
GT 1 A doença renal crônica (DRC)
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Definir DRC A doença renal crônica (DRC) é uma síndrome clínica decorrente de uma lesão renal que progride no decorrer de vários meses a anos. Sua nomenclatura tem apresentado uma variação considerável, pois diversos termos têm sido empregados como sinônimos de DRC, entre os quais falência renal crônica e insuficiência renal crônica (IRC). Para facilitar a comunicação e o entendimento entre prestadores de assistência, pacientes, pesquisadores e criadores de políticas, o National Kidney Foundation (NKF) Kidney Disease Outcome Quality Initiative (KDOQI) Advisory Board recomendou a adoção da denominação \u201cdoença renal crônica (DRC)\u201d como termo-padrão. Tabela 1: Definição de DRC Critérios Lesão renal presente por um período \u2265 3 meses definida por anormalidades estruturais ou funcionais do rim com ou sem diminuição no TFG, evidenciada por: \u2022 Anormalidades histopatológicas renais \u2022 Marcadores de lesão renal, como anormalidades urinárias (proteinúria); anormalidades sanguíneas (síndromes tubulares renais); alterações em exames de imagem (hidronefrose) OU TFG < 60 mL/min/1,73 m2 por um período \u2265 3 meses com ou sem lesão renal. RFG = ritmo de filtração glomerular. Vale salientar que a maioria das diretrizes define a IRC como: 1) TFG menor que 15 mL/min/1,73 m2, acompanhada, na maioria dos casos, por sinais e sintomas de uremia, e/ ou 2) a necessidade de início de terapia de TRS (diálise ou transplante) . Epidemiologia da DRC A DRC é, atualmente, considerada um problema de saúde pública mundial. No Brasil, a sua incidência e a prevalência estão aumentando, o prognóstico permanece ruim e os custos do tratamento da doença são altíssimos. O número projetado atualmente para pacientes em tratamento dialítico e com transplante renal no Brasil está próximo dos 130.000, a um custo de 1,4 bilhão de reais. Independentemente da etiologia da doença de base, os principais desfechos em pacientes com DRC são as suas complicações (anemia, acidose metabólica, desnutrição e alteração do metabolismo de cálcio e fósforo) decorrentes da perda funcional renal, o óbito (principalmente por causas cardiovasculares) e a necessidade de terapia renal substitutiva (TRS). Aproximadamente 8 milhões de pessoas são acometidas pela DRC de estágios 3 ou 4, sendo mais susceptíveis à insuficiência renal progressiva. Duas enfermidades são responsáveis por quase 70% dos novos casos de DRCT; cm 2003, 44,8% destes pacientes eram portadores de diabetes mellitus e 27,1% de lesão renal induzida pela hipertensão. As populações que apresentam as maiores incidências da doença são os idosos (isto é, maiores de 65 anos) e os afrodescendentes, além dos indivíduos de ascendência indígena ou asiática. As razões para esta suscetibilidade racial da DRC são desconhecidas. Além desta suscetibilidade racial, os grupos de indivíduos que correm maiores riscos de progressão da DRC à DRCT são os acometidos pela hipertensão, pelo diabetes mellitus ou pelas doenças cardiovasculares, bem como aqueles que possuem um histórico familiar de DRCT. O desenvolvimento de doença cardiovascular em pacientes com DRC está associado a taxas elevadas de morbidade e mortalidade. De fato, pacientes com DRC ainda em estágio inicial são mais propensos a morrer em decorrência de um evento cardiovascular do que a atingir um ponto em que haja indicação para terapia de substituição renal. As estratégias terapêuticas instituídas nos estágios iniciais da DRC são efetivas para retardar a progressão para insuficiência renal. Além disso, a abordagem dos fatores de risco durante os estágios mais iniciais da DRC deve ser efetiva para reduzir os eventos cardiovasculares e a mortalidade, tanto antes como após a manifestação da insuficiência renal. GRUPO DE RISCO PARA A DOENÇA RENAL CRÔNICA Avaliar presença de lesão renal (análise de proteinúria) e estimar o nível de função renal (RFG) a cada ano. Risco Elevado: \uf0b7 Hipertensão Arterial \uf0b7 Diabetes mellitus \uf0b7 História familiar de DRC Risco médio: \uf0b7 Enfermidades sistêmicas \uf0b7 Infecções urinárias de repetição \uf0b7 Litíase urinária repetida \uf0b7 Uropatias \uf0b7 Criança com < 5 anos \uf0b7 Adultos com >60 anos \uf0b7 Mulheres grávidas Tabela 2-Fatores de risco para DRC Fator de risco Definição Exemplos Fator de susceptibilidade Susceptibilidade aumentada para DRC Idosos, história familiar de DRC, redução da massa renal, baixo peso ao nascer, baixa renda e educação Fatores de iniciação Iniciam diretamente a lesão renal Diabetes, hipertensão arterial, doenças autoimunes, infecções sistêmicas, infecções do trato urinário, cálculos urinários, obstrução do trato urinário inferior, toxicidade por drogas Fatores de progressão Causam piora da lesão renal e aceleram a queda da TFG após o início da lesão renal Proteinúria maciça, hipertensão arterial grave, controle glicêmico inadequado nos diabéticos, tabagismo, obesidade Etiologia da DRC Diversas doenças podem causar DRC (Tabela 3). Estas doenças podem ser classificadas em: 1. Primárias (glomerulonefrites, doenças císticas renais, doenças tubulointersticiais etc.) ou Secundárias (DM, HAS, lúpus eritematoso sistêmico, hepatite B, C, HIV etc.). 2. Localização anatômica: patologias glomerulares, tubulointersticiais, vasculares, obstrutivas ou tumorais. 3. Adquiridas ou hereditárias. Entre todas as causas, a nefropatia diabética, a nefropatia hipertensiva, as glomerulonefrites crônicas e a doença renal policística são as etiologias mais frequentes. Tabela 3: Causas de doença renal crônica Diabetes melito Nefropatia diabética Vascular Nefropatia hipertensiva, nefropatia isquêmica, hipertensão maligna, esclerodermia, síndrome hemolítico-urêmica primária ou secundária, toxemia gravídica Glomerulonefrites primárias Glomerulonefrite membranosa, glomerulonefrite membranoproliferativa, nefropatia de IgA, glomeruloesclerose segmentar e focal, glomerulopatia fibrilar, pós-GNDA Glomerulonefrites secundárias Nefrite lúpica, crioglobulinemia essencial ou secundária, doença de cadeia leve, doença de cadeia pesada, amiloidose, hepatite B, hepatite C, HIV, esquistossomose Doenças tubulointersticiais Nefrite intersticial crônica secundária a drogas, pielonefrite de repetição e doença de refluxo, rim do mieloma múltiplo, tuberculose renal Vasculites Granulomatose de Wegener, poliangeíte microscópica, Churg-Strauss, vasculite por drogas, poliarterite nodosa, arterite de Takayasu Doenças císticas hereditárias Doença de rins policísticos, doença cística medular e outras nefronoftises Doenças hereditárias Síndrome de Alport, doença de Fabry, esclerose tuberosa e anemia falciforme Tumores Câncer renal, tumor de células transicionais, tumor de Wilms, linfomas renais Doenças metabólicas Cistinose, oxalose, nefrocalcinose, erros inatos do metabolismo O diagnóstico de DRC requer primeiramente a confirmação da natureza crônica da doença, descartando-se, portanto, a presença de qualquer componente agudo, potencialmente reversível. A seguir, é fundamental o estabelecimento da etiologia da DRC, passo este comumente negligenciado. Fisiopatologia A função primaria do rim em manter constante a composição do meio extracelular é bem preservada até que haja perda significativa da massa renal. Quando isto acontece, seja por alguma doença ou ablação cirúrgica, os néfrons remanescentes apresentam resposta fisiológica de hipertrofia e hiperfluxo compensatórios. A redução de massa renal é acompanhada não apenas de aumento significativo na função dos néfrons remanescentes, mas também nos túbulos, responsáveis pelo ajuste fino da excreção de água, eletrólitos, ácidos e produtos do catabolismo proteico. O regime de hiperfluxo, a princípio vantajoso, acarreta uma série de alterações patogênicas, que podem resultar em glomeruloesclerose, fibrose tubulointersticial e, portanto, perda progressiva da função renal. Essa lesão