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08 - RETROATIVIDADE E IRRETROATIVIDADE DA NORMA

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RETROATIVIDADE E IRRETROATIVIDADE DA NORMA 
A norma deve ter, como regra geral, uma abrangência mais ou menos ampla, 
isto é, uma generalidade e abstração, para situações futuras. Daí também a sua 
característica de hipotetividade. A noção fundamental é que a lei, uma vez promulgada 
e publicada, só poderá atingir relações jurídicas que a partir de sua vigência 
ocorrerem. Em situações apenas excepcionais, porém, mormente no regime 
democrático, que garante os direitos individuais, há hipóteses nas quais as leis 
atingem fatos pretéritos. O efeito retroativo deve ser visto como exceção a confirmar a 
regra pela qual a lei é uma norma para o futuro. Se as leis atingissem ordinariamente 
os fatos passados, as relações jurídicas se tornariam instáveis e estaria instaurado o 
caos. 
Sob esse prisma, a Constituição Federal de 1988 dispõe, no art. 5º, inciso 
XXXVI, dentro do longo elenco de direitos individuais, que "a lei não prejudicará o 
direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada". Cada um desses três 
institutos merece estudo monográfico e aprofundamento conceitual que refoge a estas 
primeiras linhas. 
Contudo, como primeiro enfoque, entenda-se que adquiridos são os direitos 
que já se incorporaram definitivamente ao patrimônio jurídico da pessoa, que já estão 
sendo exercidos ou que já podem ser exercidos. Desta sorte, a lei não poderá tolhê-
los. Assim, quem já se aposentou, ou sob a lei vigente adquiriu direito à 
aposentadoria, não pode ter seus direitos violados ou modificados por uma lei nova 
que, por exemplo, estende a idade para que seja concedido o benefício. No entanto, a 
conceituação de direito adquirido é por demais tormentosa e com muita frequência os 
tribunais são chamados a examiná-los, mormente o Supremo Tribunal Federal, a 
quem cabe decidir em última ou única instância sobre a constitucionalidade. A verdade 
é que essa é sempre uma questão em ebulição, dúctil e que atinge diretamente os 
interesses do Estado em confronto com os interesses e direitos individuais. Também 
não é menos verdade que todos os que se lançam a conceituar, definir e delimitar os 
direitos adquiridos enfrentam escolhos de difícil transposição. 
Ato jurídico perfeito é aquele já praticado e que surtiu os consequentes 
efeitos.Um contrato elaborado sob lei que o autorize não pode ser invalidado porque 
lei posterior considere esse contrato ilegal. 
A coisa julgada é o principal efeito da sentença. Trata-se da decisão judicial da 
qual não caiba mais recurso. Há instrumentos processuais que permitem, sob certas 
circunstâncias, alterar a coisa julgada: a ação rescisória no campo civil e a revisão 
criminal no campo penal. Essa matéria será estudada na ciência processual. 
No entanto, o princípio da imutabilidade da coisa julgada modernamente 
também deve ser visto sob outra ótica. Não mais se pode afirmar, como no passado, 
que a sentença faz do negro, branco, e do branco, negro; que coloca uma pedra sobre 
a questão controvertida. Há realidades materiais que nos atingem mais recentemente, 
mormente sob influência da tecnologia, que nem o direito adquirido, nem o ato jurídico 
perfeito, nem a coisa julgada podem alterar. Sob esse aspecto, apenas como 
argumento inicial para meditação, lembre-se de uma sentença trânsita em julgado que 
tenha apontado a paternidade de uma pessoa, com base em exame incorreto do DNA. 
Ninguém pode ser qualificado como pai genético se verdadeiramente não o for. 
Imaginem-se os dramas sociais que uma decisão incorreta desse jaez pode ocasionar. 
Nossos tribunais já se têm ocupado da questão. 
O fato é que tanto no que diz respeito aos direitos adquiridos como no tocante 
à coisa julgada há um novo horizonte a ser descortinado neste século, sempre, é 
verdade, buscando a proteção da dignidade humana, pedra de toque da aplicação do 
direito contemporâneo. 
Por último neste tópico, recorde-se de que no campo criminal admite-se a 
retroação benéfica da lei, a retroatio in mellius. Assim, alguém que tenha sido 
condenado por uma lei da época da conduta, e a lei nova deixa de descrevê-la como 
crime, deve ser beneficiado. Se estiver cumprindo pena, será posto em liberdade. 
Ademais, todos os registros e consequências da condenação devem deixar de operar. 
 
REVOGAÇÃO E CONFLITO DE NORMAS 
 
Quando uma lei entra em vigor não tem, como regra geral, prazo de vigência, 
salvo a exceção restrita já vista das leis temporárias. Assim, tem aplicação o art. 2º da 
Lei de Introdução ao Código Civil: "Não se destinando à vigência temporária, a lei terá 
vigor até que outra a modifique ou a revogue”. 
Revogar significa tornar sem efeito algo até então existente. Destarte, somente 
lei existente pode ser revogada. Vimos que o art. I a da citada LICC dispõe que, salvo 
disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo o país 45 dias depois de 
oficialmente publicada. Embora ainda não vigente, a lei em período de vacatio legis já 
é existente, como vimos, e, apesar de não ser opinião uníssona, mesmo durante esse 
período, a lei em vacatio pode ser revogada, como já ocorreu em nosso ordenamento. 
Como vimos, pode o legislador optar pela vigência imediata da lei, quando de 
sua publicação. Quando há período de vacatio legis, que pode ser maior ou menor que 
os citados 45 dias, é porque a lei necessita de prazo para os especialistas e 
interessados se adaptarem à nova norma e para que eventuais aprestos materiais 
com relação à nova lei sejam ultimados. 
Revogação é termo geral que abrange a derrogação e a ab-rogação. Na 
derrogação, a lei nova apenas revoga parcialmente lei anterior. Na ab-rogação, a 
revogação atinge completamente lei anterior. Quando há derrogação, o ordenamento 
ficará com ambas as leis em vigor, cabendo ao intérprete, no mais das vezes, indicar 
quais os dispositivos da lei antiga que ainda remanescem vigentes e eficazes. 
A revogação é, como facilmente se nota, questão de vital importância. Afinal, 
cabe à sociedade ter plena ciência da existência, validade e eficácia de uma norma. 
Como está descrito no próprio artigo aqui citado, uma nova lei pode modificar ou 
revogar outra lei. Começa aí um dos grandes e mais complexos problemas da ciência 
do Direito. Por vezes, como deveria suceder sempre, o legislador é expresso, 
mencionando, no bojo da nova lei, quais as leis ou artigos de leis revogados pela nova 
norma. Nesse aspecto, perante a revogação expressa, não haverá maior problema 
para o intérprete. Os dispositivos mencionados na lei nova fazem desaparecer do 
mundo jurídico a vigência e a eficácia da lei antiga. Podem remanescer efeitos de 
vigência da lei antiga, para atos praticados sob seu pálio, o que deve ser examinado 
no caso concreto. Assim, por exemplo, um contrato redigido sob lei antiga seguirá, em 
princípio, seus dispositivos. A questão, porém, não guarda essa tal simplicidade, pois 
há normas programáticas, mesmo em sede de contratos, que se aplicam de plano, 
mesmo para negócios jurídicos praticados sob a lei anterior. De qualquer forma, há 
que se preservar a vontade idônea manifestada sob a lei revogada. 
Problema maior, por vezes de alta complexidade, ocorre quando a nova lei é 
omissa sobre a modificação ou revogação da lei antiga e a novel lei mostra-se 
contraditória ou confusa com a legislação antiga ou disciplina total ou parcialmente a 
matéria até então regulada. Trata-se da problemática da revogação tácita. Nessas 
hipóteses, há todo um trabalho de raciocínio, de interpretação e integração das 
normas dentro do ordenamento a fim de se concluir pela subsistência, modificação, 
derrogação ou revogação de lei antiga. A técnica inclui-se mais propriamente no tema 
da interpretação, que trataremos a seguir, mas seprende diretamente à normatividade 
e aqui não pode ser esquecida. Há que se verificar, nesse caso, as incompatibilidades 
da lei nova com a lei antiga. O tema é conhecido como conflito de normas ou 
antinomias. Haverá conflito de normas sempre que duas ou mais leis se 
contraponham. Se esse conflito é apenas aparente, ou real, isto será o objeto da 
interpretação. Em cada caso, o intérprete examinará a abrangência da lei nova, com 
relação a uma lei já existente. Do caldeamento dos julgados, ter-se-á, por fim, um 
quadro claro sobre qual lei deve ser aplicada. Nesse prisma, expressa a Lei de 
Introdução ao Código Civil: 
"A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, 
quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a 
matéria de que tratava a lei anterior" (art. 2º, § Iº). 
 
"A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das 
já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior" (art. 2º, § 2º). 
 
"Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por 
ter a lei revogadora perdido a vigência" (art. 2º, § 3º). 
 
Desse modo, a lei nova pode também não revogar a lei antiga, mas 
complementá-la, acrescendo novos dispositivos à lei existente. Como também adverte 
esse dispositivo legal, o fato de uma lei posterior ser revogada não faz com que se 
restaure lei anteriormente revogada, fenômeno a que se dá o nome de repristinação. 
Assim, somente por dispositivo expresso em novo diploma legal é possível repristinar 
lei já revogada. Assim, por hipótese, se uma lei revogasse o atual Código Civil, não 
seria repristinado o Código de 1916, salvo se houvesse menção expressa do 
legislador. 
Geralmente, no último artigo da nova lei encontra-se a expressão "revogam-se 
as disposições em contrário", a qual pode surgir isoladamente ou em conjunto com o 
elenco de leis que o legislador deseja expressamente revogar. Ainda que essa 
expressão de praxe não estivesse presente, por uma questão de princípio e lógica 
jurídica, ainda que não tivéssemos as normas mencionadas da LICC, as disposições 
em contrário estariam revogadas. Daí por que essa expressão se mostra, na 
realidade, no mínimo desconfortável, para não afirmá-la como inútil. 
Certamente, a primeira pergunta que o iniciante fará a respeito do tema é "por que o 
legislador não é sempre expresso?", indicando peremptoriamente no texto da nova lei 
quais os dispositivos e as leis que revoga. Aliás, é mais raro que seja expresso; 
poucas vezes o será. Como regra geral, opera-se a revogação tácita. Por várias 
razões isto ocorre. Primeiramente, como temos repetido exaustivamente, é muito difícil 
ser peremptório na ciência jurídica. O ideal é, sem dúvida, que a lei expresse qual lei 
ou leis ou artigos de lei que revoga. O legislador cuidadoso assim o fará. Nem sempre 
há esse cuidado; porém, embora tenhamos uma lei que assim determine (Lei 
Complementar nº 107, de 26 de abril de 2001), sucede, com frequência, que o 
legislador não tem ou não deseja ter condições, ao editar a nova lei, de avaliar todos 
os reflexos que ela ocasionará: por ausência de conhecimentos técnicos, o que 
ultimamente tem ocorrido infelizmente com persistência, ou porque o tema é por 
demais amplo e complexo. Assim, não se arrisca o editor da nova lei a revogar 
expressamente uma norma antiga e relega todo esse trabalho, de forma mais cômoda 
e com mínimo esforço, para os interessados e os tribunais. Sem dúvida, essa postura 
traz incertezas e insegurança, mas, amiúde, torna-se de fato inconveniente e 
inoportuna outra diretriz. A par dos senhores deputados e senadores, nem sempre 
afeitos à técnica jurídica, as assessorias jurídicas da Câmara e do Senado, bem como 
das assembleias legislativas estaduais, deveriam ser mais zelosas e escrupulosas a 
esse respeito. 
Exemplo lamentável dessa ausência de esmero na elaboração da lei é o 
Código Civil de 2002: o art. 2.045 apenas revogou expressamente o Código de 1916 e 
a primeira parte do Código Comercial. Há dezenas de leis que ficaram no limbo, a 
cargo da jurisprudência, para decidir de sua vigência total ou parcial, como, apenas 
para citar os exemplos mais patentes, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei 
do Divórcio, a Lei de Condomínio e Incorporações e a Lei dos Registros Públicos. 
A citada Lei Complementar nº 107/2001 é exemplo muito elucidativo, conforme 
já comentado, de lei descumprida pelos próprios legisladores. Seu artigo 9º determina: 
"A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as 
leis ou disposições legais revogadas." 
 
O Código Civil, que se coloca como exemplo mais retumbante, mercê sua 
capital importância no ordenamento de qualquer nação, deveria ter merecido o 
cuidado propugnado por essa lei. O legislador omitiu-se. Se uma norma desse nível e 
dessa importância não obedece ao próprio ordenamento, a uma lei complementar, o 
que dizer então de leis mais singelas e menos complexas. Trata-se de exemplo claro 
de desmazelo e despreparo do legislador. O intuito dessa lei complementar foi 
evidentemente facilitar o trabalho do intérprete e dar maior segurança à sociedade. 
Portanto, por vontade do próprio Estado, continuamos dependendo dos incertos e 
demorados ventos da jurisprudência, com incerteza sobre inúmeras leis que se 
colocaram no limbo, com a promulgação do novel diploma civil, fato que ocorre 
também praticamente com a maioria das normas por aqui editadas. Com isto, fica 
claro que a própria estrutura legislativa e judiciária do país admite que leis vigentes 
podem não ser cumpridas. E fato que esse quadro demonstra um despreparo técnico 
do legislador, com a conivência paralela do Poder Executivo, e uma passividade 
daqueles que têm por missão fiscalizá-los, pelo voto e pelos instrumentos jurídicos 
postos à disposição do indivíduo. 
Sob a vertente da revogação, há sempre dois critérios fundamentais a serem 
considerados: o cronológico e o hierárquico. 
O critério cronológico é aplicação do brocardo lex posteriori derrogat priori. A lei 
posterior derroga a anterior, sendo ambas do mesmo nível hierárquico. 
Pelo critério hierárquico, uma norma inferior pode ser revogada por norma 
superior. Assim, as novas normas constitucionais tornam ineficazes todas as normas 
do ordenamento que conflitem com elas. Sendo a Constituição a lei maior, não há no 
seu bojo qualquer menção a revogação. Pelo mesmo princípio, uma norma inferior não 
pode revogar a superior. Desse modo, uma lei municipal não pode derrogar lei 
estadual ou federal. 
CONFLITO OU CONCURSO DE NORMAS 
Como se apontou, o fenômeno da revogação das normas jurídicas pode dar 
margem a outro fenômeno, qual seja, o do conflito de normas. Haverá, destarte, 
conflito de normas sempre que disposições de duas ou mais normas se 
contraponham, de modo que a observância de uma implique o descumprimento de 
outra. Não ocorrerá essa problemática, como vimos, quando o legislador é expresso e 
aponta quais as leis que o novo diploma legal revoga. Portanto, na revogação 
expressa não há conflito. A questão surgirá quando a lei é omissa, bem como perante 
a vazia expressão revogam-se as disposições em contrário. Na revogação tácita, por 
conseguinte, poderá surgir a complexidade. O conflito pode ser total ou parcial. Será 
total quando as normas são totalmente antagônicas; parcial, quando isto não ocorre. 
Aponta Oliveira Ascensão (2003:523) que, perante uma pluralidade ou 
concorrência de normas, dá-se o concurso aparente quando houver especialidade, 
subsidiariedade ou consunção. 
Quanto à especialidade, a regra a ser lembrada é que, havendo norma geral e 
norma especial sobre mesma matéria, prevalece a especial, uma vez que a lei geral só 
revogaa especial quando assim expressamente o declarar. Assim, por exemplo, a Lei 
do Inquilinato se aplica às locações de imóveis, enquanto o Código Civil se refere à 
locação em geral. As normas se apresentam como gênero e espécie. 
Ocorre a subsidiariedade quando os fatos previstos numa norma sobrepõem-se 
a fatos da mesma natureza descritos em outra. Visto por outro lado, há, então, uma 
sobreposição de normas. As regras de interpretação devem definir, desse modo, a 
norma aplicável. Assim, por exemplo, a adoção é tratada entre nós tanto pelo Código 
Civil, quanto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 13 de julho 
de 1990). Várias situações semelhantes foram criadas pela edição do mais recente 
Código Civil. A questão interpretativa é saber se será aplicado exclusivamente o 
Código Civil, se ambos os diplomas se aplicam para situações diversas ou se o ECA 
terá apenas aplicação subsidiária. Nem sempre a conclusão será simples. Em síntese, 
o intérprete terá que definir se uma norma exclui outra ou se ambas convivem. O 
trabalho do hermeneuta será perguntar qual dos dois complexos normativos deverá 
ceder perante outro em cada caso. 
Haverá consunção de normas quando "o interesse tutelado por uma norma 
absorve o tutelado por outra norma" (Ascensão, 2003:524). Nesse caso, o exegeta 
conclui que uma norma foi revogada. Ocorre o fenômeno quando norma de 
abrangência mais ampla absorve também os fatos descritos em norma de alcance 
mais restrito. 
Se não houver concurso de normas, nem mesmo aparente, conclui-se pela 
permanência das normas sob enfoque em plena vigência. Todo esse trabalho requer, 
como se nota, ingente esforço do intérprete. 
 
IGNORÂNCIA DA LEI 
A lei, uma vez promulgada e publicada, presume-se de conhecimento de todos. 
O ordenamento entende que a norma legal é obrigatória e ninguém se escusa de 
cumpri-la. O provecto preceito encontra-se estampado no art. 3º da LICC: 
"Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece." 
Como se nota, nosso ordenamento não presume propriamente a lei como 
conhecida de todos, mas não admite que se possa alegar que não seja conhecida. Há 
aspectos diversos a serem enfocados. Decorre do dispositivo que a lei, após publicada 
e decorrido eventual período de vacatio legis, torna-se obrigatória para todos. São 
muito conhecidos os brocardos ou aforismos em torno do tema: nemo jus ignorare 
censetur e error júris non excusat, os quais exprimem aproximadamente o mesmo 
conceito. 
Contudo, leva-se em conta que o fato de a lei ser presumidamente de 
conhecimento de todos e, portanto, obrigatória retrata um dos grandes obstáculos 
técnicos de nossa ciência. Não há que se levar o tema exclusivamente para o âmbito 
da presunção, pois longe está toda a população e mesmo todos os juristas e técnicos 
de conhecerem todas as leis. A realidade, como a todos é evidente, mostra-se muito 
distante disso. 
Joaquin Costa (1957:13), jurista espanhol que escreveu sobre o tema em 
meados do século passado, afirma que há mais de dois mil anos sustenta-se a 
afirmação dessa presunção, 
"que constitui um verdadeiro escárnio e a maior tirania que se 
exerceu jamais na história: essa base, esse cimento das 
sociedades humanas é o que se encerra nesses conhecidos 
aforismos herdados dos antigos romanistas". 
 
A ninguém se permite ignorar as leis (nemine licet ignorare jus). Como consequência, 
presume-se que todos as conhecem, mesmo aqueles que delas não possuem 
conhecimento algum (ignorantia legis neminem excusat). Conclui o autor que é 
conhecimento geral que esses princípios contrariam a realidade das coisas; que se 
trata de uma ficção e que constitui uma afirmação falsa. Não há dúvida de que apenas 
uma insignificante parcela da sociedade conhece as leis e, ainda assim, aquelas leis 
que lhe tocam. Mesmo o mais solerte profissional do Direito não terá conhecimento de 
todas as leis vigentes de um ordenamento. Não faltam autores que reconhecem a 
falsidade dessa afirmação, desvinculada da realidade dos fatos. 
Ocorre que o princípio da inescusabilidade do cumprimento da lei decorre do 
interesse social, pois não haveria forma de ordenar a sociedade se a cada momento 
houvesse necessidade de se comprovar o conhecimento da lei pelo destinatário ou 
interessados. Desse modo, essa norma é conveniente e oportuna, para assegurar 
certeza jurídica. 
Destarte, como é facilmente perceptível, cuidando-se esse princípio, qual seja, 
do conhecimento presumido da lei, de um preceito tão contrário à razão e oposto à 
natureza e à verdade das coisas, nem o legislador nem os tribunais mantêm-se a ele 
apegados de forma estrita. Portanto, a aplicação desse princípio, por vezes, deve ser 
vista com temperamentos. Em princípio, a doutrina admite o erro e a ignorância da lei, 
erro de direito, ao lado do erro de fato, mormente quando o agente está de boa-fé, no 
âmbito dos negócios jurídicos. O que se entende é que a ignorância da lei não pode 
ser escusada para justificar a própria ignorância da lei (Espínola e Espínola Filho, 
1999: v. 1, 79). Não há, na verdade, uma presunção de que a lei é conhecida, mas 
uma conveniência para que seja conhecida. A aplicação do erro de direito é ampla, 
como relatamos no estudo do negócio jurídico, em nossa obra de direito civil, volume 
1. Conclui-se que não se admite a alegação da ignorância da lei ou erro de direito para 
que o agente se livre das consequências do cumprimento da lei, mas, se tiver por 
objeto o erro de direito em um negócio jurídico, a alegação é válida e perfeitamente 
admissível. Assim, por exemplo, pode ser anulado o negócio jurídico quando um 
agente comerciante, por exemplo, importa mercadoria ignorando que sua 
comercialização está proibida no território nacional. Essa matéria relativa ao negócio 
jurídico não se amolda perfeitamente, contudo, aos amplos termos do art. 3º da LICC. 
A regra geral criticada, em princípio, impõe-se sem outras considerações. 
 
REFERÊNCIA: 
VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito: primeiras linhas. 2ª edição. 
São Paulo: Atlas, 2009. (p. 109-117).

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