Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
O PAPEL DO PROFESSOR (A) NA CONSOLIDAÇAO DA GESTAO DEMOCRÁTICA NA REDE MUNICIPAL DO RECIFE Maria do Socorro Vitor1 Vânia Claudia Barbosa Wanderley2 Alice Botler3 Ana Lúcia Borba4 RESUMO O presente artigo aborda a questão da participação docente na consolidação da gestão democrática. Para isso, realizamos um estudo de caso em uma escola municipal de Recife, que tomou como instrumento principal de coleta de dados entrevistas com direção, vice-direção, coordenação e professores a fim de investigar como vem se dando a contribuição dos professores na consolidação da gestão democrática no espaço escolar. A análise de conteúdos nos permitiu concluir que na escola, nosso campo de investigação o processo de participação na gestão escolar já está sendo incorporada na consciência e na prática dos professores, através principalmente da participação ativa no Conselho Escolar e na elaboração e execução do Projeto Político Pedagógico. PALAVRAS-CHAVE: Gestão Democrática, Participação Docente, Autonomia INTRODUCAO O presente estudo teve como objetivo geral investigar como vem se dando a contribuição dos professores na consolidação da gestão democrática, tomando como campo de investigação uma escola da rede municipal do Recife. O interesse em estudar a temática gestão democrática na rede municipal de ensino, surgiu a partir de inquietações advindas das leituras realizadas durante o curso de Pedagogia, a fim de melhor compreender como efetivamente os professores participam da consolidação da gestão democrática no espaço escolar. As perguntas que nortearam nosso estudo foram: Até que ponto os professores compreendem que tem um papel a desempenhar na consolidação da gestão democrática? Quais contribuições efetivas os professores (as) da rede municipal vem dando na consolidação da gestão democrática? 1 Concluinte de Pedagogia - Centro de Educação -UFPE. 2 Concluinte de Pedagogia - Centro de Educação - UFPE. 3 Doutora em Ciências Sociais e professora do Centro de Educação da UFPE. 4 Mestre em Educação pela UFPE. 2 A gestão educacional constitui-se numa relevante temática que apresenta rebatimentos sobre as praticas desenvolvidas no dia-a-dia nas escolas. Logo, percebemos a necessidade de uma interação entre professores e direção buscando uma visão que supere a gestão autoritária e centralizadora. Atualmente a gestão democrática nas escolas públicas vem sendo bastante discutida justamente por representar reflexo de uma tendência mundial encontrada nas modernas organizações, sejam elas públicas ou privadas. Sua aceitação implica uma ruptura com o modelo tradicional de compreender e atuar na realidade e impõe um novo padrão de participação, planejamento e gestão no qual tanto os professores quanto os dirigentes escolares possuem papéis definidos. Percebe-se que os professores precisam superar a concepção de que cabe a eles não somente a simples atividade de dar aulas , mas também ultrapassar as paredes da classe. Nestes termos, a função docente passa a incluir a função educativa de forma global e, nela, a incorporação da gestão. Partindo, pois, dessa compreensão é que nos propomos a fundamentar tal discussão respaldada em autores como Paro (2003) e Ferreira (2001) dentre outros que contribuem de forma relevante com a temática em estudo. GESTÃO DEMOCRÁTICA Na década de 80, no mundo inteiro, começou um forte movimento de descentralização e de busca de autonomia e gestão colegiada das escolas dos sistemas públicos de ensino. A idéia da gestão democrática no Brasil é considerada uma inovação da Constituição Federal Brasileira de 1988 (CF/88), que a incorporou como um princípio do ensino público na forma da Lei. Essa idéia surgiu como proposta no contexto da transição democrática e na contestação das práticas de gestão escolar dominantes sob o regime militar (autocrata) e na luta pela construção de uma nova escola. Isto é, de uma escola aberta à participação popular e comprometida com seus interesses históricos, com vistas a mudanças sociais duradouras e significativas para esse segmento. 3 Nesta direção, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº. 9394/96, referenda tal princípio, explicitando que a gestão democrática é feita "na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino". A gestão democrática aparece na LDBEN ligada à "participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola" e à "participação da comunidade escolar local em conselhos escolares ou equivalentes" (Art.14). A LDBEN, em seu artigo 14 apresenta as seguintes determinações: Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I. participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II. Participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.(BRASIL,1996) Vale destacar também que a Gestão Democrática das unidades escolares públicas ganha terreno quando passa a ser definida pelo estado neoliberal, como forma de garantir a eficiência e eficácia do sistema público de ensino. Isso não significa, contudo, um considerável avanço na construção de uma escola pública de qualidade, que atenda aos interesses da maioria da população brasileira, visto que a participação da comunidade na gestão escolar não é algo fácil de ser alcançado ou que possa ser garantido por determinação legal, principalmente pela tradição autoritária da sociedade brasileira. Logo, não podemos pensar que a gestão democrática da escola possa resolver todos o problemas, mas a sua implementação e efetiva consolidação são, hoje, uma exigência da própria sociedade, que a enxerga como um dos possíveis caminhos para a democratização do poder na escola e na sociedade. De acordo com Paro (2003), o que vai definir o perfil de uma gestão se é autocrática ou democrática será a qualificação de seus fins e a escolha dos processos utilizados. Assim, o autor aponta algumas condições para que a gestão democrática se concretize: 4 Transparência de informações, dos controles e das avaliações; debate e votação das decisões coletivas; normas de gestão regulamentadas e/ou legitimadas por maioria; coerência da gestão com o processo democrático mais amplo da sociedade; e vigilância e controle da efetividade das ações (PARO apud FORTUNA, 1998, p. 101). A consolidação da gestão democrática na escola pública tem sido um dos desafios destes tempos pós-LDBEN. O horizonte desse conceito de gestão é o da construção da cidadania o que inclui a noção de autonomia, participação, construção partilhada e pensamento crítico, em oposição à idéia de subalternidade mas que envolve, também, a de responsabilidade, prestação de contas, bem comum e participação consciente no espaço público. Na gestão democrática, a ideologia da burocracia como um fim em si mesma é substituída pela de organização com a finalidade de levar a escola a desempenhar com êxito o seu papel fundamental de possibilitar que crianças e jovens de quaisquer camadas sociais, se apropriem do conhecimento e construam valores. Partindo dessa idéia, a eleição de diretores representa apenas um dos aspectos desse tipo de gestão, sem esgotar a formulação de outros modelos de participação gestionária, entre elas a de um coletivo de diretores. Segundo Demo (1997), uma escola democrática é aquela que elege seus diretores, busca a participação mais expressiva de professores, funcionários, pais e alunos no seu cotidiano, mas que, sobretudo e obrigatoriamente, ultrapassa práticas sociais alicerçadas na exclusão, na discriminação, na apartação social que inviabilizam a construção do conhecimento e do indivíduo. A questão da gestão competenteda escola pública está articulada com a competência técnica, humana e política, que vai assegurar uma adequada percepção da realidade concreta que cerca a escola. A gestão educacional cultiva relações democráticas, fortalecendo princípios comuns de orientação, norteadores da construção da autonomia competente. A gestão abrange, portanto, a dinâmica do seu trabalho, como pratica social, que passa a ser o enfoque orientador da ação diretiva executada na organização de ensino. 5 Preocupados em como superar as formas conservadoras de gestão escolar, as políticas públicas propõem alternativas criativas, participativas no desenvolvimento dos processos de formação da cidadania crítica do aluno, logo, faz-se necessário promover um esforço dos gestores e professores em estimular instancias e pratica de participação coletiva possibilitando o conhecimento, avaliando e intervindo na vida da escola, influindo na democratização da gestão e na melhoria da qualidade de ensino. Todos os segmentos (direção, coordenadores, professores, alunos, funcionários e comunidade) da escola precisariam compreender melhor o funcionamento da mesma, conhecer com mais profundidade os que nela estudam e trabalham, intensificando o dialogo entre professor/aluno, professor/gestor. A participação significa engajar-se numa atividade já existente com sua própria estrutura e finalidade, ocorrendo assim a participação como meio de conquista da autonomia da escola, dos professores, dos alunos, constituindo-se como pratica formativa. As atuais reflexões sobre a gestão democrática da escola, já superam o reducionismo da escolha dos diretores, para fundamentar-se na compreensão da profunda interdependência, da ação comunicativa das pessoas entre si e destas com o ambiente. Essa compreensão constrói uma nova concepção de poder, não mais situado na qualidade do sujeito, mas na intersubjetividade, no agir comunicativo dos sujeitos, em que a escolha eletiva dos dirigentes escolares torna-se uma parte importante na construção da gestão democrática. A gestão democrática deve, dessa forma, ser compreendida não apenas como um princípio de um novo paradigma, mas também como um objetivo a ser sempre perseguido e aprimorado, além de configurar-se como uma prática cotidiana nos ambientes educativos. Nesse sentido, constrói-se um cidadão capaz de também se colocar frente à sociedade em que vive, como participante consciente de sua inserção social. Um processo de gestão que seja democrático e que objetive a construção da cidadania, não é um processo mecânico e sem compromisso. Ele só existirá na medida em que forem desenvolvidas a autonomia e a participação de todos. 6 Autonomia e Participação O conceito de autonomia está etimologicamente ligado à idéia de autogoverno, isto é, à faculdade que os indivíduos (ou as organizações) tem de se regerem por regras próprias (e de que) a autonomia pressupõe a liberdade (e capacidade) de decidir, ela não se confunde com a “independência” (na medida em que a autonomia é um conceito relacional (...) sua ação se exerce sempre num contexto de dependências e num sistemas de relações (BARROSO, 1998, p. 16). É impossível pensar numa escola democrática sem considerar alguns princípios que orientam o seu funcionamento. Autonomia das escolas não constitui, portanto, um fim em si mesma, mas um meio de a escola realizar, em melhores condições, as suas finalidades, que são a formação das crianças e dos jovens que freqüentam nossas escolas. (BARROSO apud FERREIRA, 1998, p.18) Nesta direção, cabe ressaltar também a relevância da participação. Situando-se a participação como um mero processo de colaboração, de mão única, de adesão, de obediência às decisões da direção. Subserviência jamais será participação e nunca gerará compromisso. Em primeiro lugar, a participação sem troca, como dádiva, ocorre por decisão pessoal motivada pela afetividade, pelo desejo de servir a uma causa que se julga nobre e relevante, seja religiosa, política ou social. E, nesse caso, constitui um processo de troca, que gera o compromisso. Para Habermas (apud GUTIERREZ & CATANI, 1998), “participar significa que todos podem contribuir, com igualdade de oportunidades, nos processos de formação discursiva da vontade”, ou seja, “participar consiste em construir comunicativamente o consenso enquanto a um plano coletivo”. Pra isso, torna-se necessária a construção de espaços de participação, dentre eles os Conselhos (escolares, municipais etc). Com a participação mais efetiva dos agentes envolvidos com a educação, faz com que a democracia se estabeleça dentro da escola. Em relação à escola, o 7 Artigo 12º da LDBEN, diz que “os estabelecimentos de ensino terão liberdade de elaborar e executar sua proposta pedagógica, articulando-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola”. Esse é um dos mecanismos que contribuíram bastante para a evolução da autonomia na escola. A participação da comunidade na organização da escola gera uma perspectiva de melhoria no desempenho dos alunos, bem como na educação como um todo. GESTÃO DEMOCRÁTICA E SEUS MECANISMOS DE PARTICIPAÇÃO Para a realização da gestão democrática existem vários mecanismos entre os quais citamos: CONSELHO ESCOLAR A implementação de Conselhos Escolares apareceu como um instrumento capaz de contribuir positivamente com a prática cotidiana da escola por espaços de participação, contribuindo para a democratização das relações e busca de caminhos para a superação das dificuldades da escola. O Conselho Escolar foi criado pela Lei nº 11.014/93 e formulado pela Lei nº 11.303/95, com atribuições deliberativas e organizativas da participação dos segmentos representativos da escola, contribuindo para a inserção/interação entre escola pública e comunidade na construção coletiva de propostas que qualifiquem o processo educativo e consolidem a gestão democrática nas escolas públicas. O Conselho Escolar é um órgão representativo, com função consultiva, deliberativa, normativa e fiscalizadora, que atua conjuntamente com a direção da escola, objetivando a cooperação e integração entre escola e a comunidade, construindo assim, o exercício de uma gestão democrática com garantia de eficácia na condução do seu dia a dia, no esforço de melhorar a qualidade do ensino. O objetivo principal do Conselho Escolar é garantir o exercício de uma gestão democrática e comprometida com a busca da autonomia da escola, 8 através da participação dos diversos segmentos em suas diversas dimensões: pedagógica, administrativa e financeira. De acordo com a Lei nº 11.014/93 o conselho tem como finalidade: 1. garantir a gestão democrática da escola; 2. zelar pela qualidade da educação escolar oferecida a população; 3. garantir articulação da escola com a comunidade; 4. acompanhar e fiscalizar os trabalhos da escola; 5. garantir a divulgação das ações da escola na comunidade interna e externa; 6. manter articulação com a Secretaria de Educação e Esportes, visando assegurar as condições necessárias ao funcionamento adequado da escola; 7. ajustar as diretrizes e metas estabelecidas pela Secretaria de Educação e Esportes, a realidade da escola. Cada segmento da escola deverá escolher os seus representantes por maioria simples de votos, através de eleições diretas e secretas, acompanhadas por uma comissão eleitoral, especialmente formada para esse fim. A duração dos mandatos dos membros do Conselho Escolar será de 02 (dois) anos, sendo permitida a recondução. Para o processo de implantação do Conselho Escolar é necessário que toda comunidade escolar esteja devidamente esclarecida sobre o que é, para que serve e acima de tudo compreenda a sua importância no gerenciamentoparticipativo de uma escola. No processo de instalação prevê a realização de reuniões e palestras de esclarecimentos sobre o conteúdo das Leis 11.014/93 e 11.303/95. Em seguida será convocada uma assembléia para eleger uma comissão eleitoral composta por um representante de cada segmento, que ficará encarregada de elaborar o Regimento e a organização do processo eleitoral. PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA ESCOLA O Projeto Político Pedagógico tem sido objeto de estudos para buscar a melhoria da qualidade do ensino e é entendido como a própria organização do 9 trabalho pedagógico da escola como um todo. O projeto busca um rumo, uma direção. Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola que é a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado critico e criativo. Mas na pratica o que vem ser o Projeto Político Pedagógico? ... um projeto pedagógico precisa, primeiro, saber fundamentar o que entende por processo educativo e por papel da escola, frente aos direitos dos alunos e suas famílias e da sociedade como um todo... (DEMO, 1996, p.245). Projeto Político Pedagógico é um instrumento de trabalho que mostra o que vai ser feito, quando, de que maneira, por quem, para quem chega os resultados. Alem disso, explica uma filosofia e harmoniza as diretrizes da educação nacional com a realidade da escola, traduzindo sua autonomia e definindo seu compromisso com a clientela. É a valorização da identidade da escola e um chamamento à responsabilidade dos agentes com as racionalidades interna e externa. Esta idéia implica a necessidade de uma relação contratual, isto é, o projeto deve ser aceito por todos os envolvidos, daí a importância de que seja elaborado participa e democraticamente. (NEVES, 1996, p.110) Para que a construção do Projeto Político Pedagógico seja possível é necessário propiciar a todos que fazem a escola situações que lhes permitam aprender a pensar e a realizar o fazer pedagógico de forma coerente. Diante do exposto, percebe-se, pois que a participação dos docentes tanto no âmbito do conselho escolar como na elaboração e implementação do Projeto Político Pedagógico é de suma importância, a partir do momento em que se constituem como mecanismos de participação para a efetivação da democratização do ensino e da sociedade. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para obtermos informações da realidade a fim de alcançarmos os objetivos anteriormente propostos, adotamos uma metodologia investigativa que nos 10 possibilitou o acesso aos dados pertinentes à natureza do objeto em estudo. Nessa perspectiva, na primeira parte da investigação desenvolvemos uma pesquisa bibliográfica específica sobre o tema em questão. Para Gil (1987), a pesquisa bibliográfica é realizada a partir de um levantamento de material com dados já analisados e publicados. A segunda parte foi a pesquisa de campo. Cabe destacar que a escola selecionada, pertencente à Rede Municipal de Ensino da Cidade do Recife, Escola Municipal da Iputinga fundada em dezembro de 1988, funciona nos três turnos: no turno da manha contém 245 alunos, à tarde 238 e noite 104, localizada na Rua Coronel Furtado, 479 na Iputinga, como campo amostral destaca-se pelo seu pioneirismo na implantação da gestão democrática, logo se apresenta como uma gestão democraticamente mais experiente. Como instrumento de investigação fizemos entrevistas com os principais atores sociais envolvidos em nosso estudo, a saber: gestores, coordenadores e professores da unidade escolar. Optamos por realizar entrevistas como técnica adequada para o conhecimento do contexto social em estudo; seu caráter interativo permite a captação imediata e corrente da informação desejada, além de permitir o conhecimento do ponto de vista do entrevistado. O principal procedimento para a análise dos dados foi a análise de conteúdo, tendo em vista que tal “técnica possibilita a descrição do conteúdo explícito e implícito das comunicações” (FERREIRA, 1998, p.114). 11 ATORES INFORMANTES DA PESQUISA SEGMENTO QUANTIDADE Diretor (a) 01 Vice-diretor 01 Coordenadora 01 Professores 04 Como forma de garantir o sigilo em relação à identidade dos sujeitos que colaboraram com a pesquisa, ao apresentarmos os resultados de forma que serão identificados a partir dos seguintes códigos: D1, VD1 e C1 (para o diretor, o vice- diretor e o coordenador) e P1,P2,P3 e P4 (para os professores). O QUE REVELAM OS SUJEITOS INVESTIGADOS A partir dos dados coletados constatamos que parte dos professores envolvidos na pesquisa encontra-se desestimulados diante da situação da educação do País. Por outro lado, parte dos docentes e dos gestores acredita na possibilidade de transformar essa situação. Para eles, a educação pode contribuir para que a população possa vir a lutar por seus direitos e ter uma vida digna. Nesta direção, a princípio buscamos discutir a função da educação e percebemos que a educação é instrumento útil à transformação social. Porém, essa transformação só poderá acontecer se a escola pública desenvolver seu trabalho com prioridade de mudança social (SANTIAGO, 1990). Em consonância com esse pensamento encontramos, também a fala dos professores e gestores entrevistados: Educação é um conjunto de saberes que o individuo adquire ao longo de sua vida, seja na sociedade e na escola. (P1) Educação é preparar o individuo segundo suas próprias aptidões e talentos para o mundo. (P2) É um instrumento pra socializar o individuo, ela vai propiciar o mínimo necessário para que possa viver bem na sociedade, para isso a educação não pode ser livresca, tem 12 que ser uma educação integral que trabalhe o indivíduo como um todo. (D1) Ao indagarmos sobre o entendimento que eles tem sobre gestão democrática, observamos que todos os entrevistados apontam que a participação efetiva nas decisões e encaminhamentos da escola são elementos fundamentais que constituem uma gestão democrática. Eles apontam também que a escola em que atuam já tem uma caminhada em relação a uma gestão democrática com a participação ativa da comunidade escolar. Neste sentido, apresentam os seguintes depoimentos: É trabalhar em conjunto, escutando a opinião de todos, nesta escola já temos uma gestão democrática na prática. (P2) A gestão precisa ser compartilhando com todos na escola, e em conjunto podemos opinar e essa opinião pode ser aceita, dependendo de um debate, votação e argumentação, chegando a melhor solução do problema. (VD1) Toda comunidade escolar tem que participar das decisões da parte administrativa e da parte do processo educativo, onde a comunidade participa dando sua opinião. (P1) Não existe gestão democrática, se não existir a decisão coletiva. Sentar e planejar coletivamente. (C1) É a participação de todos, no processo de administração e construção da escola, sendo que cada segmento tem sua responsabilidade específica, não adianta os pais quererem assumir o papel da direção, os professores quererem assumir a direção. Cada um tem uma função a desempenhar nesse processo e uma coisa é fundamental: que cada segmento saiba qual é sua participação. (P4) A gestão escolar entendida e assumida como prática participativa é um dos elementos decisivos, senão o mais importante, para a efetivação de uma forma democrática de organizar o trabalho pedagógico da escola. 13 Uma escola democrática define-se pela participação dos seus professores e alunos no trabalho, na convivência e nas atividades de integração através dos acordos formulados. Contudo é preciso não apenas dar a palavra, mas partir para implementar ações e não cair no vazio. Participação e democracia são princípios indissociáveis, daí porque quando o homem participa, quando toma parte, quando partilha,está exercitando a democracia. A participação só tem sentido de existir se ela for além do processo de ter o que dizer; ela implica em conseguir poder sobre os fins e os meios do processo que se está vivendo. A base efetiva da participação é aquela que não se limita à instrumentação para resolução de problemas, mas, principalmente, à satisfação de necessidades básicas. Para Bordenave (1992, p.16), “participação não é somente um instrumento para a solução de problemas mas, sobretudo, uma necessidade inerente a todo ser humano e possui duas bases complementares: uma afetiva e outra instrumental”. Quando questionados sobre o papel do professor para a consolidação da gestão democrática, que é o foco de nosso trabalho, tanto os professores quanto os gestores, deram ênfase a importância do professor neste processo. Nosso papel é muito importante. Pois não podemos apenas nos limitar aos assuntos de sala de aula. Tudo o que diz respeito à escola e o que se passa no dia-a-dia que diz respeito ao nosso aluno é fundamental para o professor e a da escola. (P3) Muito importante porque podemos dar nossa opinião, fazer queixas, reivindicações, falar o que não está bem na escola. Temos um papel muito importante, pena que poucos colegas valorizem e se limitem apenas a sala de aula. (P2) tem um papel muito importante, os professores são os grandes parceiros, porque afinal de contas quem faz a “roda” rodar são eles; tem que ter uma equipe para que haja uma interação, uma troca, uma boa sintonia para que esta roda consiga rodar bem. O professor é a peça fundamental dessa gestão democrática, sendo parceiro da direção, se ele tem a consciência de que não está só para passar conteúdos em 14 sala de aula e ir embora, se tem a consciência de querer participar, então o sucesso da escola depende do trabalho do professor, do meu trabalho, o sucesso do aluno depende de como desempenhamos nosso trabalho.(C1) No processo de decisão faz-se necessária a participação de todos, colocando de lado o tratamento desenvolvido até então na relação de poder existente, elegendo para o seu lugar a descentralização do processo de decisão. Esse mecanismo tende a envolver a participação de todos com o processo de ensino-aprendizagem da escola. Compreendemos, pois, que a gestão participativa tem por pressuposto a existência de um espaço real de autonomia da escola e tem por finalidade última a introdução de processos que devem ser sempre de compartilhar o poder de tomar decisões. Isso implica na mudança das relações de poder, passando não só pelos jogos entre os diferentes atores, considerando individualmente, como também entre os diferentes grupos e coalizões, sobretudo aquelas que materializam a convergência dos interesses específicos dos professores, dos trabalhadores não- docentes, dos alunos e seus pais e da comunidade em que se insere a escola (BARROSO, 1995). Concordamos com o autor supracitado, quando ele toma a autonomia escolar como algo construído a partir de um espaço em que se confrontam e equilibram os interesses de distintos grupos, internos e externos à escola, tais como: o governo, a administração, professores, alunos, pais e outros membros da sociedade local. Porém quando indagados sobre de que maneira costumam participar da gestão na escola, os professores afirmam: Nossa participação se dá através do Conselho Escolar, com diálogos, reuniões, debates e votação. (P1) Elaborando o Projeto Político Pedagógico, mantendo um canal aberto na comunicação, expondo idéias, planejando, avaliando e compartilhando experiências entre os pares.(P4) 15 O Conselho Escolar e o Projeto político pedagógico foram os instrumentos mais citados pelos entrevistados como fundamentais norteadores na prática cotidiana da escola. A participação e a democratização num sistema público é a forma mais prática de formação para a cidadania. A criação dos Conselhos representa uma parte desse processo, pois é através dele que a escola pode ser sempre melhorada pois, com a descentralização das decisões pedagógicas, irá ampliar a quantidade e a qualidade das ações dos agentes decisórios, para que as decisões dos processos administrativos e pedagógicos sejam tomadas com a participação de toda comunidade escolar, especialmente dos professores, gestores e coordenadores. Percebemos através das respostas dos entrevistados que há uma mudança de mentalidade onde todos sentem necessidade de discutir, pensar, avaliar suas práticas, buscando um rumo, uma direção para o trabalho escolar com qualidade, construindo e reconstruindo o Projeto Político Pedagógico para atender as especificidades da comunidade onde a escola está situada. Como sabemos, é por meio do Projeto Pedagógico em ação, que em outras palavras significa gestão da aprendizagem, que serão alcançados os objetivos propostos para o processo educativo, ao mesmo tempo em que se fortalecerá cada um dos membros da escola, que poderão reavaliar sua prática constantemente. CONSIDERAÇÕES FINAIS A investigação realizada nos conduziu a compreender que o tipo de gestão aplicada na escola pesquisada se caracteriza pelo reconhecimento da importância consciente e esclarecida das pessoas que fazem a organização de participarem ativamente das decisões sobre a orientação e planejamento de seu trabalho. A promoção de uma gestão educacional democrática e participativa está associada ao compartilhamento de responsabilidades no processo de tomada de decisão entre os diversos níveis e segmentos de autoridade educacional. Desse 16 modo, notamos que na escola em questão os profissionais da educação procuram praticar a busca de soluções coletivas para as necessidades de toda a escola, envolvendo tanto quem vai realizar esta prática quanto seus beneficiários. Notadamente sabemos que o profissional de sala de aula está voltado para o processo de ensino-aprendizagem e que está gradativamente ultrapassando os limites de sala de aula para desempenhar cada vez melhor seu papel na consolidação da gestão democrática, utilizando os instrumentos devidos (Conselho Escolar e Projeto Político Pedagógico) no aprendizado que advém da participação de todos na administração do processo educativo, o que, por sua vez, possibilita a cada um dos sujeitos e a todos coletivamente, o crescimento da pessoa humana em seus aspectos/competências: dignidade, atuação, criticidade, capacidade de decisão e ação. Tanto para o professor quanto para a comunidade, participar da gestão de uma escola significa todo um aprendizado político no sentido de opinar, fiscalizar e cumprir decisões. Significa também mudar a visão de direção de escola, passando a não esperar decisões prontas para serem seguidas. É imprescindível, por parte da direção da escola, uma coerência entre o discurso e a prática nas relações interpessoais e a competência técnica no desenvolvimento das práticas participativas. Concluindo, vale ressaltar que o papel dos professores, em relação a gestão democrática, na escola em questão é visível, até porque, esta escola foi uma das pioneiras no processo de democratização da gestão, iniciado na rede municipal do Recife. Portanto, constatamos na forma de reunir, de opinar, dar idéias, reivindicar, decidir, de compartilhar, ou seja, de participar dos sujeitos envolvidos na pesquisa. Parece-nos que ficou claro para o grupo que a democracia só se efetiva por ações e relações que se dão na realidade concreta, a coerência democrática entre o discurso e a pratica é um aspecto fundamental. A participação não depende de alguém que da abertura ou permite sua manifestação. Democracia não se concede, conquista-se, realiza-se. 17 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de nº 9.394, de 20de dezembro de 1996. BARROSO, João. Para o Desenvolvimento de uma Cultura de Participação na Escola. Cadernos de Organização e Gestão Curricular. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional, 1995. ______. O reforço da autonomia das escolas e a flexibilização da gestão escolar em Portugal. Gestão Democrática. São Paulo: Cortez, 1998. BORDINAVE, J.E.D. O que é participação? 7. ed. São Paulo: Brasilense, 1992. CORREIA, Maria Zélia de Sousa. Gestão Democrática na Escola Publica em Pernambuco: uma experiência da década de 80. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2003. Dissertação de Mestrado em Educação. DEMO, Pedro. Desafios Modernos da Educação. 4. ed. Rio de Janeiro: Vozes,1996. ______. A Nova LDB. Ranços e Avanços. Campinas, São Paulo: Papirus, 1997. FERREIRA, N.S.C. (Org.). Gestão Democrática de Educação: atuais tendências, novos desafios. São Paulo: Cortez, 1998. FERREIRA, Rosilda Arruda. A Pesquisa Científica nas Ciências Sociais. Editora Universitária da UFPE, 1998. FREITAS, Kátia Siqueira. Gestão Participativa na Escola Pública. Revista de Administração Educacional. Recife, jan./jun. v.1 n.2 p. 84-86,1998. HORA, Dinair Leal. Gestão perspectiva Democrática na Escola: Artes e ofícios da participação coletiva. Campinas – SP Papirus, 9ª ed. 2002 GIL, Antonio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 3.ed. São Paulo: Atlas,1991. HERBERMAS, Iurgen. Mudança Estrutural da Esfera Pública: Investigações quanto a uma categoria da sociedade burguesa.Trad.Flávio R. Rethe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1998 . MELO, Maria Tereza Leitão et al. Gestão Democrática. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001. 18 NEVES, Carmem M. de C. Automomia da escola: um enfoque operacional. In VEIGA, Ilma P. A. (Org.). Projeto-Politico-Pedagógico: uma construção Possível. 2. ed. Campinas, SP: Papirus, 1996. PARO, Vitor Henrique. Gestão Democrática da Escola Publica. 3. ed. São Paulo: Ática, 2003. OLIVEIRA, Lindamar Cardoso Vieira. Práticas Clientelísticas e Gestão Democrática na Instituição Escolar: A Difícil Travessia. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação. Porto Alegre, jan./jun. v. 18, n.1, p. 54-66, 2002. SANTOS, Inalda Maria. A Política de Descentralização do Financiamento do Ensino Fundamental e sua Repercussão nas Unidades Escolares: um estudo sobre o Programa Dinheiro na Escola. Dissertação de Mestrado em Educação, Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2001. SANTIAGO, M.E. Escola Pública de 1º Grau: da compreensão à intervenção. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
Compartilhar