Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
i CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO HUMANO, EDUCAÇÃO E INCLUSÃO ESCOLAR Empregabilidade e cidadania: A inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho MAGALI CARDOSO BRAGA ORIENTADORA: RUTE NOGUEIRA DE MORAIS BICALHO BRASÍLIA, 2011 Universidade de Brasília – UnB Instituto de Psicologia – IP Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento – PED Programa de Pós-Graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde PGPDS ii MAGALI CARDOSO BRAGA Empregabilidade e cidadania: A inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho Monografia apresentada ao Curso de Especialização e Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar da Faculdade UAB/UNB. Orientadora: Rute Nogueira de Morais Bicalho BRASÍLIA, 2011 Universidade de Brasília – UnB Instituto de Psicologia – IP Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento – PED Programa de Pós-Graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde PGPDS iii TERMO DE APROVAÇÃO MAGALI CARDOSO BRAGA Empregabilidade e cidadania: A inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista do Curso de Especialização em Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar – UAB/UnB. Apresentação ocorrida em ________/________/2011 RUTE NOGUEIRA DE MORAIS BICALHO – ORIENTADORA EXAMINADOR ____________________________________________________________________ MAGALI CARDOSO BRAGA BRASÍLIA/ 2011 DEDICATÓRIA iv Dedico este trabalho àquelas pessoas que valorizam a diversidade, esta que enriquece e que assusta, que encanta e que modifica nossas vidas para nos aperfeiçoar como seres humanos. v AGRADECIMENTOS Agradeço ao amor e apoio de minha família, amigos e conhecidos que de alguma forma contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho. Em particular, agradeço a minha amiga Lucrésia, um anjo que me motivou a levar este projeto até o fim. À minha orientadora Rute Bicalho por sua dedicação e ricas contribuições. Ao meu filho, Ageu, e companheiro, Almir, os quais compreensivamente alteraram suas rotinas ao meu favor para que eu pudesse finalizar esta etapa da vida E, primordialmente, a Deus, por sua grandiosidade, refletida na criação perfeita do ser humano, que se apresenta com distintas belezas e pensamentos. Ainda O agradeço por ter colocado pessoas tão especiais em meu caminho, como os meus alunos e todos aqueles que participaram desta pesquisa. Vocês, a partir de um gesto, sorriso, olhar e modo peculiar de se adaptar às adversidades, me ensinaram a sentir a vida em toda a sua plenitude! Muito obrigada! vi RESUMO Em uma sociedade em constante transformação é necessária uma organização para que todos os indivíduos sintam-se plenamente parte dela. O trabalho é um importante meio de inserção social, que para o indivíduo com deficiência passa pelo nível terapêutico (ocupacional) e a profissionalização com nível econômico, ou seja, a de ocupar o físico e a mente daqueles que vêem seu empenho como uma oportunidade de participar de sua comunidade. Pensando desta forma, o objetivo deste trabalho é analisar o processo de preparação e inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, sob o ângulo do educador, da família e da própria pessoa com necessidades especiais. O contexto de pesquisa é a Associação de Pais e Amigos Dos Excepcionais de Ceilândia e Taguatinga (APAED). Participaram: 2 alunos frequentadores assíduos dessa instituição; as famílias desses alunos; dois educadores (professora e diretora); e dois alunos egressos. De natureza qualitativa, a pesquisa utilizou entrevistas semiestruturadas e observação. Os resultados indicam que as políticas públicas exercem um papel fundamental para a regulamentação e o apoio a pessoa com deficiência, e que a preparação do individuo dentro da instituição exercem um fator diferencial e significativo para a efetiva inclusão, evitando uma frustração para ela e seus familiares. Sendo o trabalho necessário para o desenvolvimento social e a promoção a uma melhora em sua qualidade de vida. Palavras-chave: trabalho, deficiência, educação. vii ABSTRACT In the midst of a society in real transformation is important an organization for everyone feels like a citizen. The work is an important way for social integration, maily for a individuals with disabilities through the therapeutic level (occupational) and a economic professional level in order to exercise the mind and body and see their efforts as an opportunity to take part of community. About this ,this research has the objective to analyze the process of preparation and integration of people with disabilities in employment, from the pedagogue perspective, the family an the person with special needs. The research context is the Association of Parents and Friends Of Nomads Ceilândia and Wansbeck (APAED). Participants: 2 students’ regulars of this institution, the families of these students, two teachers (teacher and director) and two former students. Qualitative, the research used structured interviews and observation The results indicate that public policies play a key role in the regution and support for people with disabilities, and that the preparation of the individual within the institution and carry a significant differentiating facto for the effective inclusion, avoiding a frustration for her and her family. The work is necessary for social development, promotion an improvement in their quality of life. Keywords: Work, Disability, Education. viii SUMÁRIO RESUMO ..................................................................................................................p.VI APRESENTAÇÃO ..................................................................................................p.01 I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ....................................................................p.3 1.1 – A história do deficiente e o mercado de trabalho: algumas considerações........p.03 1.2 – Deficiência e mercado de trabalho: relação “assegurada” pela Legislação........p.05 1.3-Escolarização e educação para uma sociedade inclusiva .....................................p.10 II – OBJETIVOS ......................................................................................................p.10 III – METODOLOGIA ............................................................................................p.16 3.1- Fundamentação Metodológica ............................................................................p.16 3.2- Contextos de Pesquisa .........................................................................................p.17 3.3- Participantes ........................................................................................................p.18 3.4 – Materiais e Instrumentos utilizados ...................................................................p.18 3.5- Procedimentos de Construção de Dados ............................................................p.19 3.6- Procedimentos de Análise de Dados ..................................................................p.19 IV – RESULTADOS E DISCUSSÃO ...................................................................p.20 Categoria 1 – A chegada do aluno na APAED e sua a preparação para o trabalho...p.20 Categoria 2 – A percepção da deficiência..................................................................p.23 Categoria 3 – A inserção do aluno no mercado de trabalho.......................................p.25 Categoria 4 – o aluno egresso da APAED ................................................................p.30V – CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................p.32 REFERÊNCIAS ......................................................................................................p.35 APÊNDICES ............................................................................................................p.39. APRESENTAÇÃO Há muito preconceito enraizado na sociedade que impendem ou dificultam a inserção das pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Essas pessoas são vítimas de uma história de exclusão social, pois são equivocadamente compreendidas como pessoas lentas, incapazes e menos produtivas, ficando, em função desses rótulos e estigmas à margem do processo de inclusão. A concepção de trabalho na sociedade contemporânea, de modo geral, significa auto- realização, fonte da constituição subjetiva, é estar inserido na economia, é ser cidadão e visto como membro participante da sociedade. Considerando que o trabalho não é uma categoria a- histórica (RIBEIRO e LÉDA, 2004), sua concepção não poderia ser distinta para as pessoas com deficiência, que querem trabalhar, ser remuneradas, se auto-realizar e marcar sua existência no mundo tendo o trabalho como instrumento de emancipação. Atualmente, no Brasil, existem vários programas e Leis que ajudam a pessoa com deficiência a se inserir no mercado de trabalho e exercer uma função laboral. Porém, quando falamos especificamente da deficiência intelectual é possível perceber uma maior dificuldade para que essa inserção ocorra, em função da construção de categorias e perfis de empregabilidade demasiadamente objetivos, que inviabilizam seu enquadramento profissional. Apesar dos avanços nas concepções sobre a deficiência, as questões legais que amparam os direitos da pessoa com deficiência e os incentivos governamentais, como a Lei de Cotas que toda a empresa deve cumprir, ainda são perceptíveis os inúmeros obstáculos. Muitas vezes, o indivíduo deixa de ocupar uma vaga por não apresentar as características objetivas de uma determinada empresa, tendo toda a competência para ocupar aquela função. Esta pesquisa analisa o processo de preparação e inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, buscando evidenciar sua escolarização, as exigências que o mercado de trabalho tem exigido e chamar a atenção para a necessidade de conscientizar a pessoa com deficiência que, diante do desejo de trabalhar, acaba sendo refém dos subempregos ou da informalidade. Para tanto, pretende-se abordar as Leis que vigoram sobre o assunto, os incentivos do governo favoráveis à inserção e à participação das famílias da pessoa com deficiência no processo de inclusão no mercado de trabalho. O contexto de pesquisa é a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Ceilândia de Taguatinga (APAED), uma instituição filantrópica que atende alunos com deficiência mental e múltipla, atuando desde a estimulação precoce até a profissionalização desses alunos. A escolha da APAED deve-se ao fato de ser uma instituição que se preocupa com o desenvolvimento global do aluno. Lá, existem vários tipos de atendimento e preparação para o mercado de trabalho, como as oficinas profissionalizantes, para que os alunos tenham oportunidade de se desenvolver e se inserir social e profissionalmente. Além disso, trabalhei junto aos alunos da APAED na área da oficina pedagógica, de costura industrial, durante três anos e pude acompanhá-los até a sua inserção no mercado de trabalhou, testemunhando a melhora na qualidade de suas vidas. Logo, a motivação para desenvolver este trabalho parte do desejo contagiante desses alunos, de seus sonhos, expectativas para o futuro, das responsabilidades que querem assumir diante da vida, da necessidade de trabalhar e dele retirar seu sustento e dignidade. Considerando a minha experiência enquanto educadora de alunos com necessidades especiais e o contato constante com a APAED, além das informações advindas desta pesquisa, me sinto autorizada a afirmar que esses alunos apresentam-se responsáveis e interessados a produzir, sendo o trabalho uma forma singular de se deixar uma marca em si mesmo, nos objetos que produz, nas suas relações e no mundo. Nesse sentido, a ausência de uma ocupação laboral ou educativa, tende a gerar algumas consequências preocupantes, ao passo que o tempo ocioso, independente de ser deficiente ou não, pode promover a vulnerabilidade social por meio dos fatores de risco como o uso abusivo de drogas depressão, solidão, sensação de inutilidade, acabando por legitimar o estigma social de pessoas problemáticas e limitadas. Diante da necessidade de se compreender a relação entre o trabalho e a pessoa com deficiência, este trabalho preocupa-se em mostrar que o fato de ser deficiente não acarreta linearmente uma incapacidade para o desempenho profissional. Existem pessoas com distintas capacidades, interesses e aptidões, em que a deficiência faz “parte da dinâmica do desenvolvimento” (VYGOTSKY, 1989, apud TUNES e BARTHOLO, 2010, p. 71). A deficiência não as incapacita, apenas requer um pouco mais de atenção, a fim de mostrar que seu desempenho profissional está ligado ao tratamento que recebem. Desta forma, ressalta-se a necessidade de modificar a visão que o empregador tem sobre a pessoa com deficiência e o modo como ele lida com elas. 10 I- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 1.1 – A história do deficiente e o mercado de trabalho: algumas considerações A relação entre mercado de trabalho e deficiência não era vista como possível em meados do século XV, onde pessoas com deficiência eram jogadas na fogueira da Inquisição. Ceccim (1997, p. 28) conta que nesse mesmo período é escrito um livro intitulado “Martelo das Bruxas”, voltado para a caça das pessoas praticantes da feitiçaria, adivinhos e até pessoas (criatura) de hábitos estranhos. As pessoas com deficiência intelectuais graves eram vistas como seres possuídos por demônios. Mesmo pessoas com renomado conhecimento na época atestavam esse discurso. Segundo Silva (SILVA 1986 apud GARCIA 2004)1 , o demônio possuía os “retardados”, ocupando o lugar de suas almas, como pode-se perceber na seguinte afirmação: “o demônio possui esses retardados e ficam onde suas almas devem estar.” Mas logo nos séculos seguintes, com a expansão do cristianismo, o qual dizia que praticar a caridade era um meio para alcançar os favores celestiais, a deficiência passou a ser concebida como propósito divino, algo sublime, como se Deus estivesse consagrando a pessoa com deficiência e que, portanto, demandava condição de caridade por parte dos fiéis. Walber e Silva (2010) nos fala desse momento, em que a pobreza e a deficiência eram consideradas uma moeda de barganha, mesmo os menos afortunados, com deficiência e em condições de miséria pode auxiliar o rico a adquirir a virtude com práticas assistencialistas, conseguindo assim a salvação. Sob essa influência os senhores feudais e a igreja amparava os deficientes e doentes em abrigos e casas de amparo. Mais tarde veio a necessidade da colocação da pessoa com deficiência no “sistema de produção, ou assistidos pela sociedade, que contribuía compulsoriamente para tanto” (FONSECA, 2000, p. 2). Apesar dessa inserção ainda era inexpressiva a participação dos deficientes no âmbito social do trabalho. Somente em 1547, na França podemos notar um avanço significativo na assistência assegurada por Lei e na capacitação profissional das pessoas com deficiência. Conforme FONSECA (2000, p. 2): Na França, instituiu-se, em 1547, por Henrique II, assistênciasocial obrigatória para amparar deficientes, através de coletas de taxas. Mas foi com o Renascimento que a visão assistencialista cedeu lugar, definitivamente, à postura profissionalizante e integrativa das pessoas portadoras de deficiência. A maneira científica da percepção 1 Disponível em: http://www.deficienteciente.com.br/2010/12/deficiencia-e-questao-do.html 11 da realidade daquela época derrubou o estigma social piegas que influenciava o tratamento para com as pessoas portadoras de deficiência, e a busca racional da sua integração se fez por várias leis que passaram a ser promulgadas. Vê-se que o caminho para a integração de Leis e o amparo à pessoa com deficiência foi bem longo, em que a preocupação com a locomoção, o Código Braille e adaptações para a melhora da qualidade de vida das pessoas com deficiência física só veio ocorrer em 1789. Mas apenas na Revolução Industrial veio a real necessidade de integração das pessoas que haviam sofrido algum tipo de trauma em guerras, mutilações acarretadas por acidentes de trabalho, as doenças epidêmicas e o reconhecimento de diferenças genéticas, oportunizando a necessidade de se modificar, habilitar e reabilitar o trabalhador. Desta forma foi necessária uma nova visão para acolher as pessoas com algum tipo de deficiência. Em função disso, criou-se na época O Direito Do Trabalhador e um sistema eficiente de Seguridade Social, no qual deveria se assegurar o atendimento e cuidados com a saúde do trabalhador, assim como um programa para a reabilitação dos acidentados (FONSECA, 2000, p. 3). Nos anos 80 com a economia globalizada e o consumismo crescente, viu-se a necessidade de se estar amparando o profissional com deficiência a fim de incluí-lo nas atividades laborativas, dando-lhe condições para exercer sua cidadania plena, onde o trabalho é fundamental para que o ser humano tenha suas capacidades respeitadas e reconhecidas. Com essa necessidade, a Constituição de 1988 e diversas Leis foram criadas no intuito de reservar o direito integral do cidadão. Porém o ranço de caridade para com essas pessoas ainda dificultava a real integração delas na sociedade. Nos dias de hoje, ainda que insuficiente, é possível perceber uma abertura no mercado de trabalho para pessoas com deficiência. Elas estão adquirindo mais espaço na sociedade, estão conscientes de seus direitos, estão lutando para serem vistos como membros integrais e participantes de todos os setores de convivência com suas diferentes capacidades, modificando paulatinamente a visão simplória da sociedade de os verem apenas seres dotados de pena ou caridade. O direito à profissionalização assume, aqui, papel imprescindível de socialização do portador de deficiência, eis que suas limitações para o trabalho se constituem em barreiras, tão somente, instrumentais, mesmo que seja ele portador de deficiência física, mental, ou sensorial. Todas elas são superáveis, desde que se rompam os preconceitos atávicos, herdados, talvez, das concepções antigas dos povos primitivos, de que o portador de deficiência é um "pecador punido por Deus", que deve ser segregado (FONSECA, 2000, p.9). O papel social que hoje exerce o trabalhador é de importância não somente econômica, mas de oportunizar caminhos para o desenvolvimento social do ser humano. Privar um grupo de pessoas, segregá-las aos ambientes como instituições filantrópicas, determinando um 12 espaço para eles estarem, é legitimar a exclusão social Desta forma, a mobilização de todo o grupo social, será necessária para que o indivíduo com deficiência possa ter garantido o seu direito de ser visto como uma pessoa produtiva e eficiente. 1.2 – Deficiência e mercado de trabalho: relação “assegurada” pela Legislação A política para a inclusão está em franco crescimento, ganhando repercussão mundialmente. A inclusão da pessoa com deficiência em todos os segmentos da sociedade ganha a cada dia novos direcionamentos. Em especial, a preocupação em amparar o trabalhador com deficiência está sendo uma tendência mundial, onde muitos países estão tentando adequar-se a essa nova realidade. Podemos verificar que na União Européia também destacam a participação dessas pessoas, porém, ainda há muita dificuldade para implementação dos direitos delas. Na passagem abaixo, Verdugo (2000) 2 fala que: (...) as políticas da União Europeia têm sido efetivas em orientar ações na área nos Estados-Membros, porém algumas dificuldades encontradas atualmente incidem sobre a falta de provisão para reestruturar e implementar estratégias de emprego e, além disso, sobre a necessidade de se divulgarem informações atualizadas sobre as pessoas com deficiência e sua situação no mercado de trabalho. No âmbito do Brasil, a Constituição Federal de 1988 veio a estabelecer as primeiras regras para que as pessoas com necessidades especiais pudessem participar da economia formal, protegendo-os e fiscalizando as obrigações das empresas, pois a carta magna brasileira veta a discriminação no tocante a salários e critérios de admissão para os trabalhadores com qualquer tipo de deficiência (art.37, VIII). Também regulamenta vagas em empregos públicos de 20% das vagas totais dos concursos realizados (art. 37, VIII). Já a Lei 8.213/91 (art. 93), a chamada Lei de Cotas estabelece que todas as empresas privada com mais de 100 funcionários devem preencher entre 2 e 5% de sua vaga com trabalhadores que tenham algum tipo de necessidade especial. Segundo Pulchério (2003), o setor público é o responsável pela maior incorporação das pessoas com algum tipo de deficiência. Somando os números das esferas Federais e Estaduais, tem-se 0,526% de trabalhadores ocupando um cargo público. Em contrapartida, os números são bem mais tímidos nas empresas particulares, que colocam como barreira para a não contratação a pouca escolarização das pessoas com deficiência. Segundo pesquisa realizada por Araujo e Schmidt (2006), as empresas que contratam as pessoas com deficiência, visam preencher vagas que são exigidas pela Lei de Cotas. Eles 2 Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-65382009000200004 13 apontam também em suas pesquisas que as empresas relatam que tem pouca informação sobre o que é a deficiência intelectual, sem saber ao certo como podem estar utilizando seus potenciais e ressaltando apenas as limitações dessas pessoas, contratando-as apenas por causa da legislação. Apesar dessa obrigação legal por parte dos setores da economia, existem vários fatores que inviabilizam o preenchimento das vagas, impostas pela Lei de Cotas. A maior parte dos autores destaca a falta de escolarização, a crescente competitividade do mercado de trabalho, o baixo percentual de oferta de emprego na economia formal, e a falta de conhecimento dos empregadores sobre a deficiência. Além disso, essa cota dedicada aos deficientes tem produzido pouco impacto nas grandes empresas e multinacionais, as quais são responsáveis pelo maior número de vagas disponíveis no mercado de trabalho, devendo, por isso, na opinião de Neri (2002), ser repensada. Araujo (2000, p. 5) destaca que as empresas privadas, com um grande número de funcionários, tendem a contratar mais, seguindo a lógica apresentada a seguir: “A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:- até200, 2%; -de 201 a 500, 3%;-de 501 a 1.000, 4%;-de 1001 em diante, 5% de empregados”. Podemos notar que quanto mais funcionário, mais empregos são disponibilizados. Porém, as empresas de maior porte destacam mais barreiras, justificando que não existem pessoas com formação acadêmica ou capacitação profissional específica, Além de que, conscientemente podemos afirmar que os anos de exclusão dessas pessoas do sistema de ensino foi fator predominante para os problemas atuais. De acordo com Oliveira, Junior e Fernandes (2009), apesar do tema da inclusão está em plena expansão, com destaque nas políticas mundiais, ainda existe o empecilho difícil de transpor para a inserção da pessoa com deficiente no mercado de trabalho que é a atitude do empregador. Para Bruyereet al et. (2002), é difícil transpor as barreiras que os empregadores colocam para que a contratação seja efetivada, principalmente no setor privado, onde há a grande maioria das vagas para pessoas com deficiência. Nesse sentido, Barnes (1992) realizou uma pesquisa com 1.160 empregadores, os quais relataram que as pessoas com deficiência não se encaixam nas vagas oferecidas por elas serem “impróprias” para a função. As empresas não oferecem meios para que o trabalhador com deficiência possa se adaptar ou mesmo evoluir dentro da empresa. As pesquisas demonstram que ainda existe 14 muita discriminação e falta de conhecimento para que o trabalhador com deficiência seja visto como alguém que quer evoluir e ser capacitado como qualquer outra pessoa. Conforme Barnes (1992), o discurso dos empregadores tem origem e se perpetua por influência do modelo médico da deficiência, o qual a coisifica e orienta-se pela “falta, para o “não” e para a imposição de limites ao desenvolvimento da pessoa (TUNES e BARTHOLO, 2010, p. 71). A sociedade tende a enxergar a coletividade admite a deficiência como determinante em si mesma, pelo seu aspecto orgânico, pela falta de habilidade, segregando e subestimando, desta forma, as capacidades de adaptação do ser humano, especialmente no contexto de trabalho. Mas, pensando no paradigma de uma sociedade inclusiva, estudos refletem que não é apenas a pessoa com deficiência que deve ser adequar ou adaptar as condições da realidade, mas, por outro lado, a sociedade deve prover os meios necessários e eficazes para ela que se desenvolva em sua plenitude. Conforme Aranha (2002): A proposta de uma sociedade para todos implica mudança no foco de atenção, pois, se até então, a pessoa com deficiência deveria ajustar-se ao contexto para acessar os bens disponíveis em dada cultura, com a emergência do Paradigma dos Suportes, torna-se incisiva a responsabilidade do meio social na provisão de suportes físicos, psicológicos, sociais e instrumentais para garantir a participação de quaisquer indivíduos, deficientes ou não, na vida comunitária. Tentando responder a este paradigma da sociedade inclusiva, a legislação brasileira, Constituição Federal de 1988, assegura a pessoa com deficiência o Benefício de Prestação Continuada (BPC), cujo valor assistencial atende cerca de 2,8 milhões de pessoas no país. A portaria para conseguir essa remuneração do beneficiado é do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), repassados para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A regra para se conseguir essa remuneração hoje está à margem daquilo que é considerado o mínimo para a sobrevivência, pois o cálculo da renda familiar per capita para o BPC não pode ultrapassar ¼ do salário mínimo (inserir referência). Pode-se perceber que 30% das 25 milhões de pessoas com deficiência, no país, têm remuneração inferior a um salário mínimo. Sem condições de viver com apenas o valor custeado pelo governo, a pessoa com deficiência precisa completar sua renda por meio dos subempregos ou em empregos informais, o que pode acarretar perda do benefício, desestruturação e dificuldades de sobrevivência familiar. Para Castel (1998), essas pessoas estão em uma área de vulnerabilidade social, pois sempre estão sujeitas ao desemprego e uma renda que não dá para prover uma vida com segurança e dignidade. 15 Em função disso, a Subcomissão Permanente de Assuntos Sociais das Pessoas com Deficiência, da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), está lutando para que o benefício deva ser somente suspenso quando a pessoa conseguir uma função no mercado de trabalho, em vez de ser cancelado, como acontece atualmente. Com a interrupção, o benefício seria apenas retomado caso a pessoa com deficiência volte a ficar desempregada. Contudo pedir ou sugerir que a pessoa com deficiência desista de um benefício que, apesar de pouco, é certo para o custeio de suas despesas não é fácil. Não podemos negar essa realidade. Desta forma, coloca-se como um grande desafio ajudar a pessoa com deficiência, sem, no entanto, dispensar seu potencial para o mercado de trabalho, ou privá-la de construir uma vida digna e independente, onde o trabalho é demasiadamente valorizado na sociedade. Considerando a visão de que a pessoa só se torna capaz quando está trabalhando e quando conquista uma renda mensal, o trabalho torna-se imprescindível para o exercício pleno da cidadania. Mesmo que ela não consiga se inserir no mercado formal é importante manter-se ativa, contribuindo financeiramente para o seu próprio sustento e, sobretudo, aproveitar-se do convívio social como meio favorável ao seu desenvolvimento. Zola (2005), fala que a função das políticas públicas para a colocação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho ou ajuda de custo como o BPC, precisam de uma atitude radical de toda a coletividade, e não apenas da imposição de Leis. É necessário que Leis e políticas públicas caminhem na mesma direção. E principalmente que a sociedade se engrene na marcha da inclusão, proporcionando melhores condições para o desenvolvimento da humanidade. Temos que mudar a visão social sobre a empregabilidade garantida pela legislação brasileira, pois encontra-se desatualizada em relação às demandas das pessoas com deficiência. São necessárias novas propostas para que as leis deem apoio onde se possam desenvolver um trabalho de conscientização e planejamento da inserção das pessoas com deficiência, principalmente das pessoas com deficiência intelectual, que são as que mais sofrem com a falta de conhecimento e despreparo do empregador. Para Barnes (2000), a pessoa com deficiência intelectual tem uma dificuldade no ingresso às vagas de empregos oferecidas, dificultando sua entrada no mercado de trabalho e no processo de inclusão de modo mais amplo, e isso necessita ser avaliado. O que se percebe é que a maior parte dos empregadores e pessoas em geral, nunca se deteve para a necessidade de conhecer sobre a deficiência intelectual, em consequência disso vemos a alta rejeição dessas pessoas no mercado de trabalho. 16 Podemos notar que para o desenvolvimento da cidadania não basta simplesmente o acesso ao trabalho por uma norma ou Lei de Cotas, mas a garantia do direito à igualdade, que promove a satisfação pessoal através da comprovação da capacidade individual. Para Barnes (2000), é necessário transformações nas estruturas dos grupos de trabalhos, em suas relações, para que seja efetivamente adequado as especificidades dessas pessoas. Desta forma, Hillage e Pollar (aput OLIVEIRA, JÚNIOR, FERNANDES, 1998, p. 03) destacam alguns pontos para que a inserção no mercado de trabalho das pessoas com deficiência ocorra satisfatoriamente: a) identificação dos grupos prioritários, para que o direcionamento das açõesseja responsivo à população-alvo dessas políticas, b) levantamento das necessidades mais urgentes de cada grupo, tendo em vista a hierarquização das prioridades de investimentos, c) elaboração de objetivos para atender a essas necessidades, levando em consideração o alcance das ações em curto, médio e longo prazos, d) alocamento de recursos de modo a subsidiar as intervenções planejadas e) medidas de avaliação, a fim de verificar quais os resultados obtidos nestas intervenções e quais os possíveis ajustes a serem realizados. Além dessas ações, podemos falar de ajustes simples como palestras nas escolas e setores públicos e privados, propondo uma mudança de percepção e comportamento onde se destaca a viabilização dessa inclusão. É válido ressaltar que nenhuma política vai mudar o preconceito da sociedade e o processo de exclusão já bastante enraizado apenas pela imposição governamental. O processo de inclusão implica em mudanças na forma de pensar, de formular, de agir e, principalmente, de construir o processo de ensino-aprendizagem subsidiado pela diversidade. É necessária uma reestruturação visando um maior suporte ao deficiente. Ele precisa ser ouvido, ser orientando e amparado em suas necessidades. Antes de sua inserção no mercado de trabalho, esse suporte tem que acontecer nas esferas educacionais e, posteriormente, com o apoio do empregador. A partir de ações conjuntas voltadas para a promoção do desenvolvimento da pessoa com deficiência será possível superar a obrigação de cotas imposta pela Lei. O que ocorre hoje é que a escola, ou instituição direciona o aluno para a empresa sem prepará-lo suficientemente, e as empresas, por sua vez, pouco fornecem subsídios para que eles possam se desenvolver na função 1.3 – Escolarização e educação para uma sociedade inclusiva Como diz Brandão (1995), a escola não é o único lugar onde se aprende, nem é detentora de todos os saberes, nem o professor é o único agente de formação. Mas é nela que a sociedade se reúne para exibir sua diversidade, e nela deveríamos retomar seu primeiro 17 conceito que é refletir as necessidades de sua comunidade, tendo ela sua própria identidade, para atender as necessidades de todo um grupo, e não apenas de uma parcela privilegiada de acordo com conceitos pré concebidos e historicamente enraizados como verdade única. É função de a escola formar cidadãos mais conscientes de seus deveres e onde as pessoas com deficiência devem encontrar apoio e potencial para uma mudança de paradigmas. Hoje vivenciamos uma época em que as pessoas com deficiência querem falar por si mesmas, existindo movimentos como no artigo da revista jurídica Consulex (2009)3 que coloca: Somente as pessoas com deficiência podem lhe dizer o que é possível para elas. Nós, que as amamos, devemos ser observadores atentos e sintonizados. As pessoas com deficiência devem agir por conta própria. Podemos oferecer-lhes alternativas, possibilidades e instrumentos necessários - mas somente elas podem colocá-los em ação. Nós podemos apenas permanecer firmes, e estar presentes para reforçar, encorajar, ter esperanças e ajudar quando possível. A educação atualmente se baseia fundamentalmente em acúmulo de conteúdos nem sempre aplicados a vida do indivíduo, e às vezes não se consegue atingir a funcionalidade para a capacitação profissional ou mesmo prover meios para que eles possam se desenvolver continuamente. É urgente a necessidade de uma escolarização voltada para a formação de cidadãos que respeitem a diversidade humana sem preconceito e preparados para participar de uma inclusão que é latente nos dias atuais, deve haver uma maior qualidade no ensino para que pessoas com deficiência possam desenvolver os conteúdos com o apoio necessário, seja tecnológico ou humano. Além disso, deve haver um redimensionamento para que a escola desenvolva as diversas inteligências, não apenas a intelectual, mas a artística, física, comunicativa e tantas outras. Schmidt e Araújo (1999), ao falarem da qualidade da escolarização, afirma que as escolas têm tentado através de programas inserirem alunos com necessidades especiais em classes regulares, além de oferecer atendimentos extraclasses. Porém o que consta é que nem todos conseguem atingir o ensino fundamental. Ainda nesse sentido, contribuem para a baixa qualidade da escolarização, as precárias condições arquitetônicas das escolas, a falta de material adequado, capacitação profissional dos docentes que atuam com as pessoas com deficiência e a inadequação curricular. A maior parte dos empregadores atribui a não contratação de pessoas com deficiência intelectual, a falta de escolarização, mas que tipo de escolarização estamos propondo? A de 3 Disponível em: www.apaesp.org.br/deficiencia_intelectual/direitos/ManualDeficientes. 18 acentuar os defeitos e incapacidades biologicamente impostas? Sendo que não há nenhum individuo igual, sendo assim a escola deveria reunir diferentes capacidades para o atendimento de suas particularidades, não que seja excluído algum tipo de currículo, mas sim adaptado e valorizado as diversas formas de educar e aprender. Pelos avanços da medicina moderna tem se levantado ideias errôneas sobre a perfeição biológica, onde cada vez mais se almeja o corpo perfeito, imposto por um padrão elitista. E mesmo aqueles que querem estar inseridos na causa da inclusão total da pessoa com deficiência, que prega o multiculturalismo e a diversidade cultural prega a explicação por meio de diagnósticos, não para melhorar seu trabalho, mas para justificar suas ações. Para confirmar esse parágrafo Tunes e Bartholo (2010, p.72) relatam que: Infelizmente, mesmos aqueles que lutam pela inclusão social do deficiente buscam o apoio de diagnósticos e classificações como instrumentos fundamentais para abordagem do deficiente (a priori natural). Este fato fica bem demarcado na dependência do educador as avaliações médicas, neuropsicológicas, em que ele procura referência (diagnóstico médico, teste de QI, nível de atenção) para planejar o processo pedagógico, que se torna cada vez mais centrado na deficiência do aluno que no processo de interação social. Como nos estudos de Gdaner (aput ANTUNES 2008) ele procurou não se pautar em testes de QI, nos defeitos, ou imperfeições do ser, buscando uma forma de entender nossa diversidade e as habilidades inerentes de cada ser. Como explicar as obras de Aleijadinho, ou a superação de recordes de alguns atletas e a habilidade do jogador Ronaldo? Assim como eles, os alunos com limitações físicas ou intelectuais são capazes de desenvolver algumas atividades com mais facilidade em relação àquelas pessoas consideradas “normais”, segundo os padrões da sociedade. O conceito de inteligência é capacidade de adequação do indivíduo a uma circunstância nova. Ou como nos diz Piaget (1982): Dizer que a inteligência é um caso particular da adaptação biológica é, pois, supor que ela é essencialmente uma organização e que sua função é a de estruturar o universo como o organismo estrutura o meio imediato. Então a inteligência não pode ser simplesmente medida através de um teste pré- determinado e com respostas definidas, pois trata-se de como o indivíduo se adapta a situações diferentes. É como compreendemos e interpretamos as situações e a cultura de nossa sociedade, criando maneiras de resolver problemas. Como uma pessoa que ainda não aprendeu a amarrar os sapatos e compra um com velcro, satisfazendoa necessidade de forma satisfatória de uma maneira diferente. 19 Gadner (1983) publicou um número de oito inteligências, mas não sendo essas determinardes, portanto chamou de inteligências múltiplas que são: linguísticas ou verbal, a lógica matemática, a espacial, a sinestésica corporal, a naturalista e as inteligências pessoais, isto é, a intrapessoal e a interpessoal. Redimensionando assim o papel da escola, onde hoje vemos a necessidade de trabalhar o indivíduo a desenvolver suas habilidades e ajudar em suas dificuldades e a acomodar os conhecimentos e necessidades do meio. Assim são nossos educando com dificuldades de aprendizagem ou com déficit intelectual, onde esperamos que eles procurassem resolver situações problemas com criatividade e alcançando o objetivo principal que é adapta-se as necessidades de seu dia a dia. Devemos eliminar o conceito que a inteligência esta ligada tão somente as opiniões formais, gramaticais e acadêmicas. Tunes e Bartholo (2010, p. 19) nos falam que a exclusão é “a negação da diversidade humana, o que, em seu efeito mais deléterio, pode se tornar insustentável a vida entre os homens.” Assim devemos propor mudanças para que a sociedade se adapte a essa nova exigência desse grupo que a cada dia reivindica por seu espaço. Nesse sentido, segundo Brandão (1995)4 a educação deve pautar suas ações no “cotidiano do aluno, fazendo com que a vivência e as experiências do indivíduo façam parte efetiva da escola, e a educação será livre e comunitária.” Portanto, para promover uma sociedade mais justa, tendo por base uma escolarização eficiente, deve-se, entre outros, valorizarem o desenvolvimento individual, respeitar a diversidade e proporcionar igualdade de oportunidades para todos. 4 Disponível em: http://www.netsaber.com.br/resumos/ver_resumo_c_1208.html 20 II – OBJETIVOS 2.1 – Objetivo geral Analisar o processo de preparação e inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, sob o ângulo do educador, da família e da própria pessoa com necessidades especiais, usuários da Associação de Pais e Amigos Dos Excepcionais de Ceilândia e Taguatinga. Rute, não posso trocar o nome de Associação para Instituição Especializada de Ensino por se tratar do significado da sigla APAED, descaracterizando o nome da instituição. 2.2 – Objetivos específicos - Verificar como a pessoa com necessidades especiais é preparada para ser inserida no mercado de trabalho, desde sua chegada na Associação até o encaminhamento para as empresas. - Identificar as razões pelas quais levaram a família da pessoa com necessidades especiais procurar a capacitação profissional na Associação. - Identificar como ocorre a capacitação profissional na Associação, relacionada às especificidades da deficiência. - Verificar como se processa o encaminhamento da pessoa com necessidades especiais ao mercado de trabalho, considerando a adequação entre as particularidades da deficiência e o perfil profissional do emprego. 21 III – METODOLOGIA 3.1 – Fundamentação metodológica Quando analisamos trabalhos do paradigma qualitativo, especialmente de vertente sócio-histórica de Vygotsky e outros pensadores, podemos notar que o estilo de fazer pesquisa imprime algumas características próprias, que baseia-se na tentativa de superar os reducionismos das concepções empiristas e idealistas. Vygotsky (1996) buscou estabelecer uma nova psicologia, valorizando a pessoa em sua totalidade, articulando dialeticamente seus aspectos externos e internos e considerando a relação do sujeito com a sociedade a qual pertence. Vygotsky impunha um sentido bem definido frente às relações sociais. Ele acreditava que a conduta humana não era apenas o produto da evolução biológica, graças a qual se formou o tipo humano com todas as suas funções psicofisiológicas a ele inerentes, mas também o produto do desenvolvimento histórico e cultural (VYGOTSKY, 1996, apud FREITAS, 1996). Assim podemos notar que para a análise dos fatos devemos leva em consideração o contexto histórico, a cultura e como o indivíduo se posiciona diante dos fatos de sua história. Segundo Freitas (1996), a preocupação é encontrar métodos para estudar o homem como unidade de corpo e mente, sendo um ser biológico e social, participante do seu processo histórico. A pesquisa qualitativa, que encontra respaldo na perspectiva sócio-histórica, compreende o homem como ser histórico, concreto, marcado por uma cultura, criador de ideias e consciência que, ao mesmo tempo em que produz, também é produto da realidade social. Nas pesquisas de cunho qualitativo, no campo das ciências humanas, o objeto de estudo é o homem, compreendido como "ser expressivo e falante". Assim há uma troca de experiências, onde o pesquisador tem que interagir manter contato, procurando compreender o outro, passando a construir o conhecimento em conjunto com o indivíduo pesquisado. Diante dele, o pesquisador não pode se limitar ao ato contemplativo, pois se encontra perante um ser que tem voz, que participa da construção da realidade. Com o objetivo de compreender as vicissitudes humanas, a pesquisa qualitativa encontra na interação um campo fértil de informações, as quais deixam explícita a expressão da subjetividade daqueles que se engajam no ato comunicativo. Segundo González-Rey (2005), o diálogo estabelecido e construído passo a passo na interação permite ao 22 pesquisador: conhecer e se aproximar da realidade do participante, compreender suas dificuldades, preocupações, expectativas, desejos e necessidades, podendo organizar e interpretar as informações expressas no diálogo numa direção de coparticipação. Nesse sentido, Maciel e Raposo (2008), nos chama a atenção para as estratégias e os instrumentos a serem utilizados nesse processo, os quais devem ser construídos de forma flexível, a fim de apreender o curso das informações, que por serem variáveis e dependentes da interação, podem ser readaptados as novas necessidades que aparecerem entre os interlocutores - pesquisador/pesquisado. 3.2- Contextos de Pesquisa A Associação de pais e Amigos dos Excepcionais de Taguatinga é uma instituição que atende a crianças com necessidades especiais desde a estimulação precoce até o atendimento em oficinas pedagógicas. São atendidos também alunos matriculados nas escolas regulares de ensino, onde recebem atendimento na instituição em horário contrário as suas aulas. A instituição oferece atendimento de psicomotricidade, fonoaudiólogo o, artes, teatro, educação física, atividades regulares do cotidiano, manutenção acadêmica, Educação de Jovens e Adultos (EJA) e oficinas de: reciclagem, panificação, informática, costura e incluarte. As famílias das crianças menores têm que acompanhar de perto os atendimentos, com o objetivo de aprender um pouco mais do filho e poder estimulá-lo em casa, favorecendo uma troca de informações entre eles. Em todas as etapas as famílias são convidadas a participar e a conhecer um pouco mais sobre a deficiência e o que o governo e outras associações de pais para oferecer e amparar crianças, jovens e adultos com deficiência. A cada dois anos, a instituição promove a reunião de pais um momento reservado para essa troca, onde são convidados palestrantes que estão diretamente ligados à área da deficiência intelectual.Os alunos que atingiram a idade adulta e tem a capacidade e vontade de estarem inseridos no mercado de trabalho, tem seu encaminhamento feito pela instituição. O processo funciona da seguinte forma: inicialmente uma professora disponibiliza as características do aluno para que as empresas tenham acesso; quando interessada, a empresa entra em contato solicitando uma entrevista; a instituição, por sua vez, encaminha o aluno para a entrevista e que, quando aceito, passa a ser acompanhado pela APAED; quando o aluno não se adapta ao 23 ambiente de trabalho, ele retorna para a instituição, continuando seu aperfeiçoamento até uma nova chamada de emprego. A maior parte dos alunos fica na instituição por um período integral, sendo meio período nas oficinas e o outro na manutenção acadêmica ou EJA, onde dão continuidade aos estudos com o apoio da informática. Os alunos que recebem o BPC, ou o aluno que não tem perfil para o mercado de trabalho, ficam nas oficinas pedagógicas profissionalizantes, onde permanecem durante o tempo em que a família achar melhor ou o aluno sente vontade de estar. A maior parte dessa clientela é de pessoas que são atendidas na instituição desde pequenas, com vínculos fortes com todo o grupo da instituição. A escola recebe encomendas que são realizadas pelos alunos, sendo que os recursos arrecadados são voltados para a manutenção da própria oficina ou direcionada para alguma área precária da instituição. 3.3- Participantes de pesquisa São participantes desta pesquisa dois alunos diagnosticados com deficiência intelectual, sendo uma moça de vinte e quatro anos e um rapaz de vinte e oito anos. Ambos frequentam a APAED desde criança e recebem o Benefício de Prestação Continuada (eles são identificados como alunos A e B). Ainda participam: duas famílias (A e B), cujos filhos são usuários da instituição; a diretora que atua na APAED há mais de dez anos, com 17 anos, atuando diretamente com o ensino especial e há 10 anos como diretora da instituição; uma professora de vinte e oito anos, responsável pelo encaminhamento dos alunos ao mercado de trabalho há pelo menos quatro anos; e dois alunos (identificados com alunos egressos) que já foram indicados para o mercado de trabalho, sendo uma moça que já tem dois anos de carteira assinada como auxiliar de caixa e um rapaz com três anos no setor de serviços gerais. 3.4 – Materiais e Instrumentos utilizados Foram empregados como materiais: papel, caneta, um gravador de voz e computador. Como instrumentos foram utilizados roteiros de entrevista semiestruturados, contendo perguntas amplas sobre a escolarização, desenvolvimento nas oficinas da APAED e encaminhamento do aluno ao mercado de trabalho (ver apêndice 1 x). Como complemento as informações, foram realizadas observações com o objetivo de apreender a rotina da instituição, o funcionamento das oficinas, as relações dos alunos com os professores e com os outros alunos e o procedimento de encaminhamento dos alunos para o mercado de trabalho. 24 3.5- Procedimentos de Construção de Dados Inicialmente foi feito o contato com a direção da APAED em que foi disponibilizada a carta de apresentação (ver anexo 1), contendo os objetivos gerais e específicos deste trabalho e o compromisso ético da pesquisadora para a realização da pesquisa. Após consentimento da direção, o próximo passo foi contatar os professores, familiares e alunos usuários da instituição. A eles foram entregues a carta de apresentação e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ver anexo 2). Após leitura conjunta do termo (participante e pesquisadora), todos foram solícitos e anuíram de imediato com o desenvolvimento da pesquisa. As entrevistas foram realizadas na própria APAED, gravadas e transcritas para sua posterior análise. 3.6- Procedimentos de Análise de Dados Conforme os pressupostos da análise qualitativa, as entrevistas foram lidas e relidas buscando evidenciar os sentidos construídos pelos participantes em torno do processo de inclusão no âmbito do mercado de trabalho. As categorias foram divididas por se observar a dinâmica da instituição onde grande parte dos alunos chega na instituição encaminhados pela rede regular de ensino, sendo que muitos deles permaneciam nela durante toda sua vida. Os que tinham o perfil para se encaixar nas empresas eram encaminhados para o mercado de trabalho e alguns depois desse encaminhamento voltavam para a suas turmas como voluntários, ajudando os novos alunos no seu processo de ensino. Nesse contexto foram eleitas 4 categorias a saber: Categoria 1 – A chegada do aluno na APAED e sua a preparação para o trabalho; Categoria 2 – A percepção da deficiência; Categoria 3 – A inserção do aluno no mercado de trabalho; Categoria 4 – o aluno egresso da APAED. A partir das falas dos participantes, foi feita uma seleção daqueles trechos que ilustram os sentidos construídos sobre a temática em questão e analisados à luz do referencial teórico adotado, como pode ser vislumbrado no capítulo a seguir. As informações apreendidas pela a observação foram agrupadas nas análises das falas dos participantes por meio de tópicos para melhor esclarecer como acontece cada etapa do desenvolvimento do educando especial dentro da instituição, o envolvimento da família, a triagem que é realizada para essa inserção dentro das oficinas pedagógicas e seu encaminhamento para o mercado de trabalho. 25 IV – RESULTADOS E DISCUSSÃO Pretende-se ao longo deste capítulo apresentar as categorias que emergiram a partir das falas dos participantes e tecer um diálogo com o referencial teórico adotado. Para efeito de disposição das informações, são apresentadas em conjunto as falas de todos os participantes – pessoas com necessidades educacionais, familiares e professores – visando uma melhor compreensão e apreensão da dinâmica do fenômeno estudado. Cada categoria demonstra o funcionamento da instituição, através do olhar da família, alunos e funcionários que atendem a essa demanda. Também será posicionada minha vivência dentro da instituição, sobre seu funcionamento geral e observações feitas durante esses anos de convivência dentro da APAED. Categoria 1 – A chegada do aluno na APAED e sua a preparação para o trabalho Esta categoria deixa claro como as instituições filantrópicas exercem uma importante função de preparo e colocação da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, contribuindo para o processo de inclusão ao fazer uma ligação entre tais pessoas e as empresas. As instituições tentam em sua maioria verificar o perfil que o mercado de trabalho exige e proporcionar ao educando compatível com as dificuldades que eles poderão encontrar no dia a dia dentro das empresas. Mas também poderemos notar as dificuldades do acesso daqueles alunos, por exemplo, com dificuldades de locomoção e com déficit intelectual, os quais as empresas tendem a rejeitar. Veremos que para o sucesso da inclusão do deficiente trabalhador é imprescindível o apoio de programas que os valorizem e os capacitem. A APAED recebe o apoio dos Centros de Referência em Assistência Social de Ceilândia (CREAS), e da Secretaria de Saúde e Educacional, onde é cedida uma parte dos professores. Por meio dessa parceria, os educandos, em sua maioria, são indicados pelo CREAS. Nota-se que a maioria desses alunos não chegou a completar o ensino fundamental, demandando um trabalho mais próximo por parte da APAED. Outros alunos chegam à instituição por outros meios. A mãe da aluna “A”,conta que foi através de informações de conhecidos que ficou sabendo da existência da instituição. De acordo com ela, sua filha frequenta a instituição há mais de 13 anos. Já com a mãe B foi através do contanto e indicação da escola regular de ensino de seu filho, que estar na APAED há quase um ano. 26 As instituições oferecem distintas atividades e oficinas, como aponta nas pesquisas realizadas por Schimdt e Araújo (2006). A APAED pode ser encaixada no perfil de instituições que oferecem além da profissionalização e acompanhamento ao mercado de trabalho, atividades como informática, manutenção acadêmica, atividades culturais que muitas vezes complementam o apoio dado à rede regular de ensino. Segundo a observação realizada no contexto da APAED, é notável a satisfação dos alunos na instituição, os quais afirmam que a escola é ótima, os atendimentos são bons e ainda é possível fazer muitos amigos. Eles ainda relatam que sem o apoio da instituição eles poderiam estar “nas ruas aprendendo coisas ruins”. Os pais também reconhecem que sem a instituição, eles não teriam muitas chances para desenvolver o potencial de seus filhos no sistema público de ensino. A mãe da aluna A fala que a “APAED é onde ela pode se desenvolver, ela se sente feliz. Na escola pública ela não teria muita oportunidade”. Na instituição, o aluno tem a oportunidade de realizar as tarefas em um ambiente de cooperação. Cada um realiza seus trabalhos participando efetivamente dentro de suas possibilidades. Nesse sentido, a diretora diz que: É importante ressaltar que as limitações oriundas das deficiências devem ser consideras e respeitadas, assim como suas capacidades estimuladas e valorizadas (diretora da APAED). A professora responsável pelo encaminhamento dos alunos completa que eles passam por um período de experiência na instituição antes de efetuarem a matrícula para que seja escolhida a oficina pedagógica que atenda a necessidade específica do educando. A partir da efetivação da matrícula, eles participam de todas as etapas de profissionalização, como, por exemplo, a oficina de costura, na qual os alunos com bom desenvolvimento produzem sob orientação camisetas e confecção em geral. Nas palavras da professora: Eles conseguem melhorar seu dia a dia com o que aprenderam como pequenos consertos em casa, em suas roupas, buscando relacionar com suas necessidades (professora da APAED). A professora responsável pela triagem completa que o aluno fica inserido nas oficinas até apresentar habilidades e competências para sua inserção no mercado de trabalho. As famílias completam que os cursos oferecidos são bons, mas a mãe de B gostaria que fossem 27 criadas outras, pelo próprio pedido do filho que quer “uma oficina de lava-jato, para lavar os carros” (aluno B). Enquanto educadora da APAED, tive a oportunidade de observar também o funcionamento das oficinas pedagógicas e contribuir, junto com os demais educadores, para a melhoria do atendimento dos alunos. Entre as oficinas, cito em especial a oficina Incluarte, que tem a especificidade de ser frequentada apenas por garotas. Elas fazem vários trabalhos de artesanato, utilizando a criatividade para trabalhar com materiais alternativos. Ainda nessa oficina, o educando faz uma releitura dos trabalhos de grandes autores, pois segundo Barbosa (1984), a arte pode ser utilizada como estímulo para que a pessoa se desenvolva. Trabalhos como Portinari, Tarsila do Amaral, Di Cavalcante e outros nesta oficina proporciona um despertar do senso crítico que, aos poucos, transformam-se em novos interesses, na busca por mais informações, técnicas e diferentes aplicabilidade de seus conhecimentos. Desta forma, eles vivenciam a arte de uma maneira diferente, encontrando nela sustento para as suas necessidades financeiras; algumas alunas já estão no mercado de trabalho informal, comercializando seus produtos (panos de prato pintados e bordados, telas, flores artesanais, enfeites de cabelos entre outros). O diferencial dessa oficina é que os alunos não precisam estar encaixados no mercado formal para ganhar uma renda Na oficina de reciclagem os alunos aprendem a importância de reciclar para uma vida em harmonia com a natureza, desenvolvendo habilidades como coordenação motora fina, organização e noções sobre gestão para o trabalho. A panificação funciona como uma cozinha experimental, onde os alunos podem desenvolver receitas, aprender a manter o ambiente limpo, aprender a cortar, amassar e cozinhar os alimentos. Essa oficina ainda proporciona independência, uma vez que muitos alunos reconhecem a importância dela para o seu cotidiano, cozinhar para eles é ter independência, saber se “virar” quando precisam estar sozinhos. Para os alunos das oficinas pedagógicas ter essa oportunidade, de aprender uma função, faz toda a diferença em suas vidas, não só do ponto de vista pedagógico, no qual os ganhos são imensuráveis, mas no sentindo de que ter uma profissão para eles é realizar um sonho, é conquistar autonomia, ainda que não estejam inseridos no mercado formal de trabalho (ver anexo 3). Categoria 2 – A percepção da deficiência 28 Nota-se a pressão que a falta de habilidade em decodificar códigos de escrita acaba por deixar os alunos muito preocupados, pois a família exerce uma grande pressão, cobrando essa habilidade em relação à situação social, de não serem vistos como pessoas produtivas ou capazes. A mãe do aluno B, mesmo sabendo que ele ainda não despertou para a alfabetização, fala que todos da família a cobram muito, pelo fato dele não saber ler, culpando-a pela falta de habilidade de seu filho: “as pessoas vê o B e olham um rapaz normal aparentemente, e acham que eu que não dou oportunidades”. Durante as observações pode-se perceber que as famílias ficavam desconfortáveis quando eram questionadas sobre a escolarização dos filhos, pois vêem essa habilidade como algo fundamental para estar inserido totalmente na sociedade e seria uma obrigação do educando primeiramente saber ler e escrever para depois começar a namorar ou trabalhar. Como fala a mãe da aluna A: “eu disse a ela que só poderia começar a namorar depois que ela estivesse lendo...” Nesse sentido, a sociedade ainda não aprendeu a respeitar a diferença, deixando-os as margens de uma convivência mais saudável, suprimindo suas habilidades para apenas ver o “defeito” que uma cultura de exclusão enraizada impõem em seus ambientes familiares e social. Tunes e Bartholo (2010, p. 84) fala dessas barreiras impostas ao deficiente, que com “o avanço da biotecnologia, pressupõem um corpo perfeito um intelecto acima da média, sem considerar as diferenças advindas de qualquer ser humano ou grupo humano, com pessoas com sua variadas formas de ser, colocando assim os valores humanos fundamentais para a aceitação, sem preconceitos, tanto da deficiência quanto do deficiente”. Segundo Vygotsky (1989 apud TUNES E BARTHOLO, 2010), a deficiência passa a ser coisificada, a pessoa passa a portar um defeito e não uma diferença inerente ao ser. As pessoas com deficiência intelectual, dentro do contexto das oficinas pedagógicas da instituição, em sua maioria sabe da importância do estudo e sabem que não se encaixam em certos padrões que vivenciam em seu grupo social. Na fala do aluno A ele nos diz que: “eu tenho que continuar estudando para ser alguém na vida”. E aluno B fala: “as pessoas riem de mim, pois eu não sei as coisas”. Como educadores devemos dar o valorreal as capacidades dos indivíduos, nem estimando ou superestimando suas potencialidades, pois suas aptidões não estão ligadas, excepcionalmente às suas barreiras. Vemos hoje na mídia reportagens de pessoas com 29 deficiência intelectual, mais comumente a síndrome de Down, que estão adquirindo uma qualidade de vida de qualquer pessoa dita normal, que terminaram a faculdade e estão trabalhando em diversas áreas do conhecimento. Reconhecidas por suas capacidades e não por suas imperfeições. A esse respeito Tunes (2010, p.53) fala que: A deficiência é uma categoria ampla de bioindentidades criadas socialmente a partir da frustração de expectativas mantidas pela afirmação de tantas, auto-realizadoras. A palavra o deficiente, identificadora de uma pessoa, em efeito social iatrogênico, instaura uma desarmonia, afirma uma patologia e solapa a autonomia pessoal. Não é uma mera nomenclatura. Trata-se de uma categoria que aglomera pessoas identificadas por um atributo que lhes falta. É o nome de uma categoria empregada como nome próprio pessoal. (...) O nome próprio não é conceitual e o que é verdadeiramente, identifica uma pessoa. A segregação desses indivíduos chega a um ponto de eles não terem voz e não decidirem mais sobre os seus desejos, suas vontades, mas elas existem a entrevista mostra quando o aluno B manifesta a vontade de querer trabalhar para ter sua casa, seu espaço. E muito tem se discutido a esse respeito, teóricos como Tunes e Bartholo (2010), Barnes (2000), Carvalho (2004) já divulgam a ideia de que os indivíduos com deficiência têm condições de ter uma vida autônoma. A educação deve dar esse apoio, preparando o indivíduo com deficiência ou não para assumir seus atos de uma vida responsável e independente. As pessoas com deficiência precisam encontrar sua forma única de realizar seus afazeres, descobrir seus projetos. Determinar a nossa maneira de ser, impor-lhes nossos padrões, nossas crenças e pensamentos é cruel, pois tira a caracterização do ser humano de determinar e modificar seus próprios conceitos. Têm várias formas de se executar uma tarefa, como arrumar uma cama, segurar o lápis, diferentes maneiras de se chegar a escola. Existem diversas maneiras de se adaptar, elas precisam descobri-las, encontrar o formato adequado, para realizar as tarefas do seu dia a dia. A escola é um lugar de apoio e acolhimento para que seja formado conceitos sólidos, para uma integridade física e mental dos seus agentes. Em uma de suas falas, o aluno B expressa sua necessidade de inserir-se na escola e nas atividades que o estaria tirando da rua ou de estar “fazendo coisas que não presta”. Existem casos dentro da instituição de alunos que se envolveram com drogas, dependência alcoólica, furto e tiveram sua integridade física posta em risco ao ser ferido com arma de fogo quando foi tentar defender um ponto de droga. Nessa direção, o Secretário Geral de Reabilitação Internacional (AMORIM E BLANCO P.03),5 afirma: 5 Texto sem data, disponível em: http://www.xbrasil.net/pdf/pp_portadores.pdf 30 A combinação de pobreza e deficiência revela uma perspectiva assustadora. Uma causa à outra, e na presença de ambas se gera uma grande capacidade de destruir a vida das pessoas, assim como impor as suas famílias uma carga muito pesada a ser levada para o resto da vida. As instituições passam a ser um ambiente a ser responsável pela integridade do educando, não somente de um espaço para adquirir conhecimento, mas de socialização e um refugio para aqueles que têm o seu direito a integração social parcialmente negado, pois há leis, existem movimentos, mas têm lacunas a serem preenchidas para que a inclusão não seja uma frustração. Categoria 3 – A inserção do aluno no mercado de trabalho Normalmente a pessoa com deficiência intelectual já frequentou instituições filantrópicas ou a escola regular de ensino, onde a partir delas conseguiram sua colocação no mercado de trabalho. A instituição filantrópica tem exercido um papel de grande importância para a preparação dessa clientela, e quanto a essa preparação Araújo e Schmidt (2006, p.4) nos fala: No Brasil, a profissionalização de PNE’s tem sido oferecida, prioritariamente, por instituições especializadas, por centros de reabilitação e por associações de pessoas deficientes. As modalidades de profissionalização oferecidas vão desde o treinamento para a colocação em emprego competitivo até o programa de emprego apoiado, passando por alternativas como o trabalho protegido (oficinas) ou programas de pré- profissionalização (SASSAKI, 1997). A literatura atual tem se mostrado favorável a programas de emprego apoiado como forma viável de inclusão de PNE’s (portadores de necessidade especial) no mercado de trabalho, apesar dessa ainda ser uma modalidade pouco difundida entre as agências profissionalizantes. E junto com o apoio das famílias, esses alunos são encaminhados para o mercado de trabalho, onde a professora orientadora busca encaixar o educando de acordo com as exigências da empresa. Esse processo não é fácil, pois a professora relata que “o perfil que a empresa procura é de um aluno com uma deficiência pouco perceptiva, que não necessite de nenhum tipo de acessibilidade e com o ensino médio ou graduação”. Ela ainda acrescenta que “as empresas costumam ser inflexíveis para a aceitação desse trabalhador” e ”outro problema é a falta de acessibilidade por parte das empresas”. Segundo Oliveira, Junior e Fernandes (2009) existe uma falta de elaboração das empresas em relação à acessibilidade, sendo esse o primeiro ponto de exclusão. Existe a falta de preparação dos empregadores para receber a pessoa com deficiência que como aponta as 31 pesquisas feitas por Nery (2002) o empregador não tem conhecimento sobre as deficiências, causando um alto índice de rejeição principalmente pela deficiência intelectual. Podemos atribuir essa situação a uma falta de apoio de políticas que obrigam a empresa a contratar o deficiente pela Lei de Cotas, mas não oferece nenhum tipo de apoio para que esse trabalhador tenha uma estrutura em seu ambiente de trabalho. Na maioria dos casos não há um acompanhamento ou cursos propondo uma discussão entre empresas e a importância da inclusão, como meio de igualdade social. Ações onde a educação faria parte nesse processo para a aquisição de uma ação social evita a marginalização das pessoas com algum tipo de deficiência e sua exclusão social. A esse respeito Carvalho (2009) nos fala que a sociedade está adquirindo a consciência sobre os mecanismos excludentes, sendo denunciadas e publicamente sendo divulgadas e condenados. Mesmo com essa nova consciência a inserção no mercado de trabalho das pessoas com deficiência ainda parece distante para muitos deles, que querem exercer sua cidadania como qualquer pessoa e ter seus direitos respeitados, ao invés da imposição de rótulos, estigmas e preconceitos que o exclui da sociedade classificando-o como “incapaz”. Outro quesito que demonstra o despreparo para a inclusão da pessoa com deficiência intelectual dentro da empresa é a exigência da escolarização, que como relata a professora “as empresas exigem alto nível de escolaridade e como nossos usuários tem em sua maioria deficiência intelectual, não consegue sucesso escolar”. As pessoas com deficiência intelectual se tiverem um apoio ou preparação, eles tornam-se aptos para exercer funções variadas. O aluno deficiente, como todo ser humano, possui natureza complexa, razão pela qualnão pode ser tomado, interpretado, a partir do núcleo primário de sua deficiência (seja física, mental ou sensorial), pois estão em jogo, não só seu comprometimento orgânico, mas sua representação, sua subjetividade, seus comportamentos, suas habilidades e seus conhecimentos já construídos e a serem construídos. E estes elementos não decorrem, mecanicamente, do tipo de deficiência. Ao contrário, são construídos socialmente. O aluno deficiente traz em si tanto a marca de seu problema quanto a do meio cultural que o constitui [...]. O organismo humano deixa de pertencer ao meio sociocultural. Assim, a consciência emerge e pela cultura (TUNES e BARTHOLO, 2010, p.71). Durante a pesquisa, os entrevistados comprovaram, através de argumentos ponderativos, que são capazes de exercerem funções como coordenação/chefia, ou caixa de mercado. No entanto sentem que as empresas o submetem a trabalhos menos complexos (serviços gerais, reposição de caixa de supermercado) por subjugarem que a pessoa com deficiência é menos capazes que as pessoas “ditas normais”. 32 Na instituição, eles tiveram a capacitação para algumas funções, porém ao chegar à empresa, eles podem ter algumas dificuldades adaptativas. Via de regra, na empresas, os alunos recebem um treinamento para exercer a função atual, mas daí em diante, não há um acompanhamento, curso ou especialização por parte da empresa. Em seus relatos, os alunos reconhecem que continuar estudando é fundamental para seu crescimento profissional. Nesse sentido, uma das falas chama a atenção: “para que eu possa mudar de função é necessário continuar estudando, mas também a empresa precisa dar mais ‘atenção’, assim sei que posso aprender”, deixando explícito, nessas linhas, o potencial e o desejo por fazer mais e exercer melhor suas funções, bastando ter oportunidades para tanto. A questão de parceria com a educação e empresas vem sendo bem divulgada em todo o âmbito mundial. Muito se avançou nas comunidades Europeias que também enfrentam problemas para que se tenha um melhor resultado da inclusão das pessoas com deficiência no âmbito do mercado de trabalho. Oliveira, Junior e Fernandes (2009) nos fala que é indispensável um novo dimensionamento das políticas públicas e educação nas empresas, o que seria um grande ganho cooperando para a inserção dessa clientela no mercado de trabalho e redimensionando as possibilidades desse trabalhador para obter sucesso em sua progressão de funções dentro da empresa. Outra mudança que é pontual é a alteração de como o Beneficio de Prestação Continuada (BPC) está sendo colocado para as famílias, que como vimos é uma necessidade latente para as camadas mais pobres da população. A fala da diretora da instituição aponta que a maior parcela de interesse em ser inserido no mercado de trabalho é dos alunos que não recebem o BPC, pois os que têm direito ficam receosos de perder uma renda que é imprescindível para se manter a si e seus familiares. Em uma das falas da mãe de A ela relata que gostaria que a filha trabalhasse, “pois seria bom para o crescimento (amadurecimento) dela, mas se não der certo ela perde o benefício”. Movimentos sociais, juntamente com a sociedade civil tem se unido para mudarem os critérios para o recebimento do BPC, propondo que ao ser inserido no mercado de trabalho, o beneficio não fosse “cortado”, mas suspenso. No caso da pessoa com deficiência ficar desempregado, o INSS automaticamente o incluiria no sistema, para que não houve percas financeiras. O que proporcionaria uma desburocratização para recebimento de tal benefício. O BPC acaba se tornando uma barreira para que a inclusão social dessas pessoas aconteça de fato. A professora que acompanha esses alunos afirma que: 33 ...vários alunos têm condições de serem inseridos no mercado de trabalho, mas recebem o BPC, então existem mais vagas no mercado que alunos para serem contratados. Em ocorrência disso, a questão da elaboração de políticas públicas voltadas a esse segmento precisa urgentemente de uma reorganização. O que se visa não é apenas o benefício que reafirma que a pessoa com deficiência seja incapaz. Mas um apoio governamental que afirme suas potencialidades, e que principalmente lhe dê condições de uma vida mais digna, mais humana. A mãe de B sugere que a escola possa estar montando uma cooperativa, ou um meio do trabalho do filho ser remunerado, reconhecendo que ele executa funções dentro da instituição como em qualquer ambiente de empresa formal. E que a “renda seria bom para ele comprar as coisas que gosta. Mas ele recebe o BPC”. Segundo as Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica (2011, p.60), para a pessoa com necessidade especial ter seu direito após o período de educação infantil com uma educação complementada e suplementada por outras atividades oferecidas na rede regular de ensino ou pela rede regular de ensino privada, deve-se: Efetivar-se nos cursos oferecidos pelas redes regulares de ensino públicas ou pela rede regular de ensino privada, por meio de adequações e apoios em relação aos programas de educação profissional e preparação para o trabalho, de forma que seja viabilizado o acesso das pessoas com necessidades educacionais especiais aos cursos de nível básico, técnico e tecnológico, bem como a transição para o mercado de trabalho. Essas adequações efetivam-se por meio de capacitação de profissionais e disponibilização de recursos pedagógicos. Nos artigos 3º e 4º, do Decreto nº. 2.208/97 consideram a inserção de indivíduos em cursos para serem preparados para o mercado de trabalho em nível fundamental, sem necessidade de ter escolaridade previa, sendo possível sua inclusão em cursos técnicos e tecnológicos. Esses cursos são ofertados pela rede publica e por programas de emprego de uma forma geral, mas o que acontece é a falta de profissionais capacitados para atender a demanda de alunos com deficiência intelectual. Deixando essa formação na maior parte dos casos às instituições filantrópicas (ARAÚJO E SCHMIDT 2006). Mas para que a instituição continue atendendo com qualidade e abrangendo um pouco mais sua capacidade em estar profissionalizando esses alunos e atendendo a demanda de tipos de profissionais diferentes do que acontece hoje, é necessário segundo a diretora e a professora que cuida da profissionalização: 34 - Reestruturar todo o atendimento da profissionalização para que a escola fosse campo de trabalho para treinamento desses alunos; - Maior investimento na capacitação de recursos humanos (profissionais que tenham cursos na área de deficiência intelectual e capacitação em áreas distintas para atender a formação em diversas áreas de trabalho: costura, reciclagem, padeiro...) - Criação de um setor para encaminhamento e acompanhamento dos alunos no mercado de trabalho, que seria também responsável por desenvolver ações voltadas às famílias no sentido de conscientizá-las quanto à importância do trabalho na vida da pessoa com deficiência. Para que o processo da inclusão da pessoa deficiente aconteça de forma efetiva, podemos destacar uma nova visão sobre educação desenvolvida nas instituições filantrópicas como a APAE, APAED e tantas outras que fazem essa ponte entre o educando e a empresa. Contudo é primordial que esse vínculo seja ainda mais estreitado, oportunizando um conhecimento maior dos empregadores sobre a deficiência desmistificando posturas enraizadas durante a história sobre a pessoa
Compartilhar