. À minha mãe, Maria Antonete, e ao meu pai, Raimundo Dias, que apesar de todas as dificuldades passadas, sempre apoiaram e priorizaram minha educação. Aos meus 7 irmãos: Reinaldo, Róbson, Rayane, Raisa, Railson, Raynara e Renata; pelos incentivos, direta e indiretamente, aos estudos. Ao meu colega e também amigo Elber José, que dedicou parte de seu tempo para me ajudar na realização desta pesquisa. Também não esquecendo os meus eternos colegas e amigos Artur Kléber e Deoclécio, que, apesar de sermos apenas três, juntos, formávamos uma verdadeira Equipe, o chamado ―Trio ternura‖. Aos três, meu muito obrigado pelo companheirismo nesses 4 anos de estudos. À minha amada companheira Bianca Carvalho, que sempre me apoiou e dedicou parte de seu tempo para me ajudar na realização dessa conquista. Meu muito obrigado! Ao meu orientador, Prof. Dr. Doriedson do Socorro Rodrigues, que com sua seriedade e competência, me ajudou a realizar este trabalho. Ao núcleo universitário Sérgio de Almeida Maneschy, de Mocajuba, por todo o apoio a mim concedido durante esses 4 anos de estudos e por ser o lugar onde pude estudar e concluir minha graduação. Enfim, aos meus amigos, colegas de curso e a todos que de forma direta ou indireta fizeram parte deste momento ímpar em minha vida. Meu muito obrigado a todos! P á g i n a | vii SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS E TABELAS......................…………………............... Ix RESUMO.……………………………………………………………................. X ABSTRACT................................................................................................. Xi Introdução……………….....………………………….................... 12 CAPÍTULO I – POLÍTICA E PARTICIPAÇÃO FEMININA: QUESTÕES TEÓRICAS............................................................. Introdução.................................................................................. 18 18 1.1 Política: questões teóricas e importância para as construções do homem e da mulher....................................... 18 1.2 A mulher na política brasileira: uma caracterização.............. 20 1.3 Gênero e política…………………………………………………… 33 CAPÍTULO II – MOCAJUBA E A ANÁLISE DO DISCURSO: QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS…….....………….. 37 Introdução..................................................................................37 1.1 Análise do discurso: considerações teóricas........................ 37 1.2 O que é análise do discurso..................................................... 41 1.3 Como se fazer análise do discurso.......................................... 45 1.3.1 Metodologia em análise do discurso....................................... 51 2.1 Mocajuba – Pa: universo populacional de homens e mulheres..................................................................................... 54 2.2 Mulheres na política mocajubense.......................................... 59 2.3 Histórico político-participativo feminino mocajubense......... 61 2.4 Considerações metodológicas................................................. 64 CAPÍTULO III – O DISCURSO SOBRE A MULHER NA POLÍTICA MOCAJUBENSE....................................................... 67 Introdução.................................................................................. 67 1.1 Entrevistas: análise e discussão............................................. 67 2.1 Primeira pergunta...................................................................... 67 2.2 Segunda pergunta..................................................................... 73 P á g i n a | viii 2.3 Terceira pergunta...................................................................... 78 2.4 Quarta pergunta......................................................................... 82 Considerações finais................................................................. 87 Referências bibliográficas........................................................ 90 Apêndice..................................................................................... 93 P á g i n a | ix LISTA DE FIGURAS E TABELAS Figura 1. Evolução de candidatura a deputada estadual, 1998-2014....... 26 Figura 2. Evolução de candidatura a deputada federal, 1998-2014......... 26 Figura 3. Evolução de candidatura a senadora, 1998-2014..................... 27 Figura 4. Evolução de candidatura a governadora, 1998-2014................ 27 Figura 5. A Análise do Discurso em meios aos estudos linguísticos........ 42 Tabela 1. Quadro evolutivo de mulheres eleitas, para o congresso brasileiro, nas últimas décadas.................................................................. 28 Tabela 2. Participação feminina nos parlamentos unicamerais ou bicamerais no mundo................................................................................. 29 Tabela 3. Comparativo de filiados (2009-2015)......................................... 34 P á g i n a | x RESUMO O presente estudo baseia-se em mostrar o que é política, seus conceitos, suas fundamentações teóricas e também a real situação da política brasileira e mocajubense, assim também como se fundamenta em demonstrar estudos de orientações teóricas e metodológicas da Análise do Discurso, a partir dos seus principais conceitos e procedimentos: sujeito, ideologia, discurso e interpretação; recorte, enunciado e trajeto temático. Para além desses conceitos e procedimentos, por meio da Análise do Discurso e, assim, da interpretação, dentro das aulas de língua portuguesa, este trabalho mostra como é possível formar cidadãos críticos, com condições para exercer plenamente sua cidadania. Sendo assim, este estudo também se restringe em evidenciar as análises, interpretações e discussões da pesquisa realizada com quatro cidadãos e cidadãs mocajubenses, de idades e escolaridades diferentes, e, dessa forma, revelar para um possível leitor os ideais desses entrevistados mocajubenses em relação à participação feminina na política deste município. Portanto, com a presente pesquisa apresentada, pôde-se afirmar que o olhar da população mocajubense sobre o papel da mulher na política da cidade de Mocajuba está efetivamente ativo. Pois, todos os entrevistados demonstram conhecimento e interesse acerca das perguntas realizadas, sempre respondendo com clareza e espontaneidade. Assim, isso demonstra que a população mocajubense de hoje, está participando mais da política local e, assim sendo, possui conhecimento acerca do universo político municipal, em geral. Palavras-chave: Estudo; Análise do Discurso; Participação Feminina. P á g i n a | xi ABSTRACT The present study is based on showing what is politics, its concepts, its theoretical foundations and also the real situation of Brazilian and Mocajuba politics, as well as how it is based on demonstrating studies of theoretical and methodological orientations of Discourse Analysis, from Of its main concepts and procedures: subject, ideology, discourse and interpretation; Clipping, statement and thematic path. In addition to these concepts and procedures, through Discourse Analysis, and thus of interpretation, within Portuguese language classes, this work shows how it is possible to form critical citizens, with conditions to fully exercise their citizenship. Thus, this study is also restricted in evidencing the analyzes, interpretations and discussions of the research carried out with four Mocajuba citizens, of different ages and schooling, and, thus, reveal to a possible reader the ideals of these Mocajubenses interviewees in relation to Participation in the politics of this municipality. Therefore, with the present research presented, it was possible to affirm that the Mocajuba population's view on the role of women in the politics of the city of Mocajuba is effectively active. For, all the interviewees demonstrate knowledge and interest about the questions asked, always responding with clarity and spontaneity. Thus, this shows that the population of Mocajuba today is participating more in local politics and, therefore, has knowledge about the municipal political universe, in general. Key words: Study; Speech analysis; Female participation. P á g i n a | 12 Introdução O presente trabalho aborda o discurso sobre a participação feminina na política municipal mocajubense. Trata-se de pesquisa pautada na análise do discurso no sentido de se analisar, a partir de entrevistas junto a cidadãos desse município, a atitude para com a participação da mulher na política local, considerando que em 2016 elegera a sua primeira mulher na função de prefeita, além de em anos anteriores terem sido eleitas mulheres para a Câmara de Vereadores e Vice-Prefeita. Destaque-se que, na Microrregião Cametá, somente Mocajuba e os municípios de Baião e Oeiras do Pará já elegeram mulheres para o cargo maior da política municipal, enquanto que Cametá e Limoeiro do Ajuru até o presente momento não o conseguiram, bem como o município de Igarapé-Miri, embora este último já tenha tido uma mulher na condição de vice-prefeita. Em termos linguísticos, trata-se de pesquisa que busca propiciar uma objetivação de como é possível utilizar a análise do discurso para se realizar leituras de mundo, a partir da materialidade discursiva, no sentido de se apontar com isso elementos para o tratamento da leitura em sala de aula por meio dessa perspectiva de estudo dos significados e sentidos construídos via linguagem. Em termos teóricos, discutimos questões sobre política e gênero-política, além de categorias da análise do discurso, de modo a compreender também a participação feminina na política brasileira e, principalmente, na mocajubense, dando ênfase aos avanços alcançadosno decorrer dos anos, mais especificamente a partir da década de 1980 até o ano atual, em se tratando da cidade de Mocajuba. Com esta pesquisa, buscamos responder a indagações como: (i) qual a atitude dos mocajubenses para com a presença de mulheres na política local, com destaque para o cargo de prefeita, conforme a eleição de 2016?; (ii) que condições sócio-político-culturais podem explicar a presença de mulheres nas eleições 2016, já que a participação desse gênero foi maior que a de homens, pelo menos no que diz respeito ao cargo de prefeito (a), onde 60% desses P á g i n a | 13 candidatos (as) eram mulheres, o que até então era algo incomum neste município? Em termos de importância da presente pesquisa, partimos do pressuposto de que este trabalho tem um papel de grande relevância para a compreensão do cenário político, social e educacional do município de Mocajuba, principalmente no que diz respeito à sociedade mocajubense em termos de população politicamente ativa e também em termos de investigação nesse âmbito de pesquisa. Pois este trabalho é pioneiro dentro dessa área de estudo, que envolve a Análise do Discurso e a participação Política feminina. Com os estudos dessa pesquisa busca-se contribuir com o município de Mocajuba, mais especificamente com sua população, para que ela possa ter acesso aos ideais de amostragem de parte de seus cidadãos e aos números que envolvem a participação de mulheres na política desta cidade. Isto posto, destaque-se que Santos e Macedo (s/d), ao tratarem sobre análise do discurso e política, explanam que, em um discurso envolvendo política, a aplicabilidade conceitual da Análise do Discurso torna-se notória e intrinsecamente ligada à comunicação de massa e relação com o poder, devendo-se em um discurso considerar o contexto de comunicação como parte essencial da formação discursiva3 entendida como tudo o que se é falado em qualquer discurso, inclusive o político. Semanticamente se faz necessário analisar os processos característicos de uma formação discursiva que devem dar conta da articulação entre o processo de produção de um discurso e as condições em que ele é produzido, o que se chama semântica discursiva4. Sendo assim, segundo Cardoso (2005), não se pode dizer que o discurso se confunde com a fala. Concebido fora da dicotomia saussuriana, como um terceiro elemento (nem a língua nem a fala), o discurso é fruto do reconhecimento de que a linguagem não deve ser buscada apenas na língua, mas num nível situado fora do polo da dicotomia língua/fala. 3 Processo da análise do discurso fundamental para a produção de sentidos. Relaciona-se com a ideologia, onde permite estabelecer regularidades no funcionamento do discurso. 4 Teoria do funcionamento material da língua na sua relação com ela mesma, isto é, uma sistematicidade que não se opõe ao processo língua/fala, mas que se articula sobre processos discursivos. P á g i n a | 14 E é por esse motivo que o discurso é definido como um terceiro elemento, cabendo para análise do discurso a necessidade de distinguir o que é semântica discursiva de semântica linguística5. Esses fatores permitem que os estudiosos de comunicação política criem laços acadêmicos com os profissionais da área de AD, pois é por meio de seus conceitos teóricos, alinhavados com o processo de comunicação e marketing político, os clientes, no caso políticos assessorados, que também são amparados por essas características de expressão e comunicação perante seus pares (SANTOS e MACEDO, p.05, s/d). Então, para o universo político feminino, o estudo deste trabalho, além de ser relevante para pesquisas posteriores nessa área, é também de grande expressão para o âmbito populacional em geral do município em questão, pois é o precursor nesse sentido. Quanto à Análise do Discurso6 e sua relação com o ensino e a aprendizagem de língua portuguesa, entendemos que a Análise do Discurso para o desenvolvimento do ensino de Língua Portuguesa é de grande relevância, pois ela, a AD, apresenta, dentro de seu campo de estudo, processos para a compreensão e interpretação da linguagem por meio da leitura, ou seja, a linguagem apresenta um carácter formal, regidas por leis internas da língua, como conjunto de regras fonológicas, morfológicas e sintáticas, que propiciam o incentivo à leitura e, desse modo, a interpretação. Sendo assim, esses processos proporcionam dentro do ensino de língua uma grande contribuição para a aprendizagem dos alunos nas aulas de Língua Portuguesa (MAGALHÃES et al, 2007). Seguindo esses processos, segundo os Parâmetros curriculares Nacionais para o ensino médio, a Leitura e a Interpretação – este segundo, presente na AD como um dispositivo que tem como característica colocar o dito em relação ao não dito; o que o sujeito diz em um lugar, com o que é dito em outro lugar; o que é dito de um modo, com o que é dito de outro – são essenciais dentro da disciplina de Língua Portuguesa. É por meio da linguagem 5 Incide sobre a relação entre significantes, tais como palavras, frases, sinais e símbolos, e o que eles representam, a sua denotação. A semântica linguística estuda o significado usado por seres humanos para se expressar através da linguagem. 6 Maiores discussões sobre esse assunto melhor veremos no capítulo II deste trabalho. P á g i n a | 15 que se permeia o conhecimento, as formas de pensar e se comunicar, e, assim, se contribui com o processo de leitura e interpretação (BRASIL, 2000). Desse modo, Brito (2010) relata que a leitura, assim também como a interpretação, é uma das atividades de grande relevância que existem dentro do universo do ensino de língua portuguesa; são portas para um bom rendimento e desenvolvimento educacional. Ler e, principalmente, interpretar o que se lê é uma das aprendizagens mais importantes na vida do ser humano, porque é a partir delas que se permite o acesso a todos os outros saberes. Todavia, partimos do pressuposto de que o ato da leitura vai muito mais do que simplesmente ler um artigo, um livro, um jornal. É necessário também que se saiba ler o que não está explícito nas frases e orações lidas nesses periódicos; tem que saber interpretar. Pois, hoje, ler e entender o que se lê se tornou uma necessidade para participar ativamente da sociedade, assim também como para desenvolver a capacidade verbal, além do fato de ser uma forma de adquirir novas ideias e experiências (BRITO, 2010). Sendo assim, é a partir desses pontos citados anteriormente que a Análise do Discurso contribui no ensino de língua portuguesa. Ou seja, é por meio da leitura e interpretação que as aulas de língua portuguesa podem se valer da AD, já que pelo menos um destes processos de ensino-aprendizagem, a interpretação, faz parte do campo de estudo da Análise do Discurso ―como a manifestação do inconsciente e da ideologia na produção de sentidos, e também na constituição dos sujeitos, ou seja, é a partir dela que um enunciado pode se tornar outro enunciado‖. Desse modo, a interpretação, assim como a leitura, são partes essenciais no ensino da disciplina de Língua Portuguesa (ORLANDI, 1998). Segundo Menegassi (1995), além da interpretação, outra etapa básica do processo de leitura, que contribui com as aulas de LP é a compreensão, que ocorre quando o leitor capta do texto as informações que ali se oferecem. Seria, na verdade, ―mergulhar‖ no texto e retirar dele suas ideias, suas temáticas principais. Já a Interpretação, para que ela ocorra, é necessário que a compreensãoa proceda, caso contrário, não há possibilidades de sua manifestação. Sendo assim, ela é considerada idiossincrática, pois depende de conhecimentos anteriores que o leitor possui. Na interpretação o leitor deve ser P á g i n a | 16 consciente da polissemia textual, pois a interpretação pode ser dirigida ou não, ou seja, um texto pode ter uma interpretação clara ou pode ter variadas interpretações, o que pode ocasionar representações errôneas. Quanto à leitura, Brito (2010) relata que esse conceito na maior parte das vezes está relacionado com a decifração dos códigos linguísticos e sua aprendizagem. No entanto, não se pode deixar de levar em consideração o processo de formação social deste indivíduo, suas capacidades, sua cultura política e social. É por meio da leitura, compreensão e interpretação, que é possível formar cidadãos críticos dentro da disciplina de Língua Portuguesa, com condições para exercer sua cidadania, pois este indivíduo torna-se capaz de compreender o que se lê e manifestar-se diante de debates sociais usando sua própria voz, tomando consciência dos seus direitos e sabendo lutar por eles. Outrossim, ainda sobre os dois elementos do processo de leitura aludidos acima, Silva (1987) expõe que a interpretação difere da compreensão no sentido de ampliação de conhecimentos, no sentido de explicitação das possibilidades de significação de um objeto, projetadas pela compreensão; no entanto, são processos da leitura indispensáveis para o desenvolvimento de um aluno. Portanto, a Leitura e, a partir dessa, a Compreensão e Interpretação são processos essenciais dentro do ensino de LP. Em termos sociais e políticos, registre-se que a grande participação feminina nas eleições mocajubense 2016 e o resultado dela, tanto para o cargo a prefeito (a) como também para cargos de vereador (a), aguçou-me a curiosidade de pesquisar mais a fundo em relação a esse contexto social na cidade de Mocajuba-Pa, já que desde quando se iniciou o pleito eleitoral democrático nesse município, não se via um número tão expressivo de candidatos (as) desse gênero nas eleições, apesar do eleitorado feminino mocajubense ser praticamente igual ao masculino, e do eleitorado feminino nacional7, hoje, ser superior ao masculino, segundo dados do TSE (2016). Desse modo, com esta ideia de estudos, e em conformidade com o fato político-social citado anteriormente, as bases teóricas dessa pesquisa, entre 7 Eleitorado feminino mocajubense: 49,69%; Eleitorado feminino nacional: 53%. Fonte: TSE 2016. P á g i n a | 17 outras obras e escritores do campo da Política e da Análise do Discurso (AD), são de autores como: Mário Sérgio Cortella, Kátia Regiane Santos e Roberto Macedo Paulo Bonavides, Glaci do Carmo Bren de Andrade, Dominique Maingueneau, Milton Milanez e Janaína de Jesus Santos, Fernanda Mussalim, Eni Puccinelli Orlandi e Vânia Maria Lescano Guerra. Além também dos livros organizado pelo Senado Federal, Mais Mulheres na Política, volume I e II. Em termos de objetivos, buscamos de forma geral demonstrar o que é política, a realidade da política brasileira e mocajubense em relação às mulheres; o que é e como se proceder diante da análise do discurso; assim também como Analisar a atitude presente nos discursos de integrantes da sociedade mocajubense acerca da participação feminina na política de Mocajuba-Pa. Especificamente, buscamos: (i) Verificar se há casos de algum tipo de preconceito em relação à presença de mulheres na política; (ii) Identificar elementos sócio-político-culturais que podem propiciar a baixa participação de mulheres na política mocajubense, em termos quantitativos; (iii) Investigar, na visão dos entrevistados, qual o motivo que propiciou a maior participação de candidatos do gênero feminino (60%), em relação a do gênero masculino, nas eleições a prefeito(a) de 2016. Estruturalmente o trabalho encontra-se dividido em três capítulos. No primeiro, abordamos aspectos teóricos sobre política e participação feminina, onde se fala do que seja política, de como vem se dando a participação da mulher na política brasileira e sobre gênero e política. No segundo capítulo, contextualizam-se questões teórico-metodológicas sobre a análise do discurso, abordando informações sobre a cidade de Mocajuba: sua população, histórico administrativo e político-feminino e seu universo de homens e mulheres. Também, ainda neste capítulo, fala-se sobre as considerações metodológicas da pesquisa. E finalmente, no terceiro e último capítulo, fazemos a análise das entrevistas dos quatro cidadãos mocajubenses, em relação à mulher na política mocajubense, articulando-as com a teoria do capítulo I. Em seguida, apresentamos as considerações finais. P á g i n a | 18 CAPÍTULO I POLÍTICA E PARTICIPAÇÃO FEMININA: QUESTÕES TEÓRICAS Introdução O presente capítulo aborda, principalmente, questões teóricas sobre Política, relatando, a partir de trabalhos realizados, a definição do que seja política, origem e assuntos a ela relacionados. Neste capítulo também tratamos de assuntos históricos sobre a mulher na política brasileira, e, dessa forma, descrevendo a participação desse gênero no decorrer dos anos, além também de retratar o tema gênero e política, dentro do atual cenário brasileiro. 1.1 Política: questões teóricas e importância para as construções do homem e da mulher Segundo estudos de Bedin (2001), a política é um dos principais pilares da sociedade contemporânea. Desde a chegada dos tempos modernos, juntamente com a democracia, é por meio dela que nós, homens e mulheres, também podemos exercer nossos direitos de cidadão e decidir o futuro da sociedade em que vivemos e, desse modo, até mesmo do mundo. A esse respeito, considere-se o disposto por Cortella e Janine Ribeiro (s/d): Na década de 1980 o continente americano quase inteiro tornou-se democrático. Antes, nas Américas a democracia estava nos seus três países mais ao norte e poucos mais; mas nos últimos 30 anos a América Latina se livrou de quase todas as ditaduras. Até então, só uma parte da Europa era democrática; aí, subitamente, a Europa de Leste também se democratizou. Caíram às ditaduras de direita na América Latina, caíram às ditaduras ditas de esquerda da Europa Oriental, e passamos a ter ao menos três continentes amplamente democráticos, incluindo a Oceania, e mais uma parte razoável da Ásia... A democracia não está mais concentrada no Atlântico Norte. Enfim, foi uma mudança politicamente radical. E, a partir disso, a política mundial teve um grande avanço. (CORTELLA e JANINE RIBEIRO, s/d, p.13). P á g i n a | 19 Esse fato acima relatado por Cortella e Janine Ribeiro (s/d) demonstra que, com o avanço da democracia política pelo mundo e, dessa forma, sua chegada ao Brasil, marcada pela revolução de 1930 que acabou com a república velha, pode-se dizer, assim, que foi a partir daí, mais especificamente em 1934, com a conquista do direito ao voto e se candidatar, que as mulheres puderam exercer seus papéis como cidadãs brasileiras, de feto. Dessa forma, foi a partir desse ocorrido, que se viu provocar um corte profundo nas políticas desenvolvidas até então neste país e abriu-se um espaço de opções relativo à democracia e às políticas femininas neste país. (Mais Mulheres na Política, SENADO FEDERAL, 2015). Em termos teóricos, Política, de acordo com Ferreira (2010), é um substantivo feminino, havendo, segundo esse autor, cinco (5) significados para caracterizá-la: Ciência ou arte de governar; Orientação administrativa deum governo; Princípios diretores da ação de um governo; Arte de dirigir as relações de um Estado com outro; Conjunto dos princípios e dos objetivos que servem de guia a tomadas de decisões e que fornecem a base da planificação de atividades em determinado domínio. Com essas definições de Ferreira (2010) acima citadas, acerca da política, pretende-se mostrar nos parágrafos seguintes relações entre o que foi dito acima, com teorias de obras de outros autores que desenvolvem trabalhos na área política. Quanto à origem, segundo Anderson (1995), a palavra ―política‖ vem do vocábulo grego polis, que quer dizer cidade. Significava, para os gregos, a arte de governar a cidade. Pode ser definida como a luta pelo poder, ou seja, o jogo de forças para a conquista do poder ou para a permanência deste. No ano de 1265 a palavra ―política‖ já era definida no idioma francês – politique – como ―ciência do governo dos Estados‖ (ANDERSON, 1995, p. 09). No que diz respeito ao seu surgimento, a política surge na Grécia clássica, juntamente com a criação da polis, a cidade-estado, estabelecendo P á g i n a | 20 as bases no mundo grego e, com o passar dos séculos, espalhou-se pelo mundo, estando presente nos grandes impérios mundiais, como o Inca, sendo considerada a arte da organização8. Destacamos ainda a relação da política com a palavra poder, uma vez que, desde a sua origem, quem detinha o poder sobre uma cidade ou nação podia se considerar político, aquele que possuía comando de governo, que tinha o domínio de poder sobre um determinado povo. Isso pode melhor ser observado na obra O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, onde ele demonstra como governar e se deter poder sobre um reino. Apesar de a obra ser destinada a príncipes, nela, temos a questão muito interessante da representação feminina no poder, não somente na efígie da deusa Fortuna, mas também em outras personagens que pontuam seus escritos políticos sobre a soberania do poder (PITKIN, 1984). Dessa forma, seguindo o raciocínio de Anderson (1995), hoje, em nossa sociedade, o estado é a instância, por excelência, do exercício do poder político, concentrando diversos poderes. A centralização e institucionalização desses poderes caracteriza o estado moderno, que é regido principalmente por intermédio da Política. Ou seja, o estado é uma ordem legal, uma associação que proporciona liderança Política, que mantém a ordem social e promove o bem-estar geral, sempre agindo, direta ou indiretamente, através da Política. Esta, pela qual, ―por muitos motivos exclui às mulheres do poder do estado, pela mulher se encontrar em larga desvantagem em sua participação, se comparado aos homens‖ (BOBBIO et al, 1998). 1.2 A mulher na política brasileira: uma caracterização Aqui, pretende-se caracterizar o papel da mulher na política brasileira, desde quando se desencadeou mudanças na vida político-social desse gênero até a conquista dos muitos direitos, assim também como mostrar a situação de hoje da mulher na política brasileira, e como está sendo exercido seu papel de cidadã perante a política desse país. 8 Informações aqui presentes foram obtidas a partir do site: http://www.grupoescolar.com/pesquisa/origem-da-politica.html. Acesso em 22/06/2017. P á g i n a | 21 Em se tratando da mulher na política do estado brasileiro, a Constituição Federal de 1988 estabelece como fundamentos do Estado Democrático de Direito a igualde entre os gêneros (inclusive política), a dignidade da pessoa humana e a cidadania, entre outros. Os direitos inerentes à cidadania são inclusive protegidos como cláusulas pétreas, no artigo 60, incisos II e IV, que estabelece que ―não será objeto deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: o voto direto, secreto, universal e periódico; e os direitos e garantias individuais, os quais são privilégios cidadãos conquistados‖ (GROISSMAN e NUNES, 2014). Ao dissertar a respeito do conceito de cidadania, Marshall (1967) instrui que sua análise baseia-se mais pela história do que pela lógica, e, por esta razão, divide o conceito de cidadania, o qual as mulheres ainda hoje deixam de participar, em Três partes ou elementos, que chamou de civil9, político10 e social11. Sendo assim, segundo Avelar (2001), historicamente, a luta das mulheres por sua cidadania começou a desencadear, de fato, no início da década de 20, mais especificamente em 1922, com a Semana de Arte Moderna de São Paulo. Esse foi o primeiro passo para que as mulheres brasileiras começassem uma mudança político-cultural considerável, favorável a elas e a sua cidadania. Mas, primeiramente, as primeiras beneficiadas dessas mudanças foram principalmente àquelas que possuíam um maior recurso financeiro e grau de instrução alto, essas puderam usufruir de seus direitos de cidadã, com autonomia e independência. Sendo assim, consideremos o que diz Avelar (2001): No geral, os movimentos urbanos dos anos 1920 e 1930, em favor dos direitos políticos e de cidadã, deixaram claro que as conquistas femininas não implicaram alterar a estrutura da sociedade e da família. Frutos da ação de mulheres de classe alta e instruídas, os movimentos reiteravam a política conservadora da época, buscavam direitos e mais participação das mulheres (AVELAR, 2001, p. 18-19). 9 Composto dos direitos necessários à liberdade individual – liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, o direito à propriedade e o direito à justiça. 10 Por este, deve-se entender o direito de participar no exercício do poder político. 11 Refere-se a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participar, por completo, na herança social. P á g i n a | 22 Isto posto, no que tange a esse assunto, Korber (2007) relata que os direitos políticos e o direito ao voto, apesar de tudo, foram conquistas das mulheres brasileiras reconhecido através do decreto do presidente Getúlio Vargas, em 24 de Fevereiro de 1932. Entretanto, o reconhecimento dessa conquista ficou restrito à legislação, uma que somente em 1946 as mulheres puderam efetivamente votar, por ocasião do término da ditadura de Getúlio Vargas. Dessa forma, considere-se que, embora o termo cidadania envolva os sujeitos da sociedade como um todo, e apesar das conquistas femininas no decorrer dos anos de luta, partimos do pressuposto de que ao longo da história brasileira houve uma exclusão da figura feminina da participação Política. A esse respeito, considere-se que, na antiguidade, as comunidades eram matriarcais e homens e mulheres viviam em igualdade. A mulher era endeusada por gerar a vida. Posteriormente, com a fixação do homem na terra pela agricultura, criou-se o conceito de propriedade e a mulher passou a ser considerada como propriedade do homem. As religiões monoteístas criaram a concepção de um deus masculino, sendo que o homem, por ser sua imagem e semelhança, seria superior à mulher. Esta hierarquia, com base divina, resultou na criação de tabus que afastaram a divindade feminina pela fecundidade. Com estes argumentos, se naturalizou uma dominação que foi construída historicamente. Esta estrutura patriarcal permeou todas as relações sociais, de forma tão contundente que foi inclusive internalizada por algumas mulheres que reproduzem os argumentos dominadores. (MILES, 1989 apud GROSSMANN e NUNES, 2014). Groissmann e Nunes (2014) relatam que na Revolução Industrial inseriu- se as mulheres no mercado de trabalho formal, com todasas mazelas que perduram até hoje como a dupla ou tripla jornada de trabalho, a remuneração inferior aos homens que desempenham as mesmas atividades e outras, mas começou a despertar nas trabalhadoras um novo olhar para além dos muros do lar. Esta inserção no mercado formal de trabalho possibilitou as mulheres condições para compreender o sistema opressor em que viviam e a questioná- lo em busca de conquistar direitos, inclusive políticos. P á g i n a | 23 Ainda assim, a distância que separa homem e mulher, politicamente falando, é a mesma que constitui a dinâmica do poder. Desse modo, não pode se conceber no terceiro milênio um estado democrático de direito que tenha restrições em relação à cidadania e aos direitos políticos de qualquer pessoa, como ainda há para mulheres. Sendo assim, não há como construir uma nova sociedade sem que mais da metade desta comunidade não participe deste processo. (GROSSMANN e NUNES, 2014). Todavia, embora esse processo de exclusão tenha ocorrido, havemos de considerar que no decorrer da história as mulheres lutaram e conseguiram espaço na política brasileira. Sobre essa situação entendemos que, no Brasil, a história mostra que a luta das mulheres para a conquista de muitos direitos, incluindo a participação política, se deu muito por meio do movimento feminista, que ao longo da história registra momentos importantes na luta das mulheres em busca da emancipação. Organizadas, as mulheres conquistaram direitos essenciais, como o acesso à educação, a liberdade para escolher a própria profissão, o direito de votar e de se candidatar. (Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015, p. 16). Para tanto, depois de todas essas lutas, somente em 1932 (e consolidado na constituição de 1934), há pouco mais de 80 anos, as mulheres brasileiras tiveram direito ao voto, com a reforma do Código Eleitoral. Mas este voto era restrito, somente mulheres casadas, essas com a autorização do marido, viúvas e solteiras que tivessem renda própria podiam votar. Apenas em 1946 as mulheres tiveram acesso pleno ao voto, sem distinções com os homens. (TRE, 2014). Entretanto, em conformidade com dados do Senado Federal (2015), antes mesmo da conquista desse direito, um estado passou à frente na discussão sobre o voto feminino. Em 1927, o Rio Grande do Norte antecipou de forma pioneira o direito feminino ao voto. Lá foi registrada a primeira eleitora, Celina Guimarães Viana, que requereu o alistamento baseada no texto constitucional do estado que mencionava o direito ao voto, ―sem distinção de sexo‖. Em seguida, em 1929, o estado teve a primeira prefeita eleita da América do Sul, Alzira Soriano, na cidade de Lajes. O fato repercutiu no Poder P á g i n a | 24 Legislativo federal, que chegou a discutir a validade da lei e da votação, mas não houve conservadorismo que resistisse à vontade e à grande mobilização das mulheres pela participação na vida política do país. E, assim, a lei estadual e a votação da prefeita obtiveram o respaldo do Congresso Nacional. A partir desses fatos, foi que outras eleitoras foram requerendo alistamento nos mais diversos estados brasileiros, conquistando o direito na prática. Diante da realidade, não restou ao poder público outra alternativa se não reconhecer o direito ao voto pelas mulheres, o que veio a ocorrer, de fato, em 1934. Em homenagem à data, a ex-presidente Dilma Roussef incluiu, em 2015, no calendário oficial brasileiro, o Dia da Conquista do Voto Feminino no Brasil, comemorado a cada 24 de fevereiro. (Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015). Em relação a este fato, para Grossmann e Nunes (2014), é emblemático que a concessão do direito ao voto tenha ocorrido somente após a concessão de outros direitos. Os movimentos de mulheres forçaram a alterações em algumas estruturas, como as familiares e de propriedade, mas o direito ao voto foi o último a ser conquistado porque permitiria a participação mais ativa das mulheres na vida política e nas estruturas de poder. O direito básico de votar e ser votado, naquele momento, representaria a inserção no espaço público e na existência de vozes que dariam vazão aos anseios e pleitos das mulheres. Desse modo, deixar o ambiente doméstico e ingressar na esfera pública por excelência do poder político representava uma guinada fundamental para a mudança das regras da sociedade patriarcal, por isto da extrema resistência para esta concessão. Hoje, segundo o Senado Federal (2015), à mulher não cabe mais somente o papel de esposa, mãe e dona de casa, como coube durante um longo período de nossa história. Ampliou-se significativamente seu protagonismo na sociedade, entretanto a discriminação ainda perdura, o que faz com que elas sigam lutando pelos seus direitos e, sem dúvida, a grande batalha ainda está relacionada à ocupação de espaços de poder público. Em se tratando desse poderio, o espaço político é um domínio ainda ocupado hegemonicamente por homens, campo no qual não há representatividade feminina de fato, dada a exiguidade de posições efetivamente ocupadas por P á g i n a | 25 mulheres. Em outras palavras, o poder sobre as decisões públicas, que deveria ser neutro em relação a gênero, é marcadamente masculino, o que resulta em pouca sensibilidade no mundo político diante de assuntos importantes para a qualidade de vida das mulheres. Dessa forma, a partir de todos esses fatos, as primeiras mulheres foram ganhando espaço no poder público e no cenário político brasileiro. Logo abaixo, listam-se as pioneiras dessas conquistas e seus alcances dentro do nosso país: NOME CARGO-CONQUISTA ANO Celina Guimarães Viana 1ª Eleitora do país – Mossoró-RN. 1927 Joana Cacilda Bessa 1ª Vereadora eleita do país – Pau dos Ferros-RN. 1928 Luísa Alzira Teixeira Soriano 1ª Prefeita eleita do país – Lajes- RN. 1929 Carlota Pereira de Queirós 1ª Deputada Federal eleita – São Paulo. 1934 Maria do Céu Fernandes de Araújo 1ª Deputada Estadual eleita – Rio Grande do Norte. 1934 Eunice Mafalda Berger Michiles 1ª Senadora Federal eleita – Amazonas. 1979 Iolanda Ferreira Lima Fleming 1ª Governadora eleita do país (voto indireto) – Acre. 1986 Roseana Macieira Ferreira Araújo da Costa Sarney Murad 1ª Governadora eleita do país (voto popular) – Maranhão. 1994 Dilma Vana Rousseff 1ª Mulher Presidente do Brasil. 2011 Fonte: Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015. Entretanto, em relação ao passado de lutas, hoje, como podemos observar, as mulheres estão efetivamente mais participativas nas decisões P á g i n a | 26 políticas do país, apesar dos inúmeros tabus ainda existentes e dessa participação ainda ser insatisfatória em relação ao gênero masculino. Contudo, em conformidade com os estudos do Senado Federal (2015), não se pode deixar de considerar que, embora os tabus e participação ainda não satisfatória, a participação política feminina no Brasil vem tendo um certo percentual de crescimento ao longo dos anos, destacando-se que a conquista do direito de votar e ser votada foi apenas o início de uma luta pela ampliação de espaços para as mulheres. No entanto, em qualquer aspecto avaliado, a conclusão é sempre a mesma: houve ganhos, mas em ritmo muito inferior ao desejado. As candidaturas de mulheres para cargos eletivos crescem, porém, em ritmo lento. Registra-se que muitas candidaturas femininas prestam-se somente para o preenchimento formal das vagas. Nos gráficos 1, 2, 3 e 4 a seguir, mostra-se a evolução das candidaturas de mulheresnos últimos anos para os cargos de deputada estadual, deputada federal, senadora e governadora, respectivamente: Gráfico 1: Evolução de Candidatura a Deputada Estadual, 1998-2014. Fonte: TSE/Data Senado (2014). Gráfico 2: Evolução de Candidatura a Deputada Federal, 1998-2014. P á g i n a | 27 Fonte: TSE/Data Senado (2014). Gráfico 3: Evolução de Candidatura a Senadora, 1998-2014. Fonte: TSE/Data Senado (2014). Gráfico 4: Evolução de Candidatura a Governadora, 1998-2014. P á g i n a | 28 Fonte: TSE/Data Senado (2014). Dessa forma, com esses dados de candidaturas apresentados e avaliando-se o resultado das eleições nos últimos Trinta (30) anos, logo a seguir, constata-se um lentíssimo crescimento da participação das mulheres no Legislativo brasileiro. Na tabela 1, observa-se a progressão no Senado Federal e na Câmara dos Deputados: Tabela 1: Quadro evolutivo de mulheres eleitas, para o congresso, nas últimas décadas no Brasil. Fonte:http://www2.camara.leg.br/documentos-e- pesquisa/fiquePorDentro/temas/mulheres_no_poder/copy_of_documento-de-referencia-da- consultoria-legislativa-1 (consulta em 2 de janeiro de 2014) apud Mais Mulheres na Política, Senado Federal, 2015, p. 21. P á g i n a | 29 Essa realidade, exposta por meio de estudos do Senado Federal (2015), está em completa dissonância com o papel e responsabilidades que as mulheres assumiram na sociedade. De acordo com os números do IBGE, as mulheres totalizam 51,3% da população, e formam, também, a maior parte do eleitorado: 52%, conforme levantamento feito, em 2014, pelo Tribunal Superior Eleitoral. Em números absolutos, isso significa que, das 142,8 milhões de pessoas habilitadas a votar no Brasil, até então, 74,4 milhões são mulheres. Além disso, dados da Pesquisa Nacional por Domicílio de 2012 mostram que elas estudam mais, são maioria nas universidades brasileiras e ocupam 41,9% dos postos de trabalho. Além disso, são as principais responsáveis pela manutenção financeira de mais de 38% das famílias brasileiras. (Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015, p. 21). Entretanto, apesar desses números, a presença percentual feminina no parlamento brasileiro, como podemos deduzir, ainda é vergonhosa. Comparado com seus vizinhos latino-americanos, por exemplo, o Brasil apresenta a penúltima pior situação, estando na 29ª posição, à frente apenas do Haiti. E está na 158ª posição entre os 188 países pesquisados em dezembro de 2014 pela União Interparlamentar (IPU, na sigla em inglês). Conforme mostra a tabela 2, a seguir: Tabela 2: A participação feminina nos Parlamentos unicamerais ou bicamerais no Mundo. P á g i n a | 30 Fonte: Woman in National Parliament, de fevereiro de 2015 apud Mais Mulheres na Política, Senado Federal, 2015, p. 22. Em comparação ao Brasil, a alta participação de mulheres na política nesses países que se encontram no topo dessa tabela, se dá por conta de leis específicas, que estabelecem uma porcentagem igualitária em relação à participação do gênero masculino nos pleitos eleitorais. Em conformidade com esse estudo do Senado Federal (2015), para termos uma ideia da baixa participação direta de mulheres nos parlamentos brasileiros, basta considerarmos que, sendo esse gênero a maioria do eleitorado em nosso país, hoje, até então, somente 10% do total de parlamentares da Câmara é do gênero feminino. No Senado, somente 16% das cadeiras são ocupadas por mulheres. Além disso, Onze partidos, dentre os 28 que elegeram parlamentares para a Câmara dos Deputados, não contam com nenhuma mulher entre seus representantes. E Dezesseis estados brasileiros não contam com representação de nenhuma mulher no Senado Federal. P á g i n a | 31 Por isso, a Reforma Política inclusiva, uma reforma que leva em conta políticas afirmativas e regras mais eficientes, que garanta condições efetivas de sucesso para as candidaturas femininas, que propicia maior presença no Parlamento, foi apresentada como proposta de emenda à Constituição instituindo a reserva de vagas destinadas às mulheres entre as cadeiras da própria Casa Legislativa. A proposta é de que, na próxima eleição (2018), 30% das vagas em disputa no Legislativo, dos Três níveis federativos, sejam destinadas às mulheres. Sabe-se que há um longo caminho a trilhar e, por isso, foi proposto que a reserva de vagas cresça de modo gradual, começando com 30% e avançando mais Cinco pontos percentuais a cada eleição, até que chegue aos desejados 50%, que é o objetivo a ser alcançado, ou seja, a plena equidade. (Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015, p. 09). Além disso, consoante o Senado Federal (2015), com essa proposta objetiva-se, também, que os recursos do Fundo Partidário incentivem os partidos a buscar uma maior bancada feminina. Dessa forma, também foi apresentado que, para financiar as campanhas das mulheres, os partidos destinem ao menos 30% dos recursos do Fundo Partidário. Isso tudo demonstra que essa luta é pelo aperfeiçoamento da democracia brasileira, pelo fortalecimento e equivalência da política neste país, no sentido de tornar o estado brasileiro mais representativo em se tratando da composição social de nosso povo. Isto posto, abaixo apresentamos o Ranking dos Estados brasileiros da participação política das mulheres para todos os cargos eletivos (Prefeitas, vereadoras, deputadas estaduais, deputadas federais, governadoras e senadoras.). P á g i n a | 32 Fonte: Mais Mulheres na Política. 2ª edição. SENADO FEDERAL, 2015. No ranking ilustrativo do Senado Federal (2015), com dados reunidos a partir de informações do Tribunal Superior Eleitoral e que se referem à situação verificada na apuração dos resultados eleitorais em 2014 e 2016, pode-se constatar que, com exceção de Rio Grande do Norte e Amapá, nenhum outro estado alcança a marca de 20% da participação política das mulheres para todos os cargos eletivos. E em todos os estados brasileiros as mulheres compõem mais de 50% do eleitorado. Trata-se de uma situação que precisa ser revertida urgentemente, em favor do próprio sistema representativo. Isto posto, estabelecida essa reflexão sobre a participação da mulher no cenário político brasileiro, há necessidade de se discutir a questão da relação gênero e política, a fim de se poder analisar a atitude de mocajubenses com relação á participação da mulher na política do município. P á g i n a | 33 1.3 Gênero e política Para alguns teóricos da área política, o conceito de gênero refere-se aos traços culturais femininos que são construídos socialmente relacionados à base biológica. A diferença, portanto, é formada como categoria central de análise. As diferenças entre homens e mulheres são destacadas pela polaridade masculino e feminino, produção e reprodução, público e privado. O conceito de gênero quando enfatiza as relações sociais entre os sexos possibilita a compreensão desigual entre homens e mulheres, implicando como componente central à desigualdade de poder. (FARAH, 2004). Segundo Instituto Brasileiro de Administração Municipal, IBAM (2015), gênero, antes de tudo, não se refere exclusivamente às mulheres: trata-se de uma categoria emprestada da gramática e se refere ao masculino e ao feminino. Na realidade, refere-se à definição dos papéis sociais e sexuais desempenhados por mulheres e homens — e entre eles — em cada sociedade. É importante que fique claro que gênero é um conceito que se refere aos papéis atribuídos social e culturalmente aos sexos. As relações sociais são, antesde tudo, relações de poder — tratam-se de relações de disputa, de dominação e de opressão — estabelecidas tanto entre as classes sociais quanto entre mulheres e homens, brancos e não brancos, ou seja, entre quaisquer pessoas. Em 2015, o primeiro-ministro canadense, virou notícia por ter dividido igualmente os cargos ministeriais entre homens e mulheres. Quando questionado sobre o porquê dessa decisão, ele respondeu: Porque estamos 2015. No Brasil, aparentemente, em se tratando da igualdade de gêneros na política-poder, ainda nem chegamos ao século XXI. Um exemplo de retrocesso nos direitos das mulheres foi a alteração do status da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, que deixou de ser um ministério e, agora, encontra- se agora subordinada ao Ministério da Justiça (SANCHEZ, 2016). Em se tratando de Gênero e Política, segundo o livro Mais Mulheres na política, Senado Federal (2015), a equidade de gênero na política brasileira é questão vital posta na sociedade e debatida dentro dos poderes do governo, onde a representatividade das mulheres é ainda menor que o devido. As P á g i n a | 34 barreiras e as lutas ainda persistem para se obter o objetivo que é a conquista da equidade de gênero na vida político-partidária brasileira. As mulheres, maioria na população e no eleitorado, ainda constituem uma escandalosa minoria nos quadros representativos do País. No entanto, o ritmo dos avanços vem sendo lento demais, não chegando a ultrapassar as barreiras mais fortes enfrentadas pela maior parte desse eleitorado em sua busca por inserção na política e nos poderes do governo; como demonstra a tabela a seguir, com o comparativo do número de filiados dos dois gêneros nos últimos anos. Tabela 3: Comparativo de filiados (2009–2015). Fonte: DATASENADO/TSE, atualizada em abril de 2015. Como podemos observar, dos 15.321.181 de filiados do país, o número total de filiados do gênero feminino, com 44,32%, comparado ao masculino, que é 55,68%, ainda é muito inferior, por serem as mulheres a maioria do eleitorado brasileiro. Entretanto, o número de novos filiados mulheres, nesses últimos anos, vem crescendo em comparação com homens, tendo um acréscimo de 2,42%, contra 1,11% do gênero masculino. Contudo, um dos principais problemas normativos da representação política no país é a ameaça de desconexão entre o estado/política e os muitos que ele ou ela representa. Esse afastamento faz com que o eleitorado perca a P á g i n a | 35 percepção de influência da participação em políticas públicas e de poder, voltadas aos grupos que compõem o mesmo, assim, podendo gerar o desafeiçoamento e a abstenção na participação política e, desse modo, nas decisões que o estado democrático nos proporciona (LIMA e SCHULZ, 2014). Para tanto, em relação a esse assunto, que é a abstenção, vejamos o que diz os estudos do Dicionário de política da UNB (1998): Para que o abstencionismo não cresça, é preciso que os novos eleitores tenham interesse pela atividade política, possuam boa informação política e se mantenham "eficazes", ou seja, capazes de influir no resultado das competições eleitorais. Como os indivíduos admitidos à participação eleitoral estão muitas vezes escassamente interessados na política, estão pouco informados e são "ineficazes" (homens antes excluídos por causa do seu analfabetismo, mulheres sem experiência política anterior, minorias subalternas — uma exceção, os jovens da década de 70, já "automobilizados", mas talvez em fase de refluxo, e com alto nível de instrução), a taxa de Abstencionismo crescerá (Dicionário de Política da UNB, p.14, 1998). Os dados são concordes em indicar um Abstencionismo seletivo do eleitor que vota, em percentuais mais elevados, nas eleições consideradas mais importantes, mais nas eleições políticas, portanto, que nas administrativas (nos Estados Unidos, é maior a votação nas eleições presidenciais que nas do Congresso; na França, é maior no segundo turno, ou seja, no da decisão, que no primeiro). É o caso da Itália; mas aqui é preciso acrescentar uma participação em declínio, isto é, um crescente Abstencionismo nas consultas por referendum (de 11,9%, em 1974, a 18,8%, em 1978, e 20,4%, em 1981, com aumento também de cédulas brancas e nulas) (Dicionário de Política da UNB, 1998). Diante de tudo isso que podemos observar, a discussão sobre gênero e política se torna ainda mais relevante. As mulheres brasileiras apesar de comporem 51% da população e 52% do eleitorado, como já citado anteriormente, ocupam apenas 10% das cadeiras na Câmara dos Deputados e 13% no Senado. A sub-representação das mulheres na política legislativa está diretamente relacionada às diversas formas de dominação masculina. Uma vez que elas não são formuladoras das políticas públicas e das leis que terão impacto direto em suas realidades concretas, acabam se tornando apenas P á g i n a | 36 objetos. Isso quer dizer que por estarem ausentes dos espaços tradicionais de deliberação política elas não podem falar por si próprias. Quando apenas homens se reúnem para conversar sobre soluções para a cultura do estupro, por exemplo, percebemos o abismo existente entre as mulheres e a política institucional (SANCHEZ, 2016). Isto posto, segundo estudos do IBAM, para identificar e entender essas desigualdades entre mulheres e homens como parte estruturante das desigualdades políticas, é preciso utilizar uma categoria importante: a de gênero. Essa categoria permite compreender por que as mulheres vivenciam de forma tão diferenciada — e, muitas vezes, mais difícil — determinadas questões, se comparadas aos homens. Um aspecto importante é conhecer quais são as políticas públicas nacionais, estaduais e programas que possam ser aprimorados e mesmo acionados para enfrentar os problemas de gênero existentes na política brasileira, mas, principalmente, a partir dos recursos existentes, como acionar recursos para enfrentar desigualdades de gênero na política do país (INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, IBAM, 2015). Pois assim, utilizando-se de ideias de Sanchez (2016), com o atual cenário político brasileiro, as chances de caminharmos no sentido de alcançarmos uma maior igualdade de gênero encontram-se de forma mais evidente fora da política tradicional do que dentro dela. Dessa forma, a partir de ações como a citada anteriormente, é preciso que gestores/as reconheçam a desigualdade de gênero presente na sociedade brasileira, percebendo como ela afeta política e socialmente as mulheres. Essa situação de vulnerabilidade pode e deve ser transformada a partir de ações conjugadas entre a Sociedade, poder Executivo, Legislativo e o Judiciário (SANCHEZ, 2016). P á g i n a | 37 CAPÍTULO II MOCAJUBA E A ANÁLISE DO DISCURSO: QUESTÕES TEÓRICO- METODOLÓGICAS Introdução O presente capítulo, o segundo deste trabalho, contextualiza questões sobre a Análise do Discurso, abordando questões teóricas, mostrando o que é e como se proceder diante da AD, assim também como nele se demonstra as questões metodológicas da Análise do Discurso. Desse modo, também se retrata neste capítulo questões sobre a cidade de Mocajuba, seu histórico, sua população, seu atual universo político de homens e mulheres, e seu histórico político em relação ao gênero feminino. 1.1 Análise do discurso: considerações teóricas Primeiramente, para definirmos análise, em conformidade com Ferreira (2010), esta palavra pode indicar quatro significados: I) ação ou efeito de analisar; II) estudo pormenorizado de cada parte de um todo, para conhecer melhor sua natureza, suasfunções, relações, causas; III) crítica de uma obra e IV) decomposição de um todo nos seus elementos ou parte componentes. Esses conceitos acerca de análise serão úteis no estudo deste trabalho sobre análise do discurso. Para a área linguística, a análise, palavra de origem grega que significa dissolução, pode ser considerada uma prática e um campo da linguística e da comunicação especializado em analisar construções ideológicas presentes em um texto (AD). Dessa forma, pode-se dizer também que é o processo de decomposição de uma substância ou tópico complexo em seus diversos elementos constituintes, a fim de se obter uma melhor compreensão a seu respeito12. 12 Informações aqui presentes foram obtidas a partir do site: www.mec.gov.mz/POEMA/PO%20S5/51_a_anlise_das_tendncias.html. Acessado em: 05/07/2017. P á g i n a | 38 Em relação à palavra discurso, segundo Ferreira (2010), têm-se cinco definições para essa palavra: I) exposição oral de um texto escrito que trata um ou mais assuntos e que é normalmente preparado e organizado com antecedência para ser proferido em público; II) exposição ou dissertação ordenada sobre um dado assunto; III) realização concreta e irrepetível da linguagem verbal, escrita ou oral, e em qualquer registro; IV) conjunto de palavras vãs e sem sentido e V) oração ou fala oratória. Algumas dessas definições serão usadas no decorrer deste capítulo, a respeito do que seja discurso. Segundo Orlandi (1998), a noção de discurso, em sua definição, distancia-se do modo como o esquema elementar da comunicação dispõe seus elementos, definindo o que é mensagem. Como devemos saber, esse esquema elementar se constitui de: emissor, receptor, código, referente e mensagem. Temos então que: o emissor transmite uma mensagem (informação) ao receptor, mensagem essa formulada em um código referindo a algum elemento da realidade – o referente. Assim, seguindo as ideias do parágrafo anterior, para a análise do discurso, não se trata apenas de transmissão de informação, nem há essa linearidade na disposição dos elementos da comunicação, como se a mensagem resultasse de um processo assim serializado: alguém fala, refere alguma coisa, baseando-se em um código, e o receptor capta a mensagem, decodificando-a. Na realidade, a língua não é só um código entre outros, não há essa separação entre emissor e receptor, nem tampouco eles atuam numa sequência em que primeiro um fala e depois o outro decodifica etc. Eles realizam ao mesmo tempo o processo de significação e não estão separados de forma estanque. Desse modo, diremos que não se trata de transmissão de informação apenas, pois, no funcionamento da linguagem, que põe em relação sujeitos e sentidos afetados pela língua e pela história, temos um complexo processo de constituição desses sujeitos e produções de sentidos, não meramente transmissão de informação (ORLANDI, 1998). O conceito de Discurso fundamenta-se, principalmente, como um conjunto de enunciados regulados numa mesma formação discursiva. Para Foucault, ―é um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas P á g i n a | 39 no tempo e no espaço que definiram em uma época dada, e para uma área social, econômica, geográfica ou linguística dada, as condições da função enunciativa‖ (FOUCAULT, 1973, p.97). Isto posto, para Maingueneau (2004), no uso comum, chamamos de ―discurso‖ os enunciados solenes, ou, pejorativamente, as falas inconsequentes. O texto pode igualmente designar qualquer uso restrito da língua: ―o discurso islâmico‖, ―o discurso político‖, ―o discurso administrativo‖, ―o discurso polêmico‖ ―o discurso dos jovens‖ etc. nesse emprego, ―discurso‖ é constantemente ambíguo, pois pode designar tanto o sistema que permite produzir um conjunto de textos, quanto o próprio conjunto de textos produzidos: ―o discurso comunista‖ é tanto o conjunto de textos produzidos por comunistas, quanto o sistema que permite produzir esses textos e outros ainda, igualmente qualificados como textos comunistas. Para Santos e Macedo (s/d) o discurso é, pois, um lugar de investimentos sociais, históricos, ideológicos, psíquicos, por meio de sujeitos interagindo em situações concretas. E, segundo Fairclough (1992) apud Santos e Macedo (s/d), o discurso é uma extensão da língua falada em contraste com textos escritos como, por exemplo, artigos de jornais, revistas, anúncios, entre outros. Assim, ainda em conformidade com as ideias de Santos e Macedo (s/d), em outras palavras, ao mesmo tempo em que a linguagem é uma entidade formal, constituindo um sistema, e também atravessada por entradas subjetivas e sociais, o discurso é um objeto, ao mesmo tempo, linguístico e histórico; entendê-lo requer a análise desses dois elementos simultaneamente. Desse modo, Maingueneau, analisando as ideias bakthinianas, diz que para interpretar qualquer enunciado, é necessário relacioná-lo a muitos outros, pois ―cada gênero de discurso tem sua maneira de tratar a multiplicidade de relações interdiscursivas”. Por exemplo, um jornal não cita da mesma maneira, nem cita as mesmas fontes que uma propaganda de sabão em pó. Isso porque o discurso só adquire sentido se estiver inserido em um universo de outros discursos: quando classificamos um texto dentro de um determinado gênero estamos relacionando-o aos demais textos do mesmo gênero. Construindo-se, assim, um sistema de linguagem (MAINGUENEAU, 2000). P á g i n a | 40 Assim, essas questões citadas anteriormente apontam para o fato de que, na constituição do sujeito do discurso, intervêm dois aspectos: primeiro, o sujeito é social, interpelado pela ideologia, mas se acredita livre, individual e, segundo, o sujeito é dotado de inconsciente, contudo acredita estar o tempo todo consciente. Afetado por esses aspectos e assim constituído, o sujeito produz ou reproduz o seu discurso (GUERRA, s/d). Logo, podemos dizer que o Discurso só é considerado Discurso enquanto remete a um ou mais de um sujeito, um eu, que se coloca como fonte de referências pessoais, espaciais e, ao mesmo tempo, indica que atitude está tomando em relação àquilo que diz e em relação ao seu co-enunciador. Ele indica, em particular, quem é o responsável pelo o que está dizendo (MAINGUENEAU, 2004). Foucault (1973) apud Guerra (s/d) relata que é na dispersão de textos, e não na unidade, que se constitui um discurso; a relação com as formações discursivas em suas diferenças é elemento fundamental que constitui o que estamos chamando de historicidade do texto. O sentido sempre pode ser outro e o sujeito, com suas intenções e objetivos, não tem o controle daquilo que está dizendo. Em relação ao discurso, a partir de tais premissas podemos chegar a duas ordens de conclusões: a) um sujeito não produz só um discurso; b) um discurso não é igual a um texto. Sendo assim, a partir dessas conclusões, a AD propõe a seguinte relação: remeter o texto ao discurso e esclarecer as relações deste com as Formações Discursivas, refletindo sobre as relações destas com a ideologia e a atividade verbal (FOUCAULT, 1973 apud GUERRA, s/d). Desse modo, a partir das afirmações de Maingueneau (2004), descreve- se que conforme o discurso se refira à atividade verbal em geral ou a cada evento de fala, vemos cada vez mais frequente o uso desse termo no meio social e nas ciências da linguagem. A noção de ―discurso‖ é muito utilizada por ser o sintoma de uma modificação em nossa maneira de conceber a linguagem. Em grande parte, essa modificação resulta da influência das diversas correntes das ciências humanas reunidasfrequentemente sob a etiqueta da pragmática. P á g i n a | 41 Assim, reunir o discurso sob o rótulo de práticas de linguagem, ciência humana – ou sob outro qualquer disponível – não o faz nem auto nem mutuamente explicável: o discurso ressoa como uma categoria muito ampla para prover uma explicação precisa para o funcionamento de ações, ainda que muitas das nossas ações possam ser admitidas como discursivamente resultantes (MARI et al, 2003). Em síntese, segundo Fernandes (2005), verifica-se que, para iniciar uma reflexão sobre o discurso, na perspectiva da Análise do Discurso, necessita-se buscar compreender conceitos como: Sentido: trata-se do efeito de sentido entre sujeitos em enunciação; nega-se a ideia de mensagem encerrada em si; contesta a imanência do significado; Enunciação: posição ideológica no ato de enunciar e que integra a enunciação, lugar sócio-histórico-ideológico de onde os sujeitos dizem e que marcam o momento e o ato de dizer; Ideologia: uma concepção de mundo do sujeito inscrito em determinado grupo social em uma circunstância histórica. Linguagem e ideologia são vinculadas, esta se materializa naquela. Ideologia é inerente ao signo em geral; Condições de produção: aspectos históricos, sociais e ideológicos que envolvem o discurso, ou que possibilitam ou determinam a produção do discurso; Sujeito discursivo: constituído na inter-relação social, o sujeito é polifônico e é constituído por uma heterogeneidade de discursos. Isto posto, esses conceitos estão inter-relacionados e se implicam na definição do que seja discurso, dentro do universo da Análise do Discurso (FERNADES, 2005). Portanto, segundo Maingueneau (2004), podemos dizer que o discurso é uma forma de ação sobre o outro (sujeito) e não apenas uma representação do mundo. Toda enunciação constitui atos que visam modificar uma situação linguística. Em outro nível, esses atos se integram em discursos de um gênero determinados, que visam produzir uma modificação nos destinatários. 1.2 O que é análise do discurso Segundo Milanez e Santos (2009) a análise do discurso ―é um canteiro de diálogos e confrontos teóricos no qual pesquisadores podem falar de P á g i n a | 42 lugares múltiplos sobre sujeitos discursivos‖. Parece-nos que essa inquietação é a movência para a busca de campos discursivos e a compreensão da existência histórica das pesquisas científicas, que coloca o sujeito no centro das atenções. Sabemos que esse sujeito é a elaboração, ao mesmo tempo, de uma força de controle e uma força criativa, mostrando que o homem não é livre para fazer o que quiser, que não pode livrar-se do outro para ser ele mesmo, mas que pode, simultaneamente, reinventar essa alteridade: uma fonte para acontecimentos que nunca se repetem. Agora, antes de começarmos de fato nossas discussões acerca da Análise do Discurso, importa que entendamos o seu status dentro dos estudos linguísticos. Para tanto, optamos por iniciar este estudo trazendo uma figura que permite visualizar o escopo da ciência linguística (WEEDWOOD, 2002). Figura 5: A Análise do Discurso em meio aos estudos linguísticos. Observando-se essa a figura, segundo Meurer e Dellagnelo (2008), se percebe que ela é composta por um núcleo, comumente referido como núcleo duro da ciência linguística, no qual estão dispostos os níveis de análise linguística, quais sejam: fonética, fonologia, sintaxe, morfologia, lexicologia e semântica; e por raios que determinam as disciplinas de estudos linguísticos, P á g i n a | 43 dentre as quais, como mostra a figura, incluímos a Análise do Discurso, nosso principal objeto de estudos. Sendo assim, com base nessa relação da ciência linguística, a AD – muitas vezes considerada como simples concepções linguísticas – recusa as concepções de linguagem que a reduzem ora como expressão do pensamento, ora como instrumento de comunicação. A linguagem é entendida como ação, transformação, como um trabalho simbólico em ―que tomar a palavra é um ato social com todas as suas implicações, conflitos, reconhecimentos, relações de poder, constituição de identidade etc.” (ORLANDI, 1998). Para Maingueneau (1997), o lugar de uma disciplina desta natureza não estava previamente inscrito no campo do saber. A Análise do Discurso define um campo de problemas da linguagem sem remeter a uma disciplina conexa à linguística. É preferível interpreta-la, no interior de uma certa tradição, como o encontro de uma conjuntura intelectual do seu surgimento e de uma prática escolar. Assim sendo, a AD é interpelada no interior dessa conjuntura do seu surgimento, na década de 60, com a ―explicação de textos‖, que é a tal prática escolar, presente sob múltiplas formas em todo o aparelho de ensino. Ligado às teorias enunciativas, a AD ocupou uma boa parte do território liberado pela antiga filologia, porém com pressupostos teóricos e métodos totalmente distintos. Ela pode ser lida como uma reação sistemática àquela que procurava colocar em evidência. Já para Mussalim (s/d), falar em Análise do Discurso pode significar, em primeiro momento, algo vago e amplo, já que toda produção de linguagem pode ser considerada ―discurso‖. No entanto, a Análise do Discurso da qual estamos retratando neste trabalho trata-se do estudo de uma disciplina linguística de vertente francesa. Para Macedo e Santos (s/d), a Análise do Discurso, de origem francesa, que tem sua gênese na década de 60, com Michel Pêcheux, Jean Dubois e posteriormente, dando continuidade, com Dominique Maingueneau, surge em um contexto intelectual afetado por duas rupturas. De um lado, com o progresso da Linguística, era possível não mais considerar o sentido apenas como conteúdo. De outro, isso permitia a Análise do Discurso não visar o que o P á g i n a | 44 texto quer dizer na realidade (posição tradicional da análise de conteúdo defronte a um texto), mas como um texto funciona. Sendo assim, é, pois, sob o horizonte comum de seus percursores – que partilham convicções sobre a luta de classes, a história e movimentos sociais – e de um momento de crescimento da Linguística – que se encontra em franco desenvolvimento e ocupa o lugar de ciência piloto – que nasce o projeto da Análise do Discurso (doravante AD). Assim, o projeto da AD se inscreve num objetivo político e interpretativo, e a Linguística oferece meios para abordar esses objetivos, por meio de conjunturas do estruturalismo (de vertente saussuriana) e de materialismos históricos como o marxismo e a psicanálise. Dessa forma, é nesse contexto que nasce o projeto da Análise do Discurso, com o estruturalismo e os materialismos históricos estabelecendo as bases para a gênese da AD (MUSSALIM, s/d). À vista disso, de acordo com Maingueneau (1997), se, já nos dias de hoje, a Análise do Discurso praticamente pode designar qualquer coisa (toda produção de linguagem pode ser considerada "discurso"), isto provém da própria organização do campo da linguística no decorrer dos anos de criação da AD. Este último, muito esquematicamente, opõe de forma constante um núcleo que alguns consideram "rígido" a uma periferia cujos contornos instáveis estão em contato com as disciplinas vizinhas (sociologia, psicologia, história, filosofia, etc.). A primeira região e dedicada ao estudo da "língua", no sentido saussuriano, a uma rede de propriedades formais, enquanto a segunda se refere à linguagem apenas à medida que esta faz sentido para sujeitos inscritos em estratégias de interlocução, em posições sociais ou em conjunturas históricas. O termo "discurso" e seu correlato "análise do discurso" remetem
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