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A TEORIA CRÍTICA DO DIREITO NA PÓS-MODERNIDADE 
 
Comunicação apresentada ao XVIII CONGRESSO MUNDIAL 
DA ASSOCIAÇÃO DE FILOSOFIA DO DIREITO 
E DE FILOSOFIA SOCIAL 
La Plata – Buenos Aires, 10 a 15/08/97 
 
Luiz Fernando Coelho 
Professor da Universidade Federal do Paraná – Curitiba PR - Brasil 
 
SUMÁRIO: 1. O fim da Jusfilosofia na pós-modernidade. 2. Os pressupostos ideológicos 
do Direito pós-moderno.3. A crítica interior à dogmatica. 3. A crítica além da dogmática. 4. 
A Teoria Crítica do Direito. 
 
I. O FIM DA JUSFILOSOFIA NA PÓS-MODERNIDADE 
 
A Jusfilosofia tradicional, antes de "jurídica", foi uma "filosofia", voltada para os 
problemas mais gerais do "ser" e do "conhecer". O positivismo entretanto, ao reduzi-la a 
uma "ancilla scientiarum", atribuiu-lhe a função de reunir os resultados das ciências 
particulares numa visão universal da realidade; mas na época atual, contemplando-se os 
malefícios provocados pelo mau uso das ciências, procurou-se resgatar o sentido ético e 
crítico do saber que a antiga Filosofia apresentava, a qual deste modo continuou sendo o 
conhecimento autônomo e pantônomo de que nos fala Recaséns. Inobstante ter estado a 
serviço da dominação, enquanto pensamento autorizado pelas elites no poder, a Filosofia 
tradicional igualmente forneceu espaço para que o direito pudesse afirmar-se como arena de 
luta e conquista. A evolução da humanidade parece apontar para um sentido de libertação 
dos indivíduos e povos oprimidos, seja através da modificação das estruturas sociais, 
resultante da resistência aos despotismos, seja pela tomada de consciência acerca da 
condição de oprimido, sendo possível vislumbrar alguns momentos na história do 
pensamento filosófico em que ele se afirma como parte de um processo histórico de 
desalienação, embora isso não elida seu papel preponderantemente legitimador das 
estruturas de poder e dominação, até da opressão. 
 
O apogeu desse processo é a afirmação ideológica do Estado moderno, como o ente 
mítico que ocupou o lugar dos velhos fantasmas da Idade Média, e centrando-se nos ideais 
de liberdade e igualdade consagrados nos códigos e nas declarações universais de direitos. 
Nesse plano da afirmação do Estado como pressuposto do direito, desenvolve-se 
paralelamente uma ideologia que procura arrancar o homem, a sociedade e o próprio 
Estado, do contexto social-histórico para alçá-los a uma não historicidade: o Estado como 
símbolo da dominação social real sai de si mesmo para coisificar-se no imaginário 
metafísico que o legitima, para depois retomar sua própria idéia como algo em si mesmo, 
dispensando a legitimação externa a ele, pois se auto-institui como entidade por si mesma 
legítima, triunfante em sua tarefa de ocupação de todos os espaços normativos da sociedade 
alienada. 
Consideremos pois que assistimos no presente à consolidação da sociedade pós-
moderna, organizada em Estados nacionais que tendem a perpetuar-se como suprema forma 
de organização racional. 
 
Com o triunfo dessa forma estatal, o direito desse mesmo Estado, que se diz 
democrático e liberal vem a ser a suprema realização do conceito de direito identificado na 
lei; segundo esta concepção, não há outro direito que não o do Estado e as formas plurais de 
juridicidade, ou são manifestações primitivas a serem cooptadas pela lei, ou não passam de 
formas esdrúxulas do jus, geralmente descartadas como objeto da doutrina recepcionada 
pelo senso cumum teórico dos juristas. Em suma, trata-se da afirmação inquestionável da 
concepção jurídica das Faculdades de Direito do mundo europeizado, ou seja, a vitória da 
Dogmática Jurídica ocidental. 
 
Nesse contexto fica plenamente caracterizada certa exaustão do pensamento 
filosófico tradicional, situação que já foi definida como o fim da philosophia peremnis com 
sua problemática especulativa. E no que concerne à Jusfilosofia, não há mais espaço para as 
teorias sobre o conceito do direito, para as doutrinas da Justiça e do Direito Natural, nem 
para as teses sobre a cientificidade do saber jurídico. Na verdade, o que resta da 
filosofiajurídica tradicional é a visão positivista de uma teoria geral, ou então, certos 
desenvolvimentos do pensamento analítico que culminam com a monumental obra de 
Lógica Proposicional do Direito, não obstante distanciada da prática profissional. 
 
Daí o desafio do presente estudo: como será possível proceder ao resgate da 
Jusfilosofia, em sua tarefa de promover a dignidade da pessoa humana, nesta era de 
globalização e pós-modernidade? 
 
Tal questionamento impõe a necessidade de repensar o papel histórico que a 
Jusfilosofia tem desempenhado, o qual pode ser interpretado, primeiramente como inserido 
no processo de legitimação das estruturas sociais, mas também como a gradativa conquista 
por parcelas cada vez mais expressivas da sociedade de uma crescente conscientização da 
medida de sua alienação e, em função disso, da necessidade de cuidar de sua libertação. 
 
Essas duas tendências que presidiram a consolidação das instituições político-
jurídicas também revelam outra antinomia: o conservadorismo opondo-se à tendência 
progressista, pois a observação histórica nos oferece o exemplo dos movimentos 
revolucionários a se oporem aos grupos hegemônicos que pretendem a manutenção do statu 
quo. 
 
Essa dialética da dominação-libertação revela a dialética da história da Jusfilosofia, 
enquanto legitimação do instituído a opor-se à sua função de criadora das idéias que tendem 
a superar o estatuto social da opressão. 
 
A história das idéias sempre esteve a reboque dos interesses dos déspotas e 
vencedores. É claro que a visão histórica da humanidade jamais foi a dos vencidos; o 
duplipensar da visão histórica - usando a expressão de Orwell - sempre funcionou às mil 
maravilhas para banir da memória da humanidade o que ela teve de execrável, 
principalmente a crueldade para com o próximo, para com os pobres, os vencidos e os 
humildes; e assim, a história está repleta de nobres, santos, heróis e guerreiros, raramente 
um Espartacus, um Zumbi, jamais um operário da construção ou um simples trabalhador 
rural. 
 
Do mesmo modo, a história da Jusfilosofia apresenta-se como a história do bem 
comum, da democracia, da liberdade e da igualdade, jamais a história da sede de poder, a 
história do egoísmo, da ganância, da tirania, da intolerância, do obscurantismo e da 
destruição dos valores culturais autênticos das pessoas e das nações. Nesse contexto, a atual 
afirmação da vitória do Estado democrático e liberal se insere num contexto de auto-
legitimação. O fim da história é também o fim da filosofia, e o fim da filosofia é a aceitação 
definitiva da estrutura social real que se esconde sob a idéia do Estado, da democracia 
ocidental e do liberalismo econômico, pois doravante nada mais existe que deva ser 
legitimado pela Filosofia. 
 
E é justamente a revelação desse aspecto legitimador que indica à Jusfilosofia pós-
modernidade uma direção a seguir: se o que a história presenciou representa o fim da 
filosofia, somente a filosofia poderá fazê-la renascer. E o pensamento crítico atual nos 
indica que ela pode ser redirecionada para estar a serviço da causa da libertação . 
 
Parece pois evidente que o papel da Jusfilosofia nessa era da globalização e da pós-
modernidade transcende em muito as tarefas ainda consideradas adequadas à Jusfilosofia 
contemporânea, e que propõem o resgate da philosophia peremnis., ainda que alimentada 
pelos avanços nas ciências do homem e da sociedade. 
 
O que então denomino "Teoria Crítica do Direito" constitui uma tentativa inicial de 
formulação de teses abertas ao debate e enriquecimento, uma reunião inicial de novas 
categorias para pensar, repensar, construir e reconstruir a sociedade, valendo-se do espaço 
jurídico, que é nosso campo de ação como membros de uma sociedade.2. OS PRESSUPOSTOS IDEOLÓGICOS DO DIREITO PÓS-MODERNO. 
 
A concepção dogmática do direito pressupõe algumas crenças aceitas pelo senso 
comum teórico dos juristas como verdadeiras, ou ao menos como fundamento subjacente a 
suas elaborações teóricas. Eu as considero pressupostos ideológicos, porque foram ao longo 
da história inculcadas no inconsciente coletivo e incorporadas definitivamente à ideologia 
do direito. 
 
A primeira tarefa que então se impõe é a problematização do objeto desse saber 
acumulado para a identificação dos fatos que se escondem sob os significantes direito, 
Estado, e outros que identificam os valores que com eles se relacionam, no sentido da 
reconstrução do verdadeiro objeto de um saber que deve ser voltado para a solução dos 
grandes problemas humanos. 
 
Essa reconstrução epistêmica importa no questionamento da realidade social que 
tais significantes encobrem e pela assunção do alcance ideológico das práticas pseudo-
científicas das ciências sociais, o que nos leva a desvelar os fantasmas que constituem o 
núcleo da Dogmática Jurídica. 
 
O primeiro deles é o mito da objetividade das instituições, pois aquela realidade 
imaginária, construída pela ideologia, é encarada como um conjunto de objetos que estão aí 
e que podem ser descritos por um discurso semântico. Não se exclui o Estado como 
pressuposto do direito e de suas instituições, nem na ótica da objetivação de suas 
expressões deônticas, nem na da objetivação dialética de suas valorações imanentes. 
 
O segundo é a idéia de ordem, bem como a relação conceitual estabelecida entre a 
ordem social e a ordem jurídica. Em conseqüência da falsa implicação entre as estruturas 
sociais definidas como instituições e a estrutura formalizada das normas jurídicas, liga-se o 
Estado à denotação otimista da ordem e, em conseqüência, internaliza-se a noção de sua 
neutralidade. 
 
A ora proposta problematização do objeto implicando a problematização das 
categorias e da linguagem que o envolvem, tende a superar essas aporias, integrando-se na 
tarefa de sua transformação. A nova Jusfilosofia terá que optar por um enfoque 
interdisciplinar, onde a historicidade das instituições seja o denominador comum dos 
estudos do direito e do Estado. 
 
Além desses pressupostos da objetividade institucional e da ordem hipostasiada, a 
ideologia jurídico-política alberga outros, os quais constituem ponto de partida da Teoria 
Crítica do Direito, eis que, expressados como princípios, a eles se opõem outros 
fundamentos, não como dogmas de um saber acrítico, mas como diretrizes metodológicas 
para a reconstrução do saber jurídico, político e social. 
 
Na concepção dogmática, tanto podem revelar-se esses pressupostos nos comandos 
a que o senso comum denomina princípios gerais de direito, quanto nos standards 
metajurídicos, os quais não fazem propriamente parte do ordenamento, mas configuram 
fundamento do imaginário que vislumbramos na religião, na arte, na educação, na filosofia 
e na ciência. 
 
Entretanto, os pressupostos ideológicos que ora apresento são os que me parecem 
inerentes à concepção dogmática, eis que antecedem a toda e qualquer experiência 
considerada de caráter jurídico, bem como à teorização sobre essa experiência. A forma de 
princípios com que os apresento é coerente com o modo como atuam, pois que, embora de 
maneira dissimulada, constituem crenças a serem aceitas acriticamente.. 
 
Esses princípios podem ser divididos em dois grupos, conforme se refiram ao 
conceito do direito ou à prática da interpretação, integração e aplicaçãodas normas 
jurídicas. Ao elencá-los a seguir, apresento de modo sucinto as teses que a Teoria Crítica do 
Direito respectivamente lhes opõe. 
 
Relacionados com o conceito do direito: 
 
1. Princípio da objetividade ontológica do direito, ou da onticidade: afirma que o 
direito tem um ser, seja empírico, ideal, cultural ou metafísico, conforme as definições 
elaboradas pelas diversas doutrinas filosófico-jurídicas; e que esse ser é objetivo, isto é, 
apto a constituir um objeto do qual o sujeito cognoscente se aparta. 
 
 Ora, o direito não tem um ser-em-si que se possa considerar objetivamente; ele não 
se auto-constitui em virtude de potencialidade ontológica, mas é permanentemente 
constituído pela experiência social à medida que se problematizam os conflitos sociais e 
respectivas soluções normativas; a essa falsa objetividade ontológica a TCD opõe o 
princípio da objetividade ideológica do direito, enfatizando que o ser jurídico consiste 
numa criação ideológica comprometida com um status de dominação e manutenção de 
privilégios de toda ordem. 
 
2. Princípio da positividade axiológica do direito: acrescenta ao ser jurídico uma 
característica valorativa positiva, no sentido de polaridade, isto é, omitem-se os valores 
negativos da experiência jurídica, como a escravidão, o despotismo e o desprezo pelos 
direitos humanos, para enfatizar seu correspondente positivo; e assim o direito é "ars boni 
et aequi", identificado na justiça, no bem comum, na igualdade, na liberdade, enfim, 
naqueles valores que ao longo da história do Estado moderno têm sido afirmados como 
bastiões da fé liberal. 
 
 O mito da positividade axiológica tem a finalidade evidente de ocultar os aspectos 
perversos do direito, o uso das leis para semear o ódio, a discórdia e o desejo de vingança; a 
história do direito revela que em nome desses valores são cometidos os crimes mais 
hediondos contra a humanidade. A bondade essencial do direito não passa de artifício 
retórico para sua imposição ideológica ao consenso da macro-sociedade dominada e seu 
caráter ético está na dependência de seu uso como instrumento de controle social. 
 
Tal perversão do jus deve ser continuamente denunciada, e assim, a Teoria Crítica 
do Direito opõe o princípio da polaridade axiológica do direito, enfatizando que ele, sem 
deixar de ser direito, pode ser utilizado tanto para o bem quanto para o mal, e que essa 
escolha depende do grau de alienação da sociedade regida por tal direito. 
 
3. Princípio da cientificidade do conhecimento jurídico: afirma que o direito é 
científico, porque produzido pela elaboração racional do legislador; vale dizer, afirma-se o 
jus como resultado de um trabalho científico e portanto ideologicamente neutro. 
 
O caráter científico atribuído ao saber jurídico é o derradeiro fator de sua 
legitimação. A teoria do direito pode se alimentar das ciências particulares, especialmente a 
lógica e as ciências sociais, mas em verdade constitui uma tecnologia a serviço dos 
operadores do direito; e assim, a chamada ciência do direito consiste numa retórica 
destinada a persuadir alguém a respeito de uma verdade que é sempre subjetiva. Em suma, 
como afirmei em outro lugar1 , a lógica do direito é uma retórica da persuasão, e ao 
pressuposto da cientificidade, a TCD opõe o princípio do caráter retórico do conhecimento 
jurídico. 
 
Além disso deve-se levar em conta que o jurídico não é um objeto pré-existente ao 
conhecimento que, em sendo assim, não o descreve como objeto, mas o constitui 
permanentemente pelo próprio ato de o conhecer; ou seja, o jurista cria e modifica o direito 
à medida que, em o conhecendo, o interpreta; por isso afirma-se o caráter problemático do 
saber jurídico, eis que seu objeto somente se constitui como um problema a ser 
solucionado e não como um objeto a ser descrito. 
 
Levando em conta essas características, a TCD opõe ao pressuposto da 
cientificidade o princípio da problematicidade argumentativa e retoricidade do 
conhecimento jurídico. 
 
4. Princípio da neutralidade ideológica do direito: como implicação dos dois 
pressupostos anteriores, o da positividade valorativa e o da cientificidade, afirma que o 
Direito, tal como o Estado que o produz, nãose deixa contaminar por posturas ideológicas, 
eis que se dirige a todos no mesmo plano de isonomia; e destarte o direito é apresentado 
como garantia da liberdade e da igualdade. 
 
Os valores sociais do direito, como justiça, paz, segurança, ordem cooperação etc, e 
outros que às vezes surgem como implicação da ideologias racionais, como democracia, 
estado de Direito, progresso, desenvolvimento e modernidade, devem ser encarados em 
função do contexto social onde são aplicados e dos operadores jurídico-políticos que os 
manipulam. Ao princípio da neutralidade ideológica, a TCD opõe o princípio da 
essencialidade e operosidade ideológica dos valores jurídicos, enfatizando que esses 
valores, além de integrarem a essência da juridicidade, interferem na conduta dos cidadãos 
em virtude da manipulação a que estão sujeitos pelos operadores do direito e também pelos 
sujeitos dominantes nos grupos micro e macro-sociais. 
 
5. Princípio da unidimensionalidade do direito, ou da unicidade: afirma que o direito 
é somente um, que não existe outro direito a não ser o positivo. Com esse pressuposto 
ficam submetidas à ordem jurídica positiva quaisquer manifestações de juridicidade 
pluralista, bem como outras normas de controle social da conduta, como as éticas, 
religiosas e convencionalismos. Além disso, só se consideram como fontes do direito as de 
caráter estatal, sendo que as outras fontes, como o costume, a doutrina e os princípios gerais 
de direito, somente são admitidas como tais se reconhecidas ou cooptadas pelo direito 
positivo. 
 
O Direito não é uno: existe uma produção normativa paralela à do Estado e até 
contra ele, que se revela nos grupos sociais mais ou menos coesos, como certas minorias 
que tem suas próprias normas de convivência, substancialmente idênticas às regras oficiais 
e que só não são jurídicas porque a doutrina tradicional não as considera como tais. Ao 
pressuposto da unidimensionalidade, a TCD opõe o princípio da pluridimensionalidade do 
direito, ou do pluralismo jurídico. 
 
6. Princípio da estadualidade do direito: enuncia que esse direito único é o 
produzido pelo Estado. 
 
O Estado não passa de abstração, um mito; nós acreditamos no Estado tal como os 
gregos acreditavam nos deuses do Olimpo; ele surgiu historicamente após a consolidação 
de uma forma de experiência, um tipo de controle social a que se convencionou denominar 
direito e só se dos seus próprios componentes sistêmicos e à articulação destes num 
hiperciclo antepõe a ele para dar legitimidade a suas próprias normas. O Estado é criação 
histórica dos que detém a hegemonia na sociedade, e é por estes colocado a serviço de seus 
interesses. 
 
E ainda que se possa considerar direito unicamente as normas dimanadas das 
organizações legiferantes do Estado, deve-se enfatizar que elas são o resultado de um 
trabalho social, uma produção social específica, através dos mecanismos que a própria 
sociedade criou para tal desiderato, e que constituem a organização estatal, a burocracia, as 
instituições, mas que se ocultam sob o mito Estado. 
 
A esse pressuposto a TCD opõe o princípio da gênese histórico-social do direito. 
 
7. Princípio da racionalidade do direito: corolário do princípio da cientificidade, 
afirma que o direito é objetivamente racional, isto é, que, produto de uma elaboração 
científica, ele se concretiza em uma estrutura analítica objetiva, como norma, ordem e 
decisão jurídicas. Ou seja, embora se saiba que aracionalidade é uma característica 
subjetiva dos indivíduos e não das coisas materiais que eles criam, a ideologia apresenta o 
próprio direito como algo objetivamente racional, num processo de inversão que é uma das 
funções da ideologia. 
 
Ora, o direito não é racional: é emocional, intuitivo, prático. A racionalidade do 
Direito é um dos mitos mais frágeis, pois nem o Direito é racional e nem as decisões 
judiciais o são; a forma ou aparência de racionalidade é somente um meio de legitimar o 
direito e as decisões jurídicas. Por isso, a TCD opõe a mais esse mito o princípio da 
subjetividade ideológica do direito, enfatizando que ele não pode desligar-se de seus 
operadores, os quais lhe incutem elementos de irracionalidade, quando objetivam, através 
das regras e decisões jurídicas, suas crenças, emoções, valores e sentimentos de toda 
ordem. 
 
8. Princípio da auto-legitimidade do direito: afirma que passadas as fases de 
legitimação meta-jurídica, ou seja, carismática, tradicional, teológica, metafísica ou 
sociológico-política, o direito se auto-legitima em si mesmo como tal; concepção que se 
resolve numa tautologia: o direito é legítimo porque é o direito e é o direito porque é 
legítimo. 
 
Essa pretensa auto-legitimidade é implicação, no pensamento jurídico 
contemporâneo, dos pressupostos da unidimensionalidade, estadualidade e racionalidade, 
os quais a TCD considera um tripé ideológico a sustentar a legitimidade; ou seja, o direito é 
considerado legítimo, não em função de algum fator meta-jurídico como outrora, mas 
simplesmente porque é o único direito, estatal e racional. 
 
A legitimidade das normas não radica em sua suposta racionalidade e nem na 
cientificidade do saber que a partir dele se constrói, mas no consenso dos membros das 
comunidades que criam suas próprias regras de convivência e aderem, de maneira mais ou 
menos uniforme, à crença na necessidade de sua obediência. 
A esse pressuposto a TCD opõe então o princípio da legitimação ideológica do 
direito, asseverando que a legitimidade das normas resulta de um processo ideológico que 
fundamenta a aceitação das normas pela sociedade por elas regida. 
 
9. Princípio da sistemicidade analítica do direito: implicação do pressuposto da 
racionalidade objetiva, entende o ordenamento jurídico como um sistema lógico-analítico, 
isto é, uma estrutura de normas dispostas segundo as regras de consistência lógico-formal. 
 
A TCD considera que o sistema jurídico só pode ser objetivamente considerado 
como um contexto interdisciplinar, onde se articulam os vários sub-sistemas sociais, os 
quais são estudados como instituições políticas, econômicas, profissionais, sindicais, 
associativas, familiais, etc. Por isso, opõe-lhe o princípio da interdisciplinariedade objetiva 
do ordenamento jurídico, enfatizando-se que ele está integrado nos demais micro-sistemas 
sociais e é com eles permanentemente articulado. 
 
10. Princípio da plenitude do ordenamento jurídico: também implicação dos 
pressupostos da racionalidade e da sistemicidade analítica, entende que a ordem jurídica 
não tem lacunas, porque envolve em si mesma os instrumentos para as colmatar. 
 
Na verdade a ordem jurídica contém lacunas, inclusive intencionais, que o digam os 
criminosos de colarinho branco e os políticos e autoridades corruptos que saqueiam o País, 
sob a proteção das leis do Estado. Ou seja, o direito não forma um sistema fechado e 
coerente, ele está cheio de normas contraditórias, sob a forma de regras ilegais, 
inconstitucionais, mas eficazes, porque impostas pela autoridade. A esse pressuposto a 
TCD opõe o princípio da lacunariedade institucional do direito. 
 
11. Princípio da autopoiese do sistema jurídico: assumindo a tese de que o direito 
existe apenas e enquanto sistema comunicacional, entende que a ordem jurídica envolve 
uma dinâmica própria que lhe possibilita auto-sustentar-se e auto desenvolver-se, 
prescindindo dos demais sistemas de controle social; em outras palavras, como define 
Teubner, "o direito constitui um sistema autopoiético de segundo grau, autonomizando-se 
em face da sociedade, enquanto sistema autopoiético de primeiro grau, graças à 
constituição auto-referencial" 2. Nada mais equivocado que essa versão sofisticada, 
sistematizada por Luhmann, das teorias funcionalistas que comparam a sociedade a um 
"feed back", uma máquina cibernéticaque se retro-alimenta uma vez atingido um ponto de 
saturação. Freud já havia se referido a esse processo de compensação que possibilita 
satisfazer a determinados anseios sociais, e assim evitar que as tensões venham a explodir 
em prejuízo da manutenção da ordem e equilíbrio na sociedade. E transferir esse princípio, 
que tem algum sentido quando se trata da sociedade como um todo, ao sistema jurídico, 
parece mais uma tentativa, frustrada evidentemente, de isolar o jurídico de seu contexto 
macro-social. 
 
A esse pressuposto, a TCD opõe o princípio da alopoiese do direito, enfatizando 
que não há como sustentar-se a possibilidade de um sistema jurídico autosubsistente e que 
prescinda dos micro-sistemas formados pelas mais diversas relações sociais, mas que, pelo 
contrário, os sistemas jurídicos é que se alimentam dos demais. A dinâmica social radica 
justamente nesta interdisciplinariedade, cabendo à TCD denunciar o pretenso isolamento do 
jus, como mais uma tentativa de retirar o direito da história para alçá-lo a uma condição de 
algo acima da sociedade e neutro em relação aos seus conflitos reais. 
 
12. Princípio do primado da lei: pressupõe que, sendo a lei escrita a expressão 
racional do legislador, ela prevalece sobre as demais fontes do direito, as quais, ou se 
integram na lei ou se afirmam como tal enquanto por ela admitidas. A tal pressuposto a 
TCD opõe o princípio da isonomia nomogenética do direito, afirmando que todas as fontes 
de produção de normas jurídicas são igualmente válidas, desde que voltadas para a solução 
justa e eqüitativa dos problemas sociais concretos. 
 
13. Princípio do legalismo dogmático do direito: implicação do anterior, identifica o 
direito com a lei positiva escrita. Ocorre todavia que, como foi enfatizado no item anterior, 
todas as fontes do direito são válidas, inclusive contra a lei, e por isso, o princípio da 
isonomia das fontes do direito deve ser interpretado como subordinado às exigências da 
justiça material, enfatizando-se que o que importa não é a preservação do texto da lei, mas a 
realização da justiça nas situações concretas, com a lei ou apesar dela se necessário for. 
 
Tal orientação do pensamento crítico pode ser enunciado então simplesmente como 
o princípio do primado da justiça, estando nele implícito o da isonomia nomogenética. 
Aos voltados para a hermenêutica elencam-se: 
 
14. Princípio do legalismo hermenêutico: Reduz a Hermenêutica Jurídica a uma 
teoria da interpretação, integração e aplicação das leis, excluindo por conseguinte do labor 
hermenêutico do jurista as demais fontes do direito. A ele, a TCD opõe o princípio da 
liberdade metodológica da interpretação jurídica, resgatando a antiga tese de François Gény 
da libre récherche scientifique 3. 
 
Também a esse pressuposto ideológico opõe-se o princípio da topicidade 
hermenêutica do direito, enfatizando-se que o desenrolar histórico da experiência jurídica é 
de caráter tópico, a partir de situações concretas, e não sistemático, a partir de princípios. 
 
15. Princípio da autonomia significativa da lei: pressupõe que a lei tem um 
significado objetivo autônomo, o qual compete ao jurista descobrir, revelar e aplicar às 
situações concretas sub judice. 
 
Tal pressuposto revela-se no alcance da expressão desentranhar o sentido da lei, 
fazendo reminiscência à antigüidade, quando os sacerdotes, magos e adivinhos 
sacrificavam um cordeiro aos deuses e liam o futuro nas entranhas da vítima; esta é a 
origem da palavra "intérprete", de inter pres ("dentro do cordeiro"). 
 
O significado da lei não é autônomo: ele vem de fora e é atribuído pelo intérprete, 
conforme seus interesses, ou os interesses do cliente, que em geral é aquele que paga. O 
significado da lei é heterônomo. A esse pressuposto a TCD opõe o princípio da 
heteronomia significativa da lei, cujo enunciado se deve a Luiz Warat 4 . 
 
16. Princípio da univocidade significativa da lei: pressupõe que a lei é portadora de 
uma verdade cujo significado é unívoco, constituindo a verdade do objeto da atividade 
cognoscitiva do intérprete. 
 
O significado da lei não é unívoco mas equívoco e plurívoco, pois a lei comporta 
vários significados, todos eles verdadeiros ainda que contraditórios. A verdade da lei 
depende de sua eficácia, dos efeitos que produz no meio social a que se dirige e por isso a 
TCD opõe o princípio da plurivocidade significativa da lei. 
 
17. Princípio da referencialidade semântica da lei: pressupõe que essa verdade 
objetiva corresponde a um referencial semântico identificado num fato real, presumido ou 
fictício. 
 
Não existe o referencial semântico pretendido. O referencial da lei é pragmático, 
depende dos resultados sociais de sua aplicação e da aceitação desses efeitos pela 
comunidade jurídica. E assim, a TCD opõe-lhe o princípio da referencialidade pragmática 
da lei, enfatizando-se que a interpretação jurídica não deve ser semântica, mas pragmática. 
 
18. Princípio voluntarista: identifica o referencial semântico das expressões 
normativas do direito com a vontade fictícia de alguma entidade mítica hipostasiada pela 
ideologia, por exemplo, a mens legis, a mens legislatoris, a nação, o povo, o Estado, a 
providência divina, etc. 
 
Ora, a lei não tem vontade, nem o legislador que já morreu e nem o Estado, que é 
uma abstração. A esse pressuposto ideológico a TCD opõe o princípio da subjetividade 
hermenêutica do direito, enfatizando que não existe aquele referencial semântico 
voluntarista pretendido, mas que os significados atribuídos à lei são os que interessam 
subjetivamente ao intérprete e às pessoas a quem ele serve, como profissional ou operador 
do direito. 
 
19. Princípio da função descobridora da interpretação jurídica: afirma que o labor 
hermenêutico consiste em descobrir, descrever e revelar o significado autônomo da lei, isto 
é, desentranhar este significado para aplicá-lo às situações concretas. 
 
A função do intérprete não é descobrir um significado, mas criar o sentido que mais 
convém a seus interesses, que normalmente se identificam com os interesses daquele que 
paga seus honorários profissionais. À função descobridora, opõe-se o princípio da função 
criadora da interpretação jurídica. 
 
20. O princípio da subsunção jurídica: entende que as decisões jurídicas, 
especialmente as judiciais, formam um silogismo, o qual assegura a racionalidade dessas 
decisões e conseqüente neutralidade do juiz, seja na aplicação das leis, seja em sua atuação 
no processo judicial. 
 
A TCD considera que as decisões judiciais não são neutras, no sentido da 
racionalidade positivista. O magistrado é portador de valores, crenças e preconceitos de 
toda ordem, conscientes ou não, herdeiro da tradição e de um passado teórico que interfere 
no ato decisório. Por isso opõe-lhe o princípio da politicidade das decisões judiciais. 
 
O que se procura estabelecer com esse princípio é a diferença entre imparcialidade e 
neutralidade do juiz, submetendo-se à evidência de que, nas decisões judiciais, se o 
magistrado deve ser imparcial em relação aos interesses sub judice, ele não deve ser neutro 
em relação aos problemas que a aplicação das normas jurídicas sóem suscitar. 
 
O conjunto desses princípios dogmaticamente aceitos pelo senso comum forma o 
quadro ideológico dentro do qual vão erigir-se os mitos da teoria e da experiência jurídicas; 
com eles é possível à concepção dogmática assegurar a crença na neutralidade do Estado, 
do direito e de seus operadores, em virtude de suposta cientificidade e racionalidade 
vinculadas ao trabalho legislativo e às decisões da autoridade em face dos conflitos 
individuais e coletivos; e o Estado passa a hipostasiar-se como algo acima e além da 
história, cuidando dos fracos e oprimidos e administrando a distribuição da justiça com a 
segurançae a certeza exigidas pela razão jurídica. 
 
A consideração daqueles pressupostos a partir das categorias hauridas pelo 
pensamento crítico na interdisciplinariedade das ciências da sociedade representa uma 
tentativa inicial de reconstrução do saber jurídico, que, em se dando conta do caráter mítico 
e falacioso de seus princípios, possa contribuir para a desalienação do jurista e de seu saber, 
um passo a mais no rumo da libertação. 
 
O modo como esses pressupostos se manifestam constitui a metodologia da 
interpretação da lei, o cerne da denominada Hermenêutica Jurídica. Todo o saber referido 
ao Direito foi construído a partir da lei e este é, aliás, o sentido da expressão "dogmática", 
um conteúdo pretensamente científico, derivado de dogmas que se expressam pela norma 
jurídica. 
 
II. A CRÍTICA INTERIOR À DOGMÁTICA 
 
O pensamento crítico começa a manifestar-se no pensamento filosófico-jurídico 
como reação ao exagero das correntes dogmáticas de então, legalistas,conceptualistas e 
analíticas. 
 
Na França, a Escola da Livre Investigação Científica enfatizou o aspecto criador do 
saber jurídico num contexto dominado pela mentalidade racionalista e legalista dos 
exegetas do Código Napoleão; no mundo germânico, a teleologia de Ihering introduziu a 
noção de finalidade na teoria da interpretação da lei, o que levou a ciência jurídica a superar 
o velho ranço do positivismo conceitualista germânico: doravante, interpretar a lei não seria 
mais fixar o seu significado gramatical e lógico-formal, mas realizar na prática os fins 
sociais a que ela se destina, tal como albergou a lei de Introdução ao Código Civil 
Brasileiro, promulgada em 1942. E no mesmo contexto do direito alemão, a sociologia de 
Erlich e Kantorowicz reivindica a tese do pluralismo jurídico, onde se concebe que cada 
grupo social teria suas próprias normas de convivência, as quais se imporiam ao sistema 
jurídico estatal em caso de conflito: um Direito contra legem. No mundo de língua inglesa, 
a escola sociológica e o legal realism, reagindo contra o dogmatismo da Analytical School, 
pregaram que os precedentes judiciais não poderiam emperrar o desenvolvimento social, ou 
seja, que o Direito existe para resolver problemas sociais e não para manter princípios. E 
finalmente, no mundo luso-hispânico as correntes culturalistas desenvolvem uma 
Jurisprudência de Valores calcada no culturalismo fenomenológico, no sentido de, muito 
mais do que preservar a racionalidade e intangibilidade da lei em nome de uma discutível 
segurança das relações jurídicas, o que importa efetivamente é realizar a justiça e seus 
corolários como a ordem, paz, cooperação e solidariedade; assim como os valores da 
democracia, da liberdade, da igualdade e do Estado de Direito. 
 
Essas expressões todavia ocorreram nos quadros da ciência jurídica tradicional, 
segundo um modelo epistêmico de cunho positivista: tratava-se de corrigir e aperfeiçoar o 
direito, as leis e a organização estatal, não se cogitando acerca da sociedade da condição 
humana. 
 
É por isso que classifico essas reações uma crítica intra-dogmática, eis que os 
resultados que produziram, se bem constituíssem um avanço, na verdade acabaram 
cooptados pela Dogmática Jurídica; em outras palavras, a crítica dentro da Doigmática 
resultou numa legitimação da própria Dogmática. 
 
Mas a Teoria Crítica do Direito não se confunde com essas posturas, embora as 
absorva em seu paradigma. O que ela propõe é uma visão dialética do direito que se articula 
com a sociedade, o que vai além da Dogmática Jurídica. 
 
III. A CRÍTICA ALÉM DA DOGMÁTICA 
 
No contexto da "guerra fria" e do confronto entre as ideologias racionais do pós-
guerra é que se estruturou um novo modelo de crítica, o qual considera o fenômeno jurídico 
algo inseparável do contexto social. O saber jurídico passa a valer-se da história, da 
sociologia e da antropologia, volta-se para o meio onde o Direito ocorre e alarga ao infinito 
a compreensão do que se entende por "Direito", rompendo de vez com o velho positivismo 
que o reduzia às leis do Estado. 
 
Trata-se de uma oxigenação da teoria do Direito a partir de algumas vertentes, entre 
as quais se destacam: a) a epistemologia de Popper e Bachelard, contribuindo para a 
elaboração de nova episteme, onde a verdade científica decorre da aceitação social de seus 
enunciados; b) a lingüística de Saussure, complementada pelo notável desenvolvimento da 
teoria da comunicação e da informática, conduzindo à introdução da pragmática como nova 
dimensão do discurso; c) a sociologia de Max Weber, enfatizando a importância dos 
processos sociais de obtenção do consenso dos dominados para a reprodução da ordem; d) a 
teoria crítica da sociedade da Escola de Frankfurt enfatizando o papel ideológico da ciência 
e a própria ideologia como legitimação do poder na sociedade capitalista; e e) a filosofia 
marxista, onde o pensamento crítico vai haurir as categorias da ideologia, alienação e 
libertação; e a práxis como processo de conscientização da sociedade com vistas à sua auto-
instituição como sociedade livre. 
 
A visão crítica exsurgida dessa interdisciplinariedade possibilita fundamentar 
diferentes propostas teóricas que se consideram "alternativas" em relação ao saber 
instituído. Além disso, o modelo da Teoria Crítica do Direito tem propiciado o 
desenvolvimento de uma crítica interior aos ramos do direito positivo, isto é, teorizações 
setoriais que procuram desvelar os pressupostos ideológicos que fundamentam as 
disciplinas tradicionais da Dogmática Jurídica, com o objetivo de as reconstruir de forma a 
estarem mais próximas da realidade social. Entre essas manifestações mais ou menos 
difusas cumpre destacar alguns movimentos que convergiram de alguma forma para a 
Teoria Crítica do Direito; refiro-me especialmente aos denominados direito insurgente, 
positivismo de combate, direito achado nas ruas e outros, entre os quais o chamado uso 
alternativo do Direito, com sua versão brasileira auto intitulada Direito alternativo. 
 
No pensamento jurídico, o "alternativo" evidencia uma proposta teórica que se opõe 
às teorias do senso comum, isto é, àquele pensamento jurídico calcado nos pressupostos 
ideológicos a que me referi. Ou seja, quando o pensamento jurídico parte desses 
pressupostos, implícita ou explicitamente, temos uma teoria do senso comum, podendo 
considerar-se como alternativos os pressupostos teóricos que se afastam daqueles. 
 
O termo "alternativo" é de todo inadequado, seja como "uso alternativo", dos 
juristas europeus, seja como "direito alternativo", conceito que, pela repercussão das 
atitudes corajosas de alguns magistrados, tem estado presente em praticamente todas as 
discussões que envolvem a crítica do Direito no Brasil. 
 
É que o simples fato de considerar-se alternativo traduz o desejo de deixar de sê-lo, 
pois um saber ou comportamento alternativo almeja a impor-se como o oficial, o normal. 
Vitoriosas as teses alternativas, o que antes era "normal", passa a alternativo na medida em 
que se refugia na clandestinidade. 
 
"Alternativo" é uma categoria da lógica proposicional, isto é, um funtor que 
expressa tanto a disjunção inclusiva quanto a exclusiva; e somente nesta última é que 
ocorre a incompatibilidade entre os termos disjuntivamente correlacionados, sendo 
interessante notar que a disjunção exclusiva identifica-se com a negação da equivalência 
NEpq. 
 
O alternativismo tende para o segundo termo da disjunção "ou". Só que, quando o 
"ou" é inclusivo temos um alternativismo que acaba por integrar-se ao senso comum, o que 
ocorreu com as doutrinas hermenêuticas a que denominei "crítica intra-dogmática". 
 
Em verdade, a história da conquista de novos espaços de normatividade jurídica, 
traduziu um alternativismo inclusivo: o "ou" das novas propostas não excluiu o instituídoanterior, mas contentou-se em corrigir e melhorar, revelando no fundo uma atitude 
conservadora. Ou seja, o novo instituinte articulou-se com o velho instituído e foi por ele 
cooptado. O exemplo mais expressivo desse alternativismo "de direita" é o Direito do 
Trabalho, que se afirma a partir de pressupostos que se opõem aos princípios basilares do 
Direito Civil, do qual deriva, mas contenta-se em institucionalizar mecanismos jurídicos 
bastante discutíveis de compensação das desigualdades reais, sem enfrentar suas causas. 
 
Mas quando o alternativo envolve uma proposta política incompatível com a ordem 
anterior, temos um alternativismo exclusivo, ou propriamente disjuntivo, que pode ser 
definido como "de esquerda"; é o que ocorre com as propostas marxistas ortodoxas que 
pretendem implantar uma organização social anárquica mediante a ditadura do proletariado, 
a abolição da propriedade privada e do Estado burguês. 
 
Mas o "alternativo" também pode conotar um "alternativismo de direita", na medida 
em que se vale da técnica jurídica, não para a defesa de nobres ideais de justiça e 
democracia, mas para consolidar situações socialmente injustas. É o caso da existência de 
lacunas axiológicas intencionais no ordenamento, de que são exemplos os "crimes de 
colarinho branco". Neste sentido, o direito alternativo sempre existiu, só que em favor dos 
ricos. 
 
Entre esses dois extremos, o que chamo de alternativismo disjuntivo, no sentido de 
"exclusivo",é o que não admite um projeto político que tolere a exploração das massas e 
conviva com a alienação da sociedade. Penso portanto que o objetivo de um direito 
alternativo não pode se exaurir na crítica ao sistema social capitalista, mas deve empenhar-
se numa proposta séria de construir nova cultura jurídica, com vistas a uma nova sociedade; 
e aqui, o direito alternativo retorna ao seu tronco original, que é a Teoria Crítica do Direito. 
 Mas essa crítica, para completar-se em sua dialética, deve articular-se com a práxis, 
categoria central do pensamento crítico, que não se finda no "conhece-te a ti mesmo" do 
oráculo de Delfos, nem no "conhece a tua circunstância", de Ortega y Gasset, mas importa 
no fazer marxiano da Undécima Tese, aliado a um pleno conhecimento do próprio ser 
como ontocriação pessoal e social. 
 
V. O CAMINHO DA TEORIA CRÍTICA DO DIREITO. 
 
Trata-se em primeiro lugar de mudar a atitude do sujeito em face do próprio 
conhecimento: à velha postura descritiva e retrospectiva, que constata um final feliz para a 
filosofia do Ocidente, opõe-se o conhecimento criativo e prospectivo, inserido na práxis da 
transformação soocial. 
 
Seu alcance e possibilidades decorrem de um trabalho de conscientização dos atores 
envolvidos na experiência jurídica, de que, contrariamente ao postulado da neutralidade 
ideológica do saber, se reconheça a impossibilidade epistêmica da separação do sujeito 
cognoscente de seu objeto, do homem da sociedade, do filósofo da Filosofia, do jurista do 
direito. 
 
A sociedade não pode ser concebida como constituída de fatos in abstrato, mas 
mesclados de valores e todo o elenco dos ideais que compõem a ideologia, mas que foram 
construídos pela Filosofia em seu papel de criadora dos espaços de luta e conquista. Segue-
se que a ideologia é necessário componente do social, levando a que o jusfilósofo deva 
identificá-la para assumir seu ponto de vista ideológico, que passa a ser seu ponto de vista 
político. 
 
A constatação de que nas ciências sociais o conhecimento implica a participação 
real do sujeito em seu objeto é o início da Teoria Crítica do Direito, que desemboca numa 
práxis em que o sujeito é também responsável pelo que o objeto é; por isso o saber jurídico, 
na medida em que se desembaraça da alienação, é uma dialética de participação, cuja 
metodologia pode ser resumida no trinômio: ver, julgar e agir, importando em consciência 
social, atuação consciente a partir de um projeto político. 
 
No plano de um saber que procura desvencilhar-se de seus obstáculos alienantes, o 
direito então se articula com a comunicação intersubjetiva das consciências. A idéia básica 
portanto da inserção do direito na práxis é a consciência histórica do jurista, a qual, ao 
articular-se com a realidade concreta – que não é a dos eternos vencedores, mas a dos 
vencidos, que passam a excluídos – implica uma dialética que concebe a história como o 
meio objetivo onde o jurista tem uma tarefa concreta a executar, a qual é dada pelas 
necessidades humanas; nesta época de globalização,não nos esqueçamos de que o jurista 
ibero-americano é parte de um mundo subdesenvolvido onde a miséria e o desprezo pela 
dignidade humana convivem com o desperdício da riqueza produzida pelo trabalho social. 
 
Mas essa consciência, que se revela através da Filosofia do Direito, necessista de 
um caminho para identificar-se com um significado transcendente, o qual será o elemento 
básico da comunicação jurídica: a libertação. O que se impõe é a transformação do direito, 
que passa de instrumento de dominação para espaço da libertação dos indivíduos e povos 
que ainda permanecem naquele estado de alienação e opressão, a despeito do fim da 
história, do fim da filosofia e dos mitos da pós-modernidade. 
 
Daí a necessidade de se repensar totalmente a educação jurídica, procurando 
incentivar nossos jovens juristas a formarem nova mentalidade, não se submeterem a uma 
visão estritamente profissional de um segmento alheio ao todo e alienado dos problemas 
sociais. Urge que brote uma mentalidade voltada para o futuro, no meio daqueles que, além 
de juristas, são cientistas sociais e cidadãos. É compromisso de todos nós participarmos da 
construção de uma sociedade livre, de homens verdadeiramente livres, porque não 
alienados. 
 
A filosofia do direito não acabou, ela apenas começa para a pós-modernidade, e sua 
missão na sociedade globalizada, eminentemente construtiva, tem como categoria crítica 
fundamental o objetivo da libertação dos excluídos. 
 
A Teoria Crítica do Direito sai portanto dos limites da teoria geral para alimentar a 
Jusfilosofia, que, projetada no espaço interdisciplinar das outras ciências da sociedade, 
deságua no delta de uma sociedade comunitária, que pode ser definida como um socialismo 
de consciência comunitária. 
 
A TEORIA CRÍTICA DO DIREITO NA PÓS-MODERNIDADE 
 
R E S U M O 
 
Na era da globalização e da pós-modernidade assiste-se ao fim da filosofia, não tendo mais 
sentido a especulação sobre temas tradicionais da Jusfilosofia, como os conceitos de direito 
e justiça. Com a aceitação definitiva do Estado democrático e do liberalismo na 
organização política e econômica consolidada na sociedade pós-moderna, assiste-se 
igualmente ao triunfo da concepção dogmática do direito. Nesse contexto, como será 
possível proceder ao resgate da Jusfilosofia, em sua tarefa de promover a dignidade da 
pessoa humana? Parece evidente que o papel da Jusfilosofia na pós-modernidade 
transcende as tarefas ainda consideradas adequadas e que propõem o resgate da antiga 
philosophia peremnis. Analisando os pressupostos ideológicos do direito-pós-moderno, a 
Teoria Crítica do Direito constitui uma tentativa inicial de formulação de teses para pensar, 
repensar, construir e reconstruir a sociedade, enfatizando-se as teses opostas que defluem 
do desvelamento da ideologia do Direito e do Estado; o modelo epistêmico da TCD 
comporta uma visão prospectiva e construtiva do real, oposta ao paradigma descritivo e 
retrospectivo do positivismo. Trata-se igualmente do início de um trabalho de 
conscientização do papel histórico da Jusfilosofia, o qual revela uma dialética a opor a 
legitimação das instituições à utilização do direito e das idéias filosófico-jurídicas como 
instrumento de luta e conquista. Mas esse papel histórico evoca uma crítica intra-dogmática, que abre caminho para teorias jurídicas alternativas, as quais convergem para 
uma crítica meta-dogmática, segundo o modelo proposto pela TCD, envolvendo uma 
dialética da participação e o projeto político de um socialismo conunitário.

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