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FUNDAMENTOS SOCIOANTROPOLOGICOS DA SAÚDE

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FUNDAMENTOS SOCIOANTROPOLOGICOS DA SAÚDE
Aula 1: Introdução às Ciências Sociais: contexto histórico do surgimento
Como sabemos, a ciência (ou o pensamento científico) nada mais é que uma das maneiras de conhecermos o mundo do qual participamos. Não é a única forma de conhecer o mundo, nem a primeira. O homem sempre produziu saber sobre suas experiências. Este saber reflete crenças e valores que se tem sobre os eventos. O senso comum, a religião e a filosofia são fontes de produção de conhecimento e procuram compreender os eventos humanos (ou supra-humanos) a partir de uma lógica que lhe é própria. Cada um do seu jeito, os diversos tipos de conhecimento têm por finalidade explicar determinados conjuntos de eventos.
Mas estamos em uma Universidade. Ainda que o senso comum, a religião e a filosofia nos forneçam respostas e explicações sobre os problemas humanos, é para o conhecimento científico que devemos focalizar nossa atenção. Temos claro, entretanto, que esta é uma forma possível de conceber a realidade e que estabelece relações com as demais formas de pensamento.
 Sabemos que a lógica científica é resultado de um longo processo de transformação do pensamento humano. Baseada em metodologias específicas (científicas), e orientada por diretrizes racionais e com pretensões à universalização dos achados, a ciência objetiva superar outras formas de compreensão da realidade, investigando e construindo teorias e leis que explicam o funcionamento do mundo.
O homem e o conhecimento do homem
Podemos observar que o mundo animal apresenta regularidades. Quando atentamos para a forma de organização de um formigueiro, por exemplo, podemos ver que existem padrões de comportamentos (sociais) que se repetem e permitem o bom funcionamento do grupo.
O ser humano também é parte do reino animal e, como tal, seu mundo também deve possuir regularidades: respiramos, andamos de forma bípede, nos comunicamos com outros humanos, vivemos em grupo, dividimos o trabalho etc. Parece que estas regularidades têm como objetivo aprimorar e preservar a espécie.
Se homens e animais têm em comum um repertório de regularidades que objetivam garantir sua própria sobrevivência, por que nos tornamos tão diferentes de outras espécies? O que há de diferente em nós, ou o que nos torna diferentes de outras espécies animais?
Ora, diferentemente de outros animais, nosso arsenal genético, nossa bagagem hereditária não nos garante a sobrevivência. As formas “instintivas” dos seres humanos não são suficientes para lhes garantir a humanidade. Outras habilidades, além daquelas herdadas, têm de ser desenvolvidas. Mais do que da genética, dependemos de aprendizado.
Vimos então que, diferentemente de outras espécies animais, os seres humanos não nascem prontos; dizemos que os seres humanos nascem prematuramente, em termos de habilidades e disposição para a sobrevivência . Para sobreviver nos ambientes físicos e sociais, os indivíduos da espécie humana precisam aprender a ser humanos.
Embora algumas lendas – Rômulo e Remo, heróis míticos fundadores de Roma; Mogli etc. – falem de indivíduos que sobreviveram em condições adversas (Rômulo e Remo teriam sido, segundo a lenda, alimentados por uma loba) e se tornaram figuras especiais, sabemos da impossibilidade de tais feitos, salvo no âmbito da fantasia e da ficção.
Assim, como você viu, podemos dizer que o que distingue homem do animal é menos a organização social (que nos animais também pode estar vinculada a sexo, faixa de idade, divisão de trabalho etc.), a sociabilidade ou mesmo um pensamento ou a comunicação do que a troca de símbolos. O homem é o único capaz de criar símbolos!
Os símbolos e as culturas
“Da mesma forma que existe um pensamento e uma linguagem nos animais (isso não é mais sequer discutido hoje), existem sociedades animais e até formas de sociabilidade animal que podem ser regidas por modos de interação antagônicas ou comunitárias, bem como de modos de organização complexos (em função das faixas de idade, dos grupos sexuais, da divisão hierarquizada do trabalho etc .).
 Indo até mais adiante, existe o que hoje não se hesita mais em chamar de sociologia celular. Assim, o que distingue a sociedade humana da sociedade animal, e até da sociedade celular, não é de forma alguma a transmissão das informações, a divisão do trabalho, a especialização hierárquica das tarefas (tudo isso existe não apenas entre os animais, mas dentro de uma única célula!), e sim essa forma de comunicação propriamente cultural que se dá através da troca não mais de signos e sim de símbolos, e por elaboração das atividades rituais aferentes a estes.
Pois, pelo que se sabe, se os animais são capazes de muitas coisas, nunca se viu algum soprar as velas de seu bolo de aniversário. É a razão pela qual, se pode haver uma sociologia animal (e até, repetimo-lo, celular), a Antropologia é por sua vez especificamente humana”
O homem projeta, ordena, prevê e interpreta, vive em grupo e estabelece com o mundo relações dotadas de significado e avaliação. O conhecimento advindo desta relação (organizado, comunicado e compartilhado) transforma-se em cultura.
Você sabe por que as culturas ao redor do planeta apresentam formas tão diferentes?
• Como explicar as diferenças entre as culturas?
• Por que um grupo humano se alimenta exclusivamente de frutos e é politeísta (acredita em várias divindades), enquanto outro se alimenta de animais e é monoteísta?
• Estamos frente a diferenças de qualidade entre os diferentes grupos?
NÃO
As formas culturais diversas não são frutos de uma estrutura genética da espécie, mas da experiência particular de um grupo de homens.
“Uma vez que cada cultura tem suas próprias raízes, seus próprios significados e características, todas elas são qualitativamente comparáveis. Enquanto culturas, todas são igualmente simbólicas, fruto da capacidade criadora do homem e adaptadas a uma vida comum em determinado espaço e tempo nesse contínuo recriar, compartilhar e transmitir a experiência vivida e aprendida” (COSTA, 1997, p. 3).
“Todas as culturas apresentam padrões igualmente abstratos e significativos” (COSTA, 1977, p. 4): as culturas humanas estão diretamente relacionadas à especificidade das condições de vida de cada grupo; assim, as diferenças entre as culturas não são de qualidade nem de nível, mas estão relacionadas às condições particulares que a geraram.
"E as sociedades ágrafas , elas têm cultura? Sim! Todas as sociedades humanas produzem cultura. “A capacidade simbólica e os padrões de todas as culturas humanas são igualmente abstratos e significativos e dão respostas úteis aos problemas de compreensão do mundo” (COSTA, 1977, p. 5).
A ciência e as ciências sociais
Fruto da evolução do pensamento humano, a invenção da ciência marca a passagem de uma relação imediata com a realidade – no encontro de soluções para problemas cotidianos – para o entendimento do conhecimento como um fim em si mesmo.
 Desde a Antiguidade o homem produz saberes sobre o mundo, formulando conhecimentos sobre geometria e filosofia. Entretanto, neste momento o conhecimento ainda está vinculado a explicações religiosas ou sobrenaturais.
Com os gregos, através da filosofia, o conhecimento humano se distancia do pensamento mítico-religioso e passa a ser concebido por meio da abstração dirigida pela razão: temos aí o chamado milagre grego.
 Ao longo do tempo, temos o fortalecimento do pensamento racional, do crescimento da consciência individual e da percepção do homem como indivíduo dotado de razão e capaz de realizações próprias. Também temos expansão comercial e colonizadora que permite o contato com outras culturas, o estabelecimento da escravidão, criação de leis etc.
Com o florescer do Império Romano, permanece uma sociedade comercial e manufatureira desenvolvida pelos gregos: a razão está a serviço do homem e da sociedade.
 Queda do Império Romano: A Europa retorna a uma estrutura de sociedade agrária e teocrática: a razão e a filosofia são submetidas à teologia.
Idade Média (da quedado Império Romano, no séc. V, até a queda de Constantinopla em 1453):
- Grande poder da Igreja Católica: a razão é um instrumento auxiliar da fé; ela é usada pela Igreja como forma de manter seu poder e divulgar a fé;
- A fé passa a condicionar e explicar o comportamento do homem e da sociedade;
- O conhecimento de textos de filosofia, geometria e astronomia é propriedade exclusiva de ordens religiosas e mosteiros;
- A população laica (os não religiosos) não tem mais acesso a este saber.”
Renascimento: Movimento intelectual que no séc. XV buscou recuperar os valores e modelos da Antiguidade greco-romana, contrapondo-os à tradição medieval ou adaptando-os a ela. Renovação das artes, da arquitetura e das letras. Reorganização política e econômica da sociedade: retomada dos textos antigos e da forma “grega” de pensar.
 A partir daí, e especialmente a partir do século XVII, há um grande progresso do conhecimento científico, que objetiva descobrir as relações entre as coisas, as leis que regem o mundo natural etc.
Positivismo: primeira corrente do pensamento sociológico moderno
O positivismo foi um sistema de pensamento (filosófico) desenvolvido por Auguste Comte (1798-1857), discípulo de Saint-Simon, e continuado por diversos seguidores. Comte acreditava que, através do método característico das ciências naturais (biologia, física, química, astronomia), seria possível ordenar as ciências experimentais, considerando-as o modelo por excelência do conhecimento humano, em detrimento das especulações metafísicas ou teológicas.
 Ele pretende aplicar o mesmo rigor das ciências naturais experimentais aos eventos sociais. Considerado o fundador da sociologia, Comte nomeia a nova disciplina de física social; somente mais tarde ela seria rebatizada com o nome atual.
 Contemporaneamente, a sociologia compõe as chamadas ciências sociais, juntamente com a antropologia e a ciência política.
1-Saint-Simon (1760-1825)
2-Auguste Comte (1798-1857)
3-Karl Marx (1818-1883)
4-Max Weber (1864-1920)
5-Marcel Mauss (1872-1950)
Você viu que a preocupação das ciências sociais é explicar a estrutura e o funcionamento das sociedades. Assim, como disciplina voltada para a compreensão dos inúmeros fenômenos presentes na vida em sociedade, as ciências sociais estabelecem relações importantes com outras ciências humanas e naturais. 
Na verdade, senão a totalidade, a maioria dos fenômenos humanos é de natureza social ou, pelo menos, são direta ou indiretamente influenciados por determinantes sociais.
Como veremos ao longo de nossa disciplina, sociedade e cultura estão presentes em todos os momentos de nossa vida, e mesmo antes de nascermos. Nascemos em uma sociedade organizada de uma determinada forma, com crenças, hábitos, costumes e valores específicos. Aprendemos a entender o mundo que os rodeia a partir do que nos é disponibilizado pelos grupos dos quais fazemos parte.
 Saúde, cultura e sociedade estão intimamente relacionadas. Não podemos desconsiderar estas relações, ou não conseguiremos compreender claramente nosso universo acadêmico e profissional.
Aula 2: Principais conceitos em sociologia e antropologia 
o que caracteriza uma sociedade?
Um conjunto de indivíduos organizados. A característica de organização é fundamental para que se defina o grupo como social;
 - Conjunto ou rede de instituições sociais.
DIFERENÇA ENTRE A PRIMEIRA E SEGUNDA DEFINIÇÃO
1° DEFINIÇÃO: Diz que a sociedade é um conjunto organizado de indivíduos.
2° DEFINIÇÃO: Fala de conjunto ou rede de instituições sociais Se a primeira definição não se refere exclusivamente ao mundo humano,a segunda tem características exclusivamente humanas.
De qualquer forma, o que nos interessa no momento é pensar as sociedades humanas e a sociologia humana (poderíamos pensar em uma sociologia animal também). Então, podemos dizer que sociedade (humana) é um conjunto de indivíduos organizados em grupos, formando as instituições sociais.
 É a partir da definição de sociedade que as ciências sociais constituem seus demais conceitos. A sociologia, assim, será a ciência que estuda a estrutura das sociedades, ou dos homens organizados em grupo.
CONCEITO DE INSTITUIÇÃO SOCIAL
Trate-se de um conceito dos mais abstratos que remetem a um conjunto de valores e regras padronizados, reconhecidos e adotados por uma sociedade. Assim, a instituição social é ideia,lei, regra. E é através das organizações sociaisque as instituições sociais se expressam. 
GRUPO SOCIAL: Refere-se a um “conjunto de indivíduos que agem de maneira coordenada, autorreferida ou recíproca, isto é, numa situação na qual cada membro leva em consideração a existência dos demais membros do grupo e em que o objetivo de suas ações é, na maior parte das vezes, dirigido aos outros” (COSTA, 2005, p. 394).
 Vemos que a definição de grupo social permite pensar em outros grupos além do humano. Entretanto, a capacidade que o homem tem de ter consciência de pertencimento a um grupo faz com que se diferencie das demais espécies. Os grupos sociais são classificados em:
 Primários (família, vizinhança), onde há forte vínculo emocional;
Secundários (trabalho, exército etc.), mais formais e menos íntimos;
De referência, que servem de modelo para ações individuais.
SOCIALIZAÇÃO : Processo pelo qual o indivíduo assimila os valores, as normas e as experiências sociais de um grupo ou de uma sociedade” (COSTA, 2005, p. 405). Como um processo de aprendizagem, através da socialização, nos tornamos efetivamente humanos, à medida que aprendemos como nos relacionar com os demais membros do grupo e da sociedade.
Divide-se em socialização primária, onde a transmissão dos valores e da cultura é feita pela família; e em socialização secundária, onde a transmissão é assumida por outros grupos, como a escola e os grupos de referência.
Em antropologia, um conceito semelhante à socialização é endoculturação. Por este conceito, entende-se que o comportamento dos indivíduos depende de um processo de aprendizagem. Assim, se um menino e uma menina agem de forma distinta, isto não acontece em função de seus hormônios, mas é resultado de maneiras diversas de educação.
NORMAS SOCIAIS: “São mecanismos que asseguram a regularidade da vida social e a existência de suas instituições...” (COSTA, 2005, p. 402). As normas sociais são aprendidas (introjetadas) pelos indivíduos ao longo de seu processo de socialização. Não é possível a existência de uma sociedade sem normas sociais. A ausência de normas e regras sociais, ou o não reconhecimento delas, chama-se anomia.
Para que as normas sociais possam ser introjetadas e a socialização ocorra, é necessária certa “pressão” da sociedade sobre os indivíduos. Esta pressão é exercida por diversos dispositivos sociais e resume-se no conceito de coerção social. 
 É importante notar que a coerção social não é, a princípio, algo ruim ou negativo, como poderíamos pensar, mas a possibilidade de existência e manutenção da sociedade. Através dos vários sistemas coercitivos, a sociedade se mantém coesa, isto é, unida e funcionando adequadamente. Já pensou se cada indivíduo resolvesse fazer o que bem lhe viesse à cabeça, sem qualquer regulação ou controle externo (ou interno)?
PAPEL SOCIAL: "Conjunto de normas, direitos, deveres e expectativas que envolvem uma pessoa no desempenho de uma função junto a um grupo ou dentro de uma instituição” (COSTA, 2005, p. 403). Assim, através dos papéis sociais, que podem ser atribuídos, ou seja, designados aos indivíduos independentemente de sua escolha (filho, por exemplo) ou conquistados (escolhido ou decidido pelo indivíduo), nos localizamos e desempenhamos ações nos grupos sociais.
 Na aprendizagem e exercício dos diversos papéis sociais que desempenhamos na sociedade, vamos construindo e desenvolvendo valores. Organizando o sentido das ações humanas, os valores “são os juízos e as avaliações que os indivíduos desenvolvem por si mesmos e em grupos e que lhes permitem julgar, escolher e orientar seu comportamento. [...] Os valores sociais setraduzem na conduta humana por preferências, gostos e atitudes pelos quais os agentes sociais manifestam uma apreciação da realidade. São elementos dos mais importantes no processo de socialização pelo qual um indivíduo é assimilado a uma cultura” (COSTA, 2005, p. 407-408).
CONCEITOS DE CULTURA
É na dinâmica da vida social que vamos aprendendo a ser humanos, no sentido pleno do termo. Pelo contato com os diversos dispositivos e sistemas sociais, vamos incorporando e compreendendo o mundo. O conceito de cultura dá conta deste “conjunto de significados partilhados por um grupo” (COSTA, 2005, p. 391).
 Inicialmente concebida de forma mais concreta, cultura relaciona-se a hábitos, costumes e formas de vida que diferenciam um grupo de outro. Também pode referir-se às produções materiais como ferramentas, técnicas, alimentos etc.
Hoje, pensa-se que a cultura como “um conjunto de interpretações da realidade” (Clifford Geertz apud COSTA, 2005, p. 391). De tudo isto, devemos ter claro que a cultura é fruto do pensamento humano e que todos os grupos humanos são produtores de cultura, nenhuma sendo melhor ou superior a outra.
 O etnógrafo Edward Tylor (1832-1917) define cultura como “(...) todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade” (apud LARAIA, 2003, p. 25).
Etnocentrismo, Evolucionismo cultural (darwinismo social) e Relativismo cultural
Etnocentrismo: Quando entramos em contato com grupos ou pessoas diferentes de nós, tendemos a avaliá-los de acordo com nossa perspectiva cultural. Assim, o etnocentrismo pode ser definido como uma “visão de mundo na qual o centro de tudo é o próprio grupo a que o indivíduo pertence; tomando-o por base, são escalonados e avaliados todos os outros grupos” (SUMMER, 1906, p. 13, apud Dicionário de Ciências Sociais, 1987. p. 437). No etnocentrismo, temos a identificação pelo indivíduo com a cultura do seu grupo e a suposição de que os padrões por ele exibidos são os melhores e os mais corretos. Embora possa ser entendido com uma atitude “natural” dos sujeitos no processo de relacionamento com o outro, pelo menos em uma primeira aproximação, traz consequências negativas importantes, quando não permitem que o outro seja positivamente reconhecido. Que importância esse conceito adquire na vida real e, especialmente na área da saúde? Já pensou nas consequências de não considerar positivas as diferenças sociais e culturais? Lembra-se das definições de cultura? Existe alguma cultura superior ou mais verdadeira do que outra?
Evolucionismo cultural: O etnocentrismo tem um “primo” muito próximo: o evolucionismo cultural. Consequência de uma concepção típica do século XIX, o evolucionismo cultural, também chamado de darwinismo social, utiliza-se da lógica das ciências naturais, particularmente da biologia, para fazer entender a diversidade social e cultural. Como entender as evidentes diferenças entre sociedades e culturas espalhadas pelo mundo? Inspirado nos achados de Darwin sobre a evolução das espécies, o darwinismo social procurou compreender as diferenças sociais e culturais dos diversos grupos humanos. Mas, como afirma Costa (2005, p. 67), “A transposição de conceitos físicos e biológicos pra o estudo das sociedades e do comportamento humano promoveu desvios interpretativos graves, que acabaram por emprestar uma garantia de cientificismo a ações guiadas por preconceito e interesses particulares. Um desses desvios ocorreu com a aplicação do conceito de espécie em Darwin para o estudo das diferentes sociedades e etnias”. A lógica evolucionista (cultural) supõe que existam grupos humanos mais evoluídos, social e culturalmente, que outros, “justificando” a intervenção nas culturas e sociedades julgadas inferiores. Desde muito sabemos que não existem culturas superiores ou inferiores. Cada grupo humano apresenta padrões que lhes são próprios e que estão em função de sua história e interesses. Se os conceitos de etnocentrismo e evolucionismo cultural não permitem compreender corretamente as diferenças entre os grupos humanos, como explicar a diversidade sociocultural?
Relativismo cultural: O relativismo cultural “designa a ideia de que qualquer parte do comportamento deve ser julgada primeiramente em relação ao lugar por ela ocupado na estrutura da cultura em que ocorre e em termos do sistema de valor específico daquela cultura. Encerra, deste modo, um princípio de contextualismo” (Dicionário de Ciências Sociais, 1987, p. 1057). 
Diferentemente dos conceitos de etnocentrismo e evolucionismo cultural, a perspectiva relativista procura compreender os eventos socioculturais presentes nos diversos grupos e sociedades a partir do próprio grupo. Dito de outra maneira, um olhar relativista permite que se compreenda a realidade social de um grupo “como se fosse” alguém do próprio grupo. Ao nos colocarmos no lugar do outro, buscamos ver o mundo como o grupo vê. 
Esse descentramento que devemos fazer permite que a diferença (social, cultural, étnica, de gênero etc.) não seja valorada negativamente. Ao contrário, podemos reconhecer, apesar das diferenças, que o outro é possível e coerente, como nós.
Sendo parte das produções sociais, as ideias de saúde e doença devem ser compreendidas a partir dos significados próprios que cada grupo lhes atribui. O que isto quer dizer? Que saúde e doença não estão apenas referidas a uma dimensão orgânica ou fisiológica. Mais do que isso, estão intimamente relacionadas com a forma como os grupos humanos e a sociedade significam suas vivências.
Podemos ver com clareza que o que é considerado doença (ou sinal de saúde) em uma sociedade, pode não ser em outra. 
Uma criança gordinha pode representar, para um grupo, sinal de bons cuidados e boa nutrição, ao passo que, para outro, pode indicar descontrole ou alimentação inadequada.
Outro exemplo poderá esclarecer melhor este pensamento: até muito pouco tempo atrás, o que hoje é chamado de “síndrome de tensão pré-menstrual” (TPM) não era reconhecido como disfunção ou doença. 
As mulheres que tinham seu humor alterado no período que antecedia a menstruação eram vistas como “nervosinhas”, e suas queixas sobre sintomas somáticos e psicológicos avaliados como “frescura”. 
Em dado momento, por conta de um novo olhar sobre este evento, o que não passava de simples queixa injustificada passa a ser considerado motivo de atenção em saúde, justificando, por exemplo, dispensa médica.
Temos aqui não apenas uma questão de compreensão dos processos orgânicos, mas uma forma de significação social e cultural de um determinado fenômeno.
Apesar de se admitir hoje a TPM como um evento de saúde, ainda é considerada em diversos grupos nada mais do que “frescura”. Este raciocínio serve para praticamente todos os eventos em saúde. Pense nisso.Faça um exercício de reflexão e busque exemplos que demonstrem a relatividade da compreensão dos processos saúde-doença utilizando grupos sociais diferentes.
Natureza e cultura
Nosso estudo até agora permite que se chegue a uma importante conclusão: não existe uma oposição entre Natureza e cultura. Os determinantes orgânicos, inatos ou hereditários não são os únicos a organizar o desenvolvimento humano e os eventos de saúde e doença. As disposições fisiológicas, necessariamente, se relacionam com os elementos sociais e culturais, dando significação e sentido às experiências humanas.
Sobre uma primeira natureza – orgânica, fisiológica – o homem constrói uma segunda natureza, que é social e cultural
VOCE TEM CULTURA?
Esta pergunta, que ouvimos com frequência, subentende que existem pessoas que não têm cultura. Ou – o que é mais ou menos a mesma coisa – considera que algumas pessoas possuem conhecimentos que são reconhecidamente marcas da cultura e outras cujos conhecimentos que possuem não são considerados cultura. Temos aí uma grande confusão sobre o que é cultura.
Como vimos anteriormente, cultura é tudo que se produz socialmente, material e imaterial, frutodo exercício do convívio social e do pensamento humano. Podemos classificar as produções culturais em eruditas ou populares, por exemplo, mas isto não implica em valoração, isto é, não significa que uma seja melhor do que a outra ou que uma seja cultura e a outra não.
 Escolarização ou conhecimento acadêmico é uma forma possível de produção cultural, o que não exclui outras formas de conhecimento. Dona Maria, mesmo sem ter participado um dia sequer das aulas em uma escola, possui tanta cultura quanto um doutor com diploma universitário.
Aula 03: A saúde como fenômeno multideterminado: problematizando um conceito
“Saúde e doença não são estados ou condições estáveis, mas sim conceitos vitais, sujeitos a constante avaliação e mudança
O que significa esta afirmação?
Se saúde e doença são conceitos “sujeitos a constante avaliação e mudança”, significa que não são absolutos, isto é, que são passíveis de alterações.
E o que possibilita tais alterações?
CONCEITO
São as transformações nas condições sócio-históricas, tecnológicas, políticas, econômicas etc. que permitirão lançar novos olhares sobre questões que envolvem os processos de saúde e doença:
“... A presença ou ausência de doença é um problema pessoal e social. É pessoal, porque a capacidade individual para trabalhar, ser produtivo, amar e divertir-se está relacionada com a saúde física e mental da pessoa. É social, pois a doença de uma pessoa pode afetar outras pessoas significativas (ex.: família, amigos e colegas)”
Cada proposição (historicamente localizada) do que é saúde e doença permite a formulação de modelos explicativos e estratégias de intervenção. 
Falamos, então, de processos de significação da natureza, de funções e de estrutura do corpo e da relação homem consigo mesmo e com o ambiente.
Concepções sobre doença
Para Albuquerque e Oliveira (2002), existem duas concepções fundamentais sobre a doença e, consequentemente, a saúde: a concepção fisiológica e a ontológica.
Concepção fisiológica
Iniciada por Hipócrates, a concepção fisiológica sustenta que as doenças têm origem em um desequilíbrio entre as forças da natureza. Estas forças estão dentro e fora do indivíduo. Temos aqui uma perspectiva centrada no paciente.
Considera-se o sujeito como um todo, bem como seu ambiente. A doença é algo que fala de uma totalidade e não de particularidades, como órgãos corporais específicos.
Concepção ontológica
Diferente da concepção fisiológica, a concepção ontológica “defende que as doenças são ‘entidades’ exteriores ao organismo, que o invadem para se localizar em várias das suas partes”.
 Os significados destas “entidades” não são sempre os mesmos: poderão ser consideradas processos mágico-religiosos ou castigos divinos, ou ainda vírus.
 A concepção ontológica busca um diagnóstico preciso, relacionando órgãos corporais e agentes perturbadores.
 Para nossa discussão, é importante notar que tal concepção, embora frequentemente utilizada, é reducionista. Isto porque não considera outras dimensões presentes no processo, tais como personalidade, modo de vida, constituição física etc. Seu objetivo é identificar os órgãos perturbados.
A evolução dos conceitos de saúde e doença
Ribeiro identifica quatro períodos que permitem entender a evolução dos conceitos de saúde e doença.
• Período pré-cartesiano;
•Período científico ou biomédico; 
• Primeira revolução da saúde; 
• Segunda revolução da saúde.
• Agora veremos de forma mais aprofundada cada período
Período pré-cartesiano
Marcado pela insistência no distanciamento das práticas médicas de concepções mágico-religiosas típicas da Mesopotâmia e do Egito. 
A Grécia Antiga é o berço da ciência médica ocidental. Com Hipócrates, as lógicas do racionalismo e do naturalismo, características dos filósofos da época, são postas a serviço da compreensão dos processos de saúde e doença. Para ele, os procedimentos terapêuticos têm como objetivo os efeitos nocivos das forças naturais.
Para compreender os estados de saúde, deve-se considerar as influências do ar, da água, do ambiente e da alimentação.
Lembra-se da famosa frase “mente sã em corpo são”? 
Pois é, na verdade, não está associada a exercícios físicos ou “malhação”, mas à ideia do equilíbrio necessário entre o estilo de vida e as leis naturais. A medicina hipocrática apoia-se na concepção de que a natureza é formativa, construtiva e curativa: “O corpo humano tende a curar a si próprio”.
Assim, não fazer mal é o princípio fundamental no tratamento das doenças. Este é um dos quatro princípios fundamentais (o da não maleficência) da mais conhecida teoria bioética, chamada principialismo.
Período científico ou biomédico
Inspirado em filósofos como Galileu, Descartes, Newton, Bacon, dentre outros, apresenta uma concepção do mundo, inclusive o mundo humano, como uma máquina, funcionando mecanicamente, a partir de leis próprias da física.
Os seres vivos são constituídos e funcionam de forma semelhante às máquinas, das quais o relógio é o grande modelo: formados por peças que se encaixam e podem ser decompostas, cada uma delas com uma função própria e observável.
Para Descartes, sendo o corpo humano uma máquina, o homem doente seria um relógio avariado, assim como um homem saudável seria um relógio funcionando perfeitamente. Assim, o funcionamento dos homens é regido por uma natureza que lhe é externa. O modelo cartesiano ou mecanicista concebe o mundo como uma grande máquina ou um grande relógio.
O modelo biomédico concebe a doença, a exemplo da lógica cartesiana, como uma avaria, temporária ou permanente, de um dos componentes da “máquina”. Curar significaria consertar ou reparar esta máquina.
 Outra característica importante do modelo biomédico é a admissão de agentes específicos interferindo em partes específicas. 
Abre-se caminho, via teoria do germe, para o combate às epidemias.
Características do modelo biomédico
Para Ribeiro, o modelo biomédico permitiu grande progresso na teoria e na prática médica, apresentando três características principais:
“Tendência a reduzir os sistemas a pequenas partes, podendo cada uma delas ser considerada separadamente” (p. 4). Esta perspectiva se opõe ao caráter totalizante do modelo pré-cartesiano;
“O indivíduo, com as suas características particulares e idiossincráticas, deixou de ser o centro da atenção médica, sendo substituído pelas características universais de cada doença” (p. 4);
“Um forte materialismo substitui a tendência anterior de considerar significativos os fatores não ambientais (morais, sociais, comportamentais)” (p. 4). Trabalha-se com uma perspectiva objetiva na busca de “consertar” a “máquina defeituosa”.
Primeira revolução da saúde
É um desdobramento do modelo biomédico marcado pelo início da atenção à saúde pública.
Desde a Revolução Industrial, no século XVIII, que o mundo moderno passou por inúmeras transformações no âmbito da saúde, precipitadas por desequilíbrios ecológicos e sociais: epidemias, insalubridade, alterações no sistema de produção, êxodo do campo para as cidades.
Para Ribeiro, o modelo biomédico aplicado à saúde pública, que se estende até a década de 1970, é marcado pelo reconhecimento de que:
 
...as doenças infecciosas eram difíceis, senão impossíveis de curar e, uma vez instaladas no adulto, o seu tratamento e a sua cura eram dispendiosos;
.os indivíduos contraíam doenças infecciosas em contato com o meio ambiente físico e social que continha o agente patogênico;
.as doenças infecciosas não se contraíam, a não ser que o organismo hospedeiro fornecesse um meio favorável ao desenvolvimento do agente infeccioso”.
A evolução da compreensão dos processos saúde-doença, neste momento, permite o desenvolvimento de estratégias capazes de barrar o avanço e disseminação de agentes patogênicos.
Por exemplo, através de medidas sanitárias como esgotamento e distribuição de água potável, bem como, já em pleno século XX, na utilização de vacinas ou a utilização de antibióticos.
 Podemos ver que, aos poucos, os conceitos desaúde e doença vão se encaminhando rumo à consideração de fenômenos multicausais, isto é, deles participando uma série de agentes e determinantes.
Segunda revolução da saúde
Termo utilizado em 1979 por Julius Richmond, sublinha as mudanças necessárias para responder às novas exigências no campo da saúde.
REFLEXAO: Conforme ALBUQUERQUE; OLIVEIRA, 2002, p. 5
“Globalmente, pode afirmar-se que o desenvolvimento do modelo biomédico se centrara na doença, que a primeira revolução da saúde se centrara na prevenção da doença, e que a segunda revolução da saúde se centra na saúde”.
Primeira Revolução: acinas e antibióticos dariam conta de agentes infecciosos
Segunda Revolução: a “vacina” teria que ser a modificação de alguns comportamentos, tais como deixar de fumar, ter uma alimentação saudável, controlar o estresse, fazer atividade física, dormir adequadamente etc.
Aula 04: O conceito ampliado de saúde: a OMS e o conceito de saúde
O conceito ampliado de saúde
Ampliar o sentido dos processos de saúde e doença é passar a considerá-los algo mais complexo e diretamente relacionado a fatores sociais, políticos, econômicos, ideológicos e de representação social.
Ao fazer isso, a saúde deixa de ser compreendida a partir de uma perspectiva médica curativa, e passa a ser concebida como um processo que envolve promoção e prevenção.
 Assim, entende-se que “processo saúde-doença é um processo social caracterizado pelas relações dos homens com a natureza e com outros homens num determinado espaço geográfico e num determinado tempo histórico”
Esta “nova” compreensão de saúde está fundamentada em um modelo ampliado que, ao mesmo tempo em que orienta novos olhares sobre os fenômenos, também reorganiza ações e serviços. “A garantia à saúde transcende, portanto, a esfera das atividades clínico-assistenciais, suscitando a necessidade de um novo paradigma que dê conta da abrangência do processo saúde-doença. Nesse sentido, a promoção à saúde aglutina o consenso político em todo o mundo e em diferentes sociedades como paradigma válido e alternativo aos enormes problemas de saúde e do sistema de saúde dos países.”
A OMS e o conceito de saúde
A Organização Mundial da Saúde (OMS) foi fundada em abril de 1948, com a finalidade de desenvolver o nível de saúde da população mundial, através do planejamento e patrocínio de programas e ações em saúde. 
Hoje a OMS conta com 192 Estados membros e dois membros associados. O Brasil faz parte dos Estados membros.
A OMS DEFINE A SAUDE COMO: COMO UM ESTADO COMPLETO DE BEM ESTAR FÍSICO,MENTAL E SOCIAL, E NÃO APENAS A AUSENCIA DE ENFERMIDADE OU DOENÇA.
A definição de saúde da OMS tem sido considerada problemática por alguns pensadores, à medida que é vista como utópica. Afinal, que indivíduo ou grupo humano apresenta “completo bem-estar” físico, mental ou social? Assim, a definição apresenta a saúde como algo mais ideal do real; sua proposta é, na realidade, inatingível.
Uma posição mais favorável à definição da OMS permite tomá-la como um indicador para compreender a saúde como um fenômeno complexo que não se esgota na dimensão física ou fisiológica. 
Ao reconhecer a saúde como algo mais do que ausência de doença, a definição da OMS amplia os determinantes e, consequentemente, a responsabilidade pelo bem-estar individual e coletivo. 
A consideração da dimensão social nos estados de saúde-doença será fundamental para a compreensão de sentidos particulares e para a elaboração de políticas públicas capazes de fomentar vidas mais saudáveis..
A OMS promove uma série de encontros e discussões que têm como objetivo discutir e propor acordos e ações na área da saúde em âmbito mundial.
 Em 1978, como resultado da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, realizada em Alma-Ata, no Cazaquistão, a Declaração de Alma-Ata expressa as necessidades dos governos e das organizações que trabalham no campo da saúde que centrem seus esforços no sentido de promoção da saúde para todos os povos do mundo.
A Carta de Ottawa
Outro importante documento relacionado à ampliação do conceito de saúde é a Carta de Ottawa. 
Resultado da I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em novembro de 1986, em Ottawa, Canadá, baseia-se nos progressos das discussões de Alma-Ata.
É uma carta de intenções que tem por objetivo contribuir com as políticas de saúde desenvolvidas pelos países envolvidos na Conferência.
Na Carta de Ottawa, o ponto central é a ideia de promoção da saúde. Aqui também vemos o sentido ampliado do conceito de saúde. 
São condições e recursos para a saúde: paz, habitação, educação, alimentação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade (OPAS, 1986).
Considerando as discussões internacionais, já estamos longe de um modelo puramente organicista dos processos saúde-doença ou da concepção de saúde como ausência de enfermidade. Documentos como a Declaração de Alma-Ata e a Carta de Ottawa reorganizam a compreensão do campo da saúde, destacando a importância de outras esferas da vida.
 
No Brasil, as orientações internacionais irão se consolidar na Carta Magna de 1988. É na Constituição Federal de 1988 que o conceito de saúde expressará claramente as principais diretrizes das conferências internacionais.
A 8ª Conferência Nacional de Saúde e da Constituição Federal de 1988
O Brasil teve, ao longo de sua história, oito Constituições, sendo a primeira em 1824 e a última, em 1988. Cada um desses documentos expressa transformações e avanços na estrutura da sociedade brasileira e na consolidação da cidadania. 
Direitos civis, políticos e sociais vão, aos poucos, sendo conquistados, não sem muita luta e sacrifício. Podemos dizer que ainda estamos longe da pretendida cidadania plena. Entretanto, inegáveis mudanças podem ser observadas.
No campo da saúde, uma série de transformações vai sendo operada desde o final do século XIX e início do século XX. Assim como ocorreu em outros países, o Brasil adotou modelos de saúde semelhantes aos desenvolvidos internacionalmente. 
Embora na virada do século já houvesse alguma discussão sobre a necessidade de uma concepção mais ampliada de saúde – por exemplo, a adoção de políticas sanitárias –, a ênfase ainda recaía nas ações curativas e individualistas.
O modelo predominante de atenção à saúde é o modelo hospitalocêntrico, no qual o hospital figura como personagem principal. Este modelo, que ainda não foi totalmente superado, privilegia as ações curativas e reabilitadoras em detrimento da atenção básica, da prevenção e da promoção da saúde. 
Curiosamente, ainda que não tenhamos superado no exercício da prática esta lógica biologizante, fizemos consideráveis avanços no campo da reflexão e na definição jurídico-política.
Em 1986, em Brasília (DF), foi realizada a 8ª Conferência Nacional de Saúde. Esta Conferência foi um marco na história das conferências de saúde no Brasil, à medida que, pela primeira vez, houve participação da população. Este importante evento é o resultado de movimentos populares e de profissionais da saúde, que exigiam mudanças estruturais na concepção e gerenciamento das ações e serviços de saúde no Brasil.
Da 8ª Conferência, participaram mais de quatro mil delegados. Como consequência do chamado Movimento da Reforma, os participantes propuseram alterações nas instituições de saúde que correspondessem ao conceito ampliado de saúde, isto é, que contemplassem a promoção, a proteção e a recuperação.
O relatório final da 8ª Conferência reafirma que “em seu sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis da vida” (BRASIL, 1986, p. 4).
 
As propostas da 8ª Conferência serão consideradas pela Constituição Federal de 1988 e pelas Leis Orgânicas da Saúde,que darão sustentação ao Sistema Único da Saúde (SUS).
Aula 5: Aspectos sociológicos no mundo contemporâneo: políticas públicas em saúde
ESTILO DE VIDA
VEMOS QUE NOVO MODELO DE SAUDE INCORPORA VALORES E CONCEPÇOES PARA ALEM DE UMA PERSPECTIVA ORGANICA OU FISIOLOGICA, DA MESMA FORMA QUE NÃO SE RESTRINGE AS EVIDENCIAS DE DOENÇA OU ENFERMIDADE. FALAMOS AGORA DE ALGO MAIS ABRANGENTE, QUE PODE SER CHAMADO DE ESTILO DE VIDA.
Por este conceito, o indivíduo, o ator social, passa a ser o centro das considerações sobre a saúde, já que é o principal agente no gerenciamento das atividades sociais. 
Através de decisões individuais que afetam sua vida e sobre as quais tem algum controle, o indivíduo torna-se mais ou menos saudável.
As considerações sobre o estilo de vida são importantes na construção de respostas aos problemas que envolvem promoção, prevenção e atenção, influenciando a formulação das políticas públicas em saúde.
Políticas públicas e políticas públicas em saúde
As políticas públicas são formuladas levando em conta o interesse da coletividade. 
No caso específico das políticas públicas em saúde, a ênfase recai sobre seus principais determinantes: promoção, prevenção e recuperação.
Políticas públicas
“As políticas públicas podem ser definidas como conjuntos de disposições, medidas e procedimentos que traduzem a orientação política do Estado e regulam as atividades governamentais relacionadas às tarefas de interesse público. São também definidas como todas as ações de governo, divididas em atividades diretas de produção de serviços pelo próprio Estado e em atividades de regulação de outros agentes econômicos” (LUCCHESE, 2004).
Políticas públicas em saúde
“As políticas públicas em saúde integram o campo de ação social do Estado orientado para a melhoria das condições de saúde da população e dos ambientes natural, social e do trabalho. Sua tarefa específica em relação às outras políticas públicas da área social consiste em organizar as funções públicas governamentais para a promoção, proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e da coletividade” (LUCCHESE, 2004).
Políticas públicas de saúde no Brasil
A história das políticas públicas no Brasil permite localizar a Constituição Federal de 1988 como marco fundamental
Vimos que, na Carta Magna do nosso país, saúde é definida como “direito de todos e dever do Estado”. 
A responsabilidade do Estado pelas condições de saúde de sua população é materializada nos princípios de universalidade, equidade e integralidade.
 “As políticas públicas se materializam através da ação concreta de sujeitos sociais e de atividades institucionais que as realizam em cada contexto e condicionam seus resultados. 
Por isso, o acompanhamento dos processos pelos quais elas são implementadas, e a avaliação de seu impacto sobre a situação existente, devem ser permanentes” (LUCCHESE, 2004).
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE 
O SUS foi criado pela Constituição Federal de 1988 e implementado pela Lei Orgânica da Saúde nº 8.080/90, de 19 de setembro de 1990, e dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes.
 Além desta, a Lei nº 8.142/90, de 28 de dezembro de 1990, acresce uma característica fundamental do Sistema: a participação dos usuários (população) na gestão dos serviços, isto é, o controle social.
Três princípios organizam o SUS e têm relação direta com a compreensão ampliada de saúde, bem como com as preocupações sociais. 
São eles: universalidade, integralidade e equidade. 
Cada um destes princípios reafirma o caráter holístico, isto é, busca uma compreensão integral dos eventos e a dimensão social dos processos de saúde.
Clique na seta para conhecermos melhor estes princípios.
O SUS admite ainda diretrizes que permitem organizar e gerenciar o sistema, tais como a descentralização político-administrativa, resolutividade, direito à informação, regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde e participação da população, dentre outras.
Princípio da universalidade
O princípio da universalidade compreende a saúde como um direito de cidadania. Como vimos, a Constituição Federal define saúde como um direito de todos e um dever do Estado. 
Assim, considerando que o Estado tem o dever de prestar atendimento a toda população brasileira, este princípio garante acesso e atendimento nos serviços do SUS, independentemente de contribuição à previdência.
Princípio da integralidade
O princípio da integralidade garante o direito de atendimento de forma plena, através de um conjunto articulado e contínuo de ações preventivas e curativas, individuais e coletivas, nos três níveis de atenção ou complexidade:
 • Atenção primária ou básica, relativa à promoção e aos cuidados preventivos à saúde e agravos em doenças pré-existentes;
• Atenção secundária, voltada aos programas, sistemas e serviços de tratamento de média complexidade, como ambulatórios e consultórios;
• Atenção terciária, composta por ações de alta complexidade que objetivam reabilitar e promover a cura por meio de tratamentos, geralmente de custo mais elevado.
Princípio da equidade
O terceiro princípio do SUS é a equidade. Este é um princípio de justiça social que objetiva diminuir as desigualdades. 
Pode ser enunciado pela fórmula: tratar os iguais de forma igual e desigualmente os desiguais. 
Isto significa que, na distribuição de bens e serviços, deve-se levar em conta as necessidades, investindo mais onde a carência é maior.
SISTEMA ÚNICO DE ASSISTENCIA SOCIAL(SUAS)
O artigo 1º da LOAS diz que a assistência social é “direito do cidadão e dever do Estado, é política de seguridade social não contributiva, que prove os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas” (BRASIL, 1993).
As políticas públicas e suas consequências: os programas de saúde e de assistência social
Para concluir nossa aula, vamos enumerar alguns dos principais programas desenvolvidos na área das políticas públicas em saúde e assistência social. 
Aproveite para pesquisar e aumentar seus conhecimentos sobre estes trabalhos.	
 Programas de saúde:
- Estratégia Saúde da Família (Programa Saúde da Família – PSF)
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)
- Farmácia Popular
- Programa Nacional de Hipertensão e Diabetes
- Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) – saúde mental
 
- Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) – saúde mental
- Programa de Volta para Casa – saúde mental
- Programa de Atenção a Álcool e Outras Drogas – saúde mental
- Programa de Assistência Integral à saúde da Mulher (PAISM)
- Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa
Programas de assistência social:
 
- Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF)
- Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (crianças, adolescentes, jovens e idosos)
- Serviço de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas
- Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI)
- Serviço de Acolhimento Institucional
- Serviço de Acolhimento em República
- Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora
- Serviço de Proteção em situações de Calamidade Pública e de Emergência
Programas de assistência social:
 Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social (BPC) –  Um salário mínimo vigente ao idoso, com idade de 65 anos ou mais ou e a pessoa com deficiência ou qualquer outra situação que a impeça de participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, sem condição de garantir sua própria manutenção, nem tê-la provida por sua família.
Programas de assistência social:
 
Benefícios Eventuais – têm caráter suplementar e provisório, prestados aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.
Políticas públicas de saúde e de assistênciasocial
Se retomarmos agora o conceito de saúde considerando sua perspectiva ampliada, podemos notar que políticas, programas e ações desenvolvidas pelos setores públicos levam em conta não só os estados de disfunção física ou fisiológica, como também as variações do mundo social e psicológico.
Temos, portanto, uma conjugação de esforços entre as políticas e programas de saúde e as políticas e programas de assistência social. 
Na verdade, temos uma relação complementar e indissociável entre estas esferas, apontando para a garantia do chamado Bem-estar social ou Welfare State.
Garantido pelo Estado como agente da promoção social, defendendo e protegendo a sociedade e os cidadãos, o estado de bem-estar social assegura a todo o indivíduo o direito à educação, assistência médica gratuita, auxílio em caso de desemprego, renda mínima e recursos adicionais para a criação dos filhos.

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