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Universidade de São Paulo Instituto Astronômico e Geofísico Departamento de Ciências Atmosféricas Notas de aula da Disciplina ACA-0429 Agrometeorologia Por: Edmilson Dias de Freitas Departamento de Ciências Atmosféricas do IAG-USP São Paulo Fevereiro de 2005 Prefácio Estas notas de aula têm como objetivo introduzir alguns conceitos importantes aos alunos do curso de graduação em meteorologia sobre uma das áreas de maior importância econômica e social do mundo, a Agrometeorologia. Totalmente ligada à Agricultura, a Agrometeorologia busca fornecer informações úteis aos profissionais ligados a área e aos agricultores em geral que possam maximizar a produtividade agrícola e reduzir as perdas que podem ocorrer por ação do tempo ou do clima ou mesmo pelo desconhecimento dos mesmos. O material aqui reunido foi selecionado de várias fontes, tais como livros especializados na área, matérias publicadas em jornais ou na internet e resultados de alguns artigos científicos, para facilitar o desenvolvimento da disciplina através de um material único. Entretanto, em grande parte do mesmo, apenas algumas citações aos assuntos importantes para a área são feitas. Informações mais detalhadas de alguns assuntos necessitam da complementação dos livros aos quais foram utilizados como base para a confecção deste material. Como principais fontes devemos citar: KLAR, A. E. A água no sistema solo-planta-atmosfera. 2.ed. – São Paulo: Nobel, 1984. MOTA, F. S., 1986: Meteorologia Agrícola. 7ed. Novel. 376pp. PEREIRA, A. R., ANGELOCCI, L. R., SENTELHAS, P. C., 2002: Agrometeorologia: fundamentos e aplicações práticas. Livraria e Editora Agropecuária, Guaíba – RS, 478p. REICHARDT, K. 1975: Processos de transferência no Sistema Solo-Planta-Atmosfera. Fundação Cargil, 285 pp. ROSENBERG, N., 1982 – Microclimate, the Biological Environment. 2nd ed. 465 pp. TUCCI, C. E. M. Hidrologia: Ciência e aplicação. 2.ed. Organizado por Carlos E. M. Tucci – Porto Alegre: Editora da Universidade: ABRH, 1997. A agrometeorologia, assim como a meteorologia, é uma área em constante desenvolvimento. Sendo assim, atualizações serão sempre realizadas e sugestões ou críticas serão sempre muito bem vindas. Comentários ou qualquer outro tipo de comunicação podem ser enviadas através do email: efreitas@model.iag.usp.br. Vale ressaltar que estas notas de aula ainda não cobrem toda a ementa da disciplina, mas em breve buscaremos a inclusão dos assuntos que ainda restam. Para esses assuntos, consultar as referências anteriormente citadas ou constantes da relação de bibliografias existente no final do texto. Índice Índice ................................................................................................................................. i 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura........ 1 1.1. Introdução.......................................................................................................... 1 1.2. Objetivo da Agrometeorologia .......................................................................... 3 1.3. Unidades de medida utilizadas em agricultura .................................................. 3 1.4. Tipos de cultura ................................................................................................. 4 1.5. Safras agrícolas.................................................................................................. 5 1.6. Fenologia de Culturas........................................................................................ 6 1.7. Estrutura de uma planta ..................................................................................... 7 1.8. Exercícios .......................................................................................................... 8 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada ................................................................... 9 2.1. Relações hídricas e fotossíntese ........................................................................ 9 2.2. O potencial hídrico na planta........................................................................... 10 2.3. Transpiração .................................................................................................... 11 2.4. Fotossíntese ..................................................................................................... 12 2.4.1. A descoberta da Fotossíntese.................................................................. 13 2.4.2. Ciclos de Fixação do Carbono................................................................ 16 2.4.3. Fatores Limitantes da Fotossíntese......................................................... 19 2.4.3.1. Efeitos da taxa de iluminação (Irradiância)........................................ 20 2.4.3.2. Efeitos da água ................................................................................... 21 2.4.3.3. Efeitos da Temperatura....................................................................... 23 2.4.3.4. Efeitos da Concentração de CO2........................................................ 24 2.5. Produtividade Primária Bruta e Produtividade Primária Líquida.................... 24 2.5.1. Conceitos ................................................................................................ 24 2.5.2. Fatores Limitantes para a Produtividade Primária ................................. 27 2.5.3. Eficiência no uso de radiação solar ........................................................ 28 2.6. O ciclo do carbono........................................................................................... 28 2.6.1. Processos do carbono terrestre ............................................................... 33 2.6.2. Efeitos do Clima sobre o ciclo do carbono............................................. 36 2.7. Exercícios. ....................................................................................................... 37 3. Balanço de Radiação.............................................................................................. 39 3.1. Aquecimento e energia .................................................................................... 39 3.2. O sistema solar ................................................................................................ 39 3.3. Fluxo de energia, Densidade de fluxo (irradiância) e Constante Solar ........... 40 3.4. Leis de Radiação.............................................................................................. 42 3.4.1. Natureza da Radiação Solar e Terrestre ................................................. 42 3.4.2. Radiação de cavidade ou de Corpo Negro.............................................. 43 3.4.3. Função de Planck.................................................................................... 43 3.4.4. A lei do deslocamento de Wien.............................................................. 46 3.4.5. A lei de Kirchhoff................................................................................... 46 3.4.6. Emissividade........................................................................................... 47 3.5. Temperatura de emissão de um planeta........................................................... 47 3.6. Efeito estufa..................................................................................................... 49 3.7. O balanço global do fluxo de radiação. ........................................................... 50 3.8. O balanço regional de radiação. ......................................................................52 3.8.1. O balanço de ondas curtas (BOC). ......................................................... 53 3.8.2. O balanço de ondas longas (BOL).......................................................... 53 3.8.3. O Saldo de Radiação (RN). ..................................................................... 53 3.8.4. Estimativas de BOC, BOL e RN. ............................................................ 53 3.8.5. Balanço de Energia em ambientes protegidos........................................ 57 3.8.6. Balanço de Energia em ambientes vegetados......................................... 59 3.9. Exercícios. ....................................................................................................... 61 4. Evapotranspiração.................................................................................................. 62 4.1. Introdução........................................................................................................ 62 4.2. Evaporação ...................................................................................................... 62 4.3. Transpiração .................................................................................................... 62 4.4. Evapotranspiração (ET)................................................................................... 63 4.4.1. Evaporação Potencial (ETP) ou de Referência (ET0)............................ 63 4.4.2. Evaporação Real (ETR).......................................................................... 63 4.4.3. Evaporação de Oásis (ETO) ................................................................... 64 4.4.4. Evapotranspiração de Cultura (ETc). ..................................................... 64 4.4.5. Evapotranspiração Real de Cultura (ETr). ............................................. 65 4.5. Fatores determinantes da Evapotranspiração. ................................................. 65 4.6. Medida de Evaporação e Evapotranspiração................................................... 65 4.6.1. Medida de Evaporação. .......................................................................... 65 4.6.2. Medida de Evapotranspiração. ............................................................... 67 4.7. Métodos de estimativa de ETP. ....................................................................... 70 4.7.1. Método de Thornthwaite. ....................................................................... 70 4.7.2. Simplificação de Camargo. .................................................................... 71 4.7.3. Método de Camargo. .............................................................................. 71 4.7.4. Método do Tanque Classe A. ................................................................. 71 4.7.5. Método de Hargreaves & Samani (próprio para regiões semi-áridas). .. 71 4.7.6. Método de Priestley-Taylor. ................................................................... 71 4.7.7. Método de Penman-Monteith. ................................................................ 72 4.8. Exercícios. ....................................................................................................... 72 5. A água no Sistema solo-planta-atmosfera.............................................................. 73 5.1. Propriedades da água....................................................................................... 73 5.1.1. Estrutura molecular da água e mudanças de fase ................................... 73 5.1.2. Coesão, Adesão e Tensão Superficial .................................................... 74 5.1.3. Densidade ............................................................................................... 76 5.2. Potencial da água. ............................................................................................ 77 5.3. Composição e estrutura do solo....................................................................... 79 5.3.1. Estrutura do solo..................................................................................... 80 5.3.2. Definições............................................................................................... 81 5.3.2.1. Massa específica do solo .................................................................... 81 5.3.2.2. Umidade do solo................................................................................. 81 5.3.2.3. Porosidade .......................................................................................... 82 5.3.2.4. Grau de saturação ............................................................................... 82 5.4. Interceptação.................................................................................................... 82 5.4.1. Interceptação vegetal .............................................................................. 83 5.4.2. Medições das variáveis:.......................................................................... 84 5.4.2.1. Precipitação ........................................................................................ 84 5.4.2.2. Precipitação que atravessa a vegetação - (throughfall) ...................... 84 5.4.2.3. Escoamento pelos troncos .................................................................. 85 5.4.3. Quantificação da Interceptação. ............................................................. 85 5.4.3.1. Fórmulas conceituais. ......................................................................... 85 5.4.3.2. Equações empíricas ............................................................................ 86 5.4.3.3. Interceptação em modelos conceituais. .............................................. 87 5.4.4. Interceptação no uso da terra .................................................................. 88 5.4.5. Armazenamento nas depressões. ............................................................ 88 5.5. Infiltração ........................................................................................................ 90 5.5.1. Capacidade de infiltração e taxa de infiltração....................................... 91 5.5.2. Equacionamento geral da infiltração. ..................................................... 92 5.5.3. Variação do Teor de Umidade do Solo Durante a Infiltração ................ 99 5.5.4. Fatores que afetam a Infiltração ........................................................... 100 5.5.5. Medição da Taxa de Infiltração ............................................................ 101 5.5.6. Solos não saturados .............................................................................. 102 5.6. Armazenamento de água no solo................................................................... 103 5.7. Curva de retenção da água no solo. (Curva Característica)........................... 105 5.7.1. Capacidade de campo. .......................................................................... 106 5.7.2. Ponto de murcha Permanente. .............................................................. 106 5.7.3. Capacidade de Água Disponível (CAD). ............................................. 107 5.8. Movimento da Água nas plantas. .................................................................. 108 5.9. Permeabilidade das células e tecidos das plantas à água............................... 108 5.10. Fatores que afetam a permeabilidade das células........................................ 110 5.11. O sistema condutor de água......................................................................... 110 5.12. Mecanismos do movimento da água nas plantas......................................... 111 5.13. Modelagem da dinâmica da água nas plantas.............................................. 112 5.14. Exercícios.................................................................................................... 114 6. Balanço Hídrico ................................................................................................... 115 6.1. Introdução...................................................................................................... 115 6.1.1. O ciclo hidrológico. .............................................................................. 115 6.1.2. Descrição geral do ciclo hidrológico. ................................................... 116 6.2. Bacia hidrográfica. ........................................................................................ 118 6.3. Balanço hidrológico à superfície ................................................................... 119 6.4. Balanço Hídrico em micro bacias.................................................................. 120 6.5. Balanço Hídrico Climatológico. .................................................................... 122 6.5.1. Roteiro para elaboração do Balanço Hídrico........................................ 123 6.5.2. Período de início do BH climatológico ................................................ 125 6.5.3. Representação gráfica........................................................................... 126 6.5.4. Aplicações do Balanço hídrico climatológico ...................................... 128 6.6. Balanço hídrico seqüencial............................................................................ 128 6.7. Balanço hídrico de cultivos ........................................................................... 129 6.7.1. Elaboração do BH de cultivo................................................................ 129 6.8. Efeito da deficiência hídrica sobre a produtividade ...................................... 130 6.9. Balanço hídrico para manejo de irrigação ..................................................... 130 6.10. Exercícios .................................................................................................... 130 7. Geadas.................................................................................................................. 131 7.1. Introdução...................................................................................................... 131 7.2. Tipos de Geada .............................................................................................. 131 7.3. Fatores favoráveis à formação de geadas ...................................................... 133 7.4. Fatores naturais agravantes à ocorrência de geadas ...................................... 137 7.5. Medidas para minimizar o efeito das geadas................................................. 138 7.5.1. Medidas diretas de proteção. ................................................................ 140 7.5.1.1. Nebulização artificial da atmosfera .................................................. 140 7.5.1.2. Ventilação forçada............................................................................ 142 7.5.1.3. Irrigação............................................................................................ 142 Referências Bibliográficas............................................................................................ 144 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura 1.1. Introdução A agricultura é uma atividade altamente dependente das condições do clima e do tempo em uma dada região. Com o crescimento acelerado da população mundial, existe uma grande necessidade de aumento na produção de alimentos. Para isso, é necessário que as perdas agrícolas e pastoris sejam minimizadas e a eficiência da produção agrícola melhorada. Entretanto, o aumento da produção de alimentos vem sendo feito através da exploração inadequada dos recursos naturais, prejudicando o ambiente, o solo, a água e o ar. Um exemplo deste tipo de atividade, altamente discutido atualmente, é o desmatamento da região amazônica. As plantas dependem, para o seu crescimento e desenvolvimento, da sua constituição genética e das condições ambientais do solo e do clima. Em geral, os agricultores conhecem mais sobre o manejo do solo do que como explorar completamente os recursos climáticos. Embora o homem não seja capaz de mudar o tempo e o clima, ele é capaz de ajustar as práticas agrícolas ao clima. A Climatologia pode contribuir para solucionar o problema da escolha dos lugares para uma dada cultura ou de uma dada cultura para um lugar. Assim, a Meteorologia e a Agricultura estão intimamente ligadas. O clima assume significância em quase todas as fases das atividades agrícolas, desde a seleção de regiões ou lugares para a instalação de culturas e experimentos agrícolas, até o planejamento a longo ou curto prazo das atividades agrícolas. Podemos definir a Agrometeorologia como a ciência que estuda as relações entre o ambiente e os sistemas agrícolas. Alguns exemplos de relação entre o ambiente e sistemas agrícolas: - milho, cana-de-açúcar (típicos de regiões de clima quente) - maça, trigo (típicos de regiões de clima frio) Exemplo: Plantio de algodão no centro-oeste do Brasil. “Nos últimos anos, o cenário do algodão nacional sofreu grandes mudanças: Variedades de algodão, época do plantio, espaçamento, técnica de controle de pragas e doenças e método de descaroçamento. O Mato Grosso que em 86 respondia por apenas Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 1 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. 8% da safra, hoje produz quase metade do algodão brasileiro. Especialmente no sudeste do Estado, entre os municípios de Campo Verde, Primavera do Leste e Rondonópolis. São mais de 400 mil hectares no já chamado triângulo do algodão. Enquanto no Paraná e São Paulo, as propriedades eram, na maioria, pequenas, no Mato Grosso o algodão é cultivado em grandes áreas com mecanização intensiva. A produtividade que no Sul e Sudeste era de 1.500 kg/ha em 86, subiu para 3.700 kg/ha em 2002 em Mato Grosso. A produtividade das lavouras de algodão em Mato Grosso deve ficar 10% menor nesta safra (2004) em comparação a safra passada devido ao excesso de chuvas. Mesmo assim, o estado deve colher mais de um milhão e 400 mil toneladas de algodão em caroço. O principal obstáculo era a falta de tecnologia adequada para produzir algodão no cerrado. O modelo do sul não servia no local. A primeira lavoura foi plantada em novembro e colhida em abril. Resultado, faltou água no desenvolvimento das plantas e choveu na colheita. Com isso a produtividade caiu. Atualmente, como se planta mais tarde, em dezembro, a colheita vai de junho a agosto, período de muito sol e céu azul.” (Matéria extraída da Revista Globo Rural online 2004) Exemplo: Milho no agreste de Pernambuco. (Agosto de 2004) “O excesso de chuva está prejudicando as lavouras no agreste de Pernambuco. Muitos agricultores já perderam parte do milho e do feijão. Em Caruaru, o excesso de chuvas prejudicou o desenvolvimento das culturas. A perda estimada chegará a 30% na lavoura de milho e 70% na lavoura de feijão. Nos seis primeiros meses deste ano, choveu 20% a mais do que costuma chover durante o ano inteiro em Caruaru. Dias de sol têm sido raros. Em junho, foram 24 dias de chuva. Apesar do excesso de chuva, de acordo com a Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária, a safra de milho e de feijão, em Caruaru, foi 50% maior do que em anos de seca. Segundo Fábio César, agrônomo, se no mês de agosto continuar chovendo e fazendo sol, normalmente, podemosesperar alguma produção. Embora possa acontecer de não vingar 100% da produção, mas é possível tirar em torno de 75% da safra do milho e 60% do feijão.” (Matéria extraída da Revista Globo Rural online) Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 2 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. 1.2. Objetivo da Agrometeorologia Segundo Smith (1975), colocar a ciência da meteorologia a serviço da agricultura para melhorar o uso da terra, para ajudar a produzir o máximo de alimentos e evitar o abuso irreversível dos recursos naturais (água e solo). 1.3. Unidades de medida utilizadas em agricultura 1 légua marítima = 5.555,55 m 1 légua de sesmaria = 6.000 m 1 Palmo = 22 cm 1 Are (A) = 100 m2 1 hectare (ha)= 100 A = 105 m2 1 Acre = 4064 m2 Alqueire é a unidade de medida de superfície agrária. 1 alqueire paulista = 24.200 m2 = 2,42 ha (equivalente a 5.000 braças quadradas – São Paulo) 1 alqueire mineiro ou alqueire goiano = 48.400 m2 4,84 ha (equivalente a 10.000 braças quadradas – Minas Gerais, Rio de Janeiro e Goiás ) 1 alqueire baiano = 96.800 m2 = 9,68 ha (equivalente a 20.000 braças quadradas – Bahia) 1 alqueire do norte = 27.255 m2 = 2,72 ha Tabela 1.1: Algumas conversões de unidades utilizadas em agricultura. Conversão de Medidas Multiplique o número de por Para obter o equivalente em are 100 Metros quadrados acres 4.047 Metros quadrados acres 0,4047 Hectares hectares 10.000 Metros quadrados Alqueires paulistas 2,42 Hectares Alqueires Mineiros 4,84 Hectares Alqueires baianos 9,68 Hectares Alqueires do norte 2,72 Hectares Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 3 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. Alqueirão - é a medida utilizada em uma região que compreende o Estado de Cabrália (hipotético). É equivalente a 4 alqueires mineiros tradicionais. Cabrália seria fruto da divisão do extremo sul da Bahia e norte-nordeste de Minas Gerais, uma idéia dos tempos do Império. Nesta região usa-se também a medida de 80 medidas de milho como 1 'alqueirim' equivalente também a 48.400m². Alqueire pode ainda ser unidade de medida de capacidade para secos, equivalente a 36,27 litros ou a quatro 'quartas'. E também, no Pará, usa-se como medida de capacidade correspondente a dois paneiros ou a cerca de 30 quilos. Tarefa - medida agrária constituída por terras destinadas à cana de açúcar e que no CE equivale a 3.630 m², em AL e em SE a 3.052m² e na Bahia a 4.356m². Braça - do latim brachia - plural de brachin (braço). Antiga unidade de medida de comprimento, equivalente a 10 palmos, ou seja, 2,2 m (Brasil). Palmo = 8 polegadas = 22 cm. Braça também é unidade de comprimento do sistema Inglês equivalente a cerca de 1,8 m. Braça quadrada (brasileiro) - medida agrária que se usa em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e igual à tarefa, de Alagoas e Sergipe: 3.052m² (1 braça = 2,2 m || 30 braças = 66 m || 30 x 30 braças =4.356m² = braça quadrada). TAREFA BAIANA: Corresponde a uma área de 30 x 30 braços. Portanto uma tarefa é igual a 4.356m². Recomenda-se cuidado, pois existem outras medidas de tarefas em outros estados. Esta é a usada na Bahia. 1 arroba = 14,689 kg 1 Quintal = 58,328 kg ≈ 4 arrobas. 1.4. Tipos de cultura a) culturas anuais: São aquelas em que a semeadura e a colheita ocorrem no intervalo máximo de um ano. Exemplos: soja, milho, trigo, algodão, feijão, arroz, girassol, amendoim, cevada, etc. (OBS: o algodão no centro oeste é uma cultura anual) Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 4 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. b) Culturas perenes: São aquelas que permanecem no campo por vários anos, mas a cada ano ocorre um ciclo produtivo. Exemplos: café, uva, frutíferas em geral, seringueira (São Paulo é um dos maiores produtores), mamão, algodão, etc. (OBS: um tipo diferente de algodão é plantado no nordeste brasileiro e dá em árvores, sendo considerado uma cultura perene nesta região) Nota: café possui um período de dormência (stress hídrico). Uva e Maça necessitam de stress de frio. c) Culturas semi-perenes: São aquelas que o ciclo tem duração entre 12 e 24 meses. Exemplos: Cana-de-açúcar e mandioca (fécula de mandioca, amido natural que pertence à família dos carboidratos, é utilizada no Paraná na fabricação de comprimidos. Maior produtor de mandioca industrializada é o Pará e da farinha artesanal é a Bahia) 1.5. Safras agrícolas a) Safra das águas: semeia-se no início das chuvas e colhe-se no final da estação chuvosa. (em São Paulo no início de outubro-novembro) b) Safra das secas: semeia-se no fim da estação chuvosa e colhe-se na estação seca. (safrinha). É feita no final da estação chuvosa para aproveitar a umidade do solo. c) Safra de inverno: semeia-se e colhe-se durante a estação seca. Aplica-se em regiões onde o inverno é bem definido. Necessitam de irrigação. Exemplo: feijão no estado do Paraná. Pivô central => irriga até 200 ha = 200 x 105 m2 (1 m3 água equivale a aprox. 3 centavos) Nota: O custo de um pivô central de 70 ha é de aproximadamente 160 mil reais. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 5 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. Figura 1.1: Ilustração dos períodos que compreendem as diferentes safras agrícolas. OBS: Cultura de sequeiro: não precisa de irrigação. Só depende das chuvas da natureza. 1.6. Fenologia de Culturas. Fenologia é o estudo dos acontecimentos periódicos da vida. Está relacionada às fases de desenvolvimento dos vegetais. Crescimento -> Ramo de uma folha. Refere-se a um aumento em peso ou volume de um certo órgão de uma planta, ou da planta como um todo, dentro do intervalo de tempo de uma certa fase ou de toda a vida da planta. Desenvolvimento - > Mudança de fase. É o aparecimento de uma fase, ou de uma série de fases durante o ciclo vital da planta. Figura 1.2: Ilustração da relação entre área foliar e comprimento de raízes nas diferentes fases do desenvolvimento da cultura. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 6 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. )(soloárea AFIAF = 1.7. Estrutura de uma planta Os seres vivos podem ser divididos em vários reinos: - Reino Monera (bactérias) - Reino Protista (algas) - Reino Fungi (fungos) - Reino Plantae (vegetais) - Reino Metazoa (animais superiores) O Reino Plantae, de maior interesse para a agrometeorologia, pode ser classificado de duas maneiras: Criptógamas e Espermatófitas. As criptógamas são plantas que não produzem sementes. Dentro deste grupo encontram-se: as plantas briófitas, nas quais o corpo é dividido em caulóide, filóide e rizóides, são plantas que não possuem vasos condutores. São plantas pequenas e restritas à locais úmidos (ex. musgos); as plantas pteridófitas, nas quais o corpo é dividido em raiz, caule e folhas. Este é o primeiro grupo a apresentar vasos condutores (ex. samambaia, avenca, etc) As espermatófitas são plantas com sementes. Dentro deste grupo, encontram-se as giminospermas (plantas com sementes nuas, tais como pinheiros, araucária, sequóia, etc) e as angiospermas (plantas com sementes localizadas no interior de um óvulo transformado em fruto, tais como as frutíferas em geral.). As espermatófitas compreendem, aproximadamente, 250.000 espécies variando emforma, habitat, tamanho e ciclo vital. Há plantas de milímetros e outras de 100 m de altura, plantas que duram dias e outras, milênios. Apesar destas diversificações, elas apresentam um plano estrutural semelhante: a parte aérea consiste em caule e folhas, e as raízes localizam-se abaixo da superfície do solo; têm sementes, flores e, eventualmente, frutos. A estrutura vegetativa varia em forma e tamanho para uma determinada espécie e é afetada pelas condições ambientais. O número de partes florais, sua posição e seu arranjo na planta são constantes numa dada espécie de planta, o que é útil para identificação e classificação. As folhas são os órgãos onde ocorrem a fotossíntese e outros processos metabólicos, como respiração e síntese de proteínas; as raízes armazenam alimentos, Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 7 1. Introdução à Agrometeorologia: Conceitos Básicos e Noções de Agricultura. são suporte e sustentação das plantas e absorvem água e solutos; o caule suporta os ramos e folhas, que armazenam alimentos e transportam solutos e sintetizados. Figura 1.3: Esquema de uma planta genérica. As setas indicam alguns fluxos envolvidos no funcionamento da planta. 1.8. Exercícios 1) Um grande agricultor do centro-oeste do Brasil, após sofrer grandes perdas de produção, foi aconselhado a contratar um profissional de meteorologia. Entretanto, o agricultor não está convencido da utilidade e dos benefícios que pode obter com a contratação deste profissional. Que argumentos você utilizaria para convencê-lo? 2) O que são culturas anuais, perenes e semi-perenes? Cite alguns exemplos. 3) Explique as safras das águas, da seca e de inverno. 4) Qual a diferença entre crescimento e desenvolvimento de uma planta? 5) Qual o papel das folhas nos vegetais? Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 8 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada 2.1. Relações hídricas e fotossíntese Como os demais organismos pluricelulares, as plantas devem transportar substâncias entre suas diferentes partes de modo a garantir seu crescimento e desenvolvimento. Em linhas gerais podemos dizer que o movimento da água nas plantas segue os mesmos princípios físicos e químicos que veremos a seguir, embora os aspectos regulatórios envolvidos na absorção e movimento da água possam ser diferentes dependendo do ambiente a que estarão submetidas estas plantas. Ao considerarmos uma planta podemos imediatamente localizar: • o movimento da água e nutrientes do solo para as raízes. • o movimento da água e nutrientes das raízes para as folhas. • o movimento dos produtos da fotossíntese. Para que estes movimentos ocorram, as plantas utilizam três níveis de transporte. Um deles envolve a passagem de água e solutos através das membranas celulares, a passagem célula a célula e por último o movimento entre as partes da planta. As membranas presentes nas células têm a capacidade de controlar o tipo e a direção do movimento das substâncias que passam através delas. A figura 2.1 ilustra de modo simplificado o contexto em que se encontra uma célula vegetal, por exemplo, da epiderme de uma folha. De um lado um ambiente rico em água (os tecidos internos) e do outro lado a atmosfera, cuja umidade relativa é variável. Figura 2.1: A célula de uma planta. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 9 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. A água exerce várias funções na vida das plantas. Como exemplo, podemos citar: 1) Fotossíntese 2) Transporte 3) Meio para reações químicas 4) Regulação da temperatura 5) Suporte 6) Crescimento das células. Por exemplo, na fotossíntese a quebra da molécula de água é essencial para a liberação dos elétrons utilizados na redução do NADP+ que será posteriormente novamente oxidado permitindo a fixação do CO2. A água nos vacúolos mantém a turgidez da célula vegetal. Se a disponibilidade de água diminui a planta murcha. Devido ao alto calor específico da água, é possível às plantas absorverem grandes quantidades de radiação solar sem a conseqüente elevação de temperatura. 2.2. O potencial hídrico na planta O movimento da água é função de alguns componentes que resultam no que se denomina potencial hídrico, indicado pela letra grega psi (ψ ), que é uma indicação da energia livre disponível. O potencial hídrico da água pura é igual a zero, no entanto, quando a água é misturada com um soluto (por exemplo, um sal) o potencial hídrico é menor que zero e há nas moléculas de água na solução uma menor quantidade de energia livre. O potencial hídrico é a soma dos efeitos da pressão física (potencial de pressão) (ψp), o potencial osmótico (ψo) e o potencial matricial (ψm). Sendo que este último tem pouca influência sobre o movimento da água em células vegetais após a embebição de sementes, tal que: op ψψψ −= Dependendo do potencial hídrico do meio podemos imaginar duas situações. Se o potencial hídrico externo à célula vegetal (ou tecido) é menor que a do seu interior, a água no interior da célula (ou tecido) tende a sair tornando a célula plasmolisada. Verifica-se uma retração da membrana celular. Ao contrário da plasmólise, haverá entrada de água na célula (ou tecido) quando o meio externo tiver um potencial hídrico maior que o suco celular. As células nesta situação estão túrgidas. O turgor das células e conseqüentemente dos tecidos caracteriza uma planta murcha ou normal. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 10 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. As trocas de água entre a planta e a atmosfera ocorrem principalmente através das folhas. Nas folhas estão localizados pequenos orifícios, denominados estômatos, que se abrem e se fecham em resposta à quantidade de água existente nos mesmos. Os estômatos são delimitados por algumas células, chamadas de células-guarda, que podem se tornar túrgidas ou murchas. O turgor das células guarda que delimitam os estômatos é que determinará se estes estarão abertos ou fechados. Na maioria dos ambientes, a concentração da água externa a uma folha é menor que a interna, gerando então perda de água pelos estômatos. Figura 2.2: Funcionamento dos estômatos. O tamanho da abertura dos estômatos é então regulado pelas células-guarda. A parede das células guarda voltada para o interior do orifício é mais espessa que o resto da parede da célula. Quando a célula guarda absorve íons potássio, a água entra na célula tornando-a túrgida e como conseqüência o estômato se abre. Quando os íons potássio saem da célula guarda a água também sai, tornando a célula plasmolisada e, como conseqüência, o estômato se fecha. Os estômatos ocupam em média 1% da área de uma folha, mas são responsáveis por aproximadamente 90% da perda de água na transpiração. 2.3. Transpiração Transpiração é a eliminação de água na forma de vapor que ocorre nos vegetais e animais por uma necessidade fisiológica, sendo controlada por mecanismos físicos, morfológicos, anatômicos e fisiológicos. Nos vegetais a transpiração ocorre principalmente através das folhas, que é a principal superfície de contato do vegetal com o ambiente. O fenômeno da transpiração é fundamental para a vida do vegetal, mas deve Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 11 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. ocorrer de modo a permitir a sobrevivência do mesmo, pois o excesso de perda de água na forma de vapor pela transpiração pode levar à morte do vegetal.Os vegetais apresentam várias adaptações para evitar a transpiração excessiva, de acordo com o ambiente onde vivem. A organização do corpo do vegetal está relacionada diretamente com o fenômeno da transpiração. O número de folhas e a superfície foliar são fatores que determinam maior ou menor taxa de transpiração pelo vegetal. Numa primeira análise, a perda de água na forma de vapor parece ser algo extremamente prejudicial aos vegetais. A perda excessiva de água pode levar ao ressecamento, à desidratação e à morte do vegetal. Podemos dizer que a transpiração é um mal necessário para que atividades fisiológicas vitais possam ocorrer no vegetal. A transpiração evita o aquecimento exagerado, principalmente das folhas do vegetal, através da eliminação do excesso de calor na forma de vapor através dos estômatos. Um outro aspecto importante é a própria ascensão de seiva bruta ou inorgânica (água e sais), desde as raízes até as folhas, que é mantida graças à transpiração contínua através das folhas. Com a transpiração é mantida uma coluna de água e sais minerais dentro do corpo do vegetal, das raízes até as folhas, funcionando como uma bomba propulsora de água e sais minerais de baixo para cima. 2.4. Fotossíntese A fotossíntese (síntese pela luz) é o processo pelo qual as plantas absorvem parte da energia solar para fixar o dióxido de carbono atmosférico. Excetuando as formas de energia nuclear, todas as outras formas de energia utilizadas pelo homem foram origidas a partir do sol. A fotossíntese pode ser considerada como um dos processos biológicos mais importantes na Terra. Por liberar oxigênio e consumir dióxido de carbono, a fotossíntese transformou o mundo no ambiente habitável que conhecemos hoje. De uma forma direta ou indireta, a fotossíntese supre todas as nossas necessidades alimentares e nos fornece um grande número de fibras e outros materiais. A energia armazenada no petróleo, gás natural, carvão e lenha, que são utilizados como combustíveis em várias partes do mundo, vieram a partir do sol através do processo de fotossíntese. Uma vez que a fotossíntese afeta a composição atmosférica, o seu entendimento é essencial para compreendermos como o ciclo do CO2 e outros gases, que causam o efeito estufa, afetam o clima global do planeta. Um dos processos mais importantes da fotossíntese é a utilização da energia solar para converter o dióxido de carbono atmosférico em carboidratos, cujo subproduto é o Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 12 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. oxigênio. Posteriormente, se a planta assim o necessitar, ela pode utilizar a energia armazenada nos carboidratos para sintetizar outras moléculas. Nós fazemos o mesmo, todas as vezes que comemos, parte do alimento é oxidado a gás carbônico e água para aproveitar a energia armazenada nos alimentos. Isso ocorre durante a respiração. Assim, se não há fotossíntese, não há alimento para a grande maioria das formas de vida heterotróficas. Entretanto, o processo fotossintético é relativamente ineficiente. Por exemplo, a eficiência de ganho de carbono em um campo de milho durante a época de crescimento corresponde apenas cerca de 2% da energia solar incidente. Nos campos não cultivados, a eficiência é de apenas 0,2 %. A cana-de-açúcar possui uma eficiência de 8%. A maior fonte de perda da energia solar pelos vegetais é a fotorrespiração, processo que será discutido adiante. Existe atualmente uma grande discussão em torno do efeito estufa que seria causado pelo CO2, entre vários outros gases. Como fora dito anteriormente, durante a fotossíntese o CO2 é convertido em carboidratos e outros compostos, com a produção de O2. Diariamente, são queimadas toneladas de combustíveis fósseis, tal que todo o CO2 que fora fixado pelo processo de fotossíntese durante milhões de anos está sendo recolocado na atmosfera. Sabemos que a fotossíntese consome o CO2 e produz O2, todavia as plantas respondem de maneira diferente à quantidade de CO2 disponível. Algumas plantas crescem mais rapidamente em um ambiente rico em CO2 (as chamadas plantas de metabolismo C3), outras não necessitam de uma concentração elevada de CO2 para o seu crescimento (as chamadas plantas de metabolismo C4). A compreensão dos efeitos dos gases que causam o efeito estufa requer um conhecimento maior da interação do reino vegetal com o CO2. 2.4.1. A descoberta da Fotossíntese Na primeira metade do século 17, o médico van Helmont plantou uma planta em um jarro com terra e a regou somente com água da chuva. Ele observou que após 5 anos, a planta tinha crescido bastante, mas a quantidade de terra no jarro quase não decresceu. Van Helmont concluiu que o material utilizado pela planta para o seu crescimento veio da água utilizada para regá-la. Em 1727 o botânico inglês Stephan Hales observou que as plantas usavam principalmente o ar como fonte de nutrientes para o seu crescimento. Entre 1771 e 1777, o químico Joseph Priestly descobriu que quando ele colocava uma vela no interior de um jarro emborcado, a chama extinguia-se Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 13 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. rapidamente sem que a cera fosse completamente consumida. Posteriormente ele observou que se um camundongo fosse colocado nas mesmas condições ele morreria. Ele mostrou então que o ar que fora “viciado” pela vela e pelo camundongo, poderia ser restaurado por uma planta. Em 1778, Jan Ingenhousz repetiu os experimentos de Priestly e observou que era a luz a responsável pela restauração do ar. Ele observou também que somente as partes verdes da planta tinham essa propriedade. Em 1796, Jean Senebier mostrou que o CO2 era quem “viciava” o ar e que o mesmo era fixado pelas plantas durante a fotossíntese. Logo em seguida, Theodore de Saussure mostrou que o aumento da massa das plantas durante o seu crescimento não poderia ser devido somente à fixação de CO2, mas também devido à incorporação da água. Assim a reação básica da fotossíntese foi concluída: 2222 )( nOOCHnOnHnCO luz +→+ (2.1a) onde n é o número de mol das espécies moleculares envolvidas. Verifica-se que para a formação de uma molécula de glicose são necessárias 6 moléculas de CO2. Assim, a equação acima pode ser escrita como: 2612622 666 OOHCOHCO luz +→+ (2.1b) ou 22612622 66126 OOHOHCOHCO luz ++→+ (2.1c) O aparato fotossintético está localizado em membranas especializadas chamadas de tilacóides. Nos organismos fotossintetizantes eucariotas os tilacóides situam-se no interior de uma organela especializada chamada de cloroplasto (Figura 2.3). Nos vegetais superiores, os cloroplastos estão envoltos por uma dupla membrana, conhecida como envelope e no seu interior, os tilacóides estão dispostos em regiões de alta densidade, chamada de grana, e uma outra de baixa densidade, conhecida como lamela. A matriz que cerca os tilacóides é conhecida como estroma. A fotossíntese ocorre pela absorção da luz na faixa de 400-700 nm por pigmentos fotossintéticos, quais sejam, clorofila (vermelho e azul), carotenóides (PAR) e, em alguns casos, as bilinas. Esta faixa do espectro, que é utilizada pelos vegetais como fonte de energia para as suas atividades metabólicas, é comumente chamada em fisiologia de plantas de Radiação Fotossinteticamente Ativa (PAR, do inglês Photosynthetically Active Radiation). A fotossíntese é um processo ineficiente na Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 14 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. utilização da luz solar, pois somentea porção visível do espectro (PAR) é ativa e corresponde a cerca de 50% da radiação total. Figura 2.3: Estrutura dos cloroplastos Figura 2.4: Faixa do espectro magnético fotossinteticamente ativa. A fotossíntese é dividida em duas fases: A fase clara e a fase escura. Na fase clara a luz solar é absorvida pelos pigmentos localizados nos cloroplastos do estroma (células mesófilas) agitando as moléculas no seu interior. A excitação das moléculas gera ATP (a partir de ADP) e NADPH (a partir de NADP+) num processo chamado de Fotofosforilação. Na fase escura, a energia química produzida pelas reações na fase clara é utilizada para reduzir o carbono. Existem três ciclos para a fixação do carbono: o ciclo C3 ou ciclo de Calvin, o ciclo C4 e o ciclo CAM. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 15 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. 2.4.2. Ciclos de Fixação do Carbono O ciclo C3 foi primeiro elucidado por Calvin e colaboradores em 1946 e por esta razão, também é conhecido como ciclo de Calvin. Ele pode ser dividido em quatro fases distintas: fase de carboxilação, fase de redução, fase de regeneração e fase de síntese dos produtos. A fase de carboxilação consiste na reação de CO2 com a ribulose bisfosfato, catalisada pela ribulose-1,5-bisfosfato carboxilase (RuBisCO), seguida por uma clivagem molecular, formando o ácido fosfoglicérico (PGA). A fase de redução consiste na redução do ácido fosfoglicérico, formado na etapa anterior, em triose fosfato. A fase de regeneração consiste na regeneração da ribulose bisfosfato através de reações de interconversão de açúcares. A fase de síntese de produtos consiste na produção de outros compostos, tais como, polissacarídeos, aminoácidos e ácidos graxos. A síntese desses compostos é influenciada pelas condições fisiológicas. Figura 2.5: Ciclo de Calvin O ciclo de Calvin também é conhecido como a rota C3 de fixação do carbono, uma vez que o produto formado é um composto de 3 carbonos (ácido fosfoglicérico). Entretanto, esta não é a única rota de fixação do CO2, como será visto adiante. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 16 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. A fotorrespiração é uma ineficiência do ciclo de fixação de CO2. A Enzima RuBisCO não é específica para o CO2, ela também aceita como substrato o O2, tal que, ao invés de serem produzidas 2 moléculas de ácido fosfoglicérico após a clivagem molecular, produz-se uma molécula de ácido glicérico e uma molécula de ácido glicólico (glicolato). O glicolato é exportado aos peroxomas onde é oxidado à glioxalato e então aminado para formar o aminoácido glicina (Gli). A glicina por sua vez, é exportada para a mitocôndria onde 2 moléculas de glicina são utilizadas para gerar uma molécula de serina (Ser) e uma molécula de CO2. Daí o nome fotorrespiração, pois há a participação da luz (foto), o consumo de O2 e a liberação de CO2 (respiração). A fotorrespiração é favorecida em ambientes de alta concentração de O2 e baixa de CO2 (condição atmosférica) e em altas temperaturas (Climas tropicais e equatoriais). Pode-se então sumarizar a fotorrespiração na seguinte equação: ( ) 2 2 3 322 2 332)2(2 3325,12 COSerHNADHHPOratofosfoglice NHNADOHObisfosfatoRibulose +++++− →++++−− +− +− (2.2) Na maioria das plantas e gramíneas tropicais, tais como, a cana-de-açúcar, a cevada, o milho e o sorgo, a fixação do CO2 resulta em compostos de 4 carbonos como o oxaloacetato, o malato e o aspartato. Estas plantas possuem folhas que apresentam uma estrutura denominada “Anatomia de Kranz”. Neste tipo de anatomia, existem dois conjuntos de células nas quais ocorre a fixação do carbono: Células da bainha (com cloroplastos sem grana) e células mesofílicas (cloroplastos com grana). A fixação ocorre inicialmente nas células mesofílicas pela carboxilação do fosfoenolpiruvato (PEP) a oxaloacetato, catalisada pela enzima fosfoenolpiruvato carboxilase (PEP carboxilase ou PEP case). O malato é então transportado até as células da bainha e descarboxilado, liberando CO2 e produzindo Piruvato (Pir). O CO2 liberado é refixado via ciclo de Calvin pela RuBisCO nas células da bainha. O Piruvato resultante da descarboxilação retorna às células mesofílicas onde é convertido em fosfoenolpiruvato, regenerando o aceptor de CO2. Neste processo ocorre alta concentração de CO2 nas células da bainha e, assim, predominância da atividade carboxilase da RuBisCO, o que causa uma menor taxa de fotorrespiração. Além disso, ao ocorrer a fotorrespiração, o CO2 produzido não consegue sair das folhas porque é rapidamente refixado pela PEP case nas células mesofílicas. Quando comparadas às plantas C3 as plantas do metabolismo C4 apresentam: Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 17 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. - baixo ponto de compensação de CO2; - fotorrespiração não detectável; - alta eficiência no uso da água; - alta capacidade fotossintética. Figura 2.5: Metabolismo C4 Além dos ciclos C3 e C4, existe ainda o metabolismo ácido das crassuláceas (CAM – Crassulacean Acid Metabolism), cujo nome se deve ao fato de ser primeiro encontrado nas Crassulaceae. Este tipo de metabolismo ocorre em plantas típicas de regiões áridas, com altas temperaturas diurnas, baixas temperaturas noturnas e baixo teor de água no solo. Alguns exemplos de plantas do metabolismo CAM são os cactos, abacaxi, bromélias e orquídeas. Como nas plantas de metabolismo C4, o primeiro metabólito a ser sintetizado pela fixação do CO2 é o oxaloacetato. Este CO2 é posteriormente liberado pela descarboxilação do malato e refixado no ciclo de Calvin pela RuBisCO. Entretanto os metabolismos CAM e C4 diferem entre si pelo local e tempo de ocorrência. Nos vegetais que apresentam metabolismo C4, a fixação do CO2 ocorre nas células fotossintéticas presentes no mesófilo da folha. O carbono fixado na forma de malato migra para as células envolventes da bainha onde ocorre então a liberação e refixação do CO2 através do ciclo de Calvin. Nas plantas do metabolismo CAM as fixações via fosfoenolpiruvato carboxilase e RuBisCO estão separados pelo tempo. Nessas plantas, a fixação ocorre durante a noite quando os estômatos estão abertos via carboxilação do fosfoenolpiruvato e acúmulo do malato, assim formado nos vacúolos. Durante o dia, os estômatos se fecham para minimizar a perda de água e o malato é transportado para o citossol onde é descarboxilado e o CO2 é refixado pela RuBisCO. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 18 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. Figura 2.6: Metabolismo CAM As vantagens dos metabolismos CAM e C4 sobre o C3 são: alta taxa fotossintética (dificilmente atinge-se a saturação da fotossíntese), ausência de fotorrespiração, alta eficiência na utilização da água, alta tolerância salina e baixo ponto de compensação para o CO2. A desvantagem é o alto custo energético e o conseqüente menor rendimento quântico de fixação de CO2. Além disso, com exceção do abacaxi, as plantas de metabolismo CAM, ao contrário das de metabolismo C3, não são muito produtivas em termos de biomassa. Os vegetais de metabolismo C4 são altamente produtivos. 2.4.3. Fatores Limitantes da Fotossíntese Os fatores que influenciam a fotossíntese podem ser externos e internos ao organismo. Como fatores internos podem ser citados as estruturas das folhas e dos cloroplastos, o teor de pigmentos, o acúmulo de produtos da fotossíntese nointerior do cloroplasto, a concentração de enzimas e a presença de nutrientes. Como fatores externos podem ser citados a luz, a água, a temperatura e a pressão parcial de CO2. A compreensão, de como cada um destes fatores e seus efeitos sinérgicos afetam a fotossíntese, torna-se fundamental quando se almeja minimizar os seus efeitos adversos, a fim de se obter uma maior produtividade. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 19 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. 2.4.3.1. Efeitos da taxa de iluminação (Irradiância) Figura 2.7: Efeito da irradiância sobre a fotossíntese. As razões fotossintéticas da maioria das folhas aumentam até atingir um ponto de saturação. Figura 2.8: Fotossíntese líquida. Plantas C4: milho, sorgo, cana-de-açúcar. (Regiões de alta energia) Plantas C3: feijão, arroz, soja, algodão A taxa de saturação em plantas C4 é cerca de 3 vezes maior que em plantas C3. De um modo geral uma planta aclimatada a um ambiente de baixa irradiância (condição de sombra) possui as seguintes características quando comparada a uma planta aclimatada a um ambiente de alta irradiância (condição de sol): • Menor atividade respiratória; • Menor capacidade fotossintética; • Menor razão Clorofila a/pigmentos acessórios; • Menor seção transversal de absorção dos pigmentos; Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 20 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. • Menor concentração das enzimas do transporte de elétrons fotossintético e do ciclo de Calvin; • Menores pontos de compensação e saturação fotossintética; • Menor taxa de crescimento específico; • Maior teor de pigmentos; • Maior rendimento quântico de produção de O2 em luz limitante; • Maior tamanho e/ou número das unidades fotossintéticas. • As folhas dos vegetais aclimatados à alta irradiâncias são mais grossas e opticamente mais densas que as folhas aclimatadas à baixas irradiâncias; • A quantidade de tecido não fotossintético é maior, e conseqüentemente, a razão Chl a/biomassa é inferior nas plantas de sol; • As plantas de sombra são mais susceptíveis à foto-inibição. 2.4.3.2. Efeitos da água A água é um componente essencial na reação fotossintética. Faltas de água ou seca extrema na atmosfera criam um estresse hídrico que afeta a eficiência da reação fotossintética na planta. Boyer (1970) afirma que o estresse de umidade afeta a fotossíntese através de um grande número de mecanismos: por afetar o nível dos metabólicos intermediários, por inibir o sistema de transporte de elétrons fotossintéticos, por causar fechamento dos estômatos e por alterar a taxa de respiração. Uma influência direta da disponibilidade de água na fotossíntese é através do impacto sobre a abertura estomatal. Como os estômatos fecham em resposta ao estresse, a resistência para a difusão do CO2 dentro das folhas aumenta. Moss (1965) especula sobre a influência do estresse na umidade do solo e demanda evaporativa da atmosfera sobre a fotossíntese varia em diferentes níveis de irradiância (Figura 2.9). Com o estresse de umidade do solo aumentando, a taxa fotossintética ótima é atingida em irradiâncias mais baixas. Quando o estresse de umidade do solo é baixo e com pouca demanda evaporativa da atmosfera, a fotossíntese continua a crescer mesmo em altas irradiâncias. Alto estresse atmosférico, particularmente, estresse atmosférico extremo reduz a fotossíntese, provavelmente devido à rápida evaporação que reduz o turgor nas células guarda causando o fechamento dos estômatos. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 21 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. Figura 2.9: Efeitos esperados do estresse da umidade do solo (US) e demanda evaporativa da atmosfera sobre a fotossíntese em vários níveis de irradiância (Adaptado de Moss, 1965). Figura 2.10: Fotossíntese para soja e milho em vários níveis de potencial de água na folha (Adaptado de Boyer, 1970). A figura 2.10 (Boyer, 1970) ilustra as diferenças na sensitividade de plantas C3 e C4 ao estresse hídrico. Milho, uma planta C4, mostra um decréscimo mais ou menos constante na fotossíntese líquida com o potencial de água na folha decrescendo até –1.6 MPa. A fotossíntese líquida na soja, uma planta C3, é quase que insensível ao estresse hídrico de –0.4 a –1,2 MPa e mostra uma declinação abrupta até –2,0 MPa. Notar que, a fotossíntese no milho é cerca de 50% maior que a na soja quando o estresse hídrico é menor. Esta vantagem é perdida com potenciais cerca de –1,2 MPa. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 22 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. 2.4.3.3. Efeitos da Temperatura Figura 2.11: Resposta da taxa de fotossíntese à temperatura com radiação solar máxima. O aumento da temperatura induz em curto prazo: • O aumento da atividade fotossintética; • Aumento da atividade respiratória; • Diminuição da eficiência catalítica da RuBisCo; • Aumento das irradiâncias de compensação e saturação da fotossíntese; • Diminuição da eficiência fotossintética. Os efeitos em longo prazo do aumento da temperatura são: • Há uma relação inversa entre a capacidade fotossintética (atividade fotossintética máxima em luz saturante) e a temperatura de crescimento; • Aumento na fluidez de membrana; • Aumento da atividade enzimática das enzimas do ciclo de Calvin; • Aumento do teor de pigmentos, do número e do tamanho das unidades fotossintéticas, • Aumento da eficiência fotossintética e da biomassa; • Diminuição das irradiâncias de compensação e de saturação da fotossíntese; • Diminuição da atividade respiratória e do estímulo da atividade fotossintética à temperatura. Entretanto, existem dados na literatura de invariabilidade da eficiência fotossintética de alguns organismos em relação à temperatura de crescimento. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 23 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. 2.4.3.4. Efeitos da Concentração de CO2 No ar atmosférico há uma mistura de gases: N2 78% ; O2 21% ; CO2 0,035%. Figura 2.12: Efeito da concentração de CO2 sobre a fotossíntese. A construção do gráfico acima utiliza dados obtidos em condições experimentais de laboratório. Observa-se que a concentração ótima é atingida em 0,2% de CO2, pois acima dessa concentração a taxa de fotossíntese já não poderá melhorar. Conseqüentemente, qualquer concentração abaixo desse ótimo (0,2%) está funcionando como limitante para o melhor rendimento do processo. A concentração do CO2 no ar atmosférico exerce contribuição importante para a temperatura ambiente. Os estudiosos estimam que se essa concentração chegar em torno de 0,05% o calor será suficiente para descongelar parcela das calotas polares, fazendo subir o nível dos mares, o que provocaria inundações catastróficas. 2.5. Produtividade Primária Bruta e Produtividade Primária Líquida 2.5.1. Conceitos Biomassa: Peso dos tecidos vivos usualmente medidos por unidade de área em um intervalo de tempo particular. Pode incluir partes mortas dos organismos tais como, cabelo, unhas, etc. Produtores primários: são os organismos que ocupam o primeiro nível na cadeia alimentar. Estes organismos são autótrofos fotossintéticos, ou seja, um organismo que produz o seu alimento inorganicamente pela utilização de luz no processo químico da fotossíntese. As plantas são os autótrofos fotossintéticos dominantes na Terra. Estes organismos não necessitam de fontes externas de alimento orgânico para sua sobrevivência. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia.Por: Edmilson Dias de Freitas 24 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. Os corpos dos organismos vivos dentro de uma unidade de área definem a biomassa. Mais especificamente, a biomassa pode ser definida como a massa dos organismos por unidade de área e é usualmente expressa em unidades de energia (ex, Joules por m2) ou por matéria orgânica seca (ex. ton por hectare ou grama por m2). A maior parte da biomassa em uma comunidade é composta de plantas, as quais são os produtores primários de biomassa devido a sua habilidade de fixar o carbono através da fotossíntese. Esta reação química, como visto anteriormente, pode ser descrita pela seguinte fórmula: 2612622 666 OOHCOHCO luz +→+ Os produtos da fotossíntese são: um carboidrato, tal como a glicose, e o oxigênio que é liberado para a atmosfera. Todo o açúcar produzido nas células fotossintéticas das plantas e de outros organismos é derivado de uma combinação química inicial de dióxido de carbono e água na presença de luz. Esta reação química é catalisada pela clorofila atuando juntamente com outros pigmentos, lipídeos, açúcar, proteínas e moléculas de ácidos nucléicos. Os açúcares criados na fotossíntese podem ser convertidos posteriormente pelas plantas em amido para armazenamento, ou podem ser combinados com outras moléculas de açúcar para formar carboidratos especializados, tais como a celulose. Açúcares podem também ser combinados com outros nutrientes tais como nitrogênio, fósforo e enxofre, para formar moléculas complexas tais como as proteínas e ácidos nucléicos. Figura 2.13: Entradas e saídas no processo de fotossíntese. A produtividade primária de uma comunidade é a quantidade de biomassa produzida através da fotossíntese por unidade de área por unidade de tempo pelas plantas, os produtores primários. A produtividade primária é usualmente expressa em unidade de energia (Joules m-2 dia-1) ou em unidade de matéria orgânica seca (kg m-2 Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 25 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. ano-1). Globalmente, a produtividade primária atinge cerca de 243 bilhões de toneladas métricas de biomassa de planta seca por ano. A energia total fixada pelas plantas em uma comunidade através da fotossíntese é chamada de Produtividade Primária Bruta (PPB). Uma vez que toda a energia fixada pela planta é convertida em açúcar, é teoricamente possível determinar a energia absorvida pela medida da quantidade de açúcar produzida. Uma proporção da energia da produtividade primária bruta é utilizada pelas plantas no processo de respiração (autotrófica). A respiração fornece a energia necessária para vários processos fisiológicos da planta e para suas atividades morfológicas. A equação geral da respiração é: energia de liberação666 2226126 ++→+ OHCOOOHC (2.3) Subtraindo a respiração da produção primária bruta obtemos a Produtividade Primária Líquida (PPL), a qual representa a taxa de produção de biomassa que está disponível para o consumo (Herbívoros) pelos organismos heterotróficos (bactérias, fungos e animais). Globalmente, os padrões de produtividade primária variam tanto espacialmente como temporalmente. Os ecossistemas menos produtivos são aqueles limitados pela energia térmica e água como os desertos e a tundra polar. Os ecossistemas mais produtivos são aqueles com altas temperaturas e pleno suprimento de água e grandes quantidades de nitrogênio disponível no solo. A tabela abaixo descreve uma média aproximada da produtividade primária líquida para uma variedade de ecossistemas. Tabela 2.1: Produtividade Primária Líquida média anual dos principais biomas terrestres. Tipo de Ecossistema Produtividade Primária Líquida (quilocalorias m-2 ano-1) Floresta tropical 9000 Estuários 9000 Savana ou Cerrado 3000 Floresta temperada decídua 6000 Floresta Boreal 3500 “Grassland” temperadas 2000 Tundra Polar 600 Desertos < 200 Eventualmente, todo o carbono fixado na PPL é retornado para a piscina de CO2 atmosférico através de dois processos: respiração heterotrófica (Rh) por decompositores (alimentação de bactérias e fungos nos tecidos mortos e exudatos) e herbívoros, e a combustão por incêndios naturais ou provocados pelo homem. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 26 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. A diferença entre PPL e Rh determina quanto carbono é perdido ou ganho pelo ecossistema na ausência de distúrbios que removam carbono do ecossistema (tais como desflorestamento e queimadas). Este balanço de carbono, ou produtividade líquida do ecossistema (PLE), pode ser estimado das mudanças nos estoques de carbono, ou pela medida dos fluxos de CO2 entre porções de terra e a atmosfera. 2.5.2. Fatores Limitantes para a Produtividade Primária Apesar de todas as atividades biológicas em plantas serem intimamente dependentes da radiação solar recebida, é óbvio que a radiação solar sozinha não determina a produtividade primária. Todas as plantas requerem luz solar, dióxido de carbono e água para a fotossíntese. A fotossíntese é também dependente da temperatura e dos nutrientes do solo. Temperatura (calor) controla a taxa de metabolismo da planta, a qual determina quantidade de fotossíntese que pode acontecer. A maior parte da atividade metabólica acontece dentro do intervalo entre 0 e 50 ºC. Existe pouca atividade acima ou abaixo deste intervalo. A temperatura ótima para a produtividade coincide com o intervalo ótimo para a fotossíntese de 15 a 25 ºC. O gráfico na figura 2.14 ilustra a relação entre a produtividade primária líquida de florestas com a temperatura anual do ar. Figura 2.14: Relação entre a produtividade primária líquida de uma floresta e a temperatura anual (Adaptado de Lieth, 1973) A relação geral entre produtividade primária líquida e precipitação para florestas do mundo é mostrada na figura 2.15. Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 27 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. Figura 2.15: Relação entre PPL em florestas e precipitação. (Adaptado de Lieth, 1973) Água é uma necessidade principal para a fotossíntese e a principal componente químico da maior parte das células da planta. Em regiões secas, existe um aumento linear da PPL com o aumento da disponibilidade de água. Em climas mais úmidos de florestas, a produtividade da planta começa sob níveis mais elevados de precipitação. 2.5.3. Eficiência no uso de radiação solar Dependendo da localização, entre 0 e 5 Joules de energia solar são recebidos em cada metro quadrado da superfície da Terra a cada minuto. Entretanto, somente uma pequena porção desta energia é convertida pela fotossíntese em biomassa das plantas. Da radiação solar recebida pela superfície da Terra, somente 44 % da radiação incidente de onda curta ocorre em comprimentos de onda úteis para a fotossíntese (PAR). Ainda, mesmo as espécies de plantas mais eficientes (na maioria, plantações) podem somente incorporar de 3 a 10 % da radiação PAR à sua produção de biomassa. Dos vários biomas da Terra, florestas tropicais e coníferas são as mais eficientes, convertendo entre 1 e 3 % da energia solar utilizável em biomassa. O bioma deserto tem a mais baixa eficiência no uso da radiação. As plantas neste bioma convertem somente de 0,01 a 0,2 % da radiação PAR em biomassa. 2.6. O ciclo do carbono A concentração de CO2 na atmosfera tem aumentado de aproximadamente 280 partes por milhão em 1800, para 315 ppmv em 1957, para 356 ppmv em 1993 e para 367 ppmv em 1999, como uma resposta ao desenvolvimento de alguns setores, tais como agricultura e indústria.Estes dados foram obtidos de inúmeras composições de bolhas de ar aprisionadas no gelo da Antártica. As concentrações de CO2 atmosférico têm sido medidas diretamente com alta precisão desde 1957. Estas medidas concordam Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 28 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. bem com as estimativas feitas pelo gelo e mostram uma tendência contínua de aumento até o presente. Várias evidências adicionais confirmam que o continuo aumento do CO2 atmosférico é causado por emissões antropogênicas, sendo a queima de combustíveis fósseis a mais importante. Primeiro, o oxigênio atmosférico está diminuindo a uma taxa comparável com as emissões de CO2 por combustíveis fósseis (Combustão consome O2). Segundo, as assinaturas isotópicas características de combustíveis fósseis (sua falta de 14C e depleção no conteúdo de 13C) levam sua marca para a atmosfera. Terceiro, o aumento no CO2 observado tem sido mais rápido no hemisfério norte, onde a maior queima de combustíveis fósseis ocorre. Entretanto, o CO2 atmosférico está aumentando apenas em metade da taxa das emissões dos combustíveis fósseis. O restante do CO2 emitido em parte se dissolve na água do mar e se mistura nas profundezas do oceano. Outra parte é absorvida pelos ecossistemas terrestres. O seqüestro de carbono pelos ecossistemas é devido ao excesso de produção primária (fotossíntese) sobre a respiração e outros processos oxidativos (decomposição ou combustão de material orgânico). Os sistemas terrestres são também uma fonte de CO2 antropogênico quando o uso da terra é modificado (particularmente desflorestamento), levando à perda de carbono das plantas e do solo. Entretanto, o balanço global nos sistemas terrestres ainda representa um seqüestro líquido de CO2. A parte do CO2 emitida pelos combustíveis fósseis que é absorvida pelo oceano e a parte que é absorvida pela terra podem ser calculadas através das mudanças nos conteúdos atmosféricos de CO2 e O2 porque os processos terrestres de troca de CO2 envolvem trocas de O2 enquanto que a dissolução no oceano não. O balanço global de CO2 baseado em medidas de CO2 e O2 para as décadas de 80 e 90 são mostrados na tabela 2.2. Tabela 2.2: Balanço Global do CO2 (em PgC/ano) baseado em tendências intra-decadais no CO2 e O2 atmosférico. Valores positivos são fluxos para a atmosfera. Valores negativos representam seqüestro da atmosfera. A emissão por combustíveis fósseis corresponde à década de 80 (Marland et al., 2000) (FONTE: IPCC) 1980s 1990s Aumento na Atmosfera 3.3 ± 0.1 3.2 ± 0.1 Emissões (combustíveis fósseis, cimento) 5.4 ± 0.3 6.3 ± 0.4 Fluxo Oceano-atmosfera -1.9 ± 0.6 -1.7 ± 0.5 Fluxo terra-atmosfera* -0.2±0.7 -1.4 ± 0.7 *particionado como se segue Mudança no uso da terra 1.7 (0.6 a 2.5) NA Sumidouro terrestre residual -1.9 (-3.8 a 0.3) NA Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 29 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. A influência humana sobre os fluxos de carbono entre os três reservatórios (atmosfera, oceano e biosfera terrestre) representa uma perturbação pequena, mas significativa de um ciclo global bem maior. (Figura 2.16) Figura 2.16: O ciclo global do carbono: armazenamento (PgC) e fluxos (PgC/ano) estimados para os anos 1980s. (a) Principais componentes do ciclo natural. (b) A perturbação humana (dados da tabela 3.1). (c) Ciclo de carbono no oceano. (d) Ciclo do carbono sobre a terra. Na figura 2.16a são apresentados os principais componentes do ciclo natural, as estimativas do armazenamento nos compartimentos ativos e as estimativas dos fluxos brutos entre compartimentos. As setas mais grossas denotam os fluxos mais importantes do ponto de vista do balanço contemporâneo da atmosfera: produtividade primária bruta e respiração pela biosfera e troca física ar-mar. Estes fluxos são aproximadamente balanceados a cada ano, mas desbalanços podem afetar significativamente a concentração do CO2 atmosférico entre anos e séculos. As setas finas denotam ciclos naturais adicionais (linhas pontilhadas denotam fluxos de carbono como CaCO3), os quais são importantes sobre longas escalas de tempo. O fluxo de 0,4 PgC/ano do CO2 atmosférico via plantas para o carbono inerte do solo é aproximadamente balanceado Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 30 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. numa escala de tempo de vários milênios pelo transporte de carbono orgânico dissolvido (COD) nos rios. Outros 0,4 PgC/ano de carbono inorgânico dissolvido (CID) é derivado do weathering do CaCO3, o qual absorve CO2 da atmosfera numa razão 1:1. Estes fluxos de COD e CID juntos respondem pelo transporte pelos rios de 0,8 PgC/ano. No oceano, o COD dos rios é respirado e liberado para a atmosfera, enquanto que a produção de CaCO3 pelos organismos marinhos resulta na metade do CID dos rios sendo retornados para a atmosfera e metade sendo enterrados nos sedimentos das profundezas, os quais são precursores das rochas de carbonato. Também são mostrados os processos com escalas de tempo muito maiores: enterrio de matéria orgânica como carbono orgânico fóssil (incluindo combustíveis fósseis) e outgassing de CO2 através de processos tectônicos (vulcanismo). Emissões devidas ao vulcanismo são estimadas como 0,02 a 0,05 PgC/ano (Williams et al., 1992; Bickle, 1994). A figura 2.16b mostra as melhores estimativas dos fluxos adicionais (liberação para a atmosfera positiva, seqüestro negativo) associados com a perturbação humana do ciclo do carbono durante os anos 80s (dados da tabela 3.1). A queima de combustíveis fósseis e as mudanças no uso da terra são os principais processos antropogênicos de liberação de CO2 para a atmosfera. Somente parte deste CO2 permanece na atmosfera, o restante é aprisionado pela terra (plantas e solo) ou pelo oceano. Estes componentes de seqüestro representam imbalanços nos fluxos naturais de duplo sentido entre a atmosfera e o oceano e entre a atmosfera e a terra. Note que as quantidades brutas de carbono anualmente trocadas entre o oceano e a atmosfera e entre a terra e a atmosfera representam uma fração considerável do conteúdo de CO2 atmosférico (Figura 12.5a) e são muito maiores que a injeção de CO2 antropogênico. Sendo assim, um desbalanço nestas trocas poderia facilmente levar a uma anomalia de magnitude comparável à perturbação antropogênica direta. Isto implica que é importante considerar como estes fluxos podem ser modificados em resposta à atividade humana. Na figura 2.16c é apresentado o ciclo de carbono no oceano. CO2 que dissolve no oceano é encontrado em três formas principais (CO2, , , cuja soma é o CID). CID é transportado para o oceano por processos físicos e biológicos. A Produtividade Primária Bruta (PPB) é a quantidade total de carbono orgânico produzido pela fotossíntese (estimativas de Bender et al., 1994); A Produtividade Primária Líquida (PPL) é o que permanece depois da respiração antropogênica, isto é, respiração pelos organismos fotossintéticos (estimados de Falkowski et al., 1998). Sumidouros de COD −2 3CO − 3HCO Notas de Aula- ACA 0429 – Agrometeorologia. Por: Edmilson Dias de Freitas 31 2. Fundamentos de ecofisiologia aplicada. e material particulado orgânico (MPO) de origem biológica resultam num fluxo para baixo conhecido como “export production” (estimativas de Schlitzer, 2000). Este material orgânico é transportado e respirado pelos organismos não-fotossintéticos (respiração heterotrófica) e finalmente ressurgida e retornada para a atmosfera. Somente uma fina fração é enterrada nos sedimentos das profundezas do oceano. Transporte
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