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310 Nutrição Brasil - setembro/outubro 2011;10(5) REVISÃO Atividade antioxidante do açaí Antioxidant activity of açaí Fernanda Sarmento Rolla Bernaud*, Cláudia Funchal, D.Sc.** *Bacharel em Nutrição, graduada pelo Centro Universitário Metodista do IPA, **Farmacêutica e Bioquímica, Professora do Centro Universitário Metodista do IPA Resumo O excesso na produção de radicais livres no organismo pode conduzir a diversas formas de dano celular, tais como peroxidação de lipídios de membrana, agressão às proteínas dos tecidos e membranas, às enzimas e DNA, desencadeando inúmeras doenças. Para combater ou prevenir estes prejuízos, o organismo conta com defesas antioxidantes produzidas endo- genamente ou fornecidas através da dieta. A ingestão de alimentos ricos em polifenóis, em especial a classe dos flavonóides, tem sido associada com o baixo risco no desenvolvimento de muitas doenças, incluindo câncer e doenças neurodegenerativas como a Doença de Parkinson e a Doença de Alzheimer. O fruto da Euterpe oleracea Mart., conhecido como açaí, contém quantidades significativas de uma classe distinta de flavonóides, as antocianinas, o que atribui propriedades antioxidantes a esse fruto. O objetivo do nosso estudo foi realizar uma extensa revisão da literatura sobre as propriedades antioxidantes do açaí. Palavras-chave: Euterpe oleracea Mart, açaí, antioxidante. Abstract The excess production of free radicals in the body can lead to various forms of cellular damage such as peroxidation of membrane lipids, proteins aggression of tissues and membranes, enzymes and DNA, causing numerous diseases. To combat or prevent these losses, the organism has antioxidant defenses produced endogenously or provided through diet. The intake of foods rich in polyphenols, especially the class of flavonoids, has been associated with lower risk of developing many diseases including cancer and neurodegenerative diseases like Parkinson’s and Alzheimer’s disease. The fruit of Euterpe oleracea Mart., known as acai, contains significant amounts of a distinct class of flavonoids, the anthocyanins, which gives antioxidant properties to this fruit. The aim of our study was to conduct an extensive review of the literature on the antioxidant properties of acai. Key-words: Euterpe oleracea Mart, acai, antioxidant. Recebido 29 de abril de 2011; aceito 15 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Dra. Cláudia Funchal, Rede Metodista de Educação do Sul, Centro Universitário Metodista do IPA, Rua Cel Joaquim Pedro Salgado, 80, 90420-060 Porto Alegre RS, Tel: (51) 3316 1233, E-mail: claudia. funchal@metodistadosul.edu.br 311Nutrição Brasil - setembro/outubro 2011;10(5) Introdução Espécies reativas, radicais livres, estresse oxi- dativo e antioxidantes são termos frequentemente encontrados nas discussões científicas que buscam os mecanismos que desencadeiam algumas patologias [1]. Vários estudos demonstraram que o excesso de espécies reativas no organismo pode conduzir a diver- sas formas de dano celular, tais como peroxidação de lipídios de membrana, agressão às proteínas dos tecidos e membranas, às enzimas e DNA, desencadeando inúmeras doenças [2]. Portanto, as espécies reativas encontram-se relacionadas com diversas patologias, tais como artrite, catarata, câncer, AIDS, doenças do coração e disfunções cognitivas, podendo ser a causa ou o fator agravante do quadro geral [3]. Para combater ou prevenir os prejuízos causados pelos radicais livres e/ou espécies reativas o organis- mo conta com defesas antioxidantes, que podem ser produzidas endogenamente ou fornecidas através da dieta. O desequilíbrio entre o excesso na produção destas moléculas altamente reativas, e a velocidade de remoção pelo sistema de defesa antioxidante, caracte- riza o estresse oxidativo [4]. Estudos epidemiológicos referem que dietas ricas em polifenóis têm sido associadas com o baixo risco no desenvolvimento de muitas doenças, incluindo câncer e doenças neurodegenerativas como a Doença de Parkinson e a Doença de Alzheimer [5]. A ação antioxidante destas substâncias, principalmente a classe dos flavonóides presentes em frutas e vegetais, pode ser um dos fatores envolvidos com o baixo risco para desencadear estas patologias [6]. O fruto da Euterpe oleracea Mart., conhecido como açaí, contém quantidades significativas de uma classe distinta de flavonóides – as antocianinas, o que atribui propriedades antioxidantes a esse fruto [7]. A composição fitoquímica, nutricional e a ação antio- xidante do açaí tem sido objeto de diversos estudos internacionais [8], conforme indicado na Tabela I. Portanto, o objetivo do nosso estudo foi realizar uma extensa revisão da literatura sobre as propriedades an- tioxidantes do açaí. A consulta baseou-se em bases de banco de dados de artigos científicos como Pubmed, Science Direct, Scopus e Scielo. Também foram utili- zados livros e a busca de dados foi limitada na língua inglesa e portuguesa e os artigos analisados foram selecionados por apresentarem grande pertinência ao tema. Radicais livres, estresse oxidativo e antioxidantes Halliwell e Gutteridge [4] definem radical livre como sendo qualquer espécie química com existência independente, que contenha um ou mais elétrons não pareados nos orbitais externos. Este não-emparelha- mento de elétrons da última camada é que confere alta reatividade a estes átomos ou moléculas [9]. Os radicais livres são formados em um cenário de reações de óxido-redução, isto é, doam o elétron solitário, oxidando-se, ou recebem outro, reduzindo- se [9]. Quando o elétron desemparelhado encontra-se nos átomos de oxigênio ou nitrogênio ele recebe a denominação de espécie reativa de oxigênio (ERO) ou espécie reativa de nitrogênio (ERN). Estas reações ocorrem naturalmente ou por alguma disfunção bio- lógica [4,10,11]. No organismo, os radicais livres encontram-se envolvidos na produção de energia, fagocitose, regu- lação do crescimento celular, sinalização intercelular e síntese de substâncias biológicas importantes, como na defesa contra a infecção quando os neutrófilos são estimulados pela bactéria a produzir espécies reativas para destruir o microorganismo [2,12,13]. No metabolismo aeróbico, o oxigênio é utilizado para oxidar carbono e hidrogênio, substratos impor- tantes presentes nos alimentos, como forma de obter a energia essencial à vida, resultando na formação de água. Durante este processo ocorre redução do oxigênio e a formação de intermediários reativos como os radicais superóxido (O2 •–), hidroperoxila (HO2 •–) e hidroxila (•OH–), e o peróxido de hidrogênio (H2O2) [14]. Tabela I - Propriedades do açaí. Parte do fruto estudada Propriedades Referência Polpa liofilizada Valor energético = 489 kcal/100g Menezes et al. [35] Polpa Antioxidante Pozo-Insfran et al. [39] Polpa Antiproliferativo celular Hogan et al. [45] Óleo Antidiarréico Plotkin e Balick [33] Polpa (2% peso seco) Hipocolesterolêmico Oliveira de Souza et al. [52] Polpa Regula atividade enzimática, modula receptores de núcleo e expressão gênica Seeram [51] Óleo Aplicação na culinária, suplementos e Indústria cos- mética Pacheco-Palencia et al. [53] Polpa liofilizada Inibidor de mediadores inflamatórios COX-1 e COX -2 Schauss et al. [29] 312 Nutrição Brasil - setembro/outubro 2011;10(5) Embora certos níveis de ERO e ERN estejam envolvidos na regulação de processos fisiológicos, o excesso na produção destes compostos leva à superes- timulação de algumas vias intracelulares, o que geralmente associa-se ao aparecimento de eventos como o envelhecimento e diversas patologias como o câncer, aterosclerose, artrite reumatóide e doenças auto-imunes [15]. Além disso, a própria natureza reativa destas espécies provoca modificações em biomoléculas, acar- retando alteraçõesem suas estruturas e funções. Entre os efeitos prejudiciais mais relevantes encontram-se a peroxidação dos lipídios de membrana e a agressão às proteínas dos tecidos e das membranas, às enzimas, carboidratos e DNA [2,4,15]. De forma simplificada, o mecanismo que melhor explica a toxicidade das espécies reativas ocorre como efeito cascata. Na busca ao elétron estabilizador, as ERO e ERN chocam-se com moléculas vizinhas, dispostas em cadeia, gerando moléculas menores, cada uma delas com um radical livre, e assim sucessi- vamente, lesando diferentes estruturas celulares [4]. Neste contexto, o estresse oxidativo é caracteri- zado como o desequilíbrio entre a produção de ERO e ERN e a remoção destas espécies reativas pelos sistemas de defesa antioxidante, o que pode causar danos a diversos tecidos [4]. Além disso, os prejuízos causados pelo estresse oxidativo podem variar de um indivíduo para o outro, de acordo com a idade, estado fisiológico e dieta [16]. Em vista dos prejuízos provenientes do excesso de ERO e ERN, as células dispõem de uma variedade de mecanismos de defesa antioxidante para combater os danos causados por estas espécies [17]. Este conjunto de mecanismos caracteriza o sistema de defesa antio- xidante, o qual é formado por compostos enzimáticos e não-enzimáticos, produzidos endogenamente ou absorvidos através da dieta [4] (Figura 1). É importante salientar que os antioxidantes são substâncias presentes em concentrações baixas comparadas às concentrações do substrato oxidável, que previnem ou regeneram significativamente a oxidação destes substratos [4]. Figura 1 - Sistema de defesa antioxidante. O sistema de defesa antioxidante enzimático é composto por enzimas como: superóxido dismutase (SOD), glutationa peroxidase (GPx) e catalase (CAT). Dos componentes não-enzimáticos das defesas antio- xidantes, destacam-se as vitaminas E (α-tocoferol), Vitamina C (ácido ascórbico), alguns minerais como zinco e selênio, compostos bioflavonóides e a gluta- tiona reduzida (GSH) [18] (Figura 1). O sistema de defesa pode atuar em duas linhas. Uma delas atua como detoxificadora do agente antes que ele cause lesão. É constituída pela GSH, SOD, CAT, GPx e α-tocoferol. A outra linha de defesa tem a função de reparar a lesão ocorrida, sendo constitu- ída principalmente pela glutationa-redutase e ácido ascórbico. Com exceção do α-tocoferol, que é um antioxidante estrutural da membrana, a maior parte dos agentes antioxidantes está no meio intracelular [19,20]. Dentre os antioxidantes biológicos de baixo peso molecular encontram-se os carotenóides, a bilir- rubina, a ubiquinona e o ácido úrico. Porém, as mais importantes micromoléculas no combate ao estresse oxidativo são as vitaminas α-tocoferol [21] e ácido ascórbico [22]. Na década de 90, estudos já indicavam os benefícios na ingestão de antioxidantes na manu- tenção da saúde e prevenção de doenças causadas pelo estresse oxidativo [23]. Entretanto, alguns antioxidantes artificiais tais como butylated hydro- xyanisole (BHA) e butylated hydroxytoluene (BHT) demonstraram efeitos tóxicos dose-dependente, além de significativo aumento de DNA, sugerindo a estimulação do processo mitótico [24,25]. Segundo Rodrigues et al. [26] a demanda por antioxidantes seguros e alternativos de fontes naturais vem cres- cendo no mundo inteiro. Açaí A espécie vegetal Euterpe oleracea Mart, popu- larmente conhecida como açaizeiro ou açaí, ocorre de forma espontânea na região amazônica, amplamente distribuída na floresta de várzea no estuário amazônico, estendendo-se até Venezuela e Guianas [27]. O açaí, fruto da palmeira do açaizeiro, tem recebido muita atenção nos últimos anos, devido aos benefícios à saúde associado com a alta capacidade antioxidante e composição fitoquímica [26,28-30]. O açaí vem ganhando novos mercados desde a década de 90, devido principalmente ao seu elevado valor nutricional. No entanto, seu consumo não ocorre na forma in natura, mas principalmente como polpa, devendo o fruto ser submetido a um processo de extração [31]. SISTEMA DE DEFESA ANTIOXIDANTE ANTIOXIDANTE NÃO ENZIMÁTICOS ANTIOXIDANTE ENZIMÁTICOS ENDÓGENOS Glutationa Proteínas Minerais Co-enzimas EXÓGENOS Ácido ascóbico α-tocoferol Flavonóides Carotenódes Superóxido dismutase (SOD) Catalase (CAT) Clutationa peroxidade (GPx) Glutationa redutase (GR) Glutationa transferase (GST) 313Nutrição Brasil - setembro/outubro 2011;10(5) Dados registrados pelo IBGE apontam que a produção nacional de frutos ou coquilhos de espécimes nativos da palmeira açaí, em 2007, totalizou 108.033 toneladas, sendo 6,6% maior que a de 2006. O principal produtor é o Estado do Pará que, na temporada 2007, concentrou 86,8% da produção nacional [32]. Além de ser economicamente viável, diferentes partes desta planta foram utilizadas pelos nativos da região como medicina alternativa. Como exemplo, estudos antigos já referiam a utilização do óleo verde escuro extraído da Euterpe oleracea Martius, utilizado na medicina rural, principalmente como agente antidiarréico [33]. No fim da década de 90, o açaí deixou de ser apenas uma fruta exótica da Amazônia e conquistou adeptos em todas as regiões do Brasil, principalmente esportistas e praticantes de atividade física [34]. O valor nutricional da polpa do açaí foi objeto de estudo de alguns pesquisadores do Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Resultados de determinações analíticas mostraram que a polpa do açaí liofilizada constitui um alimento altamente calórico (489,39 kcal/100g), prin- cipalmente pelo elevado conteúdo lipídico (40,75%) dos quais 52,70% representados pelo ácido oléico (ômega 9) e 25,56% pelo ácido palmítico. Os carboi- dratos totais somam 42,53% e o teor de proteínas é de 8,13 g, por 100 g de polpa liofilizada. Os minerais observados em maior abundância foram potássio (900 mg), cálcio (330 mg) e magnésio (124,4 mg) em 100g de polpa liofilizada [35]. O açaí tem importância socioeconômica devido não só à sua relevância na alimentação da população ribeirinha e de mais baixa renda, mas também por seu potencial de aproveitamento [36]. Dos frutos se extrai a polpa e subprodutos, o caroço pode ser apro- veitado no artesanato, como adubo orgânico e fonte de antioxidantes, o caule para obtenção do palmito, as folhas para cobrir as casas dos habitantes do interior da região e ainda os estipes adultos podem ser apro- veitados para pasta e polpa de celulose pela indústria de papel [31,37]. Estudos sinalizam que atenção especial vem sendo dada para a propriedade antioxidante do fruto do açaí com possibilidades do mesmo compor o gru- po dos “alimentos funcionais” [6,28,38]. Além disso, alguns pesquisadores têm estudado as propriedades físico-químicas da polpa e apontam para um poten- cial antioxidante apreciável em função de sua rica composição em compostos fenólicos, em especial as antocianinas (ACNs) [30,39]. Açaí como antioxidante O crescente interesse dos consumidores por pro- dutos mais saudáveis como frutas e vegetais reflete as evidências de vários estudos científicos que apontam o elevado consumo destes alimentos com efeitos benéfi- cos à saúde como a prevenção de doenças crônicas cuja causa primária está relacionada ao estresse oxidativo, dentre as quais se destacam as doenças neurodege- nerativas, câncer e doenças cardiovasculares [40,41]. Em trabalho recente de Spada et al. [42], foi demonstrado que as frutas, mesmo a polpa congelada, são ricas em carotenóides, ácido ascórbico e compostos fenólicos, o que lhes confere importante atividade antioxidante. Spada et al. [43] determinaram os níveis de minerais de 23 amostras de frutas congeladas pelo método PIXE (Particle Induced Xray). Todas as fru- tas, incluindo a polpa do açaí, apresentaramFe, Mg, Cl, P, K e Na. O açaí apresentou níveis importantes de Fe, sendo observado pelos autores que 100g deste fruto pode contribuir com aproximadamente 7% da Ingestão Diária Recomendada (IDR) para homens. Níveis de Zn encontrados nas polpas congeladas são capazes de suprir cerca de 2% da IDR para homens e 3% para as mulheres. Minerais como Fe, Mn, Cu e Zn são cofatores de várias enzimas e fazem parte do sítio ativo de algumas oxidases e oxigenases [4]. De acordo com Schauss et al. [29], as ACNs, pigmento responsável pela cor violácea do fruto, e outros compostos flavonóides compõem a maioria dos fitoquímicos presentes no açaí, referindo um to- tal de ACNs encontrado de 3,19 mg/g de peso seco. Alguns autores destacam, em pesquisas anteriores, que as ACNs parecem ser os componentes que mais contribuem para ação antioxidante desse fruto [39]. Entretanto, estudos controversos referem que a capa- cidade antioxidante das ACNs, presentes no fruto da Euterpe oleracea Martius, representa apenas 10% da atividade antioxidante do açaí [44]. Extrato rico em antocianinas, gerado a partir do açaí (AEA), foi investigado por suas propriedades antioxidantes e atividade antiproliferativa contra células de glioma C6, células de cérebro de ratos e MDA-468, células humanas de câncer de mama [45]. O estudo indicou que o extrato de açaí rico em ACNs apresentou um valor de ORAC (oxygen radical absor- bance capacity assay) de 2589 μmoles equivalentes de Trolox (TE)/g de pó seco e a atividade de DPPH de TE 1208 μmoles/g, sugerindo uma excepcional fonte de antioxidantes naturais. Os resultados da fragmentação em cascata do DNA indicaram que o extrato induziu a apoptose das células de glioma C6. Os autores não encontraram nenhum efeito supressor contra as células de glioma C6, quando compararam a atividade anti- proliferativa do açaí com outros frutos ricos em ACNs, incluindo mirtilo, morango, framboesa e amora [45]. Alguns autores atribuem ao ânion superóxido a causa da formação de outras espécies reativas tais 314 Nutrição Brasil - setembro/outubro 2011;10(5) como peróxido de hidrogênio, peroxinitrito e radical hidroxila. Por este motivo, o combate à formação do radical superóxido é considerado uma das primeiras li- nhas de defesa celular antioxidante no organismo [46]. As enzimas antioxidantes CAT e SOD representam parte da primeira barreira de defesa celular contra as espécies reativas e são essenciais para a manutenção da saúde e equilíbrio antioxidante das células [47,48,49]. Dados da literatura demonstram importante ação antioxidante da polpa do açaí liofilizada contra o radical superóxido em ensaio com SOD e contra o radical peroxil em ensaios baseados na capacidade de absorbância de espécies reativas através de reações de fluorescência. Além da atividade antioxidante, a polpa do açaí liofilizada demonstrou importante papel como inibidor das enzimas mediadoras de processos inflamatórios COX-1 e COX-2 [46]. Pesquisa reali- zada por Spada e colaboradores (2009) [50] também constataram que o açaí previne a redução na atividade das enzimas CAT e SOD em córtex cerebral, cerebelo e hipocampo de ratos, quando induzido o dano nestes tecidos com o peróxido de hidrogênio. Pacheco-Palencia et al. [30] avaliaram o suco de açaí em dois estágios de clarificação (semi-clarificado e clarificado) e compararam a 100% da polpa, após adicionado ácido ascórbico, com o objetivo de detectar possíveis alterações na composição fitoquímica e ação antioxidante do fruto, quando armazenados em tem- peraturas de 4ºC e 20ºC. O clareamento da polpa do açaí resultou na perda de 27% do total de polifenóis, e 20% no total de ACNs e capacidade antioxidante. A adição de ácido ascórbico induziu a polimerização das ACNs no suco clarificado, levando a retenção dos compostos antioxidantes presentes no suco. O estudo identificou que os produtos armazenados a temperatu- ra de 4ºC apresentaram maior estabilidade para todas as variáveis analisadas [30]. Os benefícios oferecidos pelas substâncias fenóli- cas das berry fruits, nomenclatura atribuída aos frutos que se apresentam em forma de bagas, não se res- tringem apenas à ação antioxidante. Os fitoquímicos presentes nestes frutos regulam atividades enzimáticas do metabolismo, modulam receptores de núcleo e expressão gênica, além de reparar danos oxidativos causados no DNA [51]. Oliveira de Souza et al. [52] investigaram o potencial antioxidante e o efeito hipocolesterolêmico da ingestão da polpa de açaí 2% (peso seco) em ratos alimentados com dieta padrão ou hipercolesterolê- mica durante seis semanas. Os resultados da pesquisa demonstraram que os animais que receberam a dieta hipercolesterolêmica apresentaram aumento nos níveis de colesterol total (CT) e lipoproteína de baixa densi- dade (LDL). A suplementação deste grupo com açaí causou um efeito hipocolesterolêmico, reduzindo os níveis de CT e LDL. Os níveis séricos de carbonilas proteicas e grupos sulfidrilas foram reduzidos nos gru- pos de animais que receberam a dieta padrão e hiper- colesterolêmica quando suplementadas com açaí [52]. Compostos fenólicos presentes nos extratos de óleo bruto do fruto açaí foram identificados pela primeira vez por Pacheco-palencia, Mertens-Talcott e Talcott [53]. A estabilidade do óleo de açaí, contendo três concentrações de compostos fenólicos foi avaliada sob o armazenamento de curto e longo prazo para a oxidação de lipídios e impacto na capacidade antioxi- dante dos compostos fenólicos. Os autores observaram que os compostos fenólicos não foram alterados sig- nificativamente por armazenagem a longo prazo, em temperaturas até 40°C durante 10 semanas nem por aquecimento de curto prazo em temperaturas de até 170°C por 20 min, indicando boa estabilidade destes compostos e propriedades antioxidantes. Devido ao seu alto teor de compostos fenólicos, estabilidade, armazenamento e características sensoriais únicas, o óleo do açaí é considerado uma alternativa promis- sora para os óleos tradicionais utilizados na culinária, suplementos, e aplicações cosméticas [53]. Conclusão A revisão realizada compilou dados dos últimos estudos que tratam o efeito antioxidante do açaí e con- cluiu que os autores são unânimes em atribuir potencial antioxidante ao fruto do açaizeiro, da sua polpa ao óleo extraído. Os estudos indicam que o efeito antioxidante do açaí é quase totalmente atribuído às antocianinas e que a classe destes flavonóides tornara-se destaque por seus efeitos protetores contra muitas doenças, princi- palmente doenças cardiovasculares e câncer. A literatura mostrou que as propriedades dos polifenóis, vitamina C e ação antioxidante é resultado de uma combinação de diferentes compostos em sinergia. Com base nestes dados ficou claro de que é crescente o interesse pelo consumo de alimentos que proporcionem benefícios para saúde humana e nestes merecem destaque as frutas ricas em flavonóides como o açaí. Referências 1. McCord JM. The evolution of free radicals and oxidative stress. The American Journal of Medicine 2000;108:652-9. 2. 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