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Capitulo 7 - Sistem+ítica evolutiva ou gradista

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Princípios de Sistemática e Biogeografia – Capítulo 7: Sistemática Evolutiva ou Gradista 
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Capítulo 7 
 
 
Sistemática Evolutiva ou Gradista 
 
Introdução 
 Foi visto que o ponto de partida de qualquer trabalho em sistemática é o estudo 
comparado das semelhanças existentes entre os organismos. As semelhanças podem ser 
estruturais (morfológicas, bioquímicas, moleculares, entre outras), ecológicas ou 
etológicas. A priori, nenhuma dessas semelhanças pode ser considerada mais importante 
que as demais. 
 Outro aspecto já discutido diz respeito a existência de diferentes tipos de 
semelhanças que podem ser compartilhadas entre os organismos, e que fornecem 
informações distintas sobre as relações de parentesco dos organismos envolvidos. As 
semelhanças podem ser devidas a plesiomorfias, apomorfias ou homoplasias 
(convergências ou reversões). Também já foi visto que esses três tipos de semelhanças 
podem ocorrer em um mesmo táxon. A distinção ou não entre elas, como são utilizadas na 
classificação, acarretam as diferenças principais entre as “Escolas de Sistemática”. Já foram 
apresentados os fundamentos das Escolas Filogenética. A seguir, serão discutidos os 
fundamentos da Escola Evolutiva ou Gradista. 
 
Escola Evolutiva ou Gradista 
 A Escola Evolutiva ou Gradista baseia-se na teoria sintética da evolução (ou Nova 
Síntese). Os avanços ocorridos em genética de populações, entre 1920 e 1940, 
influenciaram essa escola, principalmente os trabalhos de Morgan com genética de 
drosófilas, Wright, Dobzansky e Haldane, entre outros. 
 A base teórica pode ser encontrada principalmente nas obras de Mayr (e.g. 1969) e 
de Simpson (1961). Segundo os proponetes dessa escola, para elaborar as classificações, 
são levados em consideração os graus de semelhança - expressos pela quantidade de 
mudanças evolutivas (os chamados avanços estruturais na concepção de Simpson, 1961), o 
parentesco e a ecologia, ou seja, a natureza das mudanças e das adaptações (Figura 7.1). 
Entretanto, não existe uma metodologia para incorporar todas essas informações na 
classificação. 
 Os graus de semelhança são considerados importantes devido à premissa de que 
descendentes mais próximos devem ser mais semelhantes entre si do que com descendentes 
mais afastados, isso como reflexo de maior semelhança genética. Assim, quanto maior a 
diferença genética, maior a diferença fenotípica. Entretanto, sabe-se que nem sempre isso 
acontece. Por exemplo, o homem é considerado geneticamente mais próximo do chimpanzé 
do que este do gorila (Goodman & Moore, 1971; King & Wilson, 1975), embora gorila e 
chimpanzé sejam mais semelhantes entre si do que com o homem, sendo classificados pelos 
sistematas evolutivos em uma mesma família, Pongidae, distinta de Hominidae! Esses 
trabalhos, baseados em dados moleculares, demonstraram que a semelhança fenotípica 
global nem sempre expressa a similaridade genética! 
 Os resultados da análise gradista são expressos por meio de dendrogramas 
denominados filogramas (às vezes, também denominados de “árvores filogenéticas”, 
Figura 7.1). Nesses diagramas, o comprimento, as distâncias relativas e os ângulos dos 
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 Figura. 7.1. Relacionamento diagramático entre avanço estrutural e filogenia. A. Sem grados 
eito de grado está profundamente influenciado pela visão adaptacionista do 
o que a escola evolutiva não desenvolveu uma metodologia capaz 
ram a 
propostos pela escola evolutiva para justificar o reconhecimento 
ica). 
 ser reconhecidos 
ramos procuram indicar os diferentes graus de semelhança e o tempo de evolução. A 
informação adicional, referente à quantidade de mudanças evolutivas e à ecologia, seria 
expressa através dos “grados” (Figura 7.1). Os grados seriam “táxons caracterizados por 
um nível de organização estrutural semelhante” (Huxley, 1958). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
claramente distintos e sem relacionamento útil taxonomicamente entre grados e clados. B. Sem grados 
distintos mas com forte paralelismo nos clados, cada um dos quais tendendo separadamente em direção a uma 
escala de grados contínua. C. Com grados definidos e clados não correspondendo exatamente aos clados. 
(modificado de Simpson, 1961:127) 
 
 O conc
darwinismo, considerando a evolução como um processo lento, gradual e progressivo. O 
surgimento do grado dar-se-ia pelo desenvolvimento de um conjunto de características 
adaptativas. Devido ao uso de grados na classificação, a escola evolutiva passou a ser 
denominada de gradista. 
 Deve ser ressaltad
de discernir os diferentes tipos de semelhanças, plesiomorfias, apomorfias e homoplasias. 
Nos procedimentos para serem adotados pelos seguidores da escola evolutiva, sempre era 
aconselhado evitar as semelhanças que representassem convergências (homoplasias), mas 
não havia metodologia para discriminar quais os caracteres eram convergentes. Na prática, 
os grados e os filogramas eram construídos com base na semelhança geral, segundo a 
avaliação intuitiva do pesquisador e segundo sua experiência no grupo considerado. 
 Após o advento da sistemática filogenética, muitos sistematas evolutivos passa
utilizar a metodologia hennigiana para proceder às reconstruções filogenéticas. O método 
filogenético foi considerado correto por Mayr (1974). Entretanto, os gradistas continuaram 
a utilizar táxons merofiléticos para a classificação, pois dava-se preferência à manutenção 
de entidades taxonômicas correlacionadas com grados, que não precisavam ser 
monofiléticos na concepção hennigana. Essa é uma diferença fundamental em relação à 
sistemática filogenética. 
 Dentre os critérios 
dos táxons baseados em grados, merecem destaque os seguintes. 
 1. Divergência morfológica (ou descontinuidade morfológ
 Se dentro de um grupo monofilético ou não de espécies podem
dois grupos - grados, com base em um hiato morfológico ou “diferença significativa” 
(Figura 72, “d”), esses grupos podem ser separados em 2 táxons. Em geral, essa “diferença” 
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 Figura. 7.2. Filograma para os táxons A-E. X e Y representam táxons que apresentam diferentes 
iferente
No caso acima, dentro de um grupo monofilético, foram reconhecidos dois 
resulta da inexistência de um ou mais estados de caracteres que caracterizam e legitimam o 
outro grupo e é responsável pela descontinuidade entre os grupos. Os teóricos da escola 
evolutiva recomendavam que as descontinuidades entre dois subgrupos deveriam ser 
maiores do que as existentes dentro de cada subgrupo. Isso, quase sempre, resulta na 
separação de um grupo monofilético (que apresenta a condição apomórfica) e de um grupo 
parafilético (que apresenta a condição plesiomórfica para o mesmo caráter). Como 
exemplo, pode ser citada a classificação gradista da classe Insecta, onde são reconhecidas 
duas subclasses, Pterygota e Apterygota. O táxon Pterygota é monofilético, que equivale ao 
clado “Y” da Figura 7.2, caracterizado pela sinapomorfia da presença de asas, enquanto o 
táxon Apterygota, que equivale ao clado “X” da Figura 7.2, - parafilético segundo a escola 
cladista - é considerado válido para a escolagradista, sendo justificado pela ausência de 
asas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
d s grados, d representa a diferença significativa entre os grados. 
 
 
subgrupos, sendo um monofilético (Y) e o outro parafilético (X). Existem outras 
possibilidades (Figura 7.3), como por exemplo a formação de dois táxons monofiléticos 
(A), ou um grupo monofilético e outro parafilético (B), ou ainda de um polifilético e outro 
parafilético (C). 
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 Figura 7.3. A, dois subgrupos monofiléticos; B, um subgrupo monofilético e um parafilético; C, um 
subgrupo polifilético e um parafilético. 
 
 Alguma críticas devem ser feitas ao procedimento de agrupar por divergência 
morfológica. Primeiro que as diferenças podem existir segundo um conjunto de caracteres e 
não segundo outro conjunto. Se diferentes pesquisadores escolherem, arbitrariamente, 
conjuntos de caracteres diferentes, os resultados podem ser distintos. Os resultados não 
podem ser testados ou comparados. Qual deles será aceito pela comunidade? Isso vai 
depender do prestígio do pesquisador. Quanto maior o prestígio, maior a possibilidade da 
sua classificação ser adotada. Segundo que se novos táxons forem considerados, 
apresentando caracteres intermediários entre os anteriormente conhecidos, os “hiatos 
morfológicos” existentes podem ser preenchidos, acabando assim com as descontinuidades 
que justificam as concepções de grados. 
 
 2. Riqueza de espécies. 
 Esse conceito está associado à idéia de que um grupo diversificado, ou seja, com 
um grande número de espécies, pode ser considerado “um grupo bem sucedido”. O termo 
“sucesso” é de definição difícil e ambígua. Seu uso, em biologia, geralmente tem conotação 
antropomórfica. Sempre existe um outro termo mais apropriado e específico que pode 
substituir “sucesso”. Por exemplo, grupo com maior número de espécies, ou grupo que 
vive em maior número de ambientes. 
 Para a escola evolutiva, um grupo “bem sucedido” pode receber uma categoria 
taxonômica hierarquicamente igual ou superior que a de um grupo próximo, mas que inclua 
poucas espécies. Ou então, o grupo próximo, com menos espécies, poderia ser incluído em 
um grupo parafilético que reuniria parentes mais distantes. Exemplos de classificações 
evolutivas que demonstram esse tipo de procedimento, subclasses Apterygota e Pterygota 
da classe Insecta e a classificação dos Amniota (Figura 7.4). 
 Amniota é um grupo monofilético. Para os sistematas evolutivos, os Amniota que 
não são nem aves e nem mamíferos devem ser colocados em algum táxon, e são reunidos 
sob a denominação Reptilia. Portanto, Reptilia é um grado obtido a partir da exclusão de 
Aves e Mammalia do táxon Amniota. Fica evidente que Reptilia é um exemplo de que os 
grados não são criados por processo evolutivos, mas por decisões taxonômicas. Se existe 
um padrão da história evolutiva dos organismos, e ele pode ser resgatado, por quê utilizar 
para as classificações táxons sabidamente artificiais ? 
 Dessa forma, observa-se que, para a escola evolutiva, o número de espécies influi 
na subdivisão dos táxons. Segundo Ashlock & Brothers (1979), os arranjos deveriam 
resultar em grupos que fossem feneticamente semelhantes, ou que contivessem 
aproximadamente o mesmo número de espécies”. Entretanto, isso é uma decisão que não 
corresponde à realidade, pois a evolução não tem esse compromisso. 
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 Figura 7.4. Filogenia dos Amniota recentes, reconhecendo o táxon parafilético Reptilia (R) e os 
dois grupos monofiléticos Aves (A) e Mammalia (M), segundo Carroll (1988). Ar, Archosauria (Cr+A). Ch, 
Chelonia. Cr, Crocodilia. Sq, Squamata. Sp, Sphenodon. T, Therapsida. 
 
 
 
 3. Zonas adaptativas. 
 Segundo Van Valen (1971), zona adaptativa é “um conjunto de condições abióticas 
multidimensionais existentes na natureza, que pode ou não ser habitado por organismos”. A 
zona adaptatativa seria um nicho coletivo, habitado por um táxon supra-específico. Assim, 
para a escola evolutiva, se um grupo parafilético ocupar uma zona adaptativa, ou seja, tiver 
um nicho próprio, ele estaria justificado. A Figura 7.2 mostra, em cinza, as “zonas 
adaptativas” dos táxons X e Y. Entretanto, essa suposta relação existente entre táxon supra-
específico e zona adaptativa nunca foi demonstrada. Táxons supra-específicos não 
possuem, necessariamente, nichos próprios. 
 Em geral, ao menos para as espécies sexuadas, os eventos de diversificação são 
decorrentes de especiações alopátricas. Uma barreira surge, dividindo uma população em 
duas (ou mais) populações. Persistindo a barreira, duas espécies podem se diferenciar. Esse 
é o modelo ortodoxo de especiação de Mayr (Figura 7.5). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Figura 7.5. Esquerda, população ancestral contendo duas linhagens não relacionadas A e M. Centro, 
formação de dois pares de espécies-irmãs B-C e N-O, resultantes de especiações alopátricas resultado da 
separação das linhagens ancestrais por uma barreira geográfica. As espécies descendentes de um mesmo 
ancestral não interagem entre si, pois ficaram isoladas em áreas geográficas distintas. Direita, padrão 
filogenético resultante. 
 
 Pelo esquema, fica evidente que as interações ecológicas entre as espécies filhas são 
geralmente confinadas com outras espécies (B e N; C e O), e não entre elas. As interações 
ecológicas são fenômenos de biotas e ecossistemas, e não fenômenos exibidos por unidades 
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taxonômicas, sejam clados ou grados. As especiações podem resultar em espécies-irmãs 
com ecologias semelhantes ou diferentes. 
 Como é muito difícil demonstrar qual o “nicho coletivo” de um táxon supra-
específico, na prática os sistematas gradistas se valem da “divergência morfológica” e da 
“riqueza de espécies”. Existe todo um discurso teórico, retórico, que não é implementada 
na prática. O conceito de zona adaptativa está mais ligado ao conceito da divergência 
morfológica e o conceito de riqueza associado ao sucesso do grupo. Qual seria a zona 
adaptativa do táxon Aves? Uma zona que pode ser explorada pelo vôo? Nem todas as aves 
voam, e podem possuir ecologias muito diferentes. Na realidade, Aves é considerada uma 
classe de Amniota, não porque apresente um nicho coletivo, mas porque é o único Amniota 
que possui penas e outras características exclusivas. 
 Ao se avaliar os três procedimentos utilizados para a delimitação dos grados, fica 
evidente que os grados não são criados por processo evolutivos, mas por decisões 
taxonômicas subjetivas. Ao contrário, o parentesco filogenético, ou ancestralidade comum, 
é a base fundamental do modelo evolutivo, e deve ser a base para as classificações. 
 Existe mais um conceito equivocado, muito freqüente em textos sobre sistemática 
evolutiva. Trata-se do conceito de irradiação adaptativa. “Uma espécie ou táxon supra-
específico, entrando em zonas adaptativas distintas, pode se adaptar e originar, 
simultaneamente, novas espécies” (Figura 7.6). Haveria uma aceleração dos processos de 
divergênciaevolutiva - ou as mutações selecionadas poderiam originar formas mais 
competitivas, ou as espécies encontrariam nichos vazios. Ora, esse modelo implica em 
especiação sem isolamento geográfico, contrário ao modelo mais freqüente de especiação, 
proposto pelo próprio Mayr. Esse modelo também se refere a nichos vazios, o que nunca 
foi definido com clareza. O que seria um nicho vazio? Seria um ambiente com todas as 
características adequadas, aguardando ser habitado por determinadas espécies, ainda 
inexistentes? Isso é um absurdo! Como exemplos clássicos de grupos que sofreram 
irradiação adaptativa, são citados os tentilhões de Darwin, das ilhas Galápagos, e as plantas 
floríferas que superaram as coníferas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Figura 7.6. Filograma mostrando uma irradiação adaptativa, no qual um ancestral comum exclusivo 
daria origem, simultâneamente, à várias linhagens independentes. 
 
 Outra interpretação possível para o diagrama da Figura 7.6 é que ele representa uma 
politomia não resolvida. Em muitos casos previamente considerados como irradiações 
evolutivas, estudos mais cuidadosos demonstraram haver relações de parentesco entre os 
diferentes grupos da politomia, formando subgrupos. Nesses casos, as politomias não 
constituíam um padrão evolutivo, mas simplesmente desconhecimento das relações de 
parentesco, por falta de dados ou análise adequada. Basta uma única sinapomorfia, 
compartilhada entre dois táxons, para falsear a hipótese da Figura 7.6 
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Literatura Citada:

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