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Teoria, Técnicas e Estratégia de Argumentação

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Argumentação Jurídica
Teoria
Técnicas
Estratégias
1º edição (ano 2001)
4º tiragem
Ingo Voese
Doutor em Lingüística: Professor de argumentação Jurídica nos cursos de graduação e pós-graduação da UTP
Técnicas argumentativas
 Entende-se por técnica argumentativa a produção de argumentos que tomam como orientação não o que é pertinente ao fato em avaliação, mas relações lógicas, circunstâncias e situações de outras esferas das atividades humanas e que, por pressuposição, tem condições para exercer força de convencimento: é quase como se as técnicas argumentativas representassem um recurso que empresta prestigio e valores duma determinada prática para transformá-los em argumentos – no caso do Direito – jurídicos.
 Assim, por exemplo, considera-se como verdadeiro, dentro da lógica, que, se a = b, então também é verdade que b = a; ou, então, se a = b e b = c, então, a = c. Os efeitos que produzem os dois tipos de relações lógicas (reciprocidade e transitividade) serão aproveitados, devido ao prestigio que tem o saber lógico, pela argumentação jurídica, especialmente no caso de fragilidade de provas e indícios: a construção de uma versão que interesse à sustentação da tese requer a substituição das incógnitas a, b e c por valores que serão trabalhados como se pudessem estabelecer as mesmas relações lógicas. Mais: as inferências e as deduções que resultam das propriedades que tem as relações lógicas serão utilizadas e aplicadas aos valores sociais e aceitas como argumentos importantes no julgamento jurídico.
 Outras técnicas para produzir argumentos, e que podem servir de exemplo ilustrativo para explicar o processo, são as que buscam apoio, quer seja no pressuposto de que o ponto de vista da pessoa de prestigio social é importante, quer seja na concepção de que a comparação de fatos pode ajudar a interpretar e julgá-los melhor, quer seja, ainda na definição da importância da história, da educação e das emoções na conduta dos indivíduos etc.
 As técnicas podem, pois, ser consideradas recursos que se justificam a partir de pressuposições que devem ter aceitação acadêmica e/ou social, o que, no Direito, se torna por demais importante e sublima o cuidado que o argumentador deve ter na escolha da técnica e das estratégias interativas que visam a estabelecer um acordo acerca das pressuposições subentendidas nos argumentos produzidos e utilizados.
 Em outras palavras, a construção da versão de um fato jurídico pode, quando apoiada em provas e indícios frágeis, valer-se de técnicas argumentativas. O que, na verdade, não envolve, num primeiro plano, o que está sendo julgado e permite dizer que provas e indícios são argumentos produzidos através da pesquisa e da interpretação do fato, ao contrario dos argumentos que são resultado das técnicas argumentativas e que só são aceitos como tais devido à pressuposição de que os “empréstimos” são possíveis e úteis.
 A argumentação jurídica, embora difira dos comentários dos raciocínios formais, busca, pois, aproximar-se ou orientar-se por eles porque se pressupõe que a coesão e a congruência possam contribuir com o poder de convencimento, de forma que, por exemplo, na argumentação jurídica.
 “Quem critica um argumento tenderá a pretender que o que tem à sua frente depende da lógica; a acusação de cometer uma falta de lógica é, em geral, por sua vez, uma argumentação quase-lógica. A pessoa se prevalece, com essa acusação, do prestigio do raciocínio rigoroso.” (Perelman, 1996 a, p.220).
 No presente trabalho, a distinção entre argumentos lógicos e quase-lógicos que faz Perelman não receberá, porem, considerações mais demoradas, porquanto se entende que, na pratica jurídica, especialmente quando se trata de valores, isso se torna bastante complexo, precisamente porque a argumentação jurídica, onde o objetivo não é nem demonstrar, nem descobrir verdades ou testar hipóteses, mas justificar teses pode ser caracterizada, em grandes traços, sempre como quase-lógica.
 O que importa, todavia, é observar que um raciocínio jurídico, para poder usufruir do prestigio do rigor lógico, precisa adotar procedimentos que deverão dar consistência e credibilidade à pratica, e que podem ser de diferentes níveis:
realizar interpretações que sejam aceitáveis e defensáveis, o que exige do argumentador um sistema de referencia competente e abrangente;
procurar controlar a heterogeneidade lingüística, o que exige, por sua vez, habilidades do argumentador para definições e delimitações dos sentidos das palavras;
adotar um modelo lógico como orientação.
 O estudo, pois, de diferentes técnicas argumentativas que podem ser úteis à pratica jurídica enfatizara sempre os aspectos relacionados à atividade e à lingüística e à orientação lógica, e destaca os seguintes:
 Argumento da coerência:
 Esse primeiro tipo de técnica vale-se do prestigio do rigor lógico e requer, por isso, uma atividade intensa com e sobre a linguagem – mais precisamente, de controle e de delimitação dos sentidos – para, assim, utilizar a coerência como argumento.
 A coerência – como já se enfatizou – é uma qualidade considerada imprescindível a qualquer argumentação, pois não se aceita a contradição dentro de um raciocínio, ou seja, não se deve afirmar algo e depois assumir uma outra idéia que negue a primeira afirmação. Para manter a coerência e utilizá-la como argumento, é preciso que se assuma um comprometimento com a referencia socialmente aceita e tomá-la como orientação rigorosa para a produção de sentidos que não apresentem contradições.
 E isso tem seus motivos: o prestigio do rigor lógico leva a que a contradição possa ser interpretada, uma vez, como falta de convicções claras e incapacidade para escolher com segurança a referencia que orienta a atividade, e, por outro lado, como um desrespeito com o auditório em termos de não lhe facilitar a compreensão dos objetivos da argumentação, precisamente por não haver uma organização lógica correta das relações entre referencias e sentidos verbalizados.
 Entende-se, por isso, que a falta de coerência, uma vez denunciada, expõe o argumentador à condenação e ao insucesso: a frouxidão referencial e a contradição denunciam a incapacidade de produzir boas interpretações dos fatos, vale dizer, de construir boas teses. Perde, pois, o argumentador uma das qualidades – se não a mais importante – que a interpretação cobra dos participantes, ou seja, a da credibilidade.
 Ser coerente diz, desse modo, respeito à competência tanto para escolher os conceitos que serão referencia para o raciocínio, como para organizar os argumentos sem que haja contradição com a referência escolhida.
 Na argumentação jurídica, a referencia quase obrigatória é a lei. Pode, porém, também ser uma jurisprudência ou um conceito que tenha aceitação social ou uma presunção jurídica, - desde, porém, que se enquadre nos limites dos modais deônticos. De qualquer modo, o importante é considerar que a coerência só poderá ser invocada como argumento quando determinada referência tem – ou poderá vir a ter – prestigio junto ao auditório, ou seja, ao invocar a coerência como argumento, o argumentador se vê diante de duas importantes tarefas:
fazer com que a referência escolhida seja aceita pelo auditório, o que implica em saber fazer avaliações preliminares corretas quanto ao universo referencial aceito pela sociedade e em determinar com competência o sentido desta referencia, tendo em vista o que interessa à argumentação; 
conduzir o raciocínio de modo a que não haja contradições em relação à referência, o que representa dominar os processos de manutenção da coerência, da coesão e da congruência.
 Enfim, a técnica que produz o argumento da coerência é essencialmente uma atividade lingüística que visa à utilização do prestigio do vigor lógico, ou seja, um recurso em que o argumentadorse ocupa ou em observar o rigor da relação não-contraditória entre uma referencia e as interpretações e justificativas que por ela se orientam, ou em denunciar a falta dessa condição na argumentação adversária.
 O argumento da reciprocidade:
 Essa técnica argumentativa apóia-se também no prestigio do rigor lógico, especificamente na propriedade das relações para construir uma aproximação ou simetria entre dois fatos ou idéias (ou mesmo valores) de modo a que a semelhança de características implique em que se possa aplicar o mesmo tratamento ou julgamento a ambos, mesmo se houver uma inversão de situações ou de posições da simetria inicial.
 A atividade do argumentador, nessa técnica de raciocínio, exige, principalmente, saber interpretar e construir o contexto das situações, ou seja, é preciso que a aproximação de dois fatos diferentes se faça pelo que pode localizar de semelhante neles e nos elementos contextualizadores. Isso requer, sobremodo, saber produzir interpretações apropriadas, o que, mais uma vez, enfatiza a importância de um sistema de referencia produtivo e competente, e, por isso, da linguagem: para poder aproveitar uma correlação lógica como se a = b, então b = a, na argumentação jurídica, a primeira atividade refere-se à delimitação conceitual que deverá dar condições para que o raciocínio se beneficie da relação lógica.
 Assim, por exemplo, adotando essa técnica, o argumento sustentará que, se cabe aos pais dar proteção e abrigo aos filhos enquanto estes puderem ser considerados dependentes, da mesma forma caberá aos filhos a responsabilidade de prover as condições de sobrevivência dos pais quando estes, eventualmente, atravessarem uma situação em que se puder considerá-los dependentes. O raciocínio precisa definir, obrigatoriamente, o que se entende por dependência para que o caráter de reciprocidade da relação entre pais e filhos possa ser sustentado com o apoio no modelo lógico.
 O argumento da transitividade:
 A técnica que permite à argumentação jurídica produzir determinados argumentos que mantém uma relação de transitividade, forma como motivação, segundo PERELMAN (1996), “(...) uma propriedade formal de certas relações que permite passar da afirmação de que existe a mesma relação entre os termos a e b entre os termos b e c, à conclusão de que ela existe entre os termos a e c: as relações de igualdade, de superioridade, de inclusão, de ascendência são relações transitivas.” (p.257).
 Isso significa que a argumentação jurídica pode buscar como apoio relações formais de transitividade, desde que se controle a heterogeneidade lingüística: o objetivo de construir uma relação de transitividade que não deixe de apresentar o rigor lógico exige interpretar e demarcar com a precisão possível os sentidos que substituirão as incógnitas a,b e c.
 Por exemplo, embora seja discutível sustentar que “os amigos de nossos amigos são nossos amigos”, a idéia pode ser trabalhada, insistindo que a verdadeira amizade deveria ser assim. O enunciado pode servir de referência a um raciocínio, o que quer dizer que este tem fundamento no modelo que sustenta a transitividade, pois a implicação é uma das mais importantes relações transitivas e pode ser avaliada socialmente em diferentes áreas ou práticas sociais. 
 Assim, o seguinte silogismo se constrói pela relação de transitividade:
Não deve ser condenado (=a) aquele que mata em legitima defesa (=b); ora, João (=c) matou em legitima defesa (=b); logo, João (=c) não deve ser condenado (=a).
 A dificuldade de ordem lingüística reside, em primeiro lugar, na delimitação do sentido da expressão legítima defesa e, segundo, adotar a referência para interpretar o ato de João.
 O argumento da comparação:
 A técnica que faz da comparação um argumento tem o objetivo de comparar enquadrando uma imagem (do réu ou da vítima, por exemplo) ou a versão de um fato (um delito, por exemplo) dentro duma seqüência hierarquizadora que inclui outras imagens ou versões.
 Cabe ao argumentador a tarefa de fazer as escolhas das imagens ou versões com as quais organizara a seqüência escalar que servira de parâmetro de avaliação, o que, de certa forma, corresponde à escolha da referencias com as quais ele estruturará o raciocínio. A comparação passa, portanto, a produzir argumentos, quer seja a favor, quer seja contra do que está sendo julgado: se quiser condenar, a escolha, para fazer o cotejo, deverá privilegiar aquelas imagens (referências) que têm um conceito elogiável no instituído social. E o inverso ocorrerá quando o objetivo for o de defender: o cotejo do que está sendo julgado será feito com o que houver de condenável no imaginário do auditório.
 O argumento da inclusão da parte no todo:
 Uma outra técnica de argumentação consiste em apoiar-se na presunção de que o que vale para o todo também vale para as partes, o que significa, mais uma vez, a utilização do modelo lógico-formal (se...então) e o trabalho com o sentido das palavras, i. é, a técnica inclui o controle da heterogeneidade de sentidos.
 A técnica exige, pois, além da orientação da estrutura “se...então”, uma intensa atividade de produção de sentidos (ou controle de sentidos) para a sustentação do “se” porque é preciso conseguir a adesão à idéia de que a inclusão da parte num todo em que as partes mantêm um determinado tipo de relações faz com que cada uma se submeta ao que vale para o todo.
 A produção ou o controle de sentidos refere-se, pois, a definir o que é o todo, quais são as suas partes e quais são as relações que elas mantêm entre si de modo a que se submetam ao todo. 
 Por exemplo, na argumentação jurídica, é freqüente encontrar a tese de que, se a lei vale (ou não) para o todo, também vale (ou não) para cada parte. Parte-se do pressuposto de que o todo se compõe de partes que têm entre si uma relação de igualdade, o que, especialmente no Direito, necessita de uma série de procedimentos interpretativos dos fatos, de modo a que se convença o auditório de que essa relação lógica é sustentável. Qualquer deslize ou impropriedade interpretativa fragilizara a argumentação.
 
O argumento da divisão do todo em partes:
 Trata-se, agora, ao contrário da técnica anterior, não de tentar demonstrar a inclusão e o submetimento da parte ao todo, mas de que o todo é a soma das partes: o argumentador busca aqui, quando constrói o sentido do todo, apoio no sentido da parte e no pressuposto de que a soma é a relação que sustenta o todo. O recurso da definição e da delimitação conceitual ocupa-se, em primeiro lugar, da parte, para, num segundo momento, baseado no resultado da atividade inicial, ocupar-se do todo como, por exemplo, ocorre na relação entre gênero e espécie em que, segundo PERELMAN (1996), “Para poder afirmar algo do gênero, cumpre que esse algo se confirme numa das espécies: o que não faz parte de nenhuma espécie não faz parte do gênero.” (p. 265).
 Essa técnica pode, por isso, produzir argumentos positivos, valendo-se de todos os efeitos que se pode tirar, primeiro, das interpretações realizadas, e depois, das operações de soma, de subtração e de suas combinações como, por exemplo, tentar sustentar que uma comunidade está à mercê das drogas (ou de bandidos etc.), alistando e qualificando exaustivamente os bairros que acusam o fato, ou que alguém apresenta uma boa (ou má) conduta social produzindo versões boas (ou más) de atos isolados seus.
 E evidente que, neste tipo de técnica, o argumentador tende a valer-se especialmente do tratamento estatístico e da formulação de tabelas, o que significa, novamente, que, após a atividade que produz e fixa sentidos, atua-se sobre uma pressuposição, ou seja, a de que a soma, o tratamento estatístico e as tabelas – pelo prestigio de que desfrutam – podem dar à versão a imagem da verdade.
 O argumento ad ignorantium:
 O argumentadorpode, numa situação em que as condições para uma ampla e demorada discussão estejam prejudicadas, valer-se da técnica que consiste em formular os argumentos convenientes à tese, ao mesmo tempo em que desafia – devido ou à exigüidade de tempo ou a dificuldades momentâneas – o auditório a apresentar os que se possam contrapor a eles.
 No Direito, particularmente, o uso dessa técnica pode ser muito eficaz, porquanto há, em momentos de análise e intervenção nos conflitos, situações de impasse ou de dificuldades que entravam o avanço do julgamento no exato momento em que elas requerem uma decisão urgente.
 Os argumentos a pari e a contrario:
 A concepção de relações ou de inclusão ou de exclusão orienta essa técnica argumentativa: parte-se, mais uma vez, de uma característica das ciências lógico-formais onde um elemento pode a depender de suas características, ser ou não incluído num conjunto mais amplo, do que se retira a pressuposição de que essa inclusão (ou exclusão) que permite hierarquizações e classificações contribui para uma aproximação do que é do nível do verdadeiro. Essa técnica que constitui os argumentos a pari e a contrario é muito utilizada na pratica jurídica, como, por exemplo, no caso em que a lei fala os direitos dos filhos herdeiros: pelo argumento a pari tenta-se estender os mesmos às filhas, precisamente porque a interpretação de filhos diz que a palavra não se refere, neste caso, somente aos indivíduos do sexo masculino, mas que o sentido deve ser considerado genérico e, por isso, inclui os indivíduos de ambos os sexos, o que quer dizer que a interpretação produziu uma relação de inclusão.¹º
 Pelo argumento a contrario, pode-se contestar uma inclusão ou igualdade, a depender da interpretação da lei, e que permitirá, então, construir uma relação de exclusão.
 Novamente, nos dois tipos de argumentos, a atividade lingüística é fundamental: a sustentação de uma relação de inclusão ou de exclusão só pode ser feita uma vez determinado um campo semântico onde se cotejam dois (ou mais) conceitos. A atividade interpretativa – sempre orientada por interesses bem específicos no caso do Direito – visa a incluir ou excluir um conceito menos amplo num de maior amplitude, atendendo ao prestigio que se confere ao processo de sistematização e de classificação.
 Uma conseqüência, pois, interessante (e absurda) é o que pode acontecer, por exemplo, no julgamento dum estuprador: caso o seu defensor conseguir definir o conceito de sexualidade humana como sendo igual (o que significa inclusão) ao de sexualidade dos animais em geral, é bem possível que – se a acusação não for competente para desarmar a inclusão – o estuprador seja absolvido e a vitima passe por culpada por ter estimulado a que o macho (como na natureza) se tornasse agressivo e incontrolável na conduta sexual.
¹º No Brasil, o exemplo dado pode até causar estranheza porque os direitos de herança estão garantidos tanto para filhos como para filhas. Em algumas comunidades da Ásia, porém, esse “a pari” não ocorre: prevalece o “a contrario”. 
O argumento da analogia:
 Uma das relações de igualdade da lógica formal é a analogia em termos de a = b assim como c = d, o que pode servir como um recurso para a argumentação jurídica sobre o que PERELMAN se manifesta como segue:
 “Ninguém negou a importância da analogia na conduta da inteligência. Todavia reconhecida por todos como um fator essencial de invenção, foi olhada com desconfiança assim que se queria transformá-la num meio de prova. (...) Longe de nós a idéia de que uma analogia não possa servir de ponto de partida para verificações posteriores; mas nisso ela não se distingue de nenhum outro raciocínio, pois as conclusões de todos eles sempre podem ser submetidas a uma nova prova. (...) Todo estudo global da argumentação deve, pois, incluí-la enquanto elemento de prova”.
 (PERELMAN, C. 1996 a, p. 423 – 24).
 Na verdade, a analogia é uma comparação que não visa a diferenciar, mas a estabelecer as semelhanças, o que, de certa forma, na pratica jurídica, aponta para uma igualdade de relações entre os indivíduos.
 Assim, se o argumentador escolher um enunciado como, por exemplo, “Agredir a mulher é como agredir o membro central da família e , por isso, a célula da sociedade”, estará construindo uma relação de semelhança que, ao fazer a valorização do instituído social, cria condições de valorizar a família e a mulher, ao mesmo tempo que reforça a acusação contra um eventual agressor.
 Outro efeito interessante da analogia se dá quando o argumentador quer desqualificar alguém comparando-o com o que é desprezível aos olhos do auditório: cria-se uma associação entre o individuo e o que é desqualificante – efeito da relação de igualdade que a técnica cultiva como pressuposição.
 Ainda um outro aspecto da técnica diz respeito ao cuidado na construção da analogia, pois:
 “A escolha dos termos de comparação adaptados ao auditório pode ser um elemento essencial da eficácia de um argumento, mesmo quando se trata da comparação numericamente especificável: haverá vantagem, em certos casos, em descrever um país como tendo nove vezes o tamanho da França em vez de descrevê-lo como tendo a metade do Brasil.” (PERELMAN, C. 1996 a, p.278).
 A escolha dos termos (por exemplo, dos números) é importante porque cada alteração produz diferentes efeitos de convencimento, podendo inclusive criar – especialmente no caso das estatísticas – uma imagem de credibilidade que, como se sabe, nem sempre se justifica, mas se torna decisiva para o argumentador conseguir a adesão do auditório.
 De qualquer forma, a construção de uma analogia, apesar de todos os cuidados do argumentador na avaliação do auditório, sempre revela um caráter de instabilidade ou de fragilidade, precisamente porque basta alguém não aceitar uma semelhança estabelecida para que todas as conclusões que dela se retiraram sejam também rejeitadas.
 O argumento da fixação de um grau:
 O recurso a esse argumento permite, através do processo de comparação, um cotejo entre vários objetos para avaliá-los um em relação ao outro e estabelecer as diferenças de grau de qualidade ou de características. A técnica difere do argumento de identificação como analogia porque atua ou com uma oposição (justo x injusto) ou de ordenamento (mais justo que etc.), mas mantém a pressuposição de que o ordenamento hierárquico pode facilitar o acesso ao que é verdadeiro.
 A atividade é essencialmente lingüística, o que pode ser observado tomando, como exemplo, a disposição bipolar das cores, onde num extremo da escala se suponha estar o azul e noutro o amarelo: a mistura das cores pode ser feita partindo de um ou outro ponto da escala e faz com que, querendo nomear as cores intermediárias, e partindo do amarelo em direção ao azul, possam ser utilizadas indistintamente as expressões verde mais amarelado e verde menos azulado. Tomando como referência o outro extremo, as expressões que designarão as aproximações deverão ser verde mais azulado e verde menos amarelado.
 Isso quer dizer que as escolhas parecem equivalentes, mas, na verdade, produzem efeitos diferenciados: o verde é classificado a partir ou do amarelo ou do azul, o que quer dizer que a escolha do extremo definidor corresponde, na verdade, à escolha da referência interpretativa.
 Ora, isso leva a que se constate que a argumentação, ao valer-se dessa técnica, atua, em primeiro lugar, com linguagem porque, substituindo as cores por outros pares de expressões como correto e incorreto, justo e injusto, bom e mau, social e anti-social etc., é necessário definir e delimitar as referências para, depois, proceder às classificações que, embora contenham os quantificadores mais e menos, se fazem pela expressão utilizada, ou seja, correto ou incorreto, justo ou injusto etc.
 Os efeitos que os qualificadores produzemsão, evidentemente, diferenciados e explicam tanto a sutileza como a força do argumento, ainda mais quando o argumentador, ao trabalhar a escala de mais e menos, se valer da situação e demarcar o lugar de um superlativo em termos de o verde mais amarelado ou o verde menos azulado, o verde mais azulado e o verde menos amarelado, ou no caso do Direito, o mais justo etc.: o uso do superlativo produzirá um argumento bastante agressivo que pode, em determinadas circunstâncias, causar efeitos mais eficientes do que a simples comparação.
 O argumento da relação de meios e fins:
 Essa técnica pode ser considerada como um processo que, de certo modo, também – como as técnicas anteriores – utiliza a comparação, pois realiza o cotejo entre duas realidades, não visando, porém, a estabelecer semelhanças ou a hierarquizar qualidades, mas a avaliar os sacrifícios ou meios que a obtenção de um resultado estaria exigindo.
 Um exemplo típico de argumento que é resultado do acolhimento da relação entre meio e fim é o contrato de compra e venda: a proposta de aquisição de um bem requer um determinado sacrifício (pagamento etc.), ou seja, o fim explica (ou justifica) a alocação de determinados meios.
 Na argumentação jurídica, a invocação de meios necessários pode tanto servir à acusação como à defesa, e produz efeitos importantes como, por exemplo, ocorre com frases como só acredito em quem sabe perdoar, só acredito em justiça quando houver rigor na aplicação da lei, só acredito em diminuição da violência com a implantação da pena de morte, o que quer dizer que, para conseguir credibilidade, os meios necessários são saber respeitar as leis, saber perdoar, ser rigoroso na aplicação lei ou implantar a pena de morte: o argumentador toma como referência um fim – credibilidade, por exemplo – que mereça a aprovação do auditório e que, por isso, deve dar condições a que os meios propostos também sejam aprovados.
 Observa-se, pois, nesta técnica, também a necessidade de intensa atividade lingüística – interpretar, delimitar, definir etc. -, o que destaca a sua importância para a argumentação jurídica, principalmente quando se sabe que a técnica pode gerar argumentos como Os fins sempre justificam os meios e que, na tentativa de promover a justiça, criarão, com certeza, empecilhos indesejáveis e desastrosos, porquanto a pressuposição contida no enunciado constitui, dentro da heterogeneidade social e da igualdade de forças e poderes, a possibilidade de implantação de autoritarismo e do abuso do poder.
 O argumento da probabilidade:
 Uma técnica de argumentação muito usada, mesmo (ou especialmente) para realidades não-quantificáveis, é a que busca o modelo lógico-formal para valer-se das estatísticas e do calculo de probabilidade que, se nas ciências matemáticas e naturais, têm sua importância, no Direito, só devem a sua utilização ao status do procedimento, pois a realidade a ser abordada dificilmente permite quantificações e cálculos probabilísticos.
 Assim, por exemplo, num julgamento, o uso da estatística em relação ao comportamento humano para determinar a probabilidade do percentual de responsabilidade ou do individuo ou da sociedade na ocorrência do delito, pode facilitar a tarefa do argumentador, especialmente pela imagem de credibilidade que os números constroem. Trata-se, porém, da instituição de um tratamento uniforme para uma realidade que é heterogênea, o que indica os múltiplos usos (e abusos) a que essa técnica pode servir.
 Alem disso, não se deve esquecer que qualquer fato – jurídico ou não – pode ser abordado a partir de diferentes variáveis ou conceitos operacionais, ou seja, os números e as estatísticas vão dar “credibilidade” àquilo a que o argumentador quiser dar, mas não são capazes de produzir, no direito, as “verdades” que aparentam produzir, ou seja, a realidade analisada nos tratamentos estatísticos nunca é uma totalidade, mas um recorte produzido pela intervenção do analista ao se valer de categorias operacionais escolhidas por ele: conceitos e sentidos adotados e produzidos podem e devem, pois, no caso de um debate – especialmente no Direito – ser relativizados, embora sejam eficientes como argumentos, desde que a pressuposição de que a técnica seja acolhida pelo auditório.
 O argumento do vínculo causal:
Uma argumentação pode acolher por estabelecer um vínculo causal entre:
dois acontecimentos sucessivos;
um acontecimento e uma causa determinante;
um acontecimento e seus efeitos prováveis;
 No primeiro caso, a argumentação visará à sustentação da tese que um acontecimento que sucede imediatamente a outro tem como este um vínculo causal, ou seja, é conseqüência: se não houvesse o primeiro, não haveria o segundo.
 Já é diferente a relação causal que se pretende sustentar no segundo caso: um fato ocorrido não tem necessariamente a sua origem num outro imediatamente anterior, mas num ponto qualquer que depende da escolha do argumentador. Por isso, determinar uma causa de um ato permite que o argumentador, valendo-se da riqueza de seu sistema de referência, construa argumento extremamente fortes como, por exemplo, no Direito, o da necessidade ou inexigibilidade de conduta diferente.
Pode, porém, como no ultimo caso, o argumentador construir um relação causal entre o fato ocorrido e uma situação futura.
 No caso da argumentação jurídica, a técnica que se vale de determinados procedimentos das ciências lógico-formais, precisa como todas as demais técnicas – cuidar da atividade lingüística, pois fica evidente que um vínculo causal, qualquer que seja, necessita de interpretações que produzam sentidos que possam suportar essa relação de causalidade, especialmente, tomando em consideração que se atua com valorações diferenciadas que se originam da heterogeneidade referencial.
 O argumento pragmático:
 O argumento pragmático aprecia um acontecimento pelas conseqüências favoráveis ou desfavoráveis que poderá provocar nos acontecimentos e na vida prática. Na verdade, “Esse argumento desempenha um papel a tal ponto essencial na argumentação que certos autores quiseram ver nele o esquema único da lógica dos juízos de valor.” (PERELMAN, C. 1996 a, p. 303).
 A técnica, pois, através da qual se tomam elementos do nível pragmático como argumentos é valorizada sobremodo na pratica jurídica porque as atividades referem-se a questões que dizem respeito quase sempre a problemas das relações sociais e que envolvem valores.
 Por isso, por exemplo, a condenação (ou a absolvição) do réu pode ser construída, sustentando o que a sentença poderá significar para o bem-estar da sociedade. Ao propor o sucesso (ou a felicidade, bem-estar etc.) como critério de avaliação, o argumentador vale-se da técnica para apoiar-se em determinada hierarquia de valores que, obviamente, não precisa ser considerada a única e a melhor, mas que é sempre produto de uma interpretativa que visa à defesa de interesses específicos e atua sobre a heterogeneidade referencial.
 A força do argumento pragmático está, pois, no fato de ele dizer respeito aos sentidos da vida, no cotidiano das pessoas, dos projetos pessoais etc., - elementos que pertencem ao nível imediato do contexto do fato em julgamento e que, às vezes, podem, tendo em vista os sistemas de referência do auditório, produzir maiores efeitos do que aquilo que se coloca num horizonte mais distante como, por exemplo, concepções ideológicas.
 O argumento do desperdício:
 A técnica em dizer que uma vez que já se começou a fazer algo (obra etc.) seria um desperdício não continuá-la, na pratica jurídica, pode significar, por exemplo, que não se deve perder uma oportunidade de condenar ou de absolver alguém porque já existem meios para atender os efeitos da decisão/sentença. Haveria, pois, um desperdício de meios produzidos pela sociedade e seria inaceitável, por isso, não aplicá-los ou utilizá-los, oque possibilita que a criação e a manutenção da policia, do exercito, do sistema carcerário etc. possam ser invocadas como argumento para sustentar a idéia de que é um desperdício de custos querer, num dado momento, por razoes diversas, desativar ou desconsiderar o emprego do que já foi criado.
 O argumento da direção:
 Basear-se na concepção que pressupõe que os fatos e a realidade se constituem por etapas que mantém entre si uma relação de causa e efeito, refere-se à técnica da qual resultam, como argumentos, as considerações contra ou a favor da sucessão de etapas (prováveis) que um fato poderá gerar: é o que orienta o argumento da direção.
 Por exemplo, no Direito, quando estiver em discussão o controle da violência, o argumento pode dizer que se nós vamos ceder desta vez, deveremos ceder um pouco mais na próxima, e sabe Deus onde vamos parar.
 Enfim, o argumento da direção concebe a História como uma linearidade que se sustenta por relações lógicas e desconsidera a possibilidade de que, fora da seqüência de etapas, possa existir algo que explique melhor um determinado acontecimento.
 
 O argumento que relaciona ato e pessoa:
 Esse tipo de argumento tem especial importância no Direito, porque caracteriza uma presunção jurídica que diz que o valor de um ato revela o valor da pessoa (diferente da presunção religiosa, por exemplo, que considera que cada pessoa vale mais do que o pior de seus atos).
 A dificuldade da invocação ou da sustentação dessa relação entre o ato e pessoa diz respeito à questão da subjetividade, isto é, saber o que é social e o que é de ordem pessoal nas motivações e determinações dos atos que os indivíduos realizam.
 Por exemplo, se o valor do ato determina apenas o valor da pessoa quer-se dizer que a responsabilidade do ato é inteiramente de seu autor. A sociedade, nessa concepção, não exerce nenhuma pressão sobre as condutas, o que, evidentemente, é questionável. A concepção inversa igualmente deve ser considerada um equívoco porque significa afirmar que o individuo não tem nenhuma responsabilidade por seus atos.
 A complexidade reside, evidentemente, em conseguir demonstrar ou quantificar o grau de responsabilidade do individuo e da sociedade, o que representa, contudo, a condição para que a técnica possa ser utilizada para a produção de argumentos tanto para a defesa como para a acusação do réu.
 
 O argumento da autoridade:
 O instituído social prevê, entre os valores que protege, um destaque especial para as falas de autoridade, ou seja, valoriza as falas de acordo com o prestigio do lugar social que os indivíduos ocupam.
Esse prestígio pode estar ligado não só à força e poder de determinados segmentos sociais, mas também à importância que se dá a certas atividades acadêmicas e profissionais.
 O argumento da autoridade parte, assim, do pressuposto de que a citação de outrem possibilita usar o prestigio e a autoridade do enunciante citado, valorizando o citado como argumento. Para conseguir a adesão a uma tese, o argumentador busca, pois, dar à própria fala o prestígio e a autoridade de outrem, citando o que entende como conveniente à sustentação que está fazendo.
 Para PERELMAN:
“...existe uma serie de argumentos cujo alcance é totalmente condicionado pelo prestígio. A palavra de honra, dada por alguém como única prova de uma asserção, dependerá da opinião que se tem dessa pessoa como homem de honra...” (1996 a, p. 347).
 Por isso, investir no prestígio ou na autoridade da fala de outrem pode até ser criticado como procedimento que busca sustentar uma tese, mas isso leva PERELMAN, quando se refere à estratégia muito utilizada no Direito, a afirmar:
“Mas não é uma ilusão deplorável crer que os juristas se ocupam unicamente com a verdade, e não com justiça nem com paz social? Ora, a busca da justiça, a manutenção de uma ordem eqüitativa, da confiança social, não podem deixar de lado as considerações fundamentadas na existência de uma tradição jurídica, a qual se manifesta tanto na doutrina quanto na jurisprudência, para atestar a existência de semelhante tradição, o recurso ao argumento de autoridade é inevitável.” (Op. cit., p. 349).
 A citação, contudo, não serve apenas para valer-se do prestigio de outrem, mas também pode ter por objetivo desautorizar e desvalorizar determinados argumentos de alguém a quem se busque imputar uma falta de autoridade: a técnica pode, pois, tanto servir para reforçar como desvalorizar uma atividade argumentativa e requer, por isso, que o individuo citante saiba não só interpretar, mas também avaliar corretamente as valorizações sociais das falas ou linguagens, fazer os recortes convenientes e integrá-los de modo a que eles produzam os melhores afeitos.
 
 Para MAINGUENEAU (1989),
“ Aí reside toda a ambigüidade do distanciamento: o locutor citado aparece, ao mesmo tempo, como o não-eu, em relação ao qual o locutor se delimita, e como ‘autoridade’ que protege a asserção. Pode-se tanto dizer que ‘o que enuncio é verdade porque não sou eu que o digo’, quanto o contrario.” (p.86).¹¹
 O recurso da citação, no Direito, busca – quase sempre – trabalhar com a exemplificação: toma-se um julgamento já ocorrido como orientação para a interpretação e avaliação duma nova situação. Isso pode ser interessante até o limite em que se puder sustentar que a distância histórica não torna imprópria a comparação dos dois momentos e, por isso, será problemático, por exemplo, considerar uma jurisprudência sempre atualizada, em especial, quando se sabe que houve época em que a defesa de alguns tipos de crimes acolhia a justificativa de crime contra a honra masculina. Ou seja, as interpretações e os julgamentos dos fatos não são estáticos e, por isso, nem sempre a citação auxilia o argumentador na produção da versão e na sustentação da tese.
¹¹ Além dos trabalhos de MAINGUENEAU, existem inúmeros outros estudos interessantes (BAKHTIN, 1986, por exemplo) que se ocupam dessa relação entre uma fala citante e outra citada, o que deve ser entendido como sinal de que as formas e os efeitos são variados e ricos.
 
 O argumento da relação entre ato e essência:
 Um modo de explicar (ou de interpretar) a realidade busca associar e explicar fatos particulares como manifestações de uma essência, como se determinados acontecimentos pudessem ser agrupados a partir de uma semelhança ou ponto comum. Isso pode servir de base, especialmente na argumentação jurídica – onde a essência equivale ao que é considerado normal e legal – para construir, por exemplo, a noção de que delito se opõe a uma essência, ou é um abuso que se faz contra ela: o que é normal é de acordo com a essência e o delito é um abuso porque coloca-se contra o normal.
 Na verdade, a pressuposição que dá lugar a essa técnica argumentativa pode também servir à utilização duma estratégia mistificadora, como se poderá observar no próximo capítulo.
 
O argumento do exemplo:
 
 O exemplo é um argumento, mas não uma prova: é um recurso para sustentar uma tese, especialmente na construção de uma generalização e, “Seja qual for a maneira pela qual o exemplo é apresentado, em qualquer, área que se desenvolva a argumentação, o exemplo invocado deverá, para ser tomado como tal, usufruir estatuto de fato, pelo menos provisoriamente; a grande vantagem de sua utilização é dirigir a atenção a esse estatuto.” (PERELMAN, C. 1996 a, p. 402).
 O estatuto, pois, do argumento do exemplo deve-se a uma pressuposição, ou seja, a que diz que, para os exemplos conduzirem a uma generalização convincente, é preciso que eles suportem, além de uma vinculação estreita entre si, a idéia de que da generalização que eles possibilitam se pode extrair uma verdade.
 A generalização é, pois, um processo em que o argumentador, valendo-se de versões (sentidos) de fatos, e situações particulares, constrói uma idéia geral,como se, através desse processo, pudesse alcançar uma verdade irrefutável. Em outros termos, ela é o processo que agrupa várias singularidades numa categoria mais ampla e geral, para o que elimina, por abstração, os traços singulares e mantém apenas os traços genéricos.
 Embora o raciocínio formal isso até possa ser admitido, na pratica jurídica a generalização assume enormes riscos, pois ela se realiza em função da heterogeneidade social: como superar o conflito dos inúmeros sistemas de referência sem incorrer num processo de hierarquização e valoração dos segmentos sociais – vele dizer, acionar o processo ideológico?
 Como recurso, numa disputa jurídica, pode, contudo, a generalização apresentar – especialmente se o argumentador fizer corretas avaliações do auditório – efeitos favoráveis porque,
“Em direito, notadamente, enquanto se reserva às vezes o nome de precedente à primeira decisão tomada segundo certa interpretação á lei, o alcance desse julgamento pode só ser depreendido aos poucos, depois de decisões posteriores. Assim, o fato de contentar-se com um único exemplo na argumentação parece indicar que não se percebe nenhuma duvida quanto ao modo de generalizar.” (Op. cit., p. 404)
 Isso quer dizer que a maior dificuldade da exemplificação diz respeito ao trabalho com a linguagem: os sentidos extraídos dos exemplos devem servir á aprovação da generalização proposta, o que, em qualquer raciocínio e, sobremodo no Direito, é fundamental.
 
O argumento da ilustração:
 Diferente do argumento do exemplo, onde se busca agrupar diferentes versões de fatos de modo a construir uma regra, a técnica da ilustração tem a função de reforçar a adesão a uma regra conhecida e já aceita – escolhida como referência para a sustentação duma tese.
 A atividade consiste em enriquecer o que resultou dum processo de generalização com a exposição de fotos, filmes, gravações, quadros etc. que não só esclarecem a regra, mas também demonstram a sua aplicabilidade, o que leva a que se considere a ilustração um tipo de argumento.
 O argumento da ilustração pose até ser duvidoso, mas, ao impressionar a imaginação, provoca efeitos de convencimento muito fortes, porquanto oferece singularidades ilustrativas, isto é, elementos de reforço a concepções ou regras que já pertencem ao instituto social.
 Para finalizar, é preciso ter claro que, apesar da força e da diversidade de argumentos, só eles não garantem a adesão do auditório a teses e o acolhimento de justificativas que as decisões e as sentenças exigem no Direito: há, ainda, um outro conjunto de atividades que o argumentador precisa realizar, e que dizem respeito a preencher as condições necessárias para que a argumentação possa realizar-se enquanto interação, e, assim, possam ser produzidos os efeitos desejados. É preciso, abordar, neste momento, as estratégias de argumentação entendidas como estratégias de interação.
 
 
 
 
 
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