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1 RELAÇÃO HOMOAFETIVA NO DIREITO BRASILEIRO Aspectos e consequências jurídicas Helen Júlia Barbosa1 Orientadora: Izabel Antonieta2 RESUMO É impossível dizer ao certo quando surgiu o primeiro caso de homossexualismo no mundo. A história nos traz apontamentos diversos. Muitos dizem que foi na Grécia antiga que houve os primeiros registros, mas foi com o surgimento do Cristianismo que aquele comportamento considerado uma cultura, ou até mesmo relacionamento qualquer, passou a se tornar pecado, crime, doença mental etc. A partir de então, longas batalhas perduraram durante anos, até que em 1829 a Dinamarca foi o primeiro país a legalizar a união civil entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil, ainda não existe lei que o torne legal, mas há um protejo de lei no Senado, o PLS 612/2011, propondo a substituição da expressão “HOMEM E MULHER” por “DUAS PESSOAS” no art. 1723 do Código Civil. Enquanto a alteração não é aprovada e segue os trâmites legais para demais votações, o impasse segue, visto que hoje para um casal homossexual se casar, ou mesmo adotar, ou ainda se necessitar de algum meio jurídico para comprovar ser cônjuge do outro, necessita muitas vezes recorrer ao Poder Judiciário, uma luta que perdura por longos anos, resultando em desgastes emocionais e principalmente na limitação de direitos e princípios fundamentais da isonomia, dignidade da pessoa humana, dentre outras, garantias que alicerçam o ordenamento jurídico pátrio. Palavras-chave: 1- Homossexualismo; 2- PLS 612/2011; 3- garantias constitucionais. 1 Graduanda no Curso Superior de Direito da Universidade Salgado de Oliveira - UNIVERSO, campi Goiânia-GO. 2 Advogada, Faculdade Uni-anhanguera, 1991, Especialista em Obrigações e Contratos. 2 HOMOAFETIVE RELATIONSHIP IN BRAZILIAN LAW Legal Aspects and Consequences ABSTRACT It is impossible to say for sure when the first case of homosexuality arose in the world. History brings us different notes. Many say that it was in ancient Greece that there were the first records, but it was with the rise of Christianity that that behavior considered a culture, or even any relationship, became a sin, crime, mental illness, and so on. From then on, long battles lasted for years, until in 1829 Denmark was the first country to legalize same-sex civil union. In Brazil, there is still no law that makes it legal, but there is a protection of law in the Senate, PLS 612/2011, proposing the replacement of the expression "MAN AND WOMAN" by "TWO PEOPLE" in the art. 1723 Civil Code. While the change is not approved and follows the legal procedures for other votes, the impasse continues, since today for a homosexual couple to marry, or even adopt, or still need some legal means to prove to be spouse of the other, needs many Sometimes resorting to the Judiciary, a struggle that lasts for many years, resulting in emotional exhaustion and especially in the limitation of rights and fundamental principles of equality, dignity of the human person, among others, guarantees that underpin the legal order of the country. Keywords: 1- Homosexuality; 2- PLS 612/2011; 3 - constitutional guarantees. INTRODUÇÃO Sempre que se fala em homossexualismo logo vem o preconceito, muitas vezes involuntário, com base em crenças religiosas, ou criação, costumes, dentre outros distorcidos valores, que acabaram por consolidar o senso comum na sociedade que, em que pese a evolução cultural e tecnológica, ainda se mantém 3 ultrapassada em temas cada vez mais presentes e atuais, e que merecem ser debatidos racionalmente. Com o passar dos anos, as pessoas que se declararam homossexuais foram por muito tempo excluídas da proteção legal e tratadas com indiferença pelo legislador. Atualmente, pode-se dizer que houve a maior conquista legislativa em prol deles, que se deu em 2011 quando foi registrado o primeiro casamento homoafetivo no Brasil. Sendo assim, o foco primordial do artigo é demonstrar que por mais que exista a primícia dessa evolução social, por mais que se tenha registrado casos favoráveis à causa homoafetiva, ainda não existe uma autorização legal para o exercício pleno de seus direitos em nosso ordenamento jurídico, limitando os homossexuais de certos atos jurídicos, a exemplo do casamento e suas consequências legais, cabendo ao Juiz de Direito, no ato da apreciação judicial do fato, confirmar ou não o vínculo jurídico inerente ao casamento, com base nos seus entendimentos pessoais, crenças ou costumes. É pertinente discutir o tema visto que evoluções constantes acontecem no mundo, principalmente sociais, visando sempre quebrar preconceitos, paradigmas, esclarecendo que conforme garantido pela Constituição Federal no art. 5º, caput, “Todos são iguais perante a lei”, e independente de opção sexual todos podem ter os direitos civis, previdenciários, constitucionais, iguais a todos os demais cidadãos. Com amparo em doutrinas, dispositivos legais, jurisprudências e pesquisas informativas encontradas em sites, jornais e mídias que elucidam a respeito do tema em comento, a fim de levar o leitor a compreender a evolução histórico-legislativo da união homoafetiva no direito brasileiro, seus aspectos e consequências jurídicas, é que o artigo será elaborado. 1 UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU CONTEXTO HISTÓRICO A palavra HOMOSSEXUAL vem do grego antigo que quer dizer ὁμός (homos), igual + latim sexus = sexo que refere-se à característica, qualidade ou condição de um ser (humano ou não) que se sente atraído por alguém do mesmo sexo. Não existe ao certo dados que demostram com exatidão quando e onde surgiu 4 a relação entre duas pessoas do mesmo sexo, tanto que a expressão “gay” não existia, e era comum o amor entre iguais. Tem-se indícios de que haviam rituais entre homens cerca de 10 mil anos atrás nas tribos das ilhas de Nova Guiné, Fiji e Salomão. Em meados de 1750 a.c. o imperador Hammurabi na antiga Mesopotâmia também praticava rituais homossexuais. Em ambos casos acreditavam ser sagrados tais rituais e importantes principalmente para sabedoria, acreditando que ela poderia ser transferida de um para o outro durante os rituais. Posteriormente, como herança, identificou-se que no Código de Hammurabi era reconhecida a união homossexual. A primeira vez que se viu o termo “homossexualismo” em alguma impressão foi em um panfleto no ano de 1869, publicado anonimamente pelo romanista alemão Karl-Maria Kertbeny. Já por volta de em 1879 foi publicado em um livro “Descoberta da Alma” de Gustav Jager. Historiadores dizem que era muito comum esse tipo de relação na antiguidade. Cada país tinha sua tradição, costume, religião etc. Com o desenvolvimento da sociedade em determinados lugares, eles eram tolerados, condenados ou admirados. Quando eram condenados, eram tratados como pecado, doença, e em alguns casos proibidos por lei. Existem diversos relatos a respeito do surgimento do homossexualismo. Dentre eles, o mais popular é que sua origem se deu na Grécia antiga, que tinha caráter pedagógico militar, onde os soldados mais velhos buscavam com que os jovens tivessem a mesma coragem e bravura para serem honrosos militares. Posteriormente com o crescimento do Cristianismo no ocidente, a homossexualidade passou a ser considerada uma doença pela medicina, uma doença mental ou desvio psicológico e ser condenada pela sociedade. Já na década de 90, a Organização Mundial de Saúde (OMS), suprimiu a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID), e o homossexualismo deixou de ser diagnosticado como uma anomalia psíquica. Contudo, cada país adota seu próprio entendimento a respeito da homossexualidade. Há países onde o casamento é permitido por lei, enquanto em outros é completamente proibido, como por exemplo, na Arábia Saudita, onde é considerado crime e punível com pena de morte, muitas vezes por apedrejamento. No Brasil, tem-se notícia que em meados do ano de 1985, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), seguindo o Conselho Federal de Psicologia (CFP), 5 declarou que “a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão" e que os psicólogos não colaborariam com eventos/serviços que propusessem tratamento e/ou cura da homossexualidade. Depois de muita luta, por fim, em 1991 a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra os homossexuais uma violação aos Direitos Humanos. Famílias plurais, como assim são chamados por Maria Berenice Dias, onde é enfática a respeito de como a união homoafetiva é tratada pela Constituição Federal de 1988: “Só pode ser por preconceito que a Constituição emprestou, de modo expresso, juridicidade somente às uniões estáveis entre um homem e uma mulher. Ora, a nenhuma espécie de vínculo que tenha por base o afeto pode-se deixar de conferir status de família, merecedora da proteção do Estado, pois a Constituição (l.º III) consagra, em norma pétrea, o respeito à dignidade da pessoa humana. (10ª ed. 2015, pg. 137) ” Portanto, como bem referido pela doutrina acima citada, o Brasil ainda integra o rol de países que, em que pese conter preceitos expressos de isonomia e garantia de liberdades, ainda se omite quanto à plenitude de direitos em relação à união homoafetiva, o que impede o efetivo exercício jurídico de suas prerrogativas, como se discutirá no tópico a seguir. 2 CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL HOMOSSEXUAL NO BRASIL O casamento entre pessoas do mesmo sexo não é legalizado no Brasil. Tal conclusão se extrai da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que em seu artigo 226 preconiza: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. ” Não se sabe ao certo se tal expressão na Constituição Federal de 1988 foi intencional, querendo apenas tornar legal o casamento entre relacionamentos heterossexuais, ou se o legislador não teve tal intensão de omitir. 6 Para alguns doutrinadores, com base no artigo 226, CF/88, o casamento homossexual é ilegal. Para outros é completamente legal, a exemplo do professor Sérgio Rezende que assim leciona: O afeto é que conjuga... O fato é que não é requisito indispensável para haver família que haja homem e mulher, nem pai e mãe. Há famílias só de homens ou só de mulheres, como também sem pai e mãe. (2002, v.14, p.6- 7) Para a também doutrinadora Cláudia Tome Toni: Na realidade, o legislador constitucional, ao se referir a essas espécies de entidades familiares, não previu qualquer proibição à instituição de outros tipos de formações familiares. Ao contrário, pela leitura do texto, podemos concluir claramente que o legislador, ao dizer que a família é base da sociedade, ressaltou sua importância em nosso meio e, portanto, a sua imprescindibilidade para nossa sociedade e para o próprio Estado, independentemente do modo como foi constituída. Esse fundamento é invocado pelos juristas que defendem que a união entre homossexuais também deve ser considerada à união estável, estabelecida entre casais heterossexuais, sem formalismo do casamento. (Ed., 1" ed., pg. 50/51) A Ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrigui, da 3º Turma, em julgamento do RESE 1026981/RJ, se mostra favorável ao casamento/união estável dizendo: “Demonstrada a convivência entre 2 pessoas do mesmo sexo, pública, duradoura e contínua, estabelecida o objetivo de constituição de família, haverá, por consequência, o reconhecimento de tal união como entidade familiar, como respectiva atribuição dos efeitos jurídico dela advindo. ” O Código Civil de 2002, embora novo, não pode ser considerado um código moderno. Ele que codificou a pluralidade de família também é omisso quanto ao casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Em 2013, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, declarou por meio da sua Resolução nº 175 de 14/05/2013 que a conversão da união estável homossexual em casamento e a própria celebração do casamento civil não era inconstitucional, ocasionando na época uma enorme revolução no meio jurídico e nas comunidades LGBT’s. O STF pronunciou-se no sentido de ser relevante o conhecimento, como entidade familiar, das uniões estáveis homoafetivas (ADI 3.300/MC/DF), sendo que 7 atualmente o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é permitido, mas não é legalizado. Em sentido contrário a doutrina de Guilherme Calmon Nogueira da Gama preleciona que: A Constituição Federal de 1988 expressamente introduziu, ao reconhecer a ‘união estável’ como entidade familiar, o requisito objetivo de que somente a união entre o homem e a mulher pode configurar união fundada no companheirismo, excluindo, portanto, a possibilidade de se reconhecerem as uniões entre homossexuais, mesmo que desimpedidos, convivendo com lapso de tempo razoável, com o objetivo de constituição de família. (2008. P. 155) A citação do eminente professor deixa mais do que claro que a união entre pessoas do mesmo sexo configuraria um casamento inexistente, assim como o casamento nulo e o anulável, pois segundo seu entendimento “não é possível o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo, já que tradicionalmente, o casamento entre elas é inexistente, no Direito”. Recentemente, no dia 08 do mês de março de 2017, pudemos acompanhar a aprovação de caráter terminativo da Comissão de Constituição e Justiça - CCJ, como sendo constitucional, para modificar o art. 1723 do Código Civil através do Projeto de Lei do Senado (PLS) 612/2011. O Código atual trata como casamento apenas aquele ato solene realizado entre homem e mulher, consoante se observa, por exemplo, da leitura dos artigos 1.514 e 1.517. No sobredito projeto de lei, que se encontra em votação nas casas regulares, propõe-se que o texto seja alterado para “CASAMENTO É UNIÃO DE DUAS PESSOAS” e não mais somente de homem e mulher. O projeto segue com força à Câmara dos Deputados e tem tudo para ser aprovado, o que será uma grande conquista para a sociedade e principalmente aos que vivenciam tais situações. Mesmo como esse significativo avanço, faltarão muitos outros de mesmo caráter a serem legalizados, visto que as garantias e direitos dos homossexuais esbarram em diversos outros ramos do direito, onde ainda falta devida atenção do legislador para adequação da lei às garantias inerentes à condição dos homossexuais, sobretudo a isonomia e a dignidade da pessoa humana, independentemente de sua opção sexual. 8 A lacuna deixada pela lei não pode servir de obstáculo para o reconhecimento de um direito que é garantido a todos pela nossa Carta Magna. A explicitação do casamento, da união estável na relação homossexual não exclui as demais que se constituem como comunhão de vida afetiva, com finalidade de família, de modo público e contínuo. 3 FILHOS Até o Código Civil de 1916, os filhos só eram reconhecidos aqueles advindos da família legítima, aquela constituída pelo casamento. Com o Código Civil de 2002 e a CF/88, houve a equiparação entre os filhos, independente se concebido na constância do casamento, união estável ou advindo de uma relação extraconjugal. O argumento principal utilizado pelas pessoas que tem o preconceito com a união homoafetiva é justamente de que geneticamente é impossível dois iguais gerarem filhos, e quando adotam, os mesmos dizem que a criança será influenciada a seguir o caminho dos pais que homossexuais. Ambos os argumentos são falhos, visto que com a evolução constante da medicina, hoje é possível que as próprias mulheres homossexuais gerem seus filhos, e os homens podem optar pela barriga de aluguel. Já para o segundo argumento, isso é completamente impossível, uma vez que o fato de você ser homossexual é sentimento, e não escolha. Uma criança que cresce em lar heterossexual, com uma família que frequenta sempre a igreja e não há contato com homossexuais, e descobre que é homossexual, é inconsistente com essa teoria, pois como o filho seria homossexual se em suas rotinas não há nada que o teria influenciado? Enfim, o preconceito existente na cabeça das pessoas, os leva a acreditarem em coisas inexistentes. 3.1 Barriga de aluguel e Gravidez de substituição No Brasil, não existe uma lei específica que regulamente a doação temporária do útero, porém há regras que se encontram na resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.121/2015, onde é determinado que: “considerando 9 que o pleno do Supremo Tribunal Federal, na sessão de julgamento de 5 de maio de 2011, reconheceu e qualificou como entidade familiar a união estável homoafetiva (ADI 4.277 e ADPF 132) ”. A doadora do útero deve pertencer à família de um dos companheiros em parentescos consanguíneos até o quarto grau, e para quando não o for deve haver a autorização do Conselho Regional de Medicina (CRM). Além disso, a doadora temporária do útero não poderá ter fins lucrativos ou comerciais, há a garantia do registro civil da criança pelos pacientes (pais genéticos), devendo esta documentação ser providenciada durante a gravidez. Mas ainda, o processo pode ser feito por fertilização in vitro ou inseminação artificial, e os pais podem escolher que o óvulo também seja de alguma doadora ou da própria pessoa que servirá de barriga de aluguel. Por fim, é importante salientar que a gravidez de substituição é adotada quando existir um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em casos de união homoafetiva, usando técnicas de reprodução assistida (RA). 3.2 Adoção Muitos casais homossexuais optam por adotar. O Código civil é bem claro em relação ao bem-estar da criança, visa sempre o lar onde puder oferecer uma melhor estrutura psicológica, financeira, estável. Amparados pela Lei nª 12.010/2009, Lei da Adoção, que introduziu modificações na sistemática da adoção, adaptando o Estatuto da Criança e do Adolescente e derrogando o Código Civil na parte referente ao tema, a lei é clara e expressa quanto às condições legais para conseguir-se adotar. Ela em momento nenhum se refere ao gênero do adotante, ou opção sexual, a lei visa sempre o bem-estar da criança, buscando acabar com o fato da criança estar ali, em um local desconhecido para ela, longe de qualquer vínculo familiar o que acaba virando uma tortura psicológica constate para essas crianças. O ECA em seu art. 42 nos traz que: Podem adotar os maiores de 18 anos, independentemente do estado civil, mas deve ser no mínimo, 16 anos mais velhos que o adotando; 10 § 2o Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. E em seu artigo 28, caput, “a família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos da lei”. Portanto, a homoafetividade aos poucos vem adquirindo aceitação social e legal. Com isso, podemos dizer que o melhor lar para a criança a ser adotada que pode ser com qualquer pessoa, seja ela mãe solteira ou um casal homossexual, na teoria é o que se propõe, porém na prática é completamente diferente. A adoção homoafetiva é duramente criticada principalmente pelos religiosos radicais, onde sempre pregam o pecado por esta relação. O primeiro registro de adoção homossexual do mundo foi em 1986, na Califórnia (EUA), por um casal de mulheres e posteriormente a prática foi seguida em diversos países da Europa. No Brasil, o primeiro caso surgiu em 2006, onde o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) admitiu a adoção entre duas pessoas do mesmo sexo, o que só foi confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2010. Somente no ano de 2015, foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a autorização de adoção por um casal homossexual, onde o processo corria desde 2005. Nessa decisão, o STF fundamentou o decisum justamente no bem- estar da criança, onde inclusive menciona que o lugar delas não é em orfanatos, ou nas ruas. Além disso, a mencionada decisão trata da proposição da isonomia entre os casais heterossexuais e os homossexuais. Quando se fala em adoção homoafetiva pensa-se também em como ficará o registro da criança diante de tal situação. Em 2009 tivemos um grande avanço quanto ao aspecto do registro da criança, onde deixou de se ter “pai e mãe” passando a ser “filiação”, abrindo assim caminho para casais do mesmo sexo e garantindo também ao menor todos os direitos sucessórios e patrimoniais, em caso de morte ou separação de um deles. 11 4 DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL Uma vez reconhecido legalmente o casamento ou união estável da relação homossexual, não há do que se falar sobre direitos na dissolução da sociedade conjugal e divisão de bens. Deve-se seguir os mesmos tramites legais previstos no Código Civil de 2002. Mas e quando há a união estável entre casais homossexuais, que dessa relação adquirem bens compartilhados, formam ali sua família e depois resolvem se separar nada amigavelmente? Quem resolve é o Poder Judiciário. A lei 9.278/96 trata justamente da união estável, onde nela resguarda todos os direitos, deveres e obrigações de quem convive com este regime. Logo em seu art. 1º já nos traz quando é que se pode reconhecer a união estável, “é reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”, pode-se notar que nela também contém a expressão homem e mulher. Diante de tal situação, o casal homoafetivo que necessitar desse amparo necessita ingressar com ação judicial para pleitear os direitos diante dessa dissolução conjugal. Cita-se aqui apenas a união estável pois com o casamento homossexual realizado não há do que se expor direitos estes que já são garantidos aos casados perante a lei. O próprio Código Civil já nos traz os moldes que seguirão na dissolução da sociedade conjugal dos homossexuais casados legalmente, seguindo o rol dos elencados no art. 1571, seguindo então as regras do regime adotado na constância do casamento. Para o Direito brasileiro, essas esferas no que tange a decisões extraordinárias quanto a essas matérias relativas à união homossexual são muito recentes. No ano de 2011 a apelação cível 70005488812 sendo julgado no STF, a RE 477554-MG, onde foi a primeira decisão judicial a reconhecer a dissolução entre casais homoafetivos com a determinação de partilha de bens. Em sua decisão o Ministro Celso de Mello cita a “alta relevância social e jurídico-constitucional das questões pertinentes às uniões homoafetivas”. 12 Uma vez reconhecido a união estável entre casais homossexuais, e o casamento realizado legalmente, há precedentes de direito a alimentos, preenchendo os requisitos exigidos pela lei. Houve a concessão de alimentos reconhecida pelo STJ em julgamento pela 4ª Turma pleiteados após o fim da união estável homoafetiva. Com base na ADPF 132 o Ministro relator do STJ, Luis Felipe Salomão julgou o caso reconhecendo assim a existência da união estável homoafetiva e deferindo a favor do autor o direito aos alimentos pleiteados. 5 DIREITO SUCESSÓRIO E PATRIMONIAL O Direito sucessório, embora esteja dentro do Código Civil, não faz distinção entre o casal, a lei é explícita ao mensurar em seus artigos a garantia à sucessão, seja ela testamentária ou legítima. O art. 1829, CC, nos traz a seguinte redação: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; Uma vez reconhecido o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a sucessão legítima não deixa precedentes quanto aos herdeiros e meeiro. Sejam filhos adotados, que tem seus direitos sucessórios garantidos pela lei, ou filhos advindos da concepção natural, em casos de casais de mulheres ou filhos advindos da barriga de aluguel ou gravidez de substituição. Como não há previsão legal, nos casos citados acima respectivamente, deverão ter o reconhecimento judicial. Já para a presença do meeiro e herdeiro, no caso o cônjuge, basta que o casamento ou união estável seja reconhecida judicialmente, pois conforme citado anteriormente no artigo, o cônjuge já faz parte da linha sucessória. Na sucessão testamentária dentro do 50% do valor total de bens do de cujus, ele poderá e dispor do legado da forma que quiser, sendo que os outros 50% 13 pertencerá aos herdeiros necessários que seguem a ordem: I- descendentes; II- ascendentes; III- cônjuge. A sucessão testamentária também segue as mesmas regras já citadas anteriormente quanto ao reconhecimento da união estável, casamento e filhos. 5.1 Na União Estável O Código Civil é expresso em seu artigo 1.790 as condições para concorrerem a herança do de cujus, onde expressa: Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; Recentemente, no dia 10 do mês de maio deste ano (2017), o STF equiparou os direitos sucessórios da união estável homossexual com a do casamento civil, onde a maioria dos Ministros entenderam que em relação à herança, a união estável e o casamento devem ter o mesmo tratamento. Na decisão, o indivíduo homossexual terá direito à metade dos bens do companheiro (a) assim como no casamento, contraditando assim o Código Civil. Vale ressaltar que a decisão equipara o direito à herança dos companheiros que convivem em união estável heterossexual também. 6 DIREITO PREVIDENCIÁRIO O direito de homossexual à pensão por morte do parceiro já foi reconhecido no Brasil. Uma Instrução Normativa do INSS confere tratamento isonômico na sociedade de fato entre heterossexuais com a estabelecida entre homossexuais, inclusive a Receita Federal já admitiu ao casal declarar o companheiro como dependente, para fins de dedução do imposto. 14 A Lei dos Benefícios nº 8213/91, traz que o segurado tem um conjunto de dependentes, onde é necessário a observância de uma ordem de classes. O art. 16 assim estabelece: São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, o companheiro, a companheira e o filho não emancipado de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválidos ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absolta o relativamente incapaz, assim declarada judicialmente; II - Os pais; III - O irmão não emancipado de qualquer condição, menor de 21(vinte e m) anos o invalido o que tenha deficiência intelectual o mental que o torne absolta o relativamente incapaz, assim declarada judicialmente. A lei de benefícios equipara a união estável, pois homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, e, portanto, ambos têm direito a pensão por morte deixada por seus respectivos parceiros ainda que em união estável homossexual. Em ação civil pública n° 2000.71.00.009347-0 ajuizada na cidade de Porto Alegre, na 3° Vara Previdenciária, entendeu-se que o companheiro ou a companheira homossexual deveria ser considerado dependente preferencial, dentro do inciso I, art. 16 da Lei de Benefícios, nº 8213/91, determinando tal decisão ao INSS para que passasse a cumprir-se em âmbito nacional, fundamentada no princípio da dignidade da pessoa humana garantido pela CF/88 em seu artigo 1º. A decisão inclusive reconheceu a inconstitucionalidade do art. 16, § 3º da lei 8213/91: São beneficiários do RGPS, na condição de dependentes do segurado: 3° Considera-se companheiro ou companheira a pessoa que sem ser casada, mantem união estável com o segurado, de acordo com o § 3° do artigo 226 da Constituição Federal. Que a partir de então, foi editada a instrução normativa nº 25 que estabelece o procedimento a ser adotado para que se tenha a concessão do benefício para casais do mesmo sexo. 7 CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS EM GERAL Como já mencionado anteriormente no trabalho, não existe em nosso ordenamento uma lei que legalize a união homoafetiva no aspecto civil, porém a Lei 15 11.340/06 a Lei Maria da Penha, que tem caráter híbrido, trata-se da temática em questão. Ela é a única lei do nosso ordenamento onde são expressos seus aspectos e consequências jurídicas de forma clara e direta a todos os sexos, esclarecendo que, sem distinção de opção sexual, a sanção, direitos e garantias são os mesmos. Logo em seu artigo 2º nos traz: Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. E ainda continua no art. 5º, parágrafo único, “as relações pessoais enunciadas nesse artigo independem de orientação sexual”, o que garante que a agressão por mais que advinha da companheira convivente do mesmo sexo, se houver a agressão haverá a sanção na mesma forma. A agressão não se caracteriza apenas pelo fato de ser o homem a agredir, mas sim pelo fato da agressão advir do lar, onde deve-se ser família, seja ela formada conforme cada um interprete como sua vontade. Este lar pode ser formado apenas por filhos, avós, avôs, tios, irmãos, maridos, esposas, companheiros ou companheiras, caracterizando ali essa agressão entre alguns deles física, psicológica etc, não há do que se falar em não enquadramento à referida lei. Contudo, ainda nesse aspecto meramente penal, não podemos ficar restritos apenas a Lei Maria da Penha, apesar de ser a única a nos trazer a redação específica. Recentemente, no mês de março, um Juiz da Comarca de São Luis de Montes Belos – GO, a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil, a OAB, decidiu permitir a visita íntima a um preso homossexual da cidade. O pedido judicial surgiu após a recusa do diretor da unidade prisional em liberar a visita íntima do companheiro de um detento por questões de segurança. O Juiz por sua vez em sua decisão alegou a violação aos direitos humanos e destacou ainda que “trata-se medida positiva ao processo de 16 ressocialização, uma vez que conduz à manutenção dos laços afetivos que unem à família e amigos”. O Art. 41 da Lei de Execução Penal garante aos detentos o direito a visita do cônjuge, companheira, parentes e amigos em dias determinados, ou seja, a lei não caracteriza o gênero a visitar. CONCLUSÃO Este artigo visou destacar que, apesar do tema já ser bem discutido em todos os meios existentes, ainda há um descaso quanto à legalização desses direitos. Por mais que exista diversos julgados em relação aos assuntos abordados, pode-se perceber que não há o efeito erga ommes nesses aspectos. Tudo o que se refere à vida afetiva do homossexual, caso ele construa uma família, as consequências derivadas dessa união deverão ser reconhecidas judicialmente, onde entende-se que não seria necessária tal situação, já que a Carta Magna do Brasil garante a todos em seu art. 5º, que todos são iguais perante a lei. Tudo é meramente ideológico e contraditório, o Poder Constituinte vem “remendando” as leis, tentando resolver o problema individualmente, onde é necessário resolver no caráter geral. Cada um tem o direito que fazer suas próprias escolhas, em terem que pedir permissão judicial para serem tratados iguais. Portanto, é importante destacar que com a aprovação da PLS 612/2013 não há do que se discutir a respeito, haverá assim o reconhecimento do casamento homossexual legalizado, o que sucessivamente garantirá os demais direitos e obrigações. Enquanto não chega esse dia, em meio a crises políticas, pensamentos expostos que causam ainda mais discussões desnecessárias e desrespeitosas, o que se espera é o devido respeito quanto às suas escolhas, pois o mundo justo é aquele onde a justiça prevalece sob a imposição da vontade de muitos. 17 REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RECURSO ESPECIAL Nº 1.026.981 - RJ (2008⁄0025171-7) Relatora: Ministra Nancy Andrighi; Recorrente: Severino Galdino Belo; Advogado: Roberto Augusto Lopes Gonçalves e outro (s); Recorrido: Caixa de Previdência dos funcionários do Banco do Brasil Previ; Advogado: Lise Chomaker Maurel e outro (s). DIAS, Maria Berenice – Manual de Direito de família, REVISTA DOS TRIBUNAIS, 10º Edição Revisada, editada e atualizada. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 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