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REPARO, REGENERAÇÃO E CICATRIZAÇÃO Patologia Prof. Talita Bischof Faculdade Guairacá • Quando se inicia um processo inflamatório, que é sempre um mecanismo de defesa contra um agente agressor, simultaneamente, também se dá início aos mecanismos desencadeadores de cicatrização e regeneração. • Nos casos da pneumonia (inflamação), corte na pele (trauma seguido de inflamação) ou um enfarte do miocárdio (necrose isquémica seguida de inflamação), o processo envolvido é comum: inflamação, embora o agente agressor não seja o mesmo. • Mas a inflamação vai evoluir de forma distinta, no que diz respeito à regeneração e à cicatrização. • Se um corte na pele, vai levar a cicatriz, ou não, depende da extensão da lesão. Um corte superficial na pele, em geral não leva à cicatrização, o mesmo não acontece num corte mais profundo. • Já o enfarte do miocárdio leva sempre à cicatrização. • Assim, outro ponto importante da cicatrização (para além da extensão) é o órgão, o tipo de células que o constitui. • A reparação processa-se de duas formas: • Regeneração • Cicatrização • O que vai depender para que uma reparação se processe por regeneração ou cicatrização, é: • extensão da lesão e • órgão lesado • Estes mecanismos não se excluem mutuamente, ou seja, após lesão, no mesmo tecido pode haver regeneração e cicatrização. • Se vai haver ou não cicatrização depende de: • Tipo de tecido • Intensidade da agressão • Manutenção da membrana basal, do esqueleto do tecido. • Por que é que o fígado, sendo um órgão por excelência de regeneração, leva a cirrose devido ao alcoolismo crónico? • O próprio termo cirrose significa fibrose. O que acontece é que antes de chegar a cirrose o alcoolismo crónico provocou um processo inflamatório: Hepatite alcoólica. • E a partir desta é que evoluiu para cirrose. Mas neste processo inflamatório há destruição da membrana basal, e portanto o fígado regenera. • Só que regenera duma forma desordenada: forma nódulos. Esses nódulos cercados por fibrose constituem a Cirrose Hepática. ASCITE • A regeneração depende: • do tipo de tecido • da intensidade da lesão • manutenção da estrutura prévia do tecido. • Os tecidos são classificado de acordo com a capacidade de proliferar, com a capacidade das células entrarem no ciclo celular, não no período embrionário, mas no período da vida adulta. • Existem células que quando são estimulados proliferam. Como por exemplo, o hepatócito, que é uma célula estável. Na vida adulta tem muito pouco potencial proliferativo, a não ser que seja estimulado a proliferar. • Existem outras células que estão continuadamente no ciclo celular: sempre em replicação, como por exemplo, as células da epiderme. Estas são chamadas células lábeis. • A medula óssea é outro tecido lábil. As células sanguíneas são destruídas a nível do baço e do sistema macrofágico-monocítico, removidas e repostas imediatamente a partir das células mãe que estão na medula óssea. • Existem tecidos que na vida adulta muito dificilmente reentram no ciclo celular, por isso não são capazes de se dividir, como por exemplo os miócitos e os neurónios, que são chamadas de células permanentes. • Assim, entende-se porque é que o enfarte do miocárdio não se faz por regeneração, mas por cicatrização. • As células vizinhas não têm capacidade de proliferar e substituírem a área lesada. CLASSIFICAÇÃO DOS TECIDOS/CÉLULAS DE ACORDO COM O POTENCIAL PROLIFERATIVO: • Lábeis: células que estão em contínuo processo de proliferação Ex: pele, mucosa e medula óssea • Estável: células quiescentes com baixo potencial proliferativo, mas quando estimuladas entram em proliferação Ex: parênquima do fígado, do rim e do pâncreas, células endoteliais, fibroblastos e músculo liso • Permanentes: dividem-se preferencialmente no período embrionário Ex: neurónios e músculo cardíaco • Se um tecido for constituído por células lábeis, ou estáveis vai haver regeneração. • Porque o tecido é capaz de reparar por proliferação aquelas células que morreram. • Mas no caso de ser um tecido constituído por células permanentes, mesmo que a intensidade da agressão seja pequena, vai haver reparação por cicatrização. • Se a lesão tecidual for extensa, vai haver grande destruição do tecido, mesmo que isto aconteça num tecido de células lábeis e estáveis, isto pode evoluir para uma reparação por cicatrização, dependendo da intensidade da agressão. • É o que acontece quando há formação do tecido de granulação, após um processo inflamatório, a reparação faz-se por cicatrização. • Outro fator importante é a matriz extracelular, que contribui para a sustentação e conexões da célula com o tecido conjuntivo. Se esta matriz for extensamente lesada a reparação faz-se por cicatrização. • Depois da morte de um conjunto de células num tecido, as células lábeis ou estáveis da vizinhança são estimuladas a crescerem ou a proliferarem para substituírem as células mortas. • Os estímulos, para as células entrarem no ciclo celular, são os mediadores químicos e fatores de crescimento. • Estes últimos são os maiores estimuladores positivos para as células proliferarem. • Os fatores de crescimento podem ser libertados: • pelas células inflamatórias: efeito parácrino • podem chegar ao local pela corrente sanguínea: efeito endócrino • pela própria célula: efeito autócrino • Quando as células começam a proliferar, a regenerar, esse crescimento não se pode dar de forma descontrolada e ilimitada, porque se não forma-se um tumor. • A proliferação não controlada é um princípio básico das neoplasias. • Por isso tem de haver estímulos negativos para parar a proliferação. Um dos estímulos negativos mais potentes é a chamada inibição por contato. • Ou seja, quando as células começam a proliferar e começam a entrar em contato umas com as outras, desenvolvem ligações célula a célula, e isso é um potente estímulo para que a proliferação pare. • Exemplo: • Numa placa de cultura de células não neoplásicas, as células vão proliferar até ocuparem toda a placa, depois param de crescer porque há inibição por contato. • Se forem células neoplásicas, elas não param de crescer vão crescer umas sobre as outras e algumas delas vão começar a morrer, porque numa placa de cultura não há nutrição suficiente para manter aquele crescimento celular. MATRIZ EXTRACELULAR • Um elemento muito importante durante a reparação celular e que precisa de se manter íntegro para que ocorra regeneração é a matriz extracelular. • Esta consiste basicamente, em proteínas estruturais fibrosas (que incluem vários tipos de colágeno e glicoproteínas de adesão), e numa matriz intersticial constituída por proteoglicanos. • A matriz extracelular tem um papel muito importante na estimulação da proliferação e diferenciação celular, direciona a migração celular entre os tecidos e permite a adesão das células aos tecidos. • As células parênquimatosas ligam-se à matriz extracelular através de integrinas. • Assim, as integrinas, medeiam o contato entre as células e a proteínas da matriz (colágeno e fibronectina) e permitem, também a transmissão de estímulos da matriz para o núcleo da célula. • Estes estímulos induzem proliferação, diferenciação e síntese de proteínas que interferem na migração celular. • Conclusão: a matriz é um elemento extremamente activo e dinâmico. Para que se processe a reparação, regeneração e cicatrização é essencial a comunicação entre as células do parênquima e os elementos da matriz. CICATRIZAÇÃO • Ocorre cicatrização: • num tecido constituído predominantemente por células permanentes, • se o dano tecidular for extenso • e/ou se afetar a matriz extracelular. FASES DA CICATRIZAÇÃO: • Indução da respostainflamatória pela lesão: • É nesta fase que se forma o tecido de granulação que é um tecido muito edematoso, rico em vasos, com angiogénese muita ativa, com muitas células inflamatórias e com uma matriz. A formação deste tecido é o primeiro fenómeno que ocorre quando se vai originar uma cicatriz (não confundir com granuloma, que é característico dum processo inflamatório crónico). • Regeneração das células parênquimatosas • Migração e proliferação das células parênquimatosas e do tecido conjuntivo • Síntese das proteínas da matriz extracelular • Remodelação dos elementos do parênquima para restaurar a função • Remodelação do tecido conjuntivo • Três mecanismos essenciais que ocorrem durante o processo de cicatrização: • Angiogenese: Estímulos à formação de novos vasos sanguíneos, estímulos esses que são levados a cabo por fatores de crescimento . • Fibroplasia: Quando há indução da resposta inflamatória, na primeira fase, há regeneração das células parênquimatosas. Depois dá-se migração e proliferação, tanto das células parênquimatosas como das células do tecido conjuntivo, principalmente dos fibroblastos. Então, na fibroplasia há migração e proliferação dos fibroblastos no local da lesão. As células inflamatórias são a principal fonte de fatores de crescimento (FGF), que “chamam” os fibroblastos e os induzem a proliferar e a produzir matriz. Até que se cessa a proliferação dos fibroblastos, para evitar a formação de neoplasias. • Remodelação: • Devido a grande proliferação celular e à desorganizada secreção de matriz extracelular é essencial a existência de um processo que organize a cicatriz, processo denominado remodelação. Este processo é regulado por metaloproteínases (metalo, porque são dependentes de metais para funcionar, como o zinco) e a sua função é a degradação do colágeno. TIPOS DE CICATRIZAÇÃO • Existem dois tipos de cicatrização: • a cicatrização por primeira intenção e a cicatrização por segunda intenção. • A diferença básica entre estes dois tipos é a intensidade (de organização, de reparação, de formação de cicatriz). • Um exemplo clássico de cicatrização por primeira intenção é quando é feito um corte na pele durante uma cirurgia e os bordos da ferida são aproximados (por exemplo, com pontos). A perda de tecido neste caso é muito pequena, e daí há menos organização, menos formação de tecido conjuntivo. • Uma cicatrização por segunda intenção é quando a ferida é muito grande, os bordos da ferida não são aproximados, vai haver mais organização, mais deposição de colágeno, mais formação de cicatriz. FATORES QUE INFLUENCIAM A CICATRIZAÇÃO • Estes fatores podem ser extrínsecos ou intrínsecos ao organismo. • Fatores extrínsecos: • Má nutrição: indivíduos mal nutridos têm dificuldade em formar cicatriz devido à ausência de certas proteínas, metais (como o zinco, importante para o funcionamento das metaloproteinases) e vitaminas (como a vitamina C) que são importantes para a síntese de colágeno. • Isquemia tecidual: vai haver dificuldade em chegarem células inflamatórias, à zona lesada, logo vão existir menos fatores que estimulem a proliferação dos fibroblastos e a síntese de colágeno. • Infecção: dano tecidual constante e reação inflamatória persistente • Presença de corpos estranhos: inflamação e infecção persistente • Uso de esteroídes sistémicos • Diabetes: porque causa isquemia e aumenta a susceptibilidade a infecções • Fatores intrínsecos: • Tipo de tecido lesado: lábil, estável ou permanente • Localização da lesão: cavidade pleural, peritoneal, sinovial • Aberração do crescimento celular e produção de matriz extracelular: cicatriz hipertrófica, queloídes e “granulomas piogénicos” • Reacções imunológicas/auto imunes que resultam em estimulação persistente da fibrogénese: reumatóide, cirrose, fibrose pulmonar QUELOIDE • Um queloide é uma forma exagerada de cicatrização. • A cicatriz em vez de parar, inibir o crescimento, inibir a deposição de colágeno, não para de crescer e forma uma espécie de “tumoração”. • Existe provavelmente uma predisposição genética para a formação de queloides. • Também existem reações imunológicas ou auto imunes que estimulam persistentemente a deposição de colágeno nos tecidos, um exemplo clássico é a artrite reumatoide, que pode levar à deformação acentuada das articulações.
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