Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
LEI OU NORMA E EXTENSÃO DA SUA IMPERATIVIDADELEI OU NORMA E EXTENSÃO DA SUA IMPERATIVIDADELEI OU NORMA E EXTENSÃO DA SUA IMPERATIVIDADELEI OU NORMA E EXTENSÃO DA SUA IMPERATIVIDADE Como aduzimos, a palavra lei pode ter várias compreensões, todas elas, de certa forma, relacionadas, daí sua equivocidade. A lei formula uma regra, ou, mais especificamente, uma fórmula para ordenar algo. Desse aspecto extrai-se uma noção genérica de lei. Nesse sentido, a lei da gravidade descreve igualmente uma fórmula. Trata-se de lei física, lei da natureza. Também a lei física é fórmula elaborada pelo homem para melhor compreender a natureza. A lei não está na natureza, pois o homem a formula fazendo experimentações e observando a natureza. Desse modo, a lei física, elaborada pelo cientista, é resultado de uma abstração. Quanto mais o cientista pesquisar, maior será o número de leis do mundo do ser que elabora. Não é nesse sentido que nos ocuparemos da lei, como é evidente. Por outro lado, as leis éticas dizem respeito à conduta e às ações do indivíduo e seu grupo na sociedade. O termo ética éticaética ética liga-se, portanto, diretamente à atividade humana. Ao mundo ético, cuja origem etimológica grega relaciona-se com os costumes, acorrem todos os atos humanos. Nesse passo, localiza-se no mundo da cultura, do "dever "dever"dever "dever- -- -ser". ser".ser". ser". Assim, o "não matarás" "não matarás""não matarás" "não matarás" caracteriza-se por ser uma lei ética, como também "amar o "amar o "amar o "amar o próximo como a próximo como a próximo como a próximo como a ti mesmo". ti mesmo".ti mesmo". ti mesmo". Nas leis éticas existe a característica da imperatividade imperatividadeimperatividade imperatividade, sob o prisma da sociologia, característica que não existe nas leis físicas. Essas leis éticas, quando pertencentes a um ordenamento, tornam-se normas ou leis jurídicas. normas ou leis jurídicas.normas ou leis jurídicas. normas ou leis jurídicas. Nem toda lei ética é uma norma. Assim, como referimos o fato de não cumprimentar alguém que conhecemos transgride uma lei ética ou social, mas não há norma que imponha coercitivamente coercitivamentecoercitivamente coercitivamente a fazer essa saudação. Na ciência do Direito, contudo, a palavra lei lei lei lei significa, como já acenamos, uma relação de relação de relação de relação de imputação imputaçãoimputação imputação ou uma prescrição de conduta. prescrição de conduta.prescrição de conduta. prescrição de conduta. O conceito de imputabilidade é essencial ao Direito, pois indica o sujeito da relação jurídica, ou atribui a ele os reflexos e os efeitos da norma. Há ainda que se referir a um conceito amplo e a um conceito restrito de lei em nossa ciência. Podemos entender lei em seu sentido formal lei em seu sentido formallei em seu sentido formal lei em seu sentido formal, como o ato jurídico emanado de um órgão competente do Estado. Nesse sentido, a lei do ordenamento positivo pode conter ou não uma norma, isto é, uma prescrição com as características ora estudadas. Assim, por exemplo, um decreto de nomeação de um ministro ou de um funcionário público apenas formalmente se apresenta como lei, pois nesse ato não existe o conceito normativo. Esse decreto é lei apenas no sentido formal, na sua aparência externa. Quanto à forma, portanto, a lei é uma norma escrita de direito, promulgada pelo poder público. Nesta acepção ampla, compreende a lei propriamente dita, o decreto e o regulamento. Em sentido material e próprio Em sentido material e próprioEm sentido material e próprio Em sentido material e próprio, sem que haja qualquer objeção doutrinária ponderável, lei poderá ser entendida como sinônimo de norma, nos mais diversos campos jurídicos, constitucional, civil, penal, processual etc. Trata-se daquele ato que materialmente contém os atributos e requisitos de uma lei. Ou, melhor dizendo, o caráter de normatividade. Em sentido amplo, portanto, lei é todo ato que se apresenta regularmente expedido por um órgão do Estado. Em sentido restrito, referimo-nos à lei apenas como aquele fenômeno que se apresenta com o conteúdo de norma. No sentido que ora nos interessa no Estado moderno no qual convivem os três Poderes, a lei é a norma escrita de Direito, aprovada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo Poder Executivo. Os decretos e regulamentos são, como regra geral, expedidos pelo poder executivo, o que não obsta que os outros poderes também possam expedi-los, ainda que sob outra nomenclatura. Desse modo, como anota Flóscolo da Nóbrega, Flóscolo da Nóbrega,Flóscolo da Nóbrega, Flóscolo da Nóbrega, "para ter a virtude de lei, é necessário que preencha os requisitos previstos na lei fundamental do Estado, a Constituição" (1972:103). Quanto à origem e promulgação das leis, há todo um aparato de competência, sobre as diversas matérias, incumbindo, no Estado federativo, à União, aos Estados e aos Municípios promulgá-las. Já postamos que o conceito de imperatividade, decantado como característica das leis é algo que merece estudo mais detalhado e não pode ser entendido de forma peremptória. Aliás, em Direito, nada pode ser peremptório. Nada é, tudo pode ser. Nada é, tudo pode ser.Nada é, tudo pode ser. Nada é, tudo pode ser. Toda afirmação peremptória em Direito é de risco. A regra geral descrita pela doutrina diz que o Direito é substancialmente constituído por imperativos, imperativos,imperativos, imperativos, isto é, comandos, ordens. Como regra geral a afirmação é correta, segundo afirma Karl Engisch Karl EngischKarl Engisch Karl Engisch (1979:28), (1979:28), (1979:28), (1979:28), em obra tradicional. No entanto, é preciso alertar que, ao se examinar um Código ou os dispositivos de uma lei, nem todas as proposições que ali se encontram são normas imperativas. Mormente porque em um Código, como o Código Civil, por exemplo, as normas se entrelaçam frequentemente, umas se referem às outras, nem sempre, ou muito raramente, podendo ser vistas ou interpretadas de forma autônoma. Só da combinação delas entre si é possível obter um resultado eficaz para o caso concreto que se analisa. Isto porque, como já afirmamos o Direito não permite que se raciocine o Direito não permite que se raciocine o Direito não permite que se raciocine o Direito não permite que se raciocine abstratamente. abstratamente.abstratamente. abstratamente. O Direito dirige O Direito dirigeO Direito dirige O Direito dirige- -- -se somente a realidades concretas. se somente a realidades concretas.se somente a realidades concretas. se somente a realidades concretas. Desse modo, tomemos, por exemplo, nesse universo tão amplo, a dicção do art. 723 do Código Civil, que descreve as obrigações do corretor: "O corretor e obrigado a executar a mediação com a diligência e prudência que o negócio requer, prestando ao cliente, espontaneamente, todas as informações sobre o andamento dos negócios; deve, ainda, sob pena de responder por perdas e danos, prestar ao cliente todos os esclarecimentos que estiverem ao seu alcance, acerca da segurança ou risco do negócio, das alterações de valores e do mais que possa influir nos resultados da incumbência." Dessa descrição legal, inúmeras ilações podem ser feitas. Caberá, por exemplo, ao intérprete, o juiz ou o árbitro em derradeira análise, definir qual é a diligência e prudência que o negócio sob análise demanda. Há um juízo axiológico a ser feito no caso concreto, na análise da conduta do corretor. O mesmo sediga a respeito das informações que o corretor deve fornecer ao cliente sobre a segurança e os riscos do negócio, bem como sobre eventuais alterações de valores que possam influir nos resultados dessa corretagem. Nessa norma legal, portanto, há sem dúvida uma série de imperativos uma série de imperativosuma série de imperativos uma série de imperativos dirigidos à conduta do corretor. No entanto, de plano, é possível discernir que essa norma não pode ter existência isolada, sendo dependente de outras. A primeira pergunta que o iniciante fará é certamente demandar em que consiste o contrato de corretagem. Essa definição poderia estar ou não na lei. Em princípio, a definição não estará na lei. Trata-se de uma técnica jurídica: o legislador somente define quando a compreensão do conteúdo do fenômeno social pode dar margem a dúvidas. Quando o conceito é perfeitamente conhecido, a definição não estará presente ou estará apenas implícita na lei. Toda definição é, sem dúvida, perigosa, como diz conhecido brocardo: "omnis "omnis"omnis "omnis definitio in iure civili periculosa est". definitio in iure civili periculosa est".definitio in iure civili periculosa est". definitio in iure civili periculosa est". As definições legais funcionam no ordenamento como elementos orientadores, porém não essenciais. No caso da corretagem, todavia, instituto trazido à legislação pelo atual Código Civil de 2002, pois o anterior, de 1916, não o contemplava, a definição está presente no art. 722: "Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer outra relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas." Duas inferências podem ser imediatamente tiradas deste último dispositivo legal. Em primeiro lugar, esta última dicção completa o art. 723, quando a lei descreve as obrigações do corretor. De nada adiantaria saber de suas obrigações se não se soubesse quem pode ser identificado, no universo negociai, como corretor. A lei preferiu, nesse caso, definir. Em segundo lugar, não existe propriamente um imperativo, um comando coercitivo no art. 722, pois ninguém está obrigado, necessariamente, a atuar como corretor na intermediação de um negócio, pois esta pode dar-se de várias formas, como no mandato, na comissão ou em outro negócio dito inominado, isto é, sem rotulação específica. As normas essencialmente definidoras, portanto, não contêm imperatividade. Ainda, as normas sobre o contrato de corretagem presentes no Código Civil não especificam as várias modalidades de corretagem, algumas delas reguladas por leis próprias, como os corretores de imóveis, de mercadorias, da Bolsa de Valores etc. Essas outras leis aplicam-se, sem dúvida, a essas atividades de corretagem, sem prejuízo, no que couber das normas gerais descritas no Código Civil. Vê-se, portanto, que a técnica jurídica não pode se reduzir a conceitos e a atividade singela e isolada, exigindo sempre um raciocínio complexo, com várias premissas. Daí também se verifica que a afirmação geral de a norma conter sempre um imperativo deve ser vista cum cum cum cum granum salis. granum salis.granum salis. granum salis. Tanto as definições como as permissões e proibições encontráveis nas normas são regras não autônomas. Uma coisa, porém, deve ficar clara: sempre haverá um ou mais imperativos, no que se relaciona com o fenômeno jurídico examinado, ainda que existam descrições legais nas quais o imperativo não está presente, ou porque está implícito, ou porque está presente em outra norma. Nesse sentido, conclui Engisch (1979:29): Engisch (1979:29):Engisch (1979:29): Engisch (1979:29): "Esses imperativos só se tornam completos quando lhes acrescentamos os esclarecimentos que resultam das definições legais e das delimitações do seu alcance, das permissões assim como de outras exceções. Os verdadeiros portadores do sentido da ordem jurídica são as proibições e as prescrições (comando) dirigidas aos destinatários do Direito, entre os quais se contam, de resto, os próprios órgãos estaduais. Essas proibições e prescrições são elaboradas e construídas a partir das proposições gramaticais no Código." Num outro aspecto, também, como lembra o jurista alemão, estará ausente o imperativo. Quando, por exemplo, existe uma lei revogadora. lei revogadora.lei revogadora. lei revogadora. Se uma lei, por exemplo, revogasse a proibição do aborto, de forma pura e simples, isso significaria o desaparecimento de um imperativo e essa citada lei não teria no seu bojo imperativo algum. Se a lei, no entanto, excluísse a proibição do aborto apenas em algumas hipóteses, no caso de aborto terapêutico, por exemplo, o imperativo de proibição permaneceria em alguns casos e a complexidade de integração e interpretação das normas remanesceria. Outra classe de normas que deve ser lembrada são as normas normas normas normas atributivas, atributivas,atributivas, atributivas, as quais conferem direitos subjetivos. Nestas, não há um comando ou proibição, mas uma faculdade atribuída a alguém. São exemplos terminados de normas atributivas os direitos e garantias constitucionais presentes na Constituição Federal. Assim, por exemplo, o direito de ir e vir, de reunião, de pleitear danos de natureza moral, os direitos de proteção à personalidade. Veja o que falamos, no Capítulo 1, sobre a distinção entre direito objetivo e direito subjetivo. No direito objetivo, que é norma No direito objetivo, que é normaNo direito objetivo, que é norma No direito objetivo, que é norma, há comando; estão presentes os imperativos, como vimos. No direito subjetivo, que atribui uma faculdade No direito subjetivo, que atribui uma faculdadeNo direito subjetivo, que atribui uma faculdade No direito subjetivo, que atribui uma faculdade a alguém, estão presentes as atribuições de direito. Nos direitos subjetivos há um espectro mais amplo do que simples permissões: não se pode qualificar como permissão, por exemplo, o direito de ação. Trata-se de algo muito mais amplo e que atua em outro patamar. De qualquer modo, os direitos atributivos presentes no ordenamento buscam tornar eficientes os imperativos contidos nas outras normas. Dessa forma, de nada adiantaria ter ação para fazer cessar a turbação ao direito de privacidade, manifestação que é de direito da personalidade, se a privacidade, em si, não fosse garantida por outra norma: "A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma" (art. 21 do Código Civil). Já posicionamos que a norma constitui, em princípio, um imperativo hipotético, tendo em vista fatos futuros. Na terminologia de Kant, Kant,Kant, Kant, haveria de ser feita a distinção com relação ao imperativo categórico. imperativo categórico.imperativo categórico. imperativo categórico. Neste sentido, o imperativo categórico distinguir-se-ia do hipotético porque o primeiro seria aquele que apresentasse objetivamente uma conduta necessária por si mesma, sem relação a outro fim. Os imperativos categóricos prescreveriam uma ação boa em si mesma, isto é, boa em sentido absoluto, que deveria ser cumprida incondicionalmente ou com nenhum outro fim, como por exemplo, "não mentir". O imperativo hipotético exorta e coloca em prática uma possível conduta como meio para qualquer fim que se pretenda alcançar. Na filosofia de Kant, os imperativos hipotéticos seriam meros conselhosou exortações para se alcançar determinado fim. Esse estudo, um marco da jusfilosofia, evidentemente, desvia- se de nossa linha, aqui meramente introdutória. Na verdade, os imperativos jurídicos, "são 'hipotéticos' num sentido inteiramente distinto daquele que corresponde à terminologia kantiana. Eles são hipotéticos, não no sentido de que temos de seguir determinadas prescrições quando queremos alcançar certos fins, não nos impondo nada de vinculativo quanto aos mesmos fins, mas, antes, no sentido de serem conexionados a determinados pressupostos, em parte expressamente fixados, em parte tacitamente subentendidos" (Engisch, 1979:41). Como vimos, essas normas hipotéticas inserem-se num complexo onde há normas imperativas, atributivas e aquelas que as complementam, sem se subsumir a uma ou outra categoria, as quais podemos denominar de normas normasnormas normas enunciativas enunciativas enunciativas enunciativas ou ouou ou complementares. complementares.complementares. complementares. Sob esse prisma, portanto, toda norma jurídica deve ser vista sob certas hipóteses. Assim, por exemplo, matar alguém é crime. O homicida deve ser condenado. Poderá, porém, não sê-lo, porque agiu em legítima defesa, porque não houve intenção de matar, não sendo esse ato punido como crime culposo etc. Nesse sentido é que, precipuamente, deve ser entendido o imperativo hipotético. Em torno desse diapasão deve ser vista a hipótese legal ou hipótese legal ouhipótese legal ou hipótese legal ou tipificação, tipificação,tipificação, tipificação, categoria fundamental para qualquer raciocínio jurídico. Quando se deseja qualificar um fenômeno ou uma conduta, é necessário verificar se ela se subsume, se tipifica, isto é, se amolda, a uma hipótese se amolda, a uma hipótesese amolda, a uma hipótese se amolda, a uma hipótese legal. legal.legal. legal. No direito penal essa subsunção deve ser estrita, dentro do princípio pelo qual não há crime sem lei anterior que o estabeleça. Também no direito tributário existe essa essencial subsunção estrita à norma: não há obrigação tributária se não houver hipótese de incidência ou fato gerador. Ou, em outras palavras singelas para uma primeira compreensão, ninguém está obrigado a pagar tributo se assim não estiver previsto em lei; ninguém pode ser criminalmente condenado se não tiver praticado uma conduta descrita na lei. Deve haver uma relação de causalidade relação de causalidaderelação de causalidade relação de causalidade entre o fenômeno de fato ou conduta e a descrição da lei. Sob esse aspecto, o comando abstrato da lei se concretiza. Em outros ramos do Direito, mormente no Direito privado, as hipóteses legais permitem certa abrangência, extensão ou flexibilidade. Veja o exemplo que aqui citamos sobre o negócio de corretagem. Destarte, atente-se que: "Diferentemente do que sucede com as leis naturais em que há uma relação necessária entre causa e efeito, estamos no mundo da cultura dominado pela contingência: nem sempre é possível aplicar os efeitos jurídicos quando os fatos previstos na norma se verificam. Há, aqui, uma valoração jurídica, uma criação do espírito humano, portanto, trata-se dum nexo de imputabilidade" (Justo, 2001:140). A imputabilidade imputabilidadeimputabilidade imputabilidade consiste como exposto, numa atribuição ou indicação de alguém dentro de uma relação jurídica. REFERÊNCIA REFERÊNCIAREFERÊNCIA REFERÊNCIA: : : : Venosa, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito: Introdução ao estudo do direito:Introdução ao estudo do direito: Introdução ao estudo do direito: primeiras linhas. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2009. (p. 80-85).
Compartilhar