Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 1 Concursos de Crimes 1. Definição: Ocorre quando um ou mais agentes, por meio de uma ou mais ações ou omissões prática dois ou mais delitos, sejam eles idênticos ou não. 1.1. Conceito Concurso de crimes é o instituto que se verifica quando o agente, mediante uma ou várias condutas, pratica duas ou mais infrações penais. Pode haver, portanto, unidade ou pluralidade de condutas. Sempre serão cometidas, contudo, duas ou mais infrações penais. 1.2. Espécies O concurso de crimes pode se manifestar sob três formas: concurso material, concurso formal e crime continuado. 1.3. Sistemas de Aplicação da Pena no Concurso de Crimes Destacam-se, no Brasil, três sistemas de aplicação da pena no concurso de infrações penais: cúmulo material, exasperação e absorção. Passemos à análise de cada um deles. 1.3.1. Sistema do cúmulo material (ou acumulação material) Aplica-se ao réu o somatório das penas de cada uma das infrações penais pelas quais foi condenado. Esse sistema foi adotado em relação ao concurso material (art. 69), ao concurso formal imperfeito ou impróprio (art. 70, caput, 2ª parte), e, pelo texto da lei, ao concurso das penas de multa (art. 72). O concurso material vale-se do sistema da cumulação material para a fixação da pena ao agente que, tendo praticado mais de uma ação ou omissão, cometeu dois ou mais crimes. Entretanto, o sistema que impõe a acumulação (soma) de penas também está presente em outras hipóteses, quando expressamente recomendada a sua utilização pela lei. É o que ocorre nos casos dos tipos penais prevendo a aplicação de determinada pena, além de outra, advinda da violência praticada em conjunto. Por exemplo, o disposto no art. 344 do CP (coação no curso do processo), estipulando a pena de 1 a 4 anos de reclusão, e Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 2 multa, „além da pena correspondente à violência‟. O juiz utiliza a regra do „concurso material‟ (soma das penas), ainda que tenha havido uma única ação. Coação no curso do processo Art. 344 – Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Outro exemplo pode ser encontrado nos delitos previstos no art. 161 (alteração de limites, usurpação de águas e esbulho possessório “invasão de bem imóvel alheio”), conforme prevê o § 2° (“se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada”). Alteração de limites Art. 161. Suprimir ou deslocar tapume, marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia. Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa. § 1°. Na mesma pena incorre quem: Usurpação de água I – desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias; Esbulho possessório II – invade com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório. § 2°. Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada. Assim, o concurso material ocorre quando o agente mediante mais de uma conduta (ação ou omissão) pratica dois ou mais crimes idênticos ou não. Exemplo: Fulano, armado com um revolver, atira em Cicrano e depois atira em Beltrano, ambos morrem. Neste exemplo, há duas condutas e dois resultados idênticos. Quando os resultados são idênticos, Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 3 utiliza-se o termo homogêneo e quando os resultados são diversos utiliza-se o termo heterogêneo. No concurso material, o agente deve ser punido pela soma das penas privativas de liberdade. Guilherme Nucci explica quanto ao critério para a aplicação da pena “torna-se imprescindível que o juiz, para proceder à soma das penas, individualize, antes cada uma. Ex.: três tentativas de homicídio em concurso material. O magistrado deve, em primeiro lugar, aplicar a pena para cada uma delas e, no final, efetuar a adição” Obs.: Importante observar que se houver a soma das penas antes da individualização ocorrerá à inobservância do princípio da individualização da pena, e consequentemente a anulação da sentença. No caso da sentença cumular pena de reclusão e detenção, aquela deverá ser cumprida primeiramente. Em relação ao juiz competente para aplicar a regra do concurso material, Fernando Capez explica que “se houver conexão entre os delitos com a respectiva unidade processual, a regra do concurso material é aplicada pelo próprio juiz sentenciante. Em não havendo conexão entre os diversos delitos, que são objeto de diversas ações penais, a regra do concurso material é aplicada pelo juízo da execução, uma vez que, com o trânsito em julgado, todas as condenações são reunidas na mesma execução, momento em que as penas serão somadas (LEP, art. 66, III, a)”. Art. 66, LEP. Compete ao Juiz da execução: [...] III - decidir sobre: [...] a) soma ou unificação de penas; [...] 1.3.2. Sistema da exasperação Aplica-se somente a pena da infração penal mais grave praticada pelo agente, aumentada de determinado percentual (1/6 até metade). É o sistema acolhido em relação ao Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 4 concurso formal próprio ou perfeito (art. 70, caput, 1ª parte) e ao crime continuado (art. 71). O sistema da exasperação da pena é o critério que permite, quando o agente pratica mais de um crime, a fixação de somente uma das penas, mas acrescida de uma cota-parte que sirva para representar a punição por todos eles. Trata-se de um sistema benéfico ao acusado e adotado, no Brasil, nos arts. 70 (concurso formal) e 71 (crime continuado). 1.3.3. Sistema da absorção (obs.: não adotamos este sistema expressamente aqui no Brasil, mas há casos em que a jurisprudência, levando em conta o critério da consunção (absorção) o autoriza). Aplica-se exclusivamente a pena da infração penal mais grave, dentre as diversas praticadas pelo agente, sem qualquer aumento. Esse sistema foi consagrado pela jurisprudência em relação aos crimes falimentares praticados pelo falido, sob a égide do Decreto-lei 7.661/1945, em virtude do princípio da unidade dos crimes falimentares. Isso, porém, não impedia o concurso material ou formal entre um crime falimentar e outro delito comum. Com a entrada em vigor da Lei 11.101/2005 (nova Lei de Falência), a situação deve ser mantida, mas ainda não há jurisprudência consolidada sobre o assunto. O sistema da absorção leva em consideração que, no caso de concurso de crimes, possa haver a fixação da pena com base apenas na mais grave, restando absorvidas as demais. Não adotamos esse sistema expressamente, mas há casos em que a jurisprudência, levando em conta o critério da consunção (absorção), no conflito aparente de normas, termina por determinar que o crime mais grave, normalmente o crime-fim, absorve o menos grave, o denominado crime-meio, por exemplo,art. 12 do CP. Evita-se, com isso, a soma de penas. Art. 12. A regra geral deste Código aplica-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso. Critério da absorção (consunção): quando o fato previsto por uma lei está previsto em outra de maior amplitude, aplica-se somente esta última. Em outras palavras, quando a infração prevista na primeira norma constituir simples fase de realização da segunda infração, prevista em dispositivo diverso, deve-se aplicar apenas a última. Trata-se da hipótese do crime-meio e do crime-fim. Ocorre a consunção quando determinado tipo penal absorve o desvalor de outro, excluindo-se este da sua função punitiva. A consunção provoca o esvaziamento de uma das Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 5 normas, que desaparece subsumida pela outra. É o que se dá, por exemplo, no tocante à violação de domicílio com a finalidade de praticar furto a uma residência. A violação é mera fase de execução do delito patrimonial. O crime de homicídio, por sua vez, absorve o porte ilegal de arma, pois essa infração penal constitui-se simples meio para a eliminação da vítima. O estelionato absorve o falso, fase de execução do primeiro (nesse caso, o disposto na Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvida”). Sob outro ponto de vista: TRF4: “À luz do princípio da consunção, quando um delito apresentar-se como meio para realização de outro, o crime-meio resta absorvido pelo crime-fim. Todavia, nas hipóteses em que o crime-meio estabelecer penas mais graves que o crime-fim, este restará absorvido por aquele.” (Ap. Crim. 0001329-17.2005.404.7116-RS, 8ª T., v.u., rel. Artur César de Souza, 10.02.2011, v.u.). A diferença fundamental entre o critério da consunção e o da subsidiariedade é que, neste último caso, um tipo está contido dentro de outro (a lesão corporal está incluída necessariamente no crime de homicídio, pois ninguém consegue tirar a vida de outrem sem lesioná-lo). Enquanto na outra hipótese (consunção) é o fato que está contido em outro de maior amplitude, permitindo uma única tipificação (o homicídio absorve o porte ilegal de arma porque a vítima perdeu a vida em razão dos tiros disparados pelo revólver do agente, o que demonstra estar o fato – portar ilegalmente uma arma – em outro de maior alcance – tirar a vida ferindo a integridade física de alguém). Ocorre que é possível matar alguém sem dar tiros, isto é, sem portar ilegalmente uma arma. Assim, a consunção envolve fatos que absorvem fatos, enquanto a subsidiariedade abrange tipos que, de algum modo, contêm outros. Outro exemplo: STJ: “Em razão do princípio da consunção, a lesão corporal culposa no trânsito (art. 303 do CTB) absorve o delito de dirigir sem habilitação (art. 309 do CTB), em face da menor lesividade do último” (HC 25.084-SP, 5ª T., rel. Jorge Scartezzini, 18.05.2004). Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de „seis meses a dois anos‟ e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 6 Art. 309. Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano: Penas - detenção, de „seis meses a um ano‟, ou multa. Portanto, são requisitos do concurso material de crimes: a pluralidade de condutas e a pluralidade de resultados. Exemplo de concurso material Ex: “X” decide roubar “Y” em um beco escuro. Após subtrair, com grave ameaça, a bolsa, “X” resolve estuprar “Y”. Haverá concurso de crimes, considerando que houve a prática de dois crimes (roubo e estupro). Esses dois crimes foram praticados com duas condutas. O concurso material pode ser homogêneo ou heterogêneo. Será homogêneo o concurso material de crimes se estes forem da mesma espécie. Por outro lado, constata-se um concurso material heterogêneo se os crimes são de espécies distintas. Vale lembrar que há discussão sobre o que se consideram crimes da mesma espécie. Sobre o assunto „prepondera na doutrina‟ o entendimento de que crimes da mesma espécie „são os previstos no mesmo tipo legal‟, não importando se um delito é simples e o outro qualificado ou se um é consumado e o outro tentado. Frise-se, entretanto, existir „corrente minoritária‟ de acordo com a qual, para a identificação de crimes da mesma espécie, leva-se em conta o bem jurídico afetado. O STF ao se manifestar no julgamento do HC 97057-RS, relatado pelo Ministro Gilmar Mendes, fixou entendimento de que os crimes de roubo e furto (embora protejam o mesmo bem jurídico – patrimônio) não são da mesma espécie. Comentários: Há dois critérios clássicos (pelo menos) sobre o assunto: a) são crimes da mesma espécie os previstos no mesmo dispositivo legal; (corrente majoritária) Concurso Material produzem 2 ou mais criemes Sistema do Cúmulo Material (Penas somadas) Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 7 b) são crimes da mesma espécie os que afetam o mesmo bem jurídico. A primeira corrente é ‘legalista e formalista’. A segunda é ‘substancialista’ Preponderou no julgamento do STF a primeira corrente, mas é importante notar o voto do Min. Lewandowsky que sublinhou a necessidade de examinar cada caso. Cada caso é um caso. Raciocinando dessa maneira ele foge do clássico leito de Procusto que trabalha com a ideia do tipo legal (secamente). Na opinião de LFG: é chegado o momento de alterar a velha jurisprudência formalista (e legalista). O que importa no Direito Penal, em primeiro lugar, é o bem jurídico afetado (porque todo Direito, incluindo o penal, é fato, valor e norma, consoante clássica lição de Miguel Reale). A norma existe para a tutela de um bem jurídico (de um valor), que é critério orientativo e interpretativo. Portanto, se o bem jurídico é o mesmo: Logo, se os fatos são cometidos em sequência, da mesma maneira, forma de execução etc., não há como deixar de reconhecer o crime continuado. Para nós, enfim, tudo depende do caso concreto. O que não se pode é aprioristicamente, já eliminar a possibilidade de continuidade delitiva nesses casos, só em virtude do tipo legal. Esse critério (exageradamente) formalista pode levar a injustiças enormes (como sublinhou o Min. Peluso). Crimes da mesma espécie Para DAMÁSIO E. DE JESUS são crimes da mesma espécie os “previstos no mesmo tipo penal, aqueles que possuem os mesmos elementos descritivos, abrangendo as formas simples, privilegiadas e qualificadas, tentadas ou consumadas”. (DIREITO PENAL, vol. I, pág. 526, Saraiva) Por essa forma de pensar, somente haveria crime continuado entre um homicídio simples e um privilegiado, ou uma tentativa de homicídio, ou um homicídio qualificado. Igualmente haveria entre um furto simples e um furto qualificado. E não seria possível falar em crime continuado na hipótese de um crime de estelionato e um de apropriação indébita. E tampouco entre uma calúnia e uma difamação. Deve-se pensar diferente: são crimes da mesma espécieaqueles cujos tipos tiverem o mesmo objeto jurídico. A ideia de espécie pressupõe a existência de gênero. Não se pode falar em gênero de furto, do qual seriam espécies o furto simples e o qualificado, mas em gênero de crimes contra o patrimônio, do qual são espécies o furto, simples e qualificado, o roubo, próprio e impróprio, a extorsão, o estelionato, a receptação, dolosa e culposa etc. Poderá haver Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 8 continuidade entre quaisquer crimes contra o patrimônio, ou entre mais de um dos crimes contra a pessoa, ou entre os vários crimes contra a administração pública, enfim, poderá haver continuação entre todos os crimes que tiverem como objeto o mesmo bem jurídico, desde que os demais pressupostos sejam realizados. Logo, será possível continuidade entre corrupção passiva e peculato, ou entre roubo e estelionato. A aplicação da pena no concurso material de crimes deve ser feita de maneira que o juiz primeiro aplique a pena de cada crime isoladamente e depois as some. Isso porque a prescrição de cada crime será considerada isoladamente, por orientação do Código Penal: Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente. Concurso de crimes (concurso material) e prescrição: cada delito tem a prescrição calculada isolada e individualizadamente. STF: “A Turma deferiu habeas corpus para declarar extinta, por efeito da consumação da prescrição da pretensão punitiva, a punibilidade de prefeito condenado, em ação penal originária, pelo tribunal de justiça local, à pena de 4 anos de reclusão pelos crimes previstos no art. 1°, I, do Decreto-Lei 201/67, duas vezes, em concurso material. [...] Art. 1º, do Decreto-lei 201/67. São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; Frise-se, ainda, que inexistindo conexão (relação) entre as diversas infrações penais, tendo sido elas objeto de ações penais distintas, as disposições sobre soma ou unificação das penas serão aplicadas pelo juízo das execuções, conforme preceitua a Lei de Execução Penal: Art. 66. Compete ao Juiz da execução: III - decidir sobre: a) Soma ou unificação de penas; Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 9 A segunda espécie de concurso - concurso formal se dá quando o agente mediante uma só ação ou omissão comete dois ou mais crimes idênticos ou não. Neste caso, será aplicada a mais grave das penas cabíveis se as infrações forem distintas ou apenas uma delas se as infrações forem iguais, mas em um ou em outro caso, elas serão aumentadas de um sexto até a metade (1/6 até ½). Art. 70, caput, primeira parte - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade (...). Aplica-se o chamado sistema de exasperação e a jurisprudência tem entendido que quanto maior o número de infrações, maior deve ser o aumento. Porém, se a soma das penas (nos moldes do concurso material) se mostrarem mais benéfica ao réu deve o juiz proceder ao cúmulo (concurso material benéfico). Trata-se da regra denominada de concurso material benéfico, prevista no artigo 70, parágrafo único do CP: Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. Atenção! Se a soma das penas (sistema do cúmulo material) for melhor para o réu, deve o juiz somá-las. A isso se dá o nome de concurso material benéfico. O concurso continua formal, mas a pena é aplicada como se fosse um concurso material (por ser mais benéfico para Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 10 o réu). Da mesma maneira como no concurso material de crimes, no concurso formal também é possível se falar em concurso formal homogêneo (crimes de mesma espécie) e concurso formal heterogêneo (crimes de espécies distintas). E mais. Há também concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito. O concurso formal perfeito é aquele no qual o juiz deverá aplicar uma só pena, se idênticas as infrações, ou a maior, quando não idênticas, aumentada de um sexto até a metade em ambos os casos. Ocorre quando não há desígnios autônomos em relação a cada crime. Leia-se: haverá concurso formal perfeito quando o agente pretendia mesmo praticar apenas um crime e com apenas uma ação ou omissão dá causa a mais de um crime. Por outro lado, fala-se em concurso formal imperfeito quando, embora mediante uma ação ou omissão, havia por parte do autor desígnios autônomos para cada crime. Neste caso, as penas deverão ser somadas. Art. 70, caput, segunda parte: (...) As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Saliente-se, por oportuno, que não há “concurso formal imperfeito” na conduta praticada em erro na execução (aberratio ictus: é uma modalidade de erro acidental, não excluindo a tipicidade do fato). Nela o agente com uma única conduta pratica dois crimes, mas “o segundo é culposo”, não há desígnio autônomo em praticá-lo. Nesta hipótese, o agente responde por concurso formal perfeito. Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 (1ª parte) deste Código. Art. 20, § 3º, do CP - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 11 Por fim, tem-se o crime continuado. A continuidade delitiva pode ser genérica ou específica. O artigo 71, caput, do Código Penal indica a continuidade delitiva genérica com o seguinte texto: quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro (...). Revisão de D. Penal - I – Classificação dos Crimes Crime Habitual: Trata-se de uma classificação autônoma, solitária, na qual de acordo com a conduta prevista o tipo penal exige uma prática reiterada, habitual (habitualidade) da conduta para que haja consumação. Ex.: exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica – art. 282 – no qual o verbo é exercer, o que exige uma prática habitual, um ânimo reiterado.Exercício Ilegal da Medicina, Arte Dentária ou Farmacêutica Art. 282 – Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe os limites: Pena – detenção, de seis meses a dois anos. Parágrafo único – Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também multa. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 12 Delinquência habitual ou profissional: não se aplica o “crime continuado” ao criminoso habitual ou profissional, pois não merece o benefício – afinal, busca valer-se de instituto fundamentalmente voltado ao criminoso eventual. Note-se que, se fosse aplicável, mais conveniente seria ao delinquente cometer vários crimes, em sequência, tornando-se sua “profissão”, do que fazê-lo vez ou outra. Não se pode pensar em diminuir o excesso punitivo de quem faz do delito um autêntico meio de ganhar a vida. Convém expor a posição da jurisprudência: STF: “Não se aplicam as regras do crime continuado ao criminoso habitual” (HC 101003-RS, 1ª T., rel. Cármen Lúcia, abril 2010). “A descaracterização da continuidade delitiva pela habitualidade criminosa justifica-se pela necessidade de se evitar a premiação de criminosos contumazes (constitui hábito, costumeiro, habitual), que acabam tornando-se profissionais do crime, inclusive com especializações em determinadas modalidades delituosas” (ROHC 93.144-SP, 1ª T., rel. Menezes Direito, 18.03.2008). “Se os vários crimes de estelionato forem praticados em datas distintas e contra vítimas diversas, restando patenteado o desígnio autônomo de cada uma das infrações, não há que se falar em „continuidade delitiva‟, mas sim, em „habitualidade criminosa‟ (Ag. Em Execução 873.013.2/2, rel. Renê Nunes, 29.03.2006). Posicionamento isolado – Mario Petrone Crime habitual continuado: diferente da hipótese retratada na nota anterior, que se refere ao criminoso que, habitualmente, pratica vários delitos instantâneos ou permanentes, é possível haver crime habitual em continuidade delitiva. Assim, o agente pode cometer um crime habitual ex.: manter casa de prostituição, havendo uma interrupção qualquer, seguida de outro delito habitual idêntico, o que configuraria o crime continuado. Crime Permanente: É aquele em que o momento de consumação se prolonga por determinado período de tempo, isto é, ele se consuma com a simples privação da liberdade, e o estado de consumação se prolonga pelo tempo. Ex.: sequestro (art. 148 do CP), pois enquanto a pessoa estiver tendo a sua liberdade privada o crime estará em consumação. Importante lembrar que essa é a razão pela qual o crime permanente permite a prisão em flagrante a qualquer momento. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 13 Diz-se então que para esses crimes o momento de consumação se protrai, prolonga no tempo. Sequestro e Cárcere Privado Art. 148 – Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado: Pena – reclusão, de um a três anos. [...] Confusão entre crime habitual, crime permanente, crime continuado. Trata-se de três figuras absolutamente distintas. Crime continuado não é classificação de crime, mas modalidade de concurso de crimes, e qualquer delito poderá ser realizado dessa forma; é uma forma de praticar infrações penais para considerar vários crimes como um só, para efeito de aplicação da pena (art. 71 do CP). O crime permanente é aquele em que o momento de consumação se prolonga pelo tempo. Por fim, o crime habitual, que é aquele em que se exige uma prática reiterada de atos para que se caracterize a conduta prevista e o tipo em abstrato ocorra. Nosso Código adotou a teoria da ficção jurídica: quando se constatam as condições acima ditadas, para efeito de pena, todos os crimes são considerados um só. Ressalte-se: “consideram-se um só crime apenas para efeito de pena”, já que se aplica a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave aumentada, se diversas. Atenção! Para efeito da aplicação da pena acolheu-se a teoria da ficção (os vários crimes perdem sua identidade, compondo infração penal única). No que toca aos requisitos que devem se fazer presentes para o reconhecimento da continuidade delitiva, temos: a) pluralidade de condutas, b) pluralidade de crimes da mesma espécie e c) elo de continuidade. A pluralidade de condutas exige condutas subsequentes e autônomas. O elo da continuidade se dá pelas condições de tempo (de acordo com orientação majoritária há Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 14 continuidade quando as infrações se distanciam uma da outra em até 30 dias), lugar (quando cometidos na mesma comarca ou vizinhas), maneira de execução (modus operandi) e outras circunstâncias semelhantes. Requisitos do crime continuado genérico: 1) Pluralidade de condutas: Note-se que as condutas são subsequentes e autônomas. Ex.: vários furtos cometidos de forma continuada pela mesma pessoa. 2) Pluralidade de crimes da mesma espécie: Prepondera na atualidade a doutrina de que crimes da mesma espécie são crimes previstos no mesmo tipo penal. Atenção! Roubo (art. 157, caput) e latrocínio (art. 157, § 3°), seguindo essa doutrina, seriam da mesma espécie. Mas o STF tem jurisprudência em sentido contrário, argumentando que, apesar permanecerem ao mesmo tipo, possuem bens jurídicos distintos. 3) Elo de continuidade: Que se dá: Pelas condições de tempo (segundo a jurisprudência atual, só existe crime continuado quando as infrações se distanciam uma da outra até trinta dias); Lugar (apenas os delitos cometidos na mesma comarca ou em comarcas vizinhas admitem o crime continuado); Maneira de execução (mesmo modus operandi (maneira de agir), mesmos parceiros etc.) e Outras semelhantes (mesmo instrumento do crime, mesma região da cidade etc.) Critério para a fixação da pena no crime continuado genérico, comum ou simples: Na fixação da reprimenda no crime continuado genérico o juiz leva em conta uma só pena, se idênticas, ou a maior, quando não idênticas, aumentando-a de um sexto a dois terços. Para tanto leva em consideração, sobretudo o número de infrações. Quanto mais infrações, maior deve ser o aumento. Com relação ao crime continuado específico (crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça a pessoa), vale dizer, está previsto no parágrafo único do artigo 71 do CP, conta, além dos requisitos supramencionados, com outros, rotulados como especializantes: Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 15 1) crimes dolosos; 2) praticados contra vítimas diferentes; 3) cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa. Obs.: os critérios para fixação da pena no crime continuado específico: Nesse caso, o juiz segue o mesmo raciocínio do caput, mas o aumento pode ir de um sexto até o triplo. Art. 71 - Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade,os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 do Código Penal. Parágrafo único do art. 70 – Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. Art. 75 – O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos. § 1° - Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 (trinta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. § 2° - Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido. De acordo, com jurisprudência do STF, “Em caso de fuga do condenado do estabelecimento prisional, o limite de 30 (trinta) anos deve ser contado a partir do inicio do cumprimento da pena, e não de sua eventual recaptura. Em outras palavras, a fuga não interrompe a execução da pena privativa de liberdade. Provoca apenas sua suspensão”. Crimes da mesma espécie: há duas posições a esse respeito: a) são delitos da mesma espécie os que estiverem previstos no mesmo tipo penal. Nesse prisma, tanto faz sejam figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas, Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 16 tentadas ou consumadas. Assim: Hungria, Fragoso, Frederico Marques – com a ressalva de que não precisam estar no mesmo artigo (ex.: furto e furto de coisa comum, arts. 155 e 156 CP) - Damásio, Jair Leonardo Lopez – embora admita, excepcionalmente, casos não previstos no mesmo tipo penal. Pacífico no STF: “Continuidade delitiva dos crimes de roubo e furto. Impossibilidade. Espécies distintas. Furto e Roubo: Continuidade Delitiva A Turma reafirmou jurisprudência da Corte no sentido de não haver continuidade delitiva entre os crimes de roubo e de furto. Em consequência, indeferiu “habeas corpus” impetrado contra acórdão do STJ que, ao prover recurso especial, interposto pelo Ministério Público estadual, reputara não configurada a continuidade delitiva entre os crimes de roubo majorado e de furto qualificado. “Não se admite a continuidade delitiva entre os crimes de furto qualificado e roubo majorado, uma vez que, apesar de estarem inseridos no rol dos crimes contra o patrimônio, são de espécies diferentes, o que afasta a aplicação do art. 71, caput, do Código Penal. (Precedentes do STJ e do Pretório Excelso). Recurso provido”. (STJ – 5ª T. – REsp. nº 704.941-RS – Rel. Min. Felix Fischer – j. 07.04.05 – v.u. – DJU 30.05.05, pág. 411). Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa. Furto qualificado § 4° - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I – com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III – com emprego de chave falsa; IV – mediante concurso de duas ou mais pessoas. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 17 Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência. § 2° - A pena aumenta-se de um terço até metade; Considerou-se que os referidos delitos são de espécies distintas, uma vez que o furto tem como bem jurídico violado somente o patrimônio, enquanto o roubo, crime pluriofensivo e complexo, ofende o patrimônio, a liberdade individual e a integridade física da vítima, o que afasta o nexo de continuidade e enseja a aplicação da regra do concurso material. Alguns precedentes citados: HC 70360/SP (DJU de 3.6.94); RE 85425/SP (DJU de 15.4.77). HC 97057/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.8.2010. (HC – 97057) corrente majoritária b) são crimes da mesma espécie os que protegem o mesmo bem jurídico, embora previstos em tipos diferentes. Neste sentido, Basileu, Fragoso, Delmanto, Paulo José da Costa Jr, Walter Vieira do Nascimento. Assim, seriam delitos da mesma espécie o roubo e o furto, pois ambos protegem o patrimônio. Apesar de ser amplamente majoritária na jurisprudência a primeira, Jair Leonardo Lopez traz um importante ponto para reflexão. Imagine-se um balconista que, para fazer o lanche, durante vários dias, deixa de colocar diariamente na gaveta R$ 2,00, de parte das vendas realizadas. Depois disso, durante vários outros dias, aproveitando-se da ausência do patrão, tire da mesma gaveta R$ 2,00, para o mesmo fim. A primeira ação, que seria “apropriar-se”, está prevista no art. 168, § 1°, II, do Código Penal, enquanto a segunda (furto) está prevista no art. 155, § 4°, II, do Código Penal. É justo que lhe seja considerada a existência do crime continuado, pois a aplicação do concurso material seria extremamente severa. Art. 168, § 1°, II, do CP. Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção. Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1°. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), quando o agente recebeu a coisa. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 18 II – na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário judicial; Art. 155, do CP. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 4°. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido: II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; Atenção! Confiança: é um sentimento interior de credibilidade, representando um vínculo subjetivo de respeito e consideração entre agente e vítima. A simples relação empregatícia, por exemplo, não é suficiente para configurar a relação de confiança, sendo indispensável um vínculo subjetivo. Existindo pluralidade de agentes e sendo do conhecimento de todos a existência de uma relação de confiança entre um dos agentes e vítima, esta será concedida a todos os demais agentes. Fraude: é a utilização de artifício, estratagema ou ardil (Manha; astúcia) para vencer a confiança da vítima. Ou seja, criar uma situação que consiga enganar a vítima e facilitar ou permitir a subtração da coisa por parte do sujeito ativo do delito. Ex.: Fazer-se passar por funcionário da Fundação Nacional da Saúde, em campanha de combate ao mosquito da dengue, para conseguir adentrar a casa da vítima e de lá, sem que esta perceba, subtrair objetos. Segundo a jurisprudência do STJ, o agente que, a pretexto de experimentar carro que pretende comprar, foge com ele, deverá responder por furto mediante fraude (art.155, § 4°, II, CP) e não estelionato, pois no caso, houve efetiva subtração do bem. Escala: é a penetração no local do furto por meio que demanda um esforço incomum. Não implica necessariamente subir, podendo estar configurada com a conduta de saltar fossos, rampas ou adentrar subterrâneos. Destreza: é a habilidade especial destinada a impedirque a vítima perceba a subtração da coisa. É o famoso batedor de carteira, pois muitas vezes consegui subtrair a coisa sem que a vítima sequer perceba que a conduta está sendo praticada. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 19 Estupro e atentado violento ao pudor: não eram considerados crimes da mesma espécie, mas do mesmo gênero, motivo pelo qual não se configurava a continuidade delitiva, majoritariamente na jurisprudência. Entretanto, com o advento da Lei 12.015/2009, unificaram-se as duas infrações penais (art. 213, estupro; art. 214, atentado violento ao pudor) em uma só figura típica, intitulada estupro (art. 213). Portanto, não mais se pode impedir a continuidade delitiva entre eventos criminosos baseados no art. 213, pois, se ocorrerem, serão da mesma espécie. Note-se: além dos requisitos acima mencionados, o crime continuado específico possui mais três especializantes: a) crimes dolosos, b) vítimas distintas e c) cometidos com violência ou grave ameaça. Se o concurso de crimes for o crime continuado genérico o juiz aplicará o sistema da exasperação, aplicando a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada em qualquer caso, de um sexto a dois terços. No crime continuado específico há variável no aumento a ser aplicado: até o triplo. Finalmente, insta constar que as regras atinentes ao concurso de crimes são importantes à necessária individualização da pena, como forma de garantia dos direitos individuais do acusado, em obediência aos preceitos constitucionais – art. 5º, inciso XLVI, da CF: a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: (...). 1.4. Sistemas de Aplicação da Pena Cúmulo Material (Art. 69 / Art. 70 – 2ª parte): Determina a soma das penas aplicadas para cada um dos crimes, ou seja, será feita a dosimetria da pena de cada crime separadamente e depois essas penas serão somadas. Exasperação (Art. 70 – 1° parte / Art. 71 CP): Caracteriza-se pela aplicação de uma só pena, qual seja a do crime mais grave, e essa pena será aumentada de um certo valor determinado pela Lei. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 20 1.5. Espécies de Concurso de Crimes 1.5.1. Concurso Material, também chamado de Real (Art. 69 do CP) É a mais simples das modalidades de concurso de crimes, sendo também a mais obvia, já que o agente devera praticar cada crime através de uma conduta (ação ou omissão), sejam esses crimes idênticos ou não, sem se exigir qualquer outro requisito mais específico. Art. 69. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão ou de detenção, executa-se primeira aquela. § 1°. Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código. § 2°. Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais. Há pluralidade de condutas e pluralidade de resultados. O agente, por meio de duas ou mais condutas, pratica dois ou mais crimes, pouco importando se os fatos ocorrem ou não no mesmo contexto fático. 1.5.2. Espécies O concurso material pode ser homogêneo ou heterogêneo. Homogêneo, quando os crimes são idênticos, e heterogêneo, quando os crimes são diversos. • Requisitos: • Mais de uma conduta (ação ou omissão); • Dois ou mais crimes (idênticos ou não). • Aplicação da Pena: Serão somadas as penas e aplicadas cumulativamente (sistema do cúmulo material). Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 21 Obs.: a) Se forem aplicadas de forma cumulativa uma pena de reclusão e outra de detenção executa-se primeiro a reclusão e depois a detenção, já que a primeira permite os três regimes de cumprimento de pena (fechado, semi-aberto e aberto) possibilitando assim que em certos casos o agente inicie o cumprimento da pena no regime fechado). b) Se houver conversão da pena privativa de liberdade em duas ou mais penas restritivas de direito, elas podem ser cumpridas simultaneamente, se compatíveis, ou sucessivamente, se incompatíveis. • De acordo com a natureza dos crimes praticados o Concurso Material pode ser: • Homogêneo: crimes idênticos (ex.: Furto + Furto) • Heterogêneo: Crimes diferentes (ex.: Homicídio + Furto) Art. 69, do CP – Concurso material – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeira aquela. 1.5.3. Momento adequado para a soma das penas Se houver conexão entre as infrações penais, com a consequente unidade processual, a regra do concurso material é aplicada pelo juiz que profere a sentença condenatória. O magistrado, em respeito ao princípio constitucional da individualização da pena, deve fixar, separadamente, a pena de cada uma das infrações penais. Em seguida, na própria sentença, procede à soma de todas elas. Caso, porém, não exista conexão entre as diversas infrações penais, sendo elas, consequente, objeto de ações penais diversas, as disposições inerentes ao concurso material serão aplicadas pelo juízo da execução. Com o trânsito em julgamento das sentenças, todas as condenações são reunidas na mesma execução, e aí se procederá à soma das penas, na forma prevista no art. 66, III, “a”, da Leia de Execução Penal (L.7.210/84). Lei de Execução Penal (L.7.210/84) Art. 66. Compete ao Juiz da execução: III - decidir sobre: Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 22 a) soma ou unificação de penas; 1.5.4. Imposição cumulativa de penas de reclusão e detenção Se for imposta pena de reclusão para um dos crimes e de detenção para o outro, executa-se inicialmente a de reclusão (art. 69, caput, 2ª parte, do CP). 1.5.5. Cumulação de pena privativa de liberdade com restritiva de direitos O § 1°. do art. 69 do Código Penal revela a possibilidade de se cumular, na aplicação das penas de crimes em concurso material, uma pena privativa de liberdade, desde que tenha sido concedido sursis, com uma restritiva de direitos. Definição de sursis art. 77 e ss. do CP Suspensão ou adiamento da sentença condenatória ou da execução da pena com a finalidade de reeducar o criminoso, impedindo que delinquentes condenados a penas de reduzida duração fiquem privados da liberdade, restrição que se agrava pelo convívio com outros de maior periculosidade. Por lógica, também será admissível a aplicação de pena restritiva de direitos quando ao agente tiver sido imposta pena privativa de liberdade, com regime aberto para seu cumprimento, eis que será possívelo cumprimento simultâneo de ambas. 1.5.6. Cumprimento sucessivo ou simultâneo de penas restritivas de direitos De acordo com o art. 69, § 2°, do Código Penal, o condenado cumprirá simultaneamente as penas restritivas de direitos que forem compatíveis entre si, e sucessivamente as demais. Admite-se, por exemplo, o cumprimento simultâneo de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. Se forem, todavia, duas penas de limitação de final de semana, serão cumpridas sucessivamente. 1.5.7. Concurso material e suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/1995), que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. A suspensão condicional do processo somente é admissível quando, no concurso material, a somatória das penas impostas ao acusado preencha os pressupostos do art. 89 da Lei 9.099/1995. O total das penas mínimas, portanto, deve ser igual ou inferior a 1 (um) ano. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 23 1.5.8. Concurso Formal (Art. 70 do CP) Diferentemente do Concurso Material, o Concurso Formal decorre da prática de uma única conduta (ação ou omissão) por parte do agente, sendo que dois ou mais resultados típicos se produzem, idênticos ou não. Estes resultados podem ter sido desejados individualmente pelo agente através de Dolos independentes, ou ser produto de um único objetivo ao atuar, o que pode se dar através de um único Dolo, ou mesmo através de uma conduta culposa que venha a gerar vários resultados. • Requisitos básicos do Concurso Formal: • Uma só ação ou omissão; • Dois ou mais crimes (idênticos ou não); • De acordo com a natureza dos crimes produzidos o Concurso Formal pode ser: • Homogêneo: crimes idênticos (ex.: Homicídio + Homicídio) • Heterogêneo: crimes diferentes (ex.: Homicídio + Lesão corporal) Espécies de Concurso Formal: O concurso formal se divide em duas grandes espécies, sendo que isso se dá de acordo com o número de objetos (desígnios) que o agente possui ao atuar. Como já dissemos, em certos casos esse, ou esses desígnios podem se referir a seu Dolo, mas em alguns casos podemos estar falando de seu objetivo de atuar culposamente, faltando com o cuidado – crimes culposos (ex.: um único objetivo de avançar um sinal e acabar atropelando duas pessoas). a) Concurso Formal Perfeito (Art. 70 – 1ª parte) Modalidade mais comum e evidente de Concurso Formal, já que o agente através de sua única conduta acaba produzindo dois ou mais resultados, porém ao agir possuía um único objetivo, que pode ser um único dolo, ou mesmo uma conduta culposa. Dissemos que é a forma mais evidente e comum de Concurso Formal, pois normalmente quando se prática uma só conduta se tem em mente um só objetivo, uma única finalidade. Assim fica mais fácil de guardar o nome desta modalidade de Concurso Formal, pois o “normal”, “perfeito” quando Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 24 alguém prática uma só ação ou omissão é ter um único objetivo em mente, pois quando se quer vários resultados o mais comum é agir várias vezes, praticando várias condutas. Ex.: “A” querendo matar seu desafeto “B” dispara arma de fogo contra ele, atingindo-o, porém a bala acaba acertando também “C” que passava pelo local naquele momento. Ex.2: “A” querendo chegar mais cedo no trabalho avança um sinal de transito, mas acaba atingindo um carro que passava pelo cruzamento matando dois passageiros. Requisitos do Concurso Formal Perfeito: Uma só conduta (ação ou omissão) gerando vários resultados. b) Unidade de desígnios, objetivos (ter em vista um só fim) Forma de aplicação de Pena no Concurso Formal Perfeito: Aplica-se a pena do crime mais grave aumentada de 1/6 a ½ (Sistema da exasperação), se as penas forem iguais aplica-se uma só também aumentada. Obs.: No Concurso Formal Perfeito a pena aplicada não poderá ser maior do que se fosse hipótese de Concurso Material, ou seja, se as penas fossem aplicadas separadamente e depois somadas – Art. 70 parágrafo único. c) Concurso Formal Imperfeito ou Impróprio (Art. 70 – 2ª parte CP) Modalidade anômala de Concurso Formal de crimes, já que o agente embora realize uma só conduta e produza dois ou mais resultados, deseja, querer e tem a intenção (dolo) de produzir os vários resultados (desígnios autônomos). Dissemos modalidade anômala, pois “normalmente” quando se quer produzir dois ou mais resultados, o comum é praticar várias ações. Assim fica mais fácil de guardar o nome desta modalidade de concurso de crime, pois pode-se dizer que á algo “imperfeito” querer gerar dois ou mais resultados mas atuar uma só vez. Ex.: “A” querendo matar dois executivos de uma grande empresa explode uma bomba no carro em que eles se encontram. Requisitos do Concurso Formal Imperfeito: Uma só conduta (ação ou omissão) e vários resultados. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 25 d) Possui desígnios autônomos, vontades independentes (dolos distintos), ou seja, a vontade consciente de obter fins diversos. Forma de aplicação de Pena no Concurso Formal Imperfeito: Aplica-se a pena como se fosse um concurso material, ou seja, somando-se as penas de cada um dos crimes praticados (sistema do Cúmulo Material). Na verdade o fundamento para se aplicar as penas separadamente e somadas da mesma forma que ocorre no concurso material, está no fato de que se no concurso formal imperfeito o agente necessariamente possui vários dolos independentes de gerar vários resultados lesivos, não há diferença no grau de reprovabilidade de se querer vários resultados e atuar várias vezes (concurso material), ou de querendo vários resultados se praticar uma única conduta. 1.5.9. Crime Continuado (Art. 71 do CP) Modalidade de concurso de crimes que tem como principal objetivo evitar a aplicação do Concurso Material e sua forma de aplicação da pena (soma – Cúmulo Material), para evitar penas muito altas e desproporcionais à gravidade dos fatos praticados. Na verdade, o crime continuado surge em situações que inicialmente poderiam gerar o concurso material de crimes, pois decorre da prática de várias condutas pelo agente gerando assim vários resultados, vários crimes. Porém, se percebeu que muitas vezes, de acordo com certas características específicas inerentes à situação concreta, ficaria desproporcional aplicar penas em somatória, já que o agente repete as condutas em um processo contínuo, de continuidade, sempre com características muito semelhantes, principalmente no que tange às circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução dos fatos. Surge assim a ideia de se ignorar que na verdade o agente realizou vários crimes e cria-se o instituto do Crime Continuado, para que se considere, através de uma ficção jurídica, que estes vários crimes, que devem ser da mesma espécie, sejam considerados e tratados como um único crime, realizado em continuidade, para efeitos de aplicação da pena. Requisitos do Crime Continuado: O agente realiza varias ações ou omissões produzindo vários crimes Todos os crimes devem ser da mesma espécie.Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 26 Obs.: De acordo com posicionamento dominante no STJ e no STF crimes de mesma espécie são aqueles presentes no mesmo artigo de Lei, independentemente se nas formas simples, qualificadas aumentadas ou privilegiadas previstas em seus parágrafos ou incisos. (Ex.: Um Furto simples – Art. 155 caput + Furto privilegiado – Art. 155, § 2°) Há posicionamento divergente afirmando que crimes de mesma espécie se refere ao mesmo bem jurídico tutelado (Ex.: crimes contra honra). Circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução semelhantes, o que não significa idênticas, mas apenas parecidas. (Ex.: uma caixa de supermercado que todo dia, no horário de almoço da gerente, subtrai pequenas quantias de dinheiro, no mesmo caixa em que trabalha.) Obs.: Embora não haja previsão legal para isso, o limite máximo entre cada uma das condutas realizadas é de 30 dias para que se reconheça o Crime Continuado, caso contrario, passando mais 30 dias entre uma e outra ação aplica-se normalmente o Concurso Material e a somatória das penas independentemente de cada crime. (Majoritária – STF) Espécies de Crime Continuado: Comum (Art. 71 caput, CP): Nada mais é do que a própria definição básica do crime Continuado de acordo como os requisitos fundamentais desta modalidade de concurso de crimes, quais sejam: • A pluralidade de condutas; • Crimes de mesma espécie, ou mesmo crimes iguais; • Circunstâncias (tempo/lugar/modo de execução) semelhantes. Formas de aplicação da Pena: Aplica-se a pena de um só dos crimes, qual seja o mais grave (se houver mais grave) aumentada de 1/6 a 2/3. (sistema de exasperação). Estes valores de aumento serão apurados de acordo com o número de crimes que o agente realizou, ou seja, quanto maior o número de crimes maior deve ser o aumento da pena. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 27 Específico (Art. 71, parágrafo único) • Além dos requisitos básicos descritos acima para o Crime Continuado Comum deve-se preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos específicos: • Todas as condutas devem ser dolosas (não cabe em crimes culposos). Pluralidade de vítimas • Emprego de violência ou grave ameaça à pessoa em todas as condutas. Formas de aplicação da Pena: • Aplica-se a pena de um só dos crimes aumentada de até o TRIPLO (de acordo com STF o mínimo deve ser também de 1/6). Obs.: O valor da pena aumentada não se pode exceder a pena que seria aplicada no Concurso Formal Perfeito (Art. 70, parágrafo único). Súmula do STF inerente ao Crime Continuado: • Súmula 605 STF – perdeu aplicação, em face do Crime Continuado Específico, logo nada impede que se aplique o Crime Continuado (Art. 71, parágrafo Único) à crimes de Homicídio. (Ex.: Serial Killer) • Súmula 711 STF – A Lei penal mais severa aplica-se ao Crime Continuado quando surgir entre a realização das condutas criminosas realizadas em continuidade. Ex.: “A” prática um Furto hoje, e outro 15 dias depois em continuidade delitiva, só que entre um crime e outro vem uma Lei nova que aumenta a pena do Furto. Neste caso a pena a ser aplicada será a nova pena mais grave aumentada de acordo com as regras do crime continuado. Súmula 723 STF – Não cabe suspensão condicional do processo (Lei n° 9.099/95) se em hipótese de crime continuado a pena mínima (abstrata) do crime aumentada do mínimo referente ao concurso de crimes (1/6) ultrapassar 1 ano. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 28 Crime Continuado # Crime Permanente # Crime Habitual Não se pode confundir o Crime Continuado, que é apenas uma modalidade de concurso de crimes, ou seja, uma forma específica de se aplicar a pena quando uma agente realiza vários crimes de acordo com certos requisitos, com Crime Permanente e com Crime Habitual, que são classificações de crime, ou seja, classificações dadas a certos crimes previstos abstratamente na legislação penal, devido a suas características estruturais. Não existe “um crime continuado”, mas apenas a forma de cometer vários crimes em continuidade, ou seja, a modalidade de concurso entre crimes chamados de Crime Continuado. Porém, podemos dizer que há certos Tipos Penais que “são crimes permanentes”, pois sua consumação ocorre e permanece durante certo período de tempo. (Ex.: Sequestro – Art. 148 do CP), e também podemos dizer que há certos Tipos Penais que “são crimes habituais”, pois para que se caracterize a conduta narrada no Tipo se exige que o agente realize vários atos de forma reiterada e habitual. (Ex.: Exercício Ilegal da Medicina – Art. 282 do CP) 6. Concurso de Crimes em Pena de Multa (Art. 72 do CP) No que tange a pena de multa, estas são aplicadas distinta e integralmente para cada crime, mesmo sendo hipótese de Concurso Formal Perfeito ou Crime Continuado. Logo, a regra para penas de multa é sempre que se faça o cálculo de cada multa separadamente, para que depois estas sejam somadas e seus valores cobrados integralmente do condenado. Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 29 MAPA MENTAL – CONCURSOS DE CRIMES Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 30 Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 31 Direito Penal II jadson.melo@bol.com.br 32
Compartilhar