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Ofício de Mestre imagens e autoimagens Petrópolis Vozes Ano 2013 Miguel Gonzalez Arroyo

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Miguel C. Arroyo
OFICIO 
DE MESTRE
IMAGENS E AUTOIMAGENS
^ EDITORA
Optei por falar de nosso ofício, de nós 
mesmos, Há uma intencionalidade 
política e pedagógica na opção por falar 
com e sobre professores (as): trazer o 
magistério para o centro do movimento 
de renovação educativa e contribuir para 
a desconstrução de um imaginário social 
que nos secundariza. Convivemos com 
imagens e autoimagens confusas de 
mestres, sempre em segundo plano, no 
distanciamento. Fora de foco.
Dialogo sobre estas inquietações que há 
tanto nos perseguem. Inquietações que 
são decisivas na vontade de construir 
outras autoimagens e imagens sociais 
do magistério e da educação básica,
Estes textos têm uma certa autonomia, 
foram escritos nas idas e voltas de tantas 
viagens de encontros com professores, 
sobretudo da escola pública. Viagens ao 
magistério.
Voltar ao magistério é voltar a um 
dos lugares que mais mexem conosco 
porque somos professores, por tantos 
anos e tantas horas diárias. É lembrar
nossa própria história. Encontrar 
companheiros (as) de tantas greves e 
mobilizações e de tantos congressos, 
seminários e conferências, de tantas 
transgressões educativas. É lembrar as 
marcas que nos deixaram e o profissional 
que nos fizemos.
Que categoria profissional nós 
construímos nesses trajetos tão recentes 
de nossa trajetória? Que traços perenes 
e novos desse ofício de mestre e dessa 
arte de tão longa história estamos 
reinventando?
Não esqueci que a infância tem sido 
nossa cúmplice ao longo da história 
da pedagogia e de nossa condição de 
pedagogos. Infância e adolescência que 
cada dia estão mais desafiadoras nas
ruas e também nas escolas. Seu rosto 
desfigurado é tão parecido com o nosso 
rosto desfigurado.
Que trajetos tão parecidos, infelizmente 
tão paralelos e ignorados! Que saberes 
e artes do ofício estamos reaprendendo 
para sermos pedagogos dessa infância 
negada e desfigurada? Viagens ao 
magistério. Diálogos continuados falando 
de nós que tantas histórias temos para 
trocar.
M iguel G. Arroy o é professor titu lar
emérito da Faculdade de Educação 
da UFMG. Foi secretário-adjunto de 
Educação da Prefeitura de Belo Horizonte, 
coordenando a elaboração e implantação 
da Escola Plural. Vem acompanhando 
propostas educativas em várias redes 
estaduais e municipais. É autor de 
diversas obras na área educacional, 
dentre as quais, pela Vozes,
"Trabalho, educação e teoria pedagógica", 
in: E ducação e crise do trabalho (1988); 
Im agens quebradas: tra je tórias e te m p o s 
d e a lu n o s e m e s tr e s (2004): Por um a 
edu cação d o cam po (2004); Currículo, 
te rr itó r io em d isp u ta (2011).
N ão sa b e r ia d iz e r s e o q u e e s c r e v i sã o r e f le x õ e s , im a g e n s 
o u r e c o r d a ç õ e s d o o f íc io d e m e s tr e . O u a p e n a s v o n ta d e s , v ia g e n s , 
s a u d a d e s e d e s e j o s , , , M as q u a is sã o a s v ia g e n s e im a g e n s d ig n a s 
d e s e r em reco rd ada s? N ã o e s t a m o s s a tu r a d o s d e im a g e n s 
d e p ro fe s so r (a )? N ã o e s t a m o s c om v o n ta d e d e e sq u e c e r ta n ta s 
im a g e n s d e m e s tr e q u e n o s p e r s e g u em ? Se t iv e rm o s o p o d e r d e 
ap agá -la s e s ta r ía m o s l iv r e s para r e c o n s tr u ir n o v a s a u to im a g e n s ?
Fazer o p e r cu r so à p r o cu ra d o o f íc io d e m e s tr e , a r t íf ic e , a r t is ta q u e 
h á em n ó s , r e a p r e n d e r s a b e r e s e a r te s , r e cu p era r a im a g em b e la 
q u e e s t a m o s c o n s t r u in d o n a s ú l t im a s d é c a d a s , é a v o n t a d e 
e o s e n t im e n t o q u e in sp ir am e s t e s t e x t o s . P r e te n d em c o n ta r para 
m im e a n ó s m e sm o s n o s s a p róp r ia h is tó r ia .
a s s o c ia ç ã o iw a si u t a d e m o t o s «re ocuAncos
D ad os In tern a c io n a is de C a ta logação n a P ub lica ção (C IP ) 
(C âm ara B ra sile ira do L ivro , SP , B rasil)
A rro y o , M ig u el G.
O fíc io de m estre : im agens e au to -im a g e n s / M ig u el G .
A rro y o . 14. ed . - P e tró p o lis , R J : V ozes, 2013 .
IS B N 978-85-326-2407-9
1. E ducação - F in a lid ad e e ob je tiv o s 2 . P rá tica de e n s in o 
3. P ro fe sso re s - F o rm a ç ã o p ro fiss io n a l I. T ítu lo .
00-3244 C D D -3 7 1 .1
ín d ic e s p a r a c a tá lo g o s is te m á t ic o :
1. E n s in o e p r o f e s s o r e s : E d u c a ç ã o 371 .1
2. P r o f e s s o r e s e n s in o : E d u c a ç ã o 3 7 1 .1
M igu e l G. A rroyo
O F ÍC IO DE M ESTRE
Im agen s e au to im agen s
© 20 0 0 , E d ito ra V o zes L tda.
R ua F re i L u ís, 100 
2 5 6 8 9 -9 0 0 P e tró p o lis , R J 
In te rn e t: h t tp ://w w w .v o z e s .c o m .b r 
B rasil
T o d o s o s d ire ito s reserv ad o s . N e n h u m a p a r te d esta o b ra p o d e rá ser 
re p ro d u z id a o u tra n sm itid a p o r q u a lq u e r fo rm a e /o u q u a isq u e r m eios 
(e le trô n ic o o u m ecân ico , in c lu in d o fo to c ó p ia e gravação) 
o u arquivada e m q u alq u er s is tem a ou b an co de d ad o s 
sem p e rm is sã o esc rita da E d ito ra .
E d ito ra ç ã o e org. li te rá r ia : R o b e r ta H . I tab a ian a A b re u 
C a p a : C lá u d io A rro y o 
Im a gen s d a capa:
I a capa: E sco la M u n ic ip a l Jo sé P in to d o s S an tos. C o ro n e l F a b ric ia n o - 
M G . F o to : M arli A p a rec id a da Silva Souza 
4a capa: P ro g ram a E sco la In te g ra d a - P re fe itu ra de B elo H o r iz o n te . 
E sco la M unicipal F ra n c isc a de P au la . F o to : L o ren o B ran d ão
IS B N 9 7 8 -8 5 -326-2407-9
Ed itado c o n fo rm e o n o v o a cordo o r tog rá fico .
E s te liv ro fo i c o m p o s to e im p r e s s o p e la E d i to r a V o z e s L td a .
“S o m en te p o d e m o s d a r o q u e j á é d o outro. 
N e s te livro e s tã o a s c o isa s q u e s e m p r e fo r a m suas
Jorge Luis Borges
“O q u e f a z a es tra d a ? É o son h o . E n q u an to a g e n te so n h a r 
a e s tra d a p e r m a n e c e rá viva . E p a r a is so q u e serve m 
o s cam inhos, p a r a n o s fa ze re m p a r e n te s d o fu tu ro ”.
M ia Couto
“E d e n o vo o a r q u e lhe f a l ta r a ta n to tem po, 
lhe en trou f r e s c o n os p u lm õ e s. 
E sen tiu q u e d e n o v o o a r lh e a bria , 
m a s com dor, um a lib erd a d e 
no p e i to ”, 
Fernando Pessoa
A m in h a m ã e c o m q u e m p r im e ir o 
a p r e n d i , e a in d a a p r e n d o , 
a s a r te s e s a b e r e s d o O f ic io .
A o L u c a , n e to - c r ia n ç a , e a o 
C lá u d io , f i l h o - a d o l e s c e n te , p e l a 
a l e g r i a q u e m e c o n ta g ia m e p o r 
l e m b r a r - m e q u e , p a r a c o n s tr u ir o 
f u tu r o , n a d a m e lh o r d o q u e 
c a m in h a r d e v o l ta a té a in fâ n c ia 
e a a d o le s c ê n c ia .
Sum ário
A presen tação ..................................................................................................................... 9
1. C onversas so b re o O fício de M e s tre ...................................................................... 17
2. C m m o d o d e s e r ........................................................................................................ 27
3. C m d ev e r-se r? .............................................................................................................37
4. A Inunana d o c ê n c ia ....................................................................................................50
5. C onteúdos d a h u m an a d o c ê n c ia .............................................................................. 68
6. Entranquilidades nos quin tais do c o n h e c im e n to ..................................................... 84
7. Parâm etros e a u sê n c ia s ............................................................................................. 94
8 . 0 :su bsolo com um de nossa d o c ê n c ia .................................................................. 110
9 . 0 ;ap»rendizado d o o f í c i o ..........................................................................................124
10. ap ren d e n d o n as tra n s g re s s õ e s .............................................................................135
11. UJma tra m a de p rá ticas ............................................................................................150
12. C om unidade d e aprendizes m ú t u o s .................................................................... 161
13. C ertezas nem tão c e rta s ..........................................................................................171
14. A& cm a de fe rra m e n ta s ..........................................................................................181
15. Culltura profissional do m a g is té r io ...................................................................... 189
16. Comsciência p o lítica e p ro fis s io n a l...................................................................... 203
17. Fernsões atrás das g r a d e s ....................................................................................... 210
18.. U im acategoria f ra g m e n ta d a .................................................................................217
19. Troocas de aprend izados do o f íc io ........................................................................ 227
20.. Rlecuperar a hum anidade ro u b a d a ........................................................................ 238
A presen ta ção
“...pois não é de todo infeliz aquele que 
p o d e contar a si mesmo a sua história ”.
Maria Zambrano
U o n fe sso q u e n ã o escrevi sobre a E sco la P lural e sobre outras p ropostas p o r te r m edo. 
A educação e sc o la r é u m cam po propício a m odas. Ped iram -m e várias vezes textos so­
bre ci clos, sobre e laboração e im plantação das p ropostas político-pedagógicas que 
acom panho. R esis ti a escrever p o r ter m edo de que v ire m ais um m odelo que hoje p ode 
esta r na m o d a e am a n h ã passará de m oda.
A prendi que trab a lh a r com a educação é tra ta r de um dos ofícios m ais perenes da 
form ação da espécie hum ana. N ossas práticas se o rien tam por saberes e artes aprend i­
das desde o berço da h is tó ria cu ltural e social. Ingenu idade m inha se acreditasse e fi­
zesse acred ita r q u e a E sco la P lu ral e ou tras p ropostas estão inventando m odas. Prefiro 
pensarrque estão apenas, e é m uito , tirando do baú dos esquecidos da h is tó ria do m a­
gistério a rte s que não d ev eríam te r sido esquecidas. A rtes de ofício. Saberes e sensib i- 
lida dees ap ren d id as e cu ltivadas. G uardadas no co tid iano , nas gavetas das salas de au la 
d e tarntos m estres de ag o ra e de outrora.
Quando fui p e rceb en d o que a E scola P lu ral e tan tas inovações que acontecem nas 
escolas e nas redes de educação recuperavam artes, saberes e fazeres m ais perenes do 
ofíc io' do m ag istério senti von tade de escrever. N ão p ara sugerir m odelos, m as para so­
cializar s ign ificados q u e percebo no m ovim ento de renovação pedagóg ica de que es­
tas prcopostas fazem parte .
Ptoderia falar deste m ovim ento a partir de vários ângulos: da renovação teórica, 
curric u la r e d idática , dos pro jetos pedagógicos das esco las ou das redes. O ptei p o r fa ­
la r desste m ovim ento e das propostas educativas do ângulo dos p ro fesso res e das pro- 
fess;or~as d a E sco la Básica. A lguém perguntará: P o r que falar com os m estres e não fa­
la r d iretam ente sob re a E scola P lural, C andanga, Sem fronteiras, C idadã, C abana... e 
tan tas: outras que d esp ertam a curiosidade dos p rofessores? A m elh o r m aneira de fa la r 
das im ovaçõesé d ia lo g a r com seus sujeitos, os m estres das escolas.
Fsalemos entre nós e troquem os tan tas h istó rias que tem os para trocar. É com pro- 
fess;ores e com p ro fesso ras que venho dia logando e s in to necessidade de con tinuar es­
ses idnálogos.
AJém do m ais, p recisam os repor os m estres no lugar de destaque que lhes cabe. 
Fui percebendo q u e e les são m an tidos em segundo p lano. A s escolas são m ais des ta- 
cadsas nas po líticas, na teo ria e até nos cursos de form ação do que os seus profissionais. 
E s te s ; aparecem com o u m apêndice, u m recurso p reparado ou despreparado , valo riza­
do ou desvalorizado . Depois q u e se decide a constru ção da escola , os currículos e seus 
parâm etros, as políticas de qualidade ou de dem ocratização da educação... pensam nos re­
cursos hum anos que darão conta da tarefa. R ecursos é pouco.
Até no im aginário social e das fam ílias, quando se pensa na educação da infância 
ou dos filh o s se p e n sa n a esco la . “ T o da c r ia n ç a na e s c o la “A e s c o la d e m eu s f i ­
lh o s “E m q u e e s c o la e s tu d a seu f ü h o ? ” Q u an d o p en sam o s na saú d e de n o sso s fi­
lh o s ou da in fân c ia , não p en sam o s n o hosp ita l, m as n o m éd ico . S aúde nos lem bra 
os m édicos. E d u cação nos le m b ra a e sco la , não seus p ro fiss io n a is , os educadores. 
E ste s não c o n se g u e m se r a re fe rê n c ia , m as a in s ti tu iç ã o esco la . A té a h is tó ria da 
ed u cação es tu d ad a p e lo s p ro fe sso re s(a s) é a h is tó r ia d a esco la , dos sis tem as de en ­
s in o , não su a h is tó r ia p ro fiss io n a l, dos seus sab e re s d e oficio . E n tre ta n to , os p ed a ­
gog o s fo ram an tes d o que a p ed ag o g ia e do que a s escolas. O m agistério é an terio r às 
institu ições de ensino.
H ouve n o im aginário sob re a educação um a despersonalização que não acontece 
em outros cam pos sociais. O im aginário sobre o m agistério tem m uito a ver com a desper­
sonalização da educação. A professora e o professor vistos apenas com o apêndices.
Em um a v isão m ais hum anista e personalizada, to d a relação educa tiva é um a rela­
ção de pessoas, de gerações. A pedagogia tem no seu cerne a figura e o papel do pedagogo, 
de alguém que aprendeu o viver hum ano, seus saberes e valores, os significados da cultu­
ra, a falar, a dom inar a fala, a razão, o ju ízo . Consequentem ente, está capacitado a form ar a 
infância, os “in-fans ” não falantes, os aprendizes de hum anos. Toda relação educativa 
será o encontro dos m estres do v iver e do ser, com o s iniciantes nas artes de viver e de ser 
gente. Os m estres no centro da pedagogia, não apêndices.
As instituições, os métodos e os conteúdos, os rituais e as norm as que são mediadores 
deste diálogo, convívio e encontro de gerações, roubaram a centralidade dos sujeitos e 
passaram a ser o centro do im aginário social sobre a educação. É necessário recuperar os 
sujeitos tão centrais nas m atrizes mais perenes da teo ria pedagógica.
Este é o foco das propostas pedagógicas que acom panho , recuperar m atrizes per­
didas, a educação com o encontro de gerações, dos pedagogos e da infância. Recuperar os 
sujeitos da ação educativa. N inguém m ais autorizado p ara nos acom panhar na história 
destas propostas pedagógicas d o que os pedagogos-docentes, seus agentes.
R ecuperarem os o direito à E ducação Básica u n iv e rsa l para além de “toda criança 
n a escola” se recuperarm os a centra lid ad e das re lações en tre educadores e educandos, 
en tre infância e pedagogos. C olocando seu ofício d e m estre no centro da reflexão teó ­
r ica e das po líticas educativas. C o locando os con teúdos e os m étodos, a gestão e a e s ­
co la com o m ed iadores desta relação pessoal e social. C om o m eios. D eixando de ver os 
p rofessores(as) com o recursos e recuperando sua co n d ição de suje itos da ação ed u ca ­
tiv a jun to com os educandos.
Por tudo isto opte i por falar de n o sso ofício, d e nós m esm os. H á um a intencionali- 
dade política e pedagógica na esco lh a dos m estres. Trazê-los ao centro do m ovim ento 
d e renovação educa tiva e con tribu ir p a ra a d esconstrução de u m im aginário socia l que
os secundariza. Im ag in ário que im pregna as po líticas de educação de currículos e até 
de form ação e “v a lo rização ” do m agistério . Im agens e au to im agens confusas de m es­
tres , sem pre em seg u n d o p lano, no d istanciam ento . F o ra de foco.
Dialogo sobre estas inqu ietações que há tanto nos perseguem . Inquietações que 
são decisivas na v o n ta d e de constru ir outras au to im agens e im agens sociais do m agis­
té rio e da E ducação Básica. H á dias em que estas im agens afloram co m todo seu peso , 
po r exem plo, o d ia do professor. U ltim am ente, os p ro fessores são no tíc ias não apenas 
no seu dia. Quase to d o d ia é d ia de p rofessor n a m íd ia , nas paralisações e nos confron ­
tos até de rua. Faz te m p o que os m estres sa íram da to ca de sua sala de au la e estão a í in ­
com odando e m ostrando quem são: professores, educadores, ou baderneiros? Q ue 
im agens eles m ostram e que im agens a sociedade vê?
Ncs co n fro n to s recentes en tre os p rofessores, governan tes e tropas de choque, nas 
avenidas e praças pau lis tanas, u m a das p rim eiras dam as com entou: “em re a lid a d e lá 
n ã o tinha p ro fesso res , s e fo s s e m ed u ca d o res n ão teria m e s te c o m p o rta m e n to
Quando l i a n o tíc ia e o com en tário acabava de ler A délia Prado. P ensei que m uitos 
profes sores devem ter sentido o que ela, com tan ta sensib ilidade poética, expressou:
“quero f ic a r surda p a ra suportar 
os que me querem humana, 
e p o r esta razão m e chamam desumana, 
granito cheio de musgo ”...
E as p ro fesso ras, tan tas que lá estavam carregando bandeiras e faixas e apanhan ­
do, nà«o se n d o reconhecidas com o educadoras podem ter tido os m esm os sentim entos 
que A délia Prado ex p ressa sobre a condição de m ulher:
“quando nasci um anjo esbelto, 
desses que tocam trombeta, anunciou: 
vai carregar bandeira.
Cargo muito p esa d o p ra mulher 
esta espécie ainda envergonhada ”.
Tenho insistido que o m érito da E sco la P lu ral tem sido sin tonizar-se com o m o v i­
m entei de renovação pedagógica e com o m ovim ento socia l e cultural. N essas fron tei­
ras esttáa categoria do m agistério desde o final dos anos 70. N ão fo ram as propostas 
inovadoras que tro u x eram os m estres ao centro d a a rena político -pedagógica . E les já 
estavam lá . N as g rev es de 79 ocuparam as ruas, as praças e escadarias dos palácios dos 
governos m ostrando seu rosto , sua identidade. A o longo destas duas décadas, docen ­
tes de Escola Básica ocuparam a m ídia, incom odaram os gestores e os governantes, e 
revela.ram a falta d e ética na condução do público, incom odaram e se afirm aram com o 
sujeitos políticos e tam bém pedagógicos. S uperaram im agens confusas e afirm aram 
autoitmagens mais nítidas.
Ernium congresso nacional de que participei em 1980, refle ti sob re a p resença da 
categoria na cena p o lític a m anifestada n as greves de 1979 e m e pergun te i pelas suas 
consequências p a ra os rum os d a educação. “ T ra b a lh a d o res e e d u c a d o re s s e id en tifi ­
cam , q u e ru m o s to m a rá a e d u ca çã o b ra s ile ira ? ” E s te fo i o títu lo da m in h a fala. Uma 
questão que tem m e persegu ido ao longo desses anos: que im agens e au to im agens de 
m estre e de seu o fíc io estão e m construção nas ú ltim as décadas?
O lhar os m estres é o m elhor cam inho para en tender a escola e o m ov im en to de re­
novação pedagógica. Para entender, tam bém , o sen tido de p ropostas com o a Escola 
Plural, E sco la C idadã, Escola D em ocrá tica , E sco laS em F ronteiras... Todas tê m tu d o a 
v er com os rum os q u e tom am a educação brasileira.
Em 1986 ded icava o livro D a e s c o la ca ren te à e s c o la p o s s ív e l1 “a o sp ro f iss io n a is 
d o ensin o que, co m su a s lu tas e s u a o rg a n iza çã o , v ã o co n q u is ta n d o c o n d iç õ e s de tra ­
b a lh o p a r a q u e a co n s tru çã o da e s c o la p o p u la r se to r n e p o s s ív e l n e s te p a ís
Nessas fronteiras e sonhos convivo co m m ilhares de professores da Escola Básica. 
F ronteiras de inovação educativa, de reiv indicações de direitos. N aquela época des­
tacav a com o aí, n e sses co n fro n to s , o s d o cen tes v ã o co n stru in d o a e sc o la possível, 
n e m sem pre a e sc o la sonhada. N estas re fle x õ es a q u i reu n id as d es tac o com o m uitos 
caem , ab an d o n a m o m ag istério , m a s m ilh a res se d e s c o b re m m e stre s do o fício pe ­
re n e de educar.
C onstroem o m estre e o oficio p o ssív e l e im possível. U m a h istó ria tensa do m agis­
tério .
No dia do p ro fesso r de 1995 reun im o-nos, em u m teatro em B elo H orizonte , para 
d ia logar sobre nosso dia, m elhor, sobre o oficio nosso de cada dia. D uran te m ais de um 
ano vínham os pensando na p lu ra lidade de práticas sign ifica tivas, inovadoras, silenci­
o sas e transgressoras que as p ro fesso ras e os p ro fesso res inventam no seu cotidiano. 
B uscam os os s ign ificados destas prá ticas, os eixos m a is expressivos e fom os am arran ­
do a Proposta po lítico -pedagógica E sco la P lural (o n o m e in icialm ente fazia referência 
à p luralidade de p rá ticas existentes n a rede m unicipal que m ostravam a em ergência de 
u m a escola m ais p lural).
Seguindo esse tra je to das p ráticas, nos encontram os com os profissionais destas 
p ráticas. N ão fom os a trás de d iagnósticos sobre g rades, currículos, cargas horárias, re­
pe tênc ia e rep ro v ação , problem as crôn icos da escola. N osso foco não era a instituição 
esco la e seus c lássico s com ponentes e problem as. S egu indo as trilhas das práticas nos 
encontram os com o suje itos dessas p rá ticas .
A P roposta E sco la Plural inicia co m u m subtítu lo : “A ssu m in d o a E sco la E m er­
g e n te H oje reconheço que deveria te r sido: “R ee n co n tra n d o e a ssu m in d o n o s so O fi­
c io d e M e s tr e ”. E m o u tu b ro d e 1995 j á era percep tível o foco verdadeiro da P ro p o sta e 
n o d ia do professor ficou m ais claro: a E sco la Plural m e x ia com tem pos e espaços, es­
tru turas, séries e rituais, m as, sobretudo, m exia conosco .
Lem bro-m e de u m depoim ento de um professor: “n ã o tenh o c la re za p a r a o n d e a 
P ro p o s ta n o s leva rá , so m en te s e i d e u m a c o is a : não d a r á m a is p a r a v o l ta r a s e r o que
1. A R R O Y O , M ig u e l (o rg .). Da escola carente à escola possível. São P a u lo : L oyola , 1986.
é ra m o s N ossa iden tidade e nossa au to im agem estavam em jogo. S em pre que m ex e ­
m os com currículos, m étodos, reg im entos, até com a parte física da escola , m exem os 
com o s educadores e as educadoras. M exem os com suas práticas e com sua au to im a­
gem, co m suas possib ilidades de ser. R ecuperam os d im ensões perd idas, ou guardadas 
no baúdos esquecidos.
À s vezes, diante d a figura do p rofessor(a), s in to-m e com o se estivesse dian te de 
u m velho e ap ag a d o re tra to de fam ília . C om o tem p o p e rd e ram -se co res e ap ag a- 
ram -se detalhes e traços. A im ag em fico u d esfig u rad a , p e rd eu a v iv e z a , o in te resse . 
M ais u m re tra to a guardar na gaveta de nossos sonhos perd idos, para revê-lo em tem ­
pos de saudade.
U m retrato n a gaveta ou na parede com o d ó i! (lem brando D rum m ond). Dói a im a­
gem d e professor que carregam os, a im agem de p ro fesso r que a m íd ia e os governantes 
projetam sobre o s m estres da E sco la B ásica. E nossa au to im agem é m enos do ída? Sa­
bem os bastante o que pensam sobre os p rofessores(as) seus governantes, as políticas 
de renovação curricu lar e as propostas dos centros de form ação e requalificação . São 
as im agens dos o u tro s , p roje tadas sobre o m agistério . E nossa au to im agem e autopro- 
jeção? C om o a ca teg o ria pensa em si m esm a? N o espelho dos outros ou no p róprio es­
pelho?
N as suas lutas e p rá ticas inovadoras, a categoria do m agistério básico vem cons­
tru indo outras im agens nítidas, destacadas. C om traços incôm odos q u e não coincidem 
co m as velhas im agens sobre ela p ro jetadas ao longo dos anos. A s propostas p edagóg i­
cas com o a E sco la P lu ral trazem de volta, sem saudosism o, esse re tra to vivo de cada 
m estre e da categoria p a ra recuperá-lo na m em ória e nas práticas. P ara recuperar tra ­
ços perdidos e rev iv ê -lo s nas lum inosidades do presente . E stes tex tos falam dessas 
im agens e au toim agens.
N aquele dia do professor, d ia logam os sobre essas im agens que doem quando 
com partilhadas. F om os descobrindo que é d ifícil iden tificar nosso ofíc io de m estres 
com u m a im agem única, que som os m últip los, p lu rais. Q ue o que sabem os fazer e te ­
m os d e fazer no co tid iano convívio com a in fância, ado lescência e ju v e n tu d e não cabe 
e m im agens sim plificadas, nem em u m único conceito , p rofessor, docen te , m estre , al- 
fabetizador, supervisor, orientador. C arregam os todos um a h istó ria fe ita de traços co­
muns ao m esm o ofício .
O diá logo daq u ele d ia sobre nosso ofício de m estre deu origem a outros diá logos, 
outros pensam entos com partidos que fazem parte deste livro , in titu lado O fíc io d e m es­
tre . A fa la daquele d ia do professor inspirou o títu lo destes textos.
E les re fle tem o m om ento tenso que estam os v ivenciando de dúv idas m ais d o que 
certezas. N ã o pretendem acabar com as dúvidas nem trazer certezas. O m om ento é pe ­
culiarm ente rico para d iscu tir e p ara livrar-nos de im agens pesadas do m agistério por­
que h á m uitas dúv idas sobre elas. Ir atrás de certezas m ataria a riqueza pedagóg ica do 
m om ento . Não tiv e com o horizonte dar um a de m estre que tira as respostas verdadei­
ra s do b aú de sua sabedoria. Tenho m ais dúvidas do que certezas, m e deixo contam inar 
pelo m om ento q u e vivo. Estou m ais preocupado em en tender o p ercu rso coletivo. O u­
tras formas de p e n sa r nosso oficio, de en co n tra r seu sen tido e de inven tar p ráticas, sa­
b er es e valores.
Procuro não tra ta r as incertezas que observo com o perguntas a responder. Não 
existem respostas a dar, porque em realidade não são perguntas, m as o que está em 
jo g o são se n tim en to s e v iv ên cias e x is te n c ia is , sen tidos. N ão fa lo em p ro b le m a s da 
esco la nem dos seu s m estres , p o rq u e s ig n ific a ria d e sp e r ta r a esp era de soluções. 
T ra ta r em q u a lq u e r lóg ica fech ad a o m o m en to v iv id o p e la ca te g o ria se rá m atar 
su a s v irtu a lid ad es p ed ag ó g icas . C o m o ex p lo rá -las? R e c o n h e cen d o a seried ad e das 
in q u ie taçõ es e in c e rte z a s e o que e las re v e la m de lib e rtaç ão de im ag en s d e m ag isté ­
rio co isificad as, im postas. D esconstru í-las será um alív io penoso, m as alív io . Já é 
m uito nos sen tir um pouco aliv iados.
Em realidade, estes tex to s têm u m a certa au tonom ia, foram escritos nas idas e vol­
tas de tantas v iagens de encontros co m professores sobretudo da escola pública. Via­
g en s ao m agistério .
R evisitar o m ag istério é com o rev is ita r nosso sítio, nosso lugar ou no ssa cidade. É 
rev iver lem branças, reencontros com nosso percurso p rofissional e hum ano. Reen­
contrar-nos sobretudo com tantos ou tros e outras que fize ram e fazem percursos tão 
idênticos. O m agistério é um a referência onde se cruzam m uitas h istó rias de vidas tão 
d iversas e tão próxim as. Um espaço de m últip las expressões. U sam os en tre nós o ter­
m o categoria, m agistério , a categoria do m agistério , a ca teg o ria em greve, a categoria 
injustiçada. Som os u m coletivo. H á u m a im ag em de co letivo na representação social e 
n a nossa representação.
Q uando rev isitam os n o sso lugar, nossa cidade, m atam os saudades e encontram os 
surpresas. C ada v iz inho nos conta u m a h is tó ria do lugar. N ão podem os acreditar em 
tu d o , m as nos faz b e m ouvi-las. R eacendem nossa m em ória e nossa identidade. Som os 
o lugar onde nos fizem os, as pessoas com quem convivem os. Som os a h istó ria de que 
participam os. A m em ó ria coletiva que carregam os.
Voltar ao m agistério é voltar a u m dos lugares que m ais m exem conosco porque 
som os professores, p o r tantos anos e tantas horas diárias. “R eso lv í s e r p ro fesso ra co m 15 
anos. N ova dem ais. B r ig a s e nam oros com o m agistério . E a í estou a té hoje... ” Voltar ao 
magistério é lem brar nossa própria história. Encontrar com panheiros(as) de tantas greves 
e m obilizações e de tantos congressos, sem inários e conferências e lem brar as m arcas que 
nos deixaram e o profissional que nos fizem os. R eencontrar colegas de escola , de área, de 
red e , é lem brar p ro jetos, inovações e transgressões pedagógicas onde re inven tam os o 
sentido para o co tid iano de nosso o fíc io tão sem sentido.
C ada um destes tex to s foi uma v is ita ao m agistério com o nosso lugar, nas praças, 
ruas ou becos onde o v ivem os, onde tem o s histórias a co n tar e m arcas de nossa iden ti­
d ad e a descobrir. Q ue categoria profissional nós constru ím os nesses trajetos tão recen ­
te s de nossa tra jetó ria?
M ais do que respostas a esta pergun ta , que é de c ad a um de nós e da categoria, 
trouxe as m inhas im pressões o u os m eus sonhos e desejos. T rouxe traços de um m ag is ­
té rio real, sem nom e, em constm ção, possível...
O que m ais m e in terroga são as im agens de m estre, docente, educador, p ro fessor 
ou p rofessora que estam os desconstru indo e constm indo . Q uais são os traços perenes 
e novos d esse ofício e dessa arte de tão longa h istó ria?
M anifeste i o tem p o todo m inha curiosidade pela h istó ria em que estam os envolv i­
dos, pelos convívios sociais e cultu rais, p elos em bates e lutas que nos m arcam , que nos 
oferecem os m ateria is , as cores com que vam os re inven tando nosso ofício de m estre. 
A s transgressões po líticas. C om o esquecer tantas paralisações? E as inovações p ed a ­
gógicas, a s reform as curricu lares, as políticas oficiais, a produção teórica , as p ropos­
tas po lítico -pedagógicas, a o rganização da escola em ciclos de form ação... Explorei 
um pouco essas fren tes onde nos fazem os.
A pontei de m an e ira d ispersa, m as enfática, que o m estre que som os, o pedago- 
go-educador que a flo ra em nós, refle te o rosto , o percu rso ou sem -percurso da infância 
que acom panham os. N ão esquecique a infância tem sido nossa cúm plice ao longo da 
h is to riad a pedagogia e de nossa cond ição de pedagogos. U m a frase apenas de efeito?
Escrevo esta ap resen tação no d ia 13 de junho . O jo rn a l do d iad estaca : “C ria n ç a e 
a d o le sc e n te : d ez a n o s d e e s ta tu to ”. N o rádio e na TV, com entários de juristas, de as­
sistentes sociais, de psicó logos e po líticos sobre o “E sta tu to da C r ia n ça e d o A d o le s ­
c e n te ” . E n ó s , ed u cad o res p ed ag o g o s , o que tem o s a d ize r? N in g u ém nos p e d e o p i­
n ião? Q ual a nossa opin ião se com eles convivem os todo dia, se som os seus pedago ­
gos? Um j o m al m e cham ou hoj e p a ra com pletar um a m atéria . F iquei aliv iado e pensei: 
será sobre o Esta tu to? Sobre seus dez anos? Nada. E ra sobre a reação do m agistério pau ­
lista à progressão con tinuada e a não reprovação dentro dos ciclos, ou am ontoados de 
séries da Sees-SP.
Si nceram ente , m e senti fm strado , não tem os nada a ver, nem a d ize r sobre a tra je ­
tó ria dos d ireitos da in fância e da adolescência? N o ssa tra jetó ria de pedagogos não é 
sua tra je tó ria? P or que apenas nos veem com o docentes que ensinam , aprovam -repro- 
v am e não sabem ensinar sem reprovar? Q ue im agens a sociedade tem de nós? D e nos­
so ofíc io? C oincidem tão certinho co m nossas au to im agens ou estam os lu tando por 
construir outras?
C hego a p ensar que só reconstru irem os nossa im agem de p edagogos n a m edida 
em qu en o s reencon trem os com a infância que nos dá sentido. In fância e adolescência 
que cada d ia estão m ais desafiadoras nas m as e tam bém nas escolas. Seu rosto desfigu­
rado é tão parecido com o nosso rosto desfigurado. D ez anos de ten tativas de recons- 
truí-loi, de p ressões p ara afirm ar-se su jeitos de direitos. Q ue trajetos tão parecidos, in- 
felizrmente tão paralelos e ignorados.
N ão saberia d ize r se o que escrev i são reflexões, im agens ou recordações do ofíc io 
de me-stre. O u apenas vontades, v iagens, saudades e desejos... M as quais são a s v ia ­
g en s e im agens d ig n as de serem recordadas? N ão estam os saturados de im agens de 
professsor(a)? N ão estam os com v on tade de esquecer tan tas im agens de m estre que nos 
perseguem ? Se tiv ésse m o s o p o d er de apagá-las es ta ríam o s livres p a ra reco n stru ir­
m o s movas au to im agens?
Fazer o p ercu rso à p rocura do o fíc io de m estre , artífice, artista que há em nós, rea ­
prender saberes e artes, recuperar a im ag em bela q u e estam os constru indo n as últim as 
décadas. E a von tade e o sentim ento que insp iram estes textos. C ontar para m im , e a 
nós m esm os nossa p rópria história.
Peguei em prestada a epígrafe de Jorge L arosa: “p o is n ã o é d e to d o in fe liz a q u ele 
q u e p o d e c o n ta r a s i m esm o a sua h is tó r ia Não serem o s de todo infelizes, podem os 
contar a nós m esm os a n o ssa história de m estres.
A inda pego em prestada outra ep íg ra fe em q u e Jorge faz referênc ia a u m p e n sa ­
m ento de Sam uel B eckett: “Sim, em m inh a vida... h o u v e três co isa s: a im p o ssib ilid a d e 
d e fa la r, a im p o ss ib ilid a d e d e c a la r e a so lid ã o
1
C onversa s sob re o O fíc io de M estre
“Não m e arrependo do que fu i outrora, 
Porque ainda o sou
Fernando Pessoa
‘‘N o ssa M e m ó r ia A ssim destacava um cartaz n a en trada da escola. F izeram um a 
b ela exposição. A lu n o s, p ro fessores e a com unidade observando tudo. E u tam b ém ob­
servava curioso ve lh as fotos da v id a escolar, de seus m estres e alunos. A ordem d a ex­
posição seguia a linha do tem po. As fotos de inauguração da escola e de várias festas e 
form aturas, das p assadas e das m ais recentes. A criançada ten tando identificar-se, 
‘‘o lha o u n iform e e o c a b e lo ! Q ue a n tiq u a d o s! ” E m outro canto um grupo de p ro fesso ­
ras fazia seus com entários: “p a s sa m o s a n o s e co n tin u a m o s tã o ig u a is ! ” “É, m a s um 
p o u c o m ais m o d e rn in h a s ”, com entou um a professora.
Nos alunos a surpresa alegre de serem outros. N os m estres a surpresa inconfo rm a­
da de q u e não deixam os de ser os m estres que outros foram .
Para as p ro fesso ras aquelas fotos eram m ais do que a m em ória d a escola , eram sua 
M em ória. D escobriam -se tão iguais no passado! N o silêncio de seus olhares, um a v ia­
gem de v o lta a u m p resen te incôm odo redescoberto na “M em ória” .
Não há co m o o lhar-nos sem en tender que o que p rocuram os afirm ar no presente 
são traços de um passado que m udou m enos do que im aginávam os. O reencon tro com 
“N ossa m em ória” nos leva ao reencontro com um a h is tó ria que pensávam os (ou d ese ­
javam os) não m ais existir. “C o n tin u a m o s tão ig u a is ” que poderiam os estar nas fotos 
no lugar dos m estres de outras décadas. Param os no tem po? A penas “um p o u c o m ais 
m od ern in ho s? ”
E stam os atrás de nossa identidade de m estres. O que não m udou, ta lvez, possa ser 
um cam inho tão fecundo para en tender-nos um pouco m ais, do que estar à cata d o que 
mudou, dos m oderninhos que agora som os. M as p o r que continuam os tão iguais os 
m estres de o u tro ra e de agora? P orque repetim os traços do m esm o ofic io , com o todo 
artífice e todo m estre repetem hábitos e traços, saberes e fazeres de su a m aestria . N os­
so oficio carrega um a longa m em ória.
G uardam os em n ó s o m estre que tan tos foram . P odem os m odem izá-lo , m as nunca 
deixam os d e sê-lo. P a ra reencontrá-lo , lem brar é preciso .
O s segredos e a s artes d e o fíc io
Escolhí in tencionalm ente o te rm o “ofício de m e s tre ” po rque nos rem ete a nossa 
m em ória. A lguns se estranharão com um a palavra n ã o tão fam iliar - u sar o term o ofí- 
eio não se con trapõe ao m ovim ento d a categoria p a ra a firm ar seu faze r qualificado e 
profissional? P retendo afirm ar essa d im ensão re tom ando a palav ra o fic io que incorpo­
ra esse m ovim ento .
O termo oficio rem ete a artífice, rem ete a um fazer qualificado, profissional. Os ofícios 
se referem a um co letivo de trabalhadores qualificados, os m estres de um oficio que só 
eles sabem fazer, qu e lhes pertence, p o rque aprenderam seus segredos, seus saberes e 
suas artes. U m a identidade respeitada, reconhecida socia lm en te , de traços bem defini­
dos. Os m estres de ofício carregavam o orgulho de sua m aestria. Inquietações e vontades 
tão parecidas, tão m an ifes tas no con jun to de lutas d a categoria docente.
N o auge de u m a greve e nos m ú ltip los congressos e sem inários que acom panho 
afloram saberes e segredos aprendidos. A flora o orgulho de ser p rofessor, conquistado 
nas lutas p ara ser soc ia lm en te reconhecido. Quando te rm in a um a m obilização d a cate­
goria, não fica apenas a ressaca de re iv ind icações n ã o atendidas. F icam autoim agens 
reconstruídas. Os desejos agora são recordações. O m e sm o sin to quando nos despedi­
m os depois de alguns dias de congresso e encontro. F ic a m ais do que b o as falas, anota­
ções de rela tos de experiências. F icam os nós m ais convencidos, até orgulhosos d e nos­
sa identidade coletiva. Os desejos ag o ra são au to im agens.
C ontinua, ainda, a pergunta? P or que falar em o fíc io de m estre? Tenho ainda outro 
m otivo. O term o o ficio não nos rem ete a um passado artesanal? Possivelm ente seja a 
hipótese que costu ra estas reflexões: h á constantes n o fazer educativo que não foram 
superadas, m as an tes incorporadas, m an tidas pe la m o d ern a concepção da p rática edu­
cativa. E m ais, o p en sar e fazer educativos m odernos têm com o referênc ia qualidades 
que vêm de longe e p e rd u ram no trato da educação e soc ia lização das novas gerações. 
A educação que acon tece nas escolas tem , ainda, m u ito de artesanal. S eus m estres têm 
que ser artesãos, artífices, artistas p a ra dar conta do m ag isté rio .
O saber-fazer, as artes d o s m estres da educação d o passado deixaram suas m arcas 
na prática dos educadores e das educadoras de nossos dias. E sse saber-fazer e suas d i­
m ensões ou traços m ais perm anentes sobrevivem em todos nós. O conv iver de gera ­
ções, o saber acom panhar e conduzir a in fância em seu s processos de socialização , fo r­
m ação e aprend izagem , a períc ia dos m estres não são coisas do passado descartadas 
pela tecnologia , p e lo livro didático, p e la inform ática o u p e la adm inistração de q u a li­
dade total. A períc ia dessas artes p o d eria te r sido substitu ída p o r técnicas, entretanto 
nem os tem pos da v isão m ais tecnicista conseguiram a p a g a r estas artes, nem os novos 
tem pos das novas tecn o lo g ias, da TV, d a inform ática ap licad o s à educação co n seg u i­
rão prescindir da p e ríc ia dos m estres. E ducar inco rpora as m arcas de u m ofício e de 
um a arte, aprendida no d iá logo de gerações. O m ag istério inco rpora p eríc ia e saberes 
aprendidos pela espécie hum ana ao longo de sua form ação.
M uitos saberes de m uitos ofícios foram destru ídos pe la industrialização , pelo 
avanço das m áquinas, d a tecnologia , d a incorporação do saber operário e do seu con ­
tro le . Processos te n so s de elim inação dos ofícios e dos artífices... P rocessos h istóricos 
d e expropriação d o saber operário. M as fo i e lim inado m esm o o saber dos traba lhado ­
res ou h o u v e resistências e reapropriações? E sse saber coletivo se a firm ou com o um 
sab e r de classe e d e categorias. Os traba lhadores constru íram nesses em bates um saber 
p róprio . S abem m ais, constru íram sua n ova identidade e seu novo orgulho. N o cam po 
d a educação, da so c ia lização , do desenvo lv im ento e form ação hum ana esses p roces­
sos seguiram o m esm o cam inho? E sta é a questão que nos persegue. O que ficou em 
nós do velho ofício do m agistério?
E scolher o te rm o “ oficio de m estre” sugere que apostam os em que a ca tegoria 
m an tém e reproduz a heran ça de u m sab er específico. Sem deixar de reconhecer p re s ­
sões, em bates nessa d ireção e tam bém resistências às ten tativas de adm in istração ge­
rencial, de expropriação do saber p ro fiss io n a l dos p ro fesso res através da organização 
p a rce la r do trabalho. C om o ignorar esses em bates no cam po da educação? C om o não 
p e rceb er que o saber-fazer de m estre teve alterações p ro fu n d as com as tentativas d e in ­
corporação desses processos “rac iona is” na gestão dos sistem as de ensino , n a organi­
zação e divisão d o trabalho?
U m o lhar apenas centrado na h is tó ria das políticas, das norm as e dos reg im entos, 
d a div isão g radeada e d isc ip linar d o currícu lo e do trabalho , da incorporação dos espe- 
c ia listas, da separação en tre os que decidem , os que pensam e os que fazem , nos lev ará 
fácil e p recip itadam en te a conclu ir pela elim inação de qualquer das trad icionais di­
m ensões e traços do o fic io de m estre. M as cabem ou tros olhares que p re tendam ser 
m ais totalizantes p a ra p erceber que os traços m ais defin idores de toda ação educativa 
resistiram e perduram . H á um a resisten te cu ltura docente.
O traba lh o e a relação educativa que se dá na sala de au la e no conv ív io en tre edu- 
cadores(as)/e-ducandos(as) traz ainda as m arcas da especific idade d a ação educativa. 
A esco la e outros espaços educativos ainda dependem dessa qualidade. A s ten tativas 
de racionalização em presarial não conseguiram to m ar essa qualificação dispensável. 
A lém d o m ais. p a ra q u e substitu ir u m a escola centrada nas relações in terpessoais e em 
processos e saberes artesanais, por u m a esco la cen trada n a racionalidade em presarial, 
n a desqualificação do trabalho , se o trab a lh o qualificado dos m estres é tão barato?
C onversar sobre o ofíc io de m estre tem ainda outra m otivação: é entre nós e sobre 
nós que conversam os em tantos encon tros, congressos e conferências, em tantas te n ta ­
tiv as co letivas d e constm ir a escola e de nos constru irm os com o profissionais. P o r 
to d o lado e a qualquer pretex to , se inven tam encontros, m ais da categoria do que o fic i­
ais. E ncon tros onde o o lh a r é sobre a p rática, o fazer e p en sar educativo , sobre os p ro je ­
tos de escola, sobre as áreas do conhecim ento, sobre as condições de trabalho, salariais, 
de carreira , d«e estab ilidade. Sobre nossa condição e iden tidade coletiva. Q uanto m ais 
nos aproxim am os do co tid iano esco lar m ais nos convencem os de que ainda a e sco la 
g ira em to rn o dos professores, de seu ofício, de sua qualificação e profissionalism o. 
S ão eles e elas q u e a fazem e reinventam .
Um o fíc io d esca rtáve l?
Tem os um a h istó ria e um a m em ória . D om inam os segredos e artes de um ofício. 
D e um ofício descartável? O s apelos tão n a m oda de todos os lados, dos in teresses neo- 
liberais e tam bém dos progressistas de p re tender co lo ca r no cem e da ação educativa 
escolar a com unidade, as fam ílias e as o rgan izações sociais, a sociedade d ifusa dos 
em presários, a m íd ia e os am igos d a escola, co rrem o perigo de descaracterizar esse 
núcleo constitu tivo de toda ação educativa . C orrem o perigo de tirar o foco da d im en ­
são pessoal, do d iá logo e convívio d e g e raçõ es, do saber-fazer, das artes d o s p ro fesso ­
res. Esse núcleo da ação educativa acon tece n o s tem pos e espaços de convívio p ed ag ó ­
gico. N ão se dará ou m u d ará apenas porque a com unidade seja m obilizada para d eb a ­
te r a gestão escolar.
N ão podem os co n fu n d ir e substitu ir a gestão p a rtic ip a tiv a pelo cem e da relação 
educativa. A m ob ilização e participação das com unidades e das fam ílias p o d e ría se r 
eq u ac io n ad a n a s d im e n sõ e s so c ia lizad o ras, e d u ca tiv a s que sem d ú v id a tê m . P o d e ­
r ía ser u m a o p o rtu n id ad e p a ra que o s ed u can d o s e ed u c a d o re s p e rc e b e sse m as p ro ­
x im id ad es en tre os e sp a ç o s fam iliares , co m u n itá rio s e e sco la res , en tre o s sab e re s 
do cu rrícu lo e o s sab eres sociais. P o d e ría s e r um a o p o rtu n id ad e p a ra q u e a e sco la 
se ab ra à cu ltu ra , à m e m ó ria co le tiv a e à d in â m ic a social. C ien tes , p o rém , de que 
av an ç a r n as fo rm as de p a rtic ip a ção da c o m u n id a d e e sc o la r e da so c ied ad e n ã o su ­
p r irá n u n ca o o f íc io dos m estres, a ss im co m o a v a n ç a r na g estão p a rtic ip a tiv a dos 
cen tro s de saúde n ão p o d e rá d ispensar n u n ca o trab a lh o artesanal e p ro fissional dos 
profissionais da saúde.
Q uando se buscam rendim entos po líticos a curto prazo é ten tadora a m ob ilização 
em tom o dos d ire itos socia is , saúde, ed u cação , m oradia, etc. São eles o centro das lu ­
tas e anseios populares. P orém nem sem pre e ssa m obilização ten tadora tem significa­
do avanço na efetivação desses direitos.
Investir na garan tia desses d ireitos, n o trabalho d o s seus profissionais, n a qualifi­
cação dos tem pos e espaços de sua ação e da m ateria lidade e das cond ições de in ter­
venção é m ais caro , m ais lento, e p o litic am en te m enos m anipu láve l e ren táveldo que 
cam panhas e m obilizações para angariar am igos da esco la . A h istó ria m ostra que tem 
sido pelo investim ento nos profissionais e nas cond ições para desenvo lverem seu ofí­
cio com profissionalism o q u e a garan tia dos direitos so c ia is tem avançado em todas as 
áreas. Já desde a G récia se criou u m a figura esp ec ia lizad a em conduzir a in fânc ia , o 
pedagogo. C om o se criou u m especialista nas artes d a saúde. F iguras que aprenderam 
a agir com m aestria e ética. Q uando os d ire ito s sociais são usados p a ra rend im entos 
políticos, eles regridem , e os profissionais reagem p o r descobrirem -se usados. É fácil 
perceber essa reação das categorias p ro fiss ionais a essas flu idas m obilizações de m ui­
tas adm in istrações, de cores políticas d iversas.
A categoria de profissionais da educação percebe que é atacada de vários lados: do 
lado das gestões tecnocráticas, “m o d em izan tes” , que consideram a educação centrada 
no seu ofício qualificado com o um lastro de tem pos p ré -in d u stria is e jo g a ra m a escola 
para um a com unidade d ifusa , am orfa. M as tam bém o ataque vem do lado d as gestões
p rogressistas, que abrem tanto a responsab ilidade socia l e com unitária do tra to da edu ­
cação esco lar que, se n ão d ispensam , ao m enos descaracterizam a cen tralidade da ação 
qualificada dos p ro fiss io n a is. “M o b iliza r a co m u n id a d e é a so lu ç ã o ”, defend ia u m se­
cretário de educação pergun tado pelas saídas para a crise da esco la pública. Será? No 
dizer de um conceituado e com prom etido p rofissional d a saúde pública, a educação 
está passando pelos m esm o s riscos d e descaracterização p o r que passou a saúde p ú b li­
ca na d écad a de 80. A flu idez de seu trato , sobretudo quando se pensa na educação e na 
saúde pública, p o d e a tra sa r a construção de sistem as púb licos, ún ica garan tia de d ire i­
tos.
D iante dessas am eaças a ca tegoria de trabalhadores em educação se vo lta sobre 
ela m esm a e tenta defender e reafirm ar a especialidade de sua ação, de seu ofício , de 
seu saber-fazer, sab er p lanejar, in tervir, educar. É oportuno falar-nos sobre nosso ofí­
cio. P odem os p e rceb er um m ovim ento de retom ada da especific idade da ação p ro fis ­
sional am eaçada de v ário s lados. É cu rioso perceber que, quando os p róprios p rofesso ­
res levantaram a b an d e ira da gestão dem ocrática, s ign ificou u m m ovim ento de afirm a­
ção d a categoria fren te a invasão da escola pelos governos e pelos partidos, pelas bar­
ganhas políticas. O alargam ento da gestão no sentido de inclusão da com unidade, das 
fam ílias e d a sociedade am pla e d ifusa na adm inistração escolar é outra bandeira , ve­
nha d e onde vier, que am eaça a cen tralidade da categoria e do peso das decisões co le ti­
vas de m estres d as a rtes de ensinar e de educar.
N ão temos d ú v id a que a garantia dos direitos sociais som ente acon tecerá na afir­
m ação d e uma c u ltu ra pública, no reconhecim ento social, coletivo desses d ireitos, no 
com prom etim ento d a sociedade. Sabem os que a educação enquanto d ireito é u m a em ­
preitada tão séria que não poderá f ica r apenas po r co n ta dos seus profissionais, mas 
tam bém n ão aconteceria sem eles, sem sua períc ia , seu traba lho qualificado . Seu p la ­
nejam ento e ação com petentes são insubstitu íveis. Seu o fício não é descartável.
A esp ec ific idade d o sab er -fa zer edu ca tivo
U so o term o “o fíc io de m estre” ten tando aproxim ar-m e destes p rocessos que me 
parecem extrem am ente significativos p ara a construção socia l do m agistério básico. 
R ecuperando esse te rm o , quero destacar que está em jo g o a defesa do seu antigo signi­
ficado, que vê n o pedagogo , no educador ou no m estre u m hom em , u m a m u lh er que 
tem u m ofício, q u e d o m in a um sab er específico . Ter u m o fício sign ificava orgulho, sa­
tisfação pessoal, afirm ação e d efesa de um a identidade indiv idual e coletiva. D e um a 
identidade social do cam po de sua ação.
D ialogar sobre o ofíc io de m estre é ten tar in terp retar a h istó ria m ais recente . Du­
rante as ú ltim as décadas podem os acom panhar u m m ovim ento de afirm ação p rofis ­
sional dos p ro fesso res que vêm se reconhecendo e ex ig indo ser reconhecidos com o 
categoria , c om su a especific idade h is tó rica , social e política. Q ue vêm afirm ando e de­
fendendo sua iden tidade . U m m om ento fo rte a c o n te c e u n o f in a l da d é c a d a de se te n ­
ta e s e in te n s if ic o u n a d écad a de 1980 , o cen tro fo i a d efesa de sua identidade com o 
trabalhadores e m educação . N a década de 1990, este m ovim ento passa p e la defesa da
especificidade de seu saber e fazer, o que vem re fo rça r a defesa da identidade da cate ­
goria com o trabalhadores em educação. E sta iden tidade foi afirm ada fren te ao Estado 
em pregador que os descaracteriza com o funcionários. A n o v a identidade tende a ser 
afirm ada frente a nova descaracterização da escola e da ação educativa.
Estam os em um m om ento de reafirm ação da d im ensão de traba lhador q u a lifica ­
do, senhor de u m sab e r d e ofício , u m m e stre nas a r te s de e n s in a r e educar, in s u b s ti ­
tu ível, re s is tin d o às a m eaças de su a d e sca rac te rização . E s te no v o m o m en to pode 
s ig n ifica r a defesa d e u m certo “m o n o p ó lio ” dessa fu n ç ã o so c ia l. D ian te d esse m o ­
v im ento nos p e rg u n tam o s: que sen tid o e le tem ? R e a firm a u m a v isão trad ic io n a l da 
função de m estres, ou incorpora a defesa de d im ensões e funções profissionais p e r­
m anentem ente am eaçadas?
Estes dois p rocessos que se dão nas duas últim as d écad as de form as d iversas têm 
significado um a autodefesa. A defesa do trabalho e do saber qualificado é a defesa d a ­
queles que o exercem , de sua identidade e cen tra lidade social. É um a au todefesa, que 
apressadam ente pode ser in terpretada com o corporativa, con trária a ab rir a esco la e 
seu saber-fazer ao crivo d a participação socia l m ais am pla. N o m eu en tender essa seria 
u m a in terpretação parc ia l, p recipitada, que deve ser m e lh o r ponderada. P odem os ver 
este m om ento com o um a percepção que os próprios p ro fiss io n a is têm da especific ida ­
de do seu saber-fazer com o insubstitu ível, logo a ser defen d id o e a ser tra tado com a 
devida seriedade e respeito .
N essa au todefesa podem os ver a in d a u m dos m ecan ism os m ais sérios de a firm a ­
ção da identidade do cam po educativo. A q u em in teressa que a esco la seja considerada 
com o terra vadia, de todos e de n inguém ? C om o responsab ilidade de um a co ncepção 
d ifusa de com unidade? C om o um clube de am igos ou co m o p retex to p ara outras finali­
dades políticas, p o r m ais ju stifica tiv as progressistas q u e elas apresentem ? U sa r os d i­
reitos hum anos com o p re tex to s para m obilizações d ifusas será sem pre um desresp e ito 
aos sujeitos desses d ire ito s e aos p ro fissionais que os garan tem . A s questões que têm 
estado em jogo nestas d écadas são essas: a defesa da id en tid ad e dos p rofissionais d a 
educação, de sua qualificação e p rofissionalism o e a d efesa da especific idade d o cam ­
po educativo. A m bas cam inharam ju n ta s ao longo da h istó ria .
R efletir sobre esse m ovim ento é traze r à cena o p ró p rio ofic io de m estre, a cons­
trução social desse p ro fiss io n a l e do cam po educativo. U m processo h istó rico delicado 
que esteve na base da garan tia do d ireito socia l à educação eà cultu ra. Q ue lan ça as ba­
ses onde se enraiza essa garantia: na configuração de cam p o s sociais e dos papéis so­
c ia is que dele deem conta. S em essa b ase e esse subsolo o s d ireitos ficam soltos, à m er­
cê de m obilizações pon tua is, de responsabilidades difusas.
O d ireito à educação n u n ca será garan tid o por um c lu b e de am igos. Já tem o s am i­
gos e am igas da cu ltu ra , de anim ais d e estim ação am eaçados, de crianças de ru a , de ór­
fãos e agora a m ídia e os governos lançam a cam panha “ A m igos da escola!” M ais um 
capítu lo de nossa longa h istória, de sua descaracterização . A educação escolar tra tada 
com o um a terra vadia , sem cercas, fac ilm en te invadida por aven tureiros ou p o r am i­
gos. M ui am igos! Q ualquer u m entende, palp ita sobre a esco la , ace ita serp ro fesso r(a),
secretário(a) ou g e s to r de educação. P arale lo a esse p rocesso tivem os a descarac teriza ­
ção dos seus profissionais, ou a desprofissionalização dos m estres de escola . Q ualquer 
um que dom ine u m conhecim ento e u m a técnica, poderá ensiná-los com o um b isca te e 
um com plem ento a seus salários.
A s artes de e d u c a r e o dom ínio da teo ria pedagógica se to m aram desnecessários 
d ian te de um cam po descaracterizado. A L ei 5692 de 71 descarac terizou a esco la e os 
cu rrícu lo s d e fo rm ação . A s licen c ia tu ras d esfig u ra ram seu s m estres. O s cu rrícu lo s 
g rad ead o s e d isc ip lin a re s em p o b re ce ram o co n h ec im e n to , a e sco la e os p ro fe s so ­
res. O peso cen tra l d ad o ao d o m ín io dos co n teú d o s d as á reas nas lic e n c ia tu ra s e o 
peso secundário d a d o ao dom ín io das artes ed u ca tiv as re f le te essa m esm a co n ce p ­
ção e trato d e sc a ra c te r iz a d o do o fíc io e do cam po ed u ca tiv o que v em se a lastran d o 
por d é c a d a s . R eduzim os a escola a ensino e os m estres a ensinantes. O m ov im en to de 
afirm ação d o cam po educativo, de sua especificidade e do p rofissionalism o do trato 
está no o u tro lado, vem na contram ão d essa triste histó ria. Tem sentido d ialogar sobre 
o ofício de m estre .
A categoria p e rc e b e q u e está n a co n tram ão , que te n ta lev ar essa v e lh a h is tó ria 
em o u tra direção. P ercebe que afirm ar a especificidade da educação e dos saberes p ro ­
fissionais pode s ig n if ic a r a defesa da superioridade q ualita tiva do saber específico 
aprendido nos cu rso s de form ação e, sobretudo, na p rá tica educativa. P o r aí a ca tegoria 
encon tra mais u m a estratég ia de defesa de si m esm a, de suas condições de traba lho , de 
sua carre ira e seu s salários, de seus tem pos de estudo, p esqu isa e coordenação . D e sua 
condição d e profissionais.
E sta s lutas só têm sentido se fo r reconhecida a especific idade de seu papel. A des­
valorização do cam p o educativo e d o saber profissional levará à desvalorização d a ca­
tegoria fren te aos governos e à sociedade. N ão sera essa percepção que leva professo- 
res(as) a não se e n tu s ia sm ar dem asiado com essas ondas constitu in tes, partic ipativas, 
que p en sam gerir u m cam po tão específico à base de u m a m obilização d ifusa? H á em 
foco questões d em asiad o sérias, entre elas a defesa socia l da escola , sua especific idade 
e a defesa dos d o cen tes e de seu profissionalism o. E x p lic ita r essas questões em jo g o 
dará m aior realism o p o lítico a este m om ento tão afirm ativo dos d ireitos sociais. Fale ­
mos de nosso o fíc io . Tem os m uitas lutas a lembrar.
Q u an d o acom panho os vin te ú ltim os anos de h istó ria do m agistério , v e jo m ais do 
que lu tas p o r salários e carreira, estab ilidade e condições de trabalho. Vejo a defesa e 
afirm ação d e um ofício que foi vu lgarizado e precisa ser recuperado sem arrepender­
m os do que fomos outrora, porque ainda o som os.
H á ainda o u tra m otivação: a afirm ação e defesa da especific idade do cam p o da 
educação e de se u trato profissional se dá em tem pos em que os p rofessores e as p ro fes ­
soras têm m aior seg u ran ça pelo fato d e terem aum entado nestas décadas os n íve is de 
q ualificação em g rad u ação e pós-graduação e por estarem passando p o r m últip las for­
m as de requaliflcação: cursos oficiais, congressos, conferências, oficinas, le ituras, 
partic ip ação na a ç ã o sindical e nos m ovim entos sociais...
Todo esse acúm ulo de qualificação le v a a u m a m aior segurança e à consequen te 
defesa da especific idade de seu saber-fazer, de seu o fíc io . Im pressiona a quantidade de 
tem pos de reflexão e de debate, de ap re n d e r a fazer, de le itu ra e de socialização d e e x ­
periências que acon tecem cada d ia en tre o s profissionais da E sco la B ásica. Podem os 
ver nessas práticas um a procura de u m saber-fazer m elhor, m ais fundam entado . P o d e ­
m os v er um a afirm ação profissional, um reen co n tro co letivo com sua identidade.
E ste quadro tão d inâm ico se dep ara co m essas v á ria s propostas de gestão d ifusa da 
escola, de elaboração am p la de po líticas e d e p lan o s d e governo. H á algo que não se 
encaixa. C om o en ten d er estes p rocessos socia is e p ro fiss ionais, seus encontros e de- 
senconfros? P odem ser articuladas essas duas tendências, o aum ento da qua lificação 
profissional de u m lado, e o apelo d ifuso à gestão esco lar, e à form ulação d e p ropostas 
de inovação, n a b ase da adesão e da m obilização d e todos? C om o afirm ar a d im ensão 
social, a responsab ilidade d a sociedade e ao m esm o tem po reafirm ar o tra to p ro fiss io ­
nal, a centralidade insubstitu ível da ca teg o ria e a responsab ilidade dos governos n a g a ­
ran tia dos direitos socia is? M ostrando que o m agistério não é descartável.
Esse m ovim ento faz parte da co n stru ção social do cam po da educação e dos seus 
profissionais. Insisto no o lh a r social, tenso, m ais de fundo. R econheço as bases sociais 
onde se enraizam as garan tias dos d ireitos. É aí que as tensões estão postas. N ão ig n o ­
ra r que a escola, com o d ireito , só av an ça quando en ra izad a no subsolo social. N a tra ­
m a, nas redes e nos p rocessos de p ro d u ção e reprodução socia l e cultu ral. M as não 
confund ir esse subsolo co m m obilizações e cam panhas perifé ricas, com adesões p o n ­
tuais e voluntaristas. É todo o contrário do q u e nos o rie n ta quando defendem os o en ra ­
izam ento social e cu ltu ra l d o direito à educação e à escola.
M estres de o fíc io , n ão ca ta -v en to s
Falar do ofício de m estre pode nos rem e te r ao p assad o , superado p ara alguns. P as- 
sado-presente , no m eu entender, a ser recuperado. O que im porta é através dessa ex­
pressão - ofício de m estre - e do p assado q u e carrega entender-nos com o con tinuado- 
res de u m saber-fazer enraizado no passado , em um a h istó ria . F azem os parte dessa h is­
tória. Vam os nessa estrada acom panhados p o r m uitos m estres das artes de educar. 
Iden tificar nosso saber-fazer com essa m em ó ria poderá d a r o u tra qualidade à s lutas em 
defesa dos direitos profissionais.
As políticas de form ação e de currícu lo e , sobretudo, a im agem de professor(a) em 
q u e se ju s tif ic a m p e rd e ra m essa re fe rên c ia a o p assad o , à m em ó ria , à h is tó ria , com o 
se ser p ro fe sso r(a ) fo sse um ca ta-ven to que g ira à m e rc ê da ú ltim a v o n ta d e p o lític a 
e da ú ltim a d em an d a tecn o ló g ica . C a d a n o v a id e o lo g ia , n o v a m o d a e c o n ô m ica ou 
p o lítica , p e d ag ó g icae acad êm ica , c a d a n o v o g o v e rn an te , g e s to r ou te c n o c ra ta até 
de ag ên c ia s de f in a n c ia m e n to se ju lg a m no d ireito d e n o s d iz e r o que não so m o s e o 
q u e devem os ser, de defin ir nosso perfil, de red e fin ir nosso p apel social, nossos sabe- 
res e com petências, red efin ir o currícu lo e a institu ição que nos form arão a través de 
um sim ples decreto.
Podem os d en u n ciar tudo isso e ca ir num jo g o de forças p ara im por outro olhar, ou­
tra po lítica , mas s e não sairm os dessa lóg ica , continuarem os no m esm o jo g o e na m es­
m a visão de que a ca tegoria de p ro fesso res não passa de u m cata-vento . A questão pas­
sa a ser que vento sopra e quem con tro la hegem onicam ente o vento que fa rá g irar os 
m estres, q u e definirá o perfil, o currículo e a institu ição conform adora dessa m assa in ­
form e. 0 debate em to m o dos PCN s, dos C urrículos de form ação, dos pareceres dos 
C onselhos e decretos p residenciais so b re as legítim as institu ições form adoras re fle ­
te m essas brigas ex te rn as à escola en tre academ ia e governantes. R efletem essas con ­
cepções dem asiado “po líticas” , vo lun taristas, a-h istóricas no trato de um a categoria 
p ro fissional tão v e lh a - os pedagogos, os educadores d a infância . O fíc io tão enraizado 
na h is tó ria quanto a in fânc ia . U m ofíc io que decretos e currícu los sonham m an ipu lá ­
vel. N em tanto p o rq u e carrega um a lo n g a história.
Uso a expressão “ o fíc io de m estre” para cham ar a a tenção p ara essa longa histó ria, 
p a ra p ro cu rarn o ssa iden tidade longe, p a ra nos ver com o u m a construção social, h is tó ­
rica , cu ltu ra l que finca raízes fundas no passado.
O h istoriador Eric J . H obsbaw m 2 (1987, p. 349s.) reconstró i a h istó ria d e concei­
tos com o artífice, oficio, m estre e artesão , sua herança e com o a industria lização ten ­
tou redefinir, superar, m as tam bém recu p e ra r o conteúdo dessas form as de trabalho. 
M ostra com o nesses em b ates há constan tes que perm anecem : o apego ao saber, ao es­
tudo, à qualificação, à identidade ind iv idual e coletiva, ao cam po de sua p rática . Se 
pergunta sobre o que fico u dessa h is tó ria e dessa herança n a passagem para novas fo r­
m as de trabalho. U m h isto riad o r m estre n essa percepção dos p rocessos h istó ricos, das 
descontinuidades e con tinu idades na h is tó ria do trabalho, no fazer-se dos p róprios tra­
balhadores, na co n s tru çã o de suas identidades. U m a sensib ilidade h istó rica que tan ta 
falta nos fa z quando o lham os p ara o p e rfil de p rofessor(a) de E ducação B ásica.
Tem os nina h is tó ria , fazem os parte de u m a construção social, cu ltural, que tem 
sua h is tó ria , que te m m u ito a ver com a h istó ria do traba lho , dos trabalhadores, d e seus 
saberes e ofícios. C om a histó ria do fazer-se da cu ltu ra operária. N ão é esse o legado 
acum ulado nos ú lt im o s v in te anos pelas lu tas da categoria ao identificar-se com o tra ­
balhadores em ed u ca ção ?
Em certo m o m en to de sua análise , H obsbaw m se pergun ta : “O q u e e le s ( os n o vo s 
artífices) a p ro ve ita ra m d e su a h era n ça d e o f íc io p ré - in d u s tr ia l? E responde não sem 
um a p itad a de c r ít ic a à s análises acadêm icas que ignoram o passado:
“O s acadêm icos não deveríam ter dificuldade em apreender as prem is­
sa s p o r trás do pensam ento e da ação de ofícios organizados, visto que 
nós mesmos continuamos em grande p a r te a atuar a p a r tir dessas p re ­
m issas. Um ofício com preendia todos aqueles que tinham adquirido as 
técnicas peculiares de uma ocupação mais ou menos difícil, a través de 
um p rocesso específico de educação, com pletado p o r testes e avaliações
2. HO BSB AW M . E r i c J. Mundos do trabalho. R io d e Janeiro: P az e T erra , 1987.
que garantiam conhecimento e desem penho adequado do oficio. Em 
compensação estas p esso a s esperavam o direito de exercer seu oficio e 
ganhar o que consideravam um a vida decente, correspondente a seu v a ­
lo r na sociedade e a seu status social... E isto significava que eles tinham 
um direito inquestionável... E ra um lugar-comum do debate p o lític o que 
o trabalho era “propriedade ” do trabalhador e que deveria ser desta 
form a tratado... Em resumo, o oficio não era som ente uma m aneira de 
fa zer dinheiro, mas, na realidade, a renda que ele proporcionava era o 
reconhecimento p e la so c ied a d e e p e la s autoridades constituídas do va ­
lo r do trabalho decente executado decentem ente p o r grupos d e homens 
respeitáveis, adequadam ente treinados nas tarefas que a sociedade n e ­
cessitava ” (p. 355).
Seria forçado pensar q u e tudo isso tem m u ito a v e r com a h istó ria de nosso o fíc io 
de m estre? Que te m m u ito a ver com as lutas d a categoria?
A iden tificação dos professores e das p ro fesso ras com o trabalhadores(as) assum i­
da pela categoria d esd e fin a l dos anos de 1970 n o s co lo ca nessa longa herança a que 
H obsbaw m se refere. Os trabalhadores n a academ ia, nas escolas con tinuam os em 
grande parte a a tuar a p a rtir das p rem issas dos ofícios, de sua herança. C arregam os 
um a ideia de co letiv idade, de dom ínio coletivo d e saberes e de fazeres, d e passag en s 
p o r rituais idênticos de titulação, seleção e concursos. P rovam os dom inar saberes, c o ­
nhecim entos e com petênc ias adequados a nosso ofício , e com o coletivo esperam os o 
direito de exercê-lo e g an h a r para te r um a v ida decen te , co rresponden te ao valor que a 
educação tem na sociedade.
N ão foram estas as coordenadas em que a ca tegoria avançou e se organizou? N ão é 
essa a au to im agem constru ída? A d efesa da esco la , do papel central dos seus p ro fis s io ­
nais não recolhia e a firm av a esse lugar-com um d o debate político-h istórico , q u e o tra ­
balho é p ropriedade do trabalhador e que deve s e r desta form a tratado? N ão te m sido 
essa visão que vem inspirando as lu tas p o r salários, carreira, condições e q u a lifica ­
ção...?
N este contexto h istó rico , nesta heran ça e n es te debate político con tem porâneo uso 
a expressão “ofício de m estre” e sobre essa h istó ria quero dia logar, con tin u ar ou tros 
diá logos que venho travando com m ilh a res de m estres em encontros, sem inários e 
congressos. Tem os m uitas histórias a co n ta r sobre n o sso ofíc io p o rque não n o s a rre ­
pendem os do que fom os outrora, p o rque ainda o som os.
Um m odo de ser
“Sim , so u eu, eu m esm o, ta l q u a l re su lte i d e 
tudo...
Q u an to fu i, q u a n to n ã o fu i, tu d o is so sou ... 
Q uan to qu is , q u a n to n ã o qu is, tu d o is s o m e 
fo rm a ... ”
F e rn a n d o P e sso a
L endo o livro Im a g en s do outro*, m e cham ou a a tenção um a pergun ta que é posta 
logo na apresentação: n ão sou eu m e sm o um o u tro p a r a m im m esm o ... ? ” Um outro
que resu lte i de tu d o e que m e acom panha. Q ue som os e querem os deixar de ser. N ão é 
fácil ace ita r uma identidade tão socia lm ente determ inada.
Participo de m u ito s encontros de professores(as). N u m cartaz bonito e a traen te se 
destaca o tema d o sem inário . Penso, o tem a é esse ou o tem a de tan tos congressos so­
mos nós? O clim a é d e festa, de encon tro m arcado. E ncon tros com nós m esm os, com 
nós-outros, com o outro que h á e m todos nós, o ser professor. E ncontros que dão que 
pensar. E m que d á para sentir que am am os e odiam os o p ro fesso r que há em nós. Q ue 
carregam os paraa escola , p ara casa e para nossos congressos. Se p ercebe nos d iá lo ­
gos, nas experiências e práticas ap resen tad as que o que h á de m ais esperançador de 
que poderem os sa ir d e lá liberados um pouco é o sen tim ento , a paixão e ódio p a ra com 
o ser professor.
P roblem atizar-nos a nós m esm os po d e ser um bom com eço, sobretudo se nos leva 
a desertar das im ag en s de professor q u e tan to am am os e odiam os. Q ue nos enclausu ­
ram, m ais d o q u e nos libertam . Porque som os professores. Som os p rofessoras. Som os, 
não apenas exercem os a função docen te . Poucos traba lhos e posições socia is podem 
usar o verb o ser d e m aneira tão apropriada. P oucos trabalhos se identificam tan to com 
a to ta lidade da v id a pessoal. O s tem pos de escola invadem todos os outros tem pos. L e­
vam os p a ra casa as p ro v as e os cadernos, o m ateria l d idático e a preparação das aulas. 
C arregam os angústias e sonhos d a escola para casa e de casa para a escola . N ão dam os 
con ta de separar esses tem pos porque ser professoras e p ro fessores faz parte de nossa 
vida pessoal. É o outro em nós. 3
3. L A R O S A , Jorge & Z A R A , M aria Pérez d e . (orgs.)- Im agens do outro . Petrópo lis: V ozes, 1998 .- V e r : L A R O S A , 
Jorge. P edagogia p ro fan a - Danças, piruetas emascarados. Porto A legre: C o n trab an d o , 1998.
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P or vezes nos in co m o d a esse en trecruzam ento d e tem pos e de vivências. D e pa­
péis sociais. Tentam os despir-nos d essa cond ição q u e se inco rporou em nós. Tentam os 
afirm ar-nos, p ro fissionalizar nossos tem pos, não m istu rá-lo s com visões an tiquadas 
de vocação ou de amor. G ostaríam os de libertar-nos desses en trecruzam entos e redu ­
z ir o m agistério a u m tem p o p rofissionalm ente delim itado . E tendo cum prido esse 
tem po esquecer de que som os professores.
A ssisti um a en trev ista com u m a atriz de teatro. E m debate a m esm a questão nesse 
tipo de entrevista: se a personagem rep resen tada tin h a a v e r com a m ulher-atriz, com o 
separar a representação e a vida p essoal, com o separar a personagem do h u m an o de 
quem a representa... Em nosso caso, com o tirar a m ásca ra de professora , de p rofessor 
quando term ina o espetácu lo da docência. A m áscara virou um m odo de ser? P ersona­
lidade? São frequentes depo im entos com o estes: “q u a n d o term in a m a s a u la s quero 
d e ix a r na g a v e ta as v iv ê n c ia s do d ia , n ã o co n sig o “ Q ua nd o vo u c h eg a n d o em c a sa 
ten to e sq u e c e r a s le m b ra n ç a s da e sc o la , n ão d á
N e sse sentido , so m o s p ro fe sso re s(a s) . R ep re se n ta m o s u m papel, u m a im agem 
so c ia l, que carrega tra ç o s m uito m a rc a n te s e m u ito m istu rad o s . Incôm odos. A re s ­
p o s ta à p e rg u n ta quem so m o s está c o la d a a com o fo i- s e co n stitu in d o a im ag em so ­
c ia l do m agistério .
O am b ígu o sonho da p ro fiss ion a liza ção
P o r vezes ouvim os q u e essas fro n te iras tão d ifusas en tre os tem pos da d o cên c ia e 
os tem pos da vida se devem a uma visão pouco profissional e às im agens ultrapassadas 
que tem os de superar. A profissionalização do m agistério aparece com o u m rem édio para 
a afirm ação de nossa identidade. Profissionalizados serem os capazes de separar nossos 
tem pos, tirar a m áscara após cada dia de docência e m ostrar nossos múltiplos rostos com 
orgulho. N as últimas décadas não faltaram pressões p ela profissionalização do m agistério, 
m as as incertezas ainda continuam. Seria m ais um a m áscara? U m a outra im agem mais 
m oderna, racional e fria? A identidade pessoal e profissional estaria sendo redefinida com 
as pressões pela profissionalização d a docência? Estam os avançando para u m perfil de 
professor de tempos específicos, de com petências exclusivas, de períodos defin idos? O 
ser professor(a) estaria deixando de in v ad ir outras d im ensões de n o ssa existência? So­
m os ou apenas estam os professores e professoras?
N o final dos 70 h o u v e um a opção por defin ir-se co m o trabalhadores em educação . 
T rabalhadores com o qualquer outros, caracterizados pelos traços do trabalho . M ais 
recen tem ente a iden tificação e valorização com o pro fiss ionais p assou a p reva lecer no 
discurso. A identificação com o p ro fesso r-trabalhador ou com o profissional não pare ­
ce te r redefin ido a au toim agem , nem m exido na im agem socia l. Som os o u tros o u con ­
tinuam os os m esm os? U m a pergunta que aflora nos en co n tro s e n a abundan te literatu ­
ra sobre v idas de p rofessores.
A preocupação p o r encontrar-nos com o profissionais com petentes em u m cam po 
do conhecim ento vai e v o lta e refle te a p ro cu ra da id en tid ad e co letiva e pessoal. H á
p rofissões que têm seu estatuto defin ido e reconhecido. E ntretan to , o saber-fazer dos 
professores de E d u cação B ásica ainda não tem seu estatu to profissional. M as poderá 
ter? A crença em que p o d erá ter é b astan te dom inante na categoria. O prob lem a passou 
a ser apenas com o ch eg a r lá. Sendo m ais com petentes é o sonho. Tendo m elhor p repa­
ro a través de novos cu rso s de graduação, especialização , pós-graduação ou de form a­
ção perm anente. T om ando a esco la de m elhor qualidade. D efin indo u m a carreira pau ­
tada por critérios “p ro fiss io n a is” . E spera-se que a com petência defina ou altere o im a­
ginário social sobre n o sso ofício. N o s libere da m áscara.
A com petência e m u m determ inado recorte da ação socia l é co locada com o um 
dos traços da p rofissionalização . E ntretan to , nem todas as p rofissões são reconhecidas 
pela com petência. A im agem social ou o reconhecim ento social é m ais im portan te do 
que a com petência e m si. O m édico tem garantia de u m a p resum ida com petência . E 
socia lm ente reconhecido. Os m estres d a E ducação B ásica não, ainda que dom inem sa- 
beres e com petências. N em parece que estam os cam inhando nessa d ireção e não por 
falta de com petênc ias acum uladas.
O discurso do p ro fissionalism o é um sonho am bíguo. D o lado da categoria pode 
significar o reconhecim ento e a valorização . D o lado socia l, pode sign ificar a ju s tif ica ­
tiva para ad iar esse reconhecim ento . P o r falta de com petência e de dom ínio de saberes, 
o reconhecim ento e a valorização são sem pre adiados. Q uando os n íveis de titu lação 
aum entarem serás reconhecido e valo rizado . N ovos p lanos de valorização do m agisté ­
rio num futuro sem pre adiado. O d iscurso da incom petência-com petência não tem ser­
vido de justifica tiva , m ais aparente do que real, para ad iar esse reconhecim ento? N ão 
penso que os p ro fiss ionais da E ducação B ásica sejam m enos com petentes do que ou ­
tros profissionais de áreas próxim as. A qualificação aum en tou consideravelm ente nas 
últim as décadas não obstan te o estatu to profissional da categoria con tinua indefinido, 
ainda im erso em u m a im agem social d ifusa, sem contornos.
V olto à pergunta que nos persegue: quem som os? D om inando com petências m u­
darem os a im agem ? Elm ponto de partida para responder estas perguntas p oderia ser 
este: S om os a im ag em que fazem d e nosso papel social, n ão o que te im am os ser. Tería- 
mos d e consegu ir q u e os outros acreditem no que som os. U m processo socia l com pli­
cado, lento, de desencon tros entre o que som os para nós e o que som os p ara fora. Entre 
im agens e au to im agens. É frequente lam en ta r que não som os socia lm ente reconheci­
dos. M as com o se co n stró i o reconhecim ento social de u m a profissão?

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