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In. AFONSO, Maria Lúcia M. (org.). Oficinas em dinâmica de grupo na área da saúde. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. (p. 27-34) 1.1. GRUPOS: O QUE SÃO E COMO SE ORGANIZAM O módulo inicial do nosso curso é dedicado a introduzir o conceito de grupo e a expor seus principais elementos. O objetivo é delimitar nosso tema de estudo, que será aprofundado nos módulos seguintes, tanto em termos de sua fundamentação teórica quanto dos procedimentos metodológicos e técnicos envolvidos na utilização do grupo na área da saúde. 1. O que é GRUPO? Nossa vida cotidiana está organizada em grupos: a família, o grupo de amigos, o grupo de trabalho, e outros. Nos grupos, os sujeitos humanos se reconhecem como participantes de uma sociedade, inseridos em uma teia de relações e papéis sociais, através das quais constróem suas vidas. Neste curso, falaremos dos "pequenos grupos", como os grupos de convivência e os grupos de atendimento, e não dos grandes grupos como a multidão, a classe social ou o conjunto dos moradores de um bairro. Todos os pequenos grupos dos quais participamos têm, cada qual à sua maneira, uma ligação com uma instituição, valores e práticas sociais, que estão presentes no grupo mas que o ultrapassam, enquanto tal. Assim, existem as leis, as normas, as práticas e os costumes para a família, para o mundo do trabalho, para a amizade, para a religião, para a política, etc. E, no entanto, os grupos também têm uma história própria e aspectos particulares. Podemos dizer que todos os grupos têm, ao mesmo tempo, um jeito de ser próprio (uma singularidade) e um pertencimento social pelo qual se fazem similares a outros grupos. "GRUPO" é um conjunto de pessoas unidas entre si porque se colocam objetivos e/ou ideais em comum e se reconhecem interligadas por estes objetivos e/ou ideais. Para estar dentro dessa definição, um "grupo" deve ter "relações face a face", isto é, todos os seus membros se conhecem e se reconhecem unidos no grupo. Por exemplo, pessoas em uma sala de espera de hospital podem até ter o mesmo objetivo, mas não tem um objetivo EM COMUM e nem se percebem INTERLIGADOS. É apenas quando se vêem na condição de agir juntos para alcançar o seu objetivo, por exemplo quando precisam unir-se para uma reivindicação, que essas pessoas passam a constituir um GRUPO. Entretanto, mesmo tendo OBJETIVOS em comum, os participantes do grupo continuam tendo a sua individualidade. Isso significa que o consenso no grupo é sempre fruto de acordos que vão mudando ao longo do tempo, e também que conflitos e divergências fazem parte da vida do grupo, precisando apenas ser trabalhados para se chegar à construção do consenso. Também é preciso lembrar que um grupo pode ter objetivos claros e EXPLÍCITOS bem como outros objetivos IMPLÍCITOS e mesmo INCONSCIENTES. Por exemplo, na escola, um grupo de colegas pode resolver estudar juntos mas, ao mesmo tempo, desejar aprofundar as interações e amizade entre eles. É no processo de constituição do grupo que vai se configurar a sua "dinâmica", que alguns autores chamariam mesmo de "dialética" do grupo. O processo do grupo é justamente o movimento que esse grupo faz ao se constituir enquanto tal. A "DINAMICA DE GRUPO" é a disciplina que estuda os processos grupais. Falamos de uma DINÂMICA INTERNA e de uma DINÂMICA EXTERNA do grupo. Na dinâmica interna, estudamos as características, fases e elementos do processo grupal, ressaltando os fatores que aí interferem - dificultando ou facilitando - esse processo. Na dinâmica externa, estudamos as forças sociais e institucionais que influenciam o processo grupal. Nenhum grupo é resultado apenas de sua dinâmica interna ou apenas de sua dinâmica externa. Existe uma relação entre as dinâmicas interna e externa que pode ter caráter diversificado: atração, rejeição, conflito, espelhamento, complementaridade, entre outros. Os MÉTODOS de trabalho com grupos variam, de acordo com as características e os objetivos dos grupos. Alguns são bem conhecidos, tais como debate, painel, dramatização, reunião, assembléia. Mas, novas metodologias podem surgir para adaptar os grupos necessidades atuais em áreas diversas. É o caso do trabalho em equipe e da Oficina, que serão objeto do nosso curso. 2. ELEMENTOS BÁSICOS DOS GRUPOS É interessante notar que, nas diversas abordagens teóricas do grupo, alguns elementos são constantes, ou, podemos dizer, básicos. A sua interpretação pode variar mas a sua presença no grupo é sempre reconhecida em teorias diversas. Que elementos são esses? Vamos procurar sintetizá-los, de forma didática, em sete itens que poderão ser facilmente reconhecidos e memorizados: 1) Primeiramente, é preciso considerar as razões pelas quais os indivíduos se juntaram em grupo e como esse grupo se relaciona com o seu contexto. Ou seja, que DEMANDA deu origem ao grupo e em que CONTEXTO social e institucional? Esse "nascimento" do grupo marca muito todo o seu processo, 2) Estreitamente ligada à demanda é a definição dos OBJETIVOS do grupo. Quais foram a MOTIVAÇÃO e DESEJOS que os membros buscaram realizar através do seu pertencimento a esse grupo, como por exemplo, o desejo de ter segurança, reconhecimento, afeto, novas experiências, comparar suas experiências, pensar os seus problemas, resolver questões, entre tantos outros. Nesse sentido, podemos considerar, ainda, se o grupo tem objetivos mais voltados para uma dimensão EDUCATIVA ou mais voltados para uma dimensão terapêutica ou CLÍNICA, embora haja sempre alguma co-relação entre essas duas dimensões, como veremos adiante em nosso curso, 3) A demanda e os objetivos estão diretamente ligados à construção de uma IDENTIDADE ou "sentimento de nós" no grupo. Essa IDENTIDADE indica também um grau de coesão - ou, ao contrário, de dispersão - no grupo. Quanto maior a sua INTEGRAÇÃO, mais forte - e rígida - a sua IDENTIDADE. A coesão e a dispersão em graus extremos levam o grupo, respectivamente, ao autoritarismo interno e à desintegração. Assim, é preciso que um grupo saiba construir, junto à sua identidade, um sistema de trocas com outros grupos sociais e uma certa tolerância diante de diferenças internas ao grupo. A identidade do grupo está vinculada também à sua atmosfera ou CLIMA, que diz respeito ao modo de sentir que permeia o grupo como um todo e que caracteriza a sua disposição geral diante dos objetivos que se propôs. Os coordenadores de grupo preocupam-se em favorecer uma atmosfera de aceitação mútua, respeitosa e democrática; 4) No processo de sua constituição, um grupo precisa de se organizar diante de seus objetivos. A ORGANIZAÇÃO do grupo implica na distribuição de papéis e funções entre os participantes, de forma bastante variável. Mas, principalmente, diz respeito à distribuição de PODER e relações de LIDERANÇA no grupo. Ora, não existem, no grupo, relações de poder sem que existam também formas de COOPERAÇÃO, CONFLITO E CONTROLE. Essas relações poderão ser percebidas no grupo através da interação e comunicação entre os participantes, 5) Os padrões de INTERAÇÃO, COMUNICAÇÃO e PARTICIPAÇÃO no grupo dizem muito sobre a capacidade do grupo de enfrentar suas dificuldades e trabalhar por seus objetivos. Quanto menos centralizadas, e mais abertas e democráticas, melhor fluem a comunicação e a participação no grupo. Seguindo esses padrões, vamos nos deparar também com as DIFICULDADES de comunicação, às quais os coordenadores do grupo dedicam uma atenção especial, visando sua superação, 6) A relação entre o grupo, como um todo, e os seus membros, também é objeto de atenção dos coordenadores. De fato, quando se juntam em grupo, os indivíduos manejam um duplo investimento: por um lado, buscam ser reconhecidos pelos seus companheiros como "iguais", isto é, parceiros de um ideal e, por outro lado, querem ser reconhecidos como pessoas únicas, que têm suas particularidades diante do ideal do grupo. Esse duplo investimento caracteriza um movimento próprio de todos os grupos que oscilam entre a GRUPALIZAÇÃO (a ênfase nos vínculos e nos ideais comuns) e a INDIVIDUAÇÃO (a ênfase nas diferenças individuais). Ao invés de ser danosa para o grupo, essa dinâmica entre grupalização e individuação serve de alimento ao seu crescimento bem como ao crescimento dos participantes. É pelo constante desafio de estar junto e se manter único que os participantes do grupo poderão conhecer melhor suas motivações e suas capacidades no grupo. 7) Finalmente, há que se comentar que um grupo não é um conjunto de características estáticas. Todos os seus elementos estão em constante movimento, fortalecendo ou não a sua produtividade, conduzindo ou dificultando o seu crescimento. Assim, é fundamental sempre pensar o grupo como um PROCESSO. O processo grupal inclui a série de movimentos que o grupo faz para alcançar os seus objetivos, trabalhar as suas relações, transformar a sua visão de mundo, promover mudanças nos participantes, e tantas outras dimensões envolvidas. Ou seja, nesse processo, duas grandes referências são delineadas: qual é o grau de AUTONOMIA que o grupo tem e/ou desenvolve? Que ELABORAÇÃO alcança diante de seus objetivos e relações? Além dos elementos acima mencionados, que dizem respeito mais à ESTRUTURA do grupo do que à sua FORMA, podemos considerar algumas características formais ou DESCRITIVAS dos grupos que vêm a influenciar o seu processo e suas relações. Dentre elas, podemos selecionar: o número de participantes ou tamanho do grupo, a rotatividade da participação, a homogeneidade ou heterogeneidade dos participantes e a duração do grupo no tempo. A escolha dessas características na formação de um grupo variará conforme a natureza e o objetivo do grupo. O TAMANHO de um grupo influencia no desenvolvimento do tipo de relações dentro do grupo. Grupos menores propiciam maior cumplicidade entre os participantes mas também menor diversidade de pontos de vista. Muitas vezes, os participantes se apressam a entrar em consenso para defender a mútua satisfação afetiva. Grupos maiores aceitam a diversidade de pontos de vistas e os conflitos com maior presteza. Mas, neles, as trocas emocionais são mais superficiais ou tendem a se limitar aos pequenos grupos. Ao mesmo tempo, podemos lembrar que: o funcionamento democrático do grupo aumenta a possibilidade de expressão de diferentes pontos de vista, mesmo nos grupos pequenos e que grupos grandes mas com um funcionamento autoritário podem coibir as diferenças internas e enfatizar as trocas emocionais dentro de um padrão mais rígido e repetitivo. Assim, não se trata de dizer qual o melhor tamanho de grupo mas, sim, de se perguntar, em cada caso, qual tamanho de grupo é melhor para uma dada proposta de trabalho. Para os trabalhos que envolvem reflexão e criatividade, e em especial quando existe um grau maior de integração afetiva no grupo, a literatura da área tem recomendado grupos de 5 a 8 participantes. Grupos até 12 participantes demonstram maior integração e tendência ao consenso. Quando uma dimensão educativa é também almejada, ou quando os objetivos do grupo estão limitados a uma intervenção focalizada, esse número pode subir um pouco, digamos, para 15 participantes. Esses números são como uma ESTIMATIVA de qualidade que servem para dar uma referência aos coordenadores de grupo. Mas, não têm e nem poderiam ter o peso de uma fórmula matemática, pois diversos fatores interferem na produtividade de um grupo. O grupo pode ser "FECHADO", quando a rotatividade dos participantes é zero ou pequena, ou "ABERTO" quando se admite a entrada e saída de novos membros ao longo do processo. Uma rotatividade alta prejudica a formação de vínculos entre os participantes mas uma rotatividade nula pode ser por demais rígida. Quando o grupo trata de questões mais conflitivas ou emocionalmente mobilizadoras, por exemplo, um grupo de pacientes com câncer, é mais difícil lidar com a rotatividade dos participantes. Mas um grupo que tem um caráter mais preventivo e educativo pode até achar interessante acolher novos membros e suportar a saída de outros. Por exemplo, um grupo de gestantes com diabetes pode funcionar em uma estrutura aberta, permitindo a saída e chegada de novos membros dependendo de sua inserção no acompanhamento pré-natal. O raciocínio acima pode ser empregado para as outras características dos grupos. A HOMOGENEIDADE pode ser produtiva e assim também a HETEROGENEIDADE, dependendo das possibilidades de sua expressão, comparabilidade e de seu aproveitamento no grupo. Alguns grupos podem se beneficiar mais da homogeneidade, por exemplo, grupos de pacientes onde todos têm o mesmo problema de saúde. Outros se beneficiam da heterogeneidade, assim como os grupos de criatividade em uma sala de aula. Podemos dizer que, examinando as características dos participantes, haverá sempre um certo grau ou tipo de homogeneidade e um certo grau ou tipo de heterogeneidade. A DURAÇÃO do grupo no tempo, que pode ser pensada tanto em termos de número de encontros quanto de extensão desses encontros ao longo de um período dado, é um fator importante para se avaliar as possibilidades de aprofundamento de trabalho nesse grupo. Também existe uma grande variação nesse aspecto. Podemos dizer que quanto mais um grupo estende o seu trabalho no tempo ou intensifica os seus encontros, mais possibilidades terá de aprofundamento em suas reflexões e interações. Assim, um grupo de apoio para pacientes com depressão provavelmente precisará de uma maior extensão no tempo do que um grupo de prevenção, educativa, do câncer de mama. Não precisamos manter uma atitude do tipo "ou oito ou oitenta", isto é, ou o grupo é rápido e meramente educativo ou é do tipo terapêutico e não terá tempo definido para acabar. Mas, precisamos, sim, adequar a nossa proposta de tempo de funcionamento do grupo aos objetivos e tipo de participantes. Mais uma vez, não existe receita, mas critérios variáveis com a proposta do grupo. Ao formar um grupo na área da saúde, os coordenadores examinam esses critérios, avaliam a sua pertinência e propõem uma dada forma de funcionamento. Veremos que, para se propor um trabalho com grupos, precisamos de uma teoria ou MODELO DE INTERPRETAÇÃO dos elementos acima citados bem como de uma METODOLOGIA de trabalho. Esses tópicos serão abordados em nosso curso, em diferentes módulos.
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