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1 2 3 Reitor Prof. Ms. Stefano Barra Gazzola Gestão da Educação a Distância Prof. Ms. Wanderson Gomes de Souza Design Instrucional e Diagramação Diógenes Caxin Victor Rocha Coord. do Núcleo Pedagógico Prof.ª Ms. Terezinha Nunes Gomes Garcia Prof.ª Dr.ª Gleicione Aparecida Dias Bagne de Souza Revisão ortográfica / gramatical Erika de Paula Sousa 4 Autores DIOGO AMARAL DE MAGALHÃES Licenciado em Física pela UNIFEI. Mestre em Ciências em Física e Matemática Aplicada pela UNIFEI (2009). DÉBORAH REIS ALVARENGA Bacharel em Física pela UFMG (2004). Mestre em Física pela UFMG (2006). Doutora em Física pela UFMG, na modalidade SWE, com estágio na Universidade Técnica de Viena (2011). 5 530.12 M188E MAGALHÃES, Diogo Amaral de Guia de Estudo - Estrutura da Matéria. Diogo Amaral de Magalhães. Varginha: GEaD- UNIS/MG, 2009. 124p 1. Estrutura da Matéria. 2. Mecânica Quântica. 3. Formalismo de Schroedinger. I. Título. 6 Sumário 1-RADIAÇÃO TÉRMICA E O POSTULADO DE PLANCK ................................................................... 15 1.1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................. 16 1.2 A TEORIA DA RADIAÇÃO DE CORPOS NEGROS DE PLANCK............................................. 18 1.2.1 A Dedução da Energia Média de Planck ..................................................................................... 28 1.1.2 Recuperando o Clássico........................................................................................................................ 31 2-PROPRIEDADES CORPUSCULARES DA RADIAÇÃO .................................................................... 33 2.1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................. 34 2.2 O ANO DE 1905 E O EFEITO FOTOELÉTRICO ............................................................................. 37 2.3 EFEITO COMPTON ....................................................................................................................................... 44 2.4 PRODUÇÃO E ANIQUILAÇÃO DE PARES E SIMETRIA CROSSING ................................... 49 2.4.1 Partículas e Antipartículas ..................................................................................................................... 49 2.4.2 Aniquilação de Um Par Elétron – Pósitron Em Dois Fótons .............................................. 52 2.4.3 Simetria de Crossing: Um Sabor de Teoria Quântica de Campos ................................ 52 3-PROPRIEDADES ONDULATÓRIAS DAS PARTÍCULAS ................................................................. 59 3.1 As ondas de De Broglie.............................................................................................................................. 60 4-SOBRE O ÁTOMO ............................................................................................................................................. 66 4.1 O MODELO DE BOHR ................................................................................................................................. 67 4.2 LINHAS ESPECTRAIS DO HIDROGÊNIO .......................................................................................... 74 4.3 OS FORMALISMOS DA TEORIA QUÂNTICA ................................................................................... 78 4.4 PRINCIPIOS DA CMPLEMENTARIEDADE E INCERTEZA ........................................................ 80 4.4.1 O Princípio da Complementaridade ............................................................................................... 80 4.4.2 O Princípio da Incerteza ......................................................................................................................... 82 5.1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................. 90 5.2 A EQUAÇÃO DE SCHROEDINGER ....................................................................................................... 92 5.3 – APLICAÇÕES DA EQUAÇÃO DE SCHROEDINGER ............................................................... 104 5.3.1 – A Partícula Livre ..................................................................................................................................... 104 7 5.3.2 – O Poço de Potencial Infinito .................................................................................................... 107 5.4 – O EFEITO TUNEL ............................................................................................................................... 115 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................ 123 Básica .................................................................................................................................................................. 123 Complementar ............................................................................................................................................... 123 8 EMENTA Radiação de corpos negros; Teoria de Planck. Dualidade onda- partícula; Efeito Fotoelétrico e Compton; Produção e Aniquilação de Pares; Onda de matéria de-Broglie. O Modelo de Bohr para o Átomo. Princípio da Exclusão de Pauling. Princípios da Complementaridade e Incerteza; Interpretação de Copenhague. Formalismo de Schroedinger; Valor Esperado; Interpretação Probabilística de Born. Aplicações da Teoria de Schroedinger, 9 10 Caro (a) aluno (a) A disciplina Estrutura da Matéria é seu primeiro contato com a Mecânica Quântica, uma teoria que fornece a descrição do “mundo dos átomos”, ou seja, dos sistemas físicos cujas dimensões são da ordem ou menores que a escala atômica, tais como moléculas, átomos, elétrons, prótons. Embora leve em conta o aspecto microscópico da matéria, a teoria descreve também fenômenos macroscópicos. 11 A Mecânica Quântica recebe esse nome devido a fenômeno físico chamado quantização. No “mundo dos átomos” a energia de um elétron orbitando um núcleo é quantizada, ou seja, apenas alguns estados de energia são permitidos para o elétron, os outros, são proibidos. No nosso mundo clássico isso é algo que não podemos imaginar. A Teoria Quântica descreve também fenômenos como a dualidade onda-partícula do comportamento da luz e explica os princípios da interação da energia com a matéria. Nas Unidades 1, 2 e 3 são introduzidos os vários fenômenos do princípio da Mecânica Quântica, são desenvolvidas as ideias essências que deram origem a teórica quântica. Nesta abordagem, resolve-se primeiro o problema da radiação de corpos negros, que inclui a proposta de quantização da energia. A dualidade onda-partícula vem na sequência. Finalmente, é introduzida a interpretação de Copenhague e os princípios da incerteza e complementaridade. Naunidade 4 é apresentado o modelo de Bohr para o átomo. Na Unidade 5 estudaremos a 12 Teoria de Schroedinger, que especifica quais as leis do movimento ondulatório que as partículas obedecem, porém, na mecânica quântica, o movimento das partículas é descrito por uma função de onda. Será apresentado um panorama breve da equação de Schroedinger e como interpretá-la segundo Born. Em seguida, esta é aplicada para resolver alguns exemplos não muito sofisticados. Espero que o mundo mágico da Mecânica Quântica consiga encantar vocês! Nunca se esqueçam da fala do nosso colega de profissão Albert Einstein “Uma mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará a seu tamanho original”. 13 META Após ter cursado esta disciplina o aluno deverá ser capaz de: - Relatar os principais fenômenos físicos que, no início do século XX, não puderam ser descritos apropriadamente pelos modelos da Física clássica e apontar as dificuldades e inconsistências desses modelos clássicos quando utilizados para tais descrições; - Distinguir os fenômenos que requeiram uma descrição ondulatória, quanto-mecânica, dos que permanecem sendo bem descritos pela física clássica; - Interpretar as regras de quantização dos fenômenos microscópicos; - Justificar a formulação ondulatória da mecânica quântica; - Distinguir a interpretação causal e determinística da mecânica clássica da interpretação probabilística dos resultados da mecânica quântica; - Resolver e interpretar a equação de Schroedinger para sistemas físicos simples. OBJETIVOS GERAIS Adquirir uma visão conceitual sobre os princípios da Mecânica Quântica. 14 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Transmitir ao aluno conhecimentos necessários para a compreensão do seguintes fenômenos e conceitos: - Radiação Térmica e o Postulado de Planck; -O Efeito Fotoelétrico; -Teoria Quântica de Einstein; - Efeito Compton; - Natureza Dual da Radiação; - O Postulado de De Broglie; - Propriedades Ondulatórias das Partículas da Radiação: Onda e Matéria, Dualidade Onda-Partícula; - O Princípio da Incerteza e suas conseqüências; - O Modelo de Bohr para o Átomo; - A Teoria de Schroedinger da Mecânica Quântica. 15 1-RADIAÇÃO TÉRMICA E O POSTULADO DE PLANCK 16 1.1 INTRODUÇÃO A Física Quântica estuda o comportamento dos corpos de pequenas dimensões. Assim como a velocidade da luz c, caracteriza a relatividade, a chamada constante de Planck h, caracteriza a física quântica. Esta descoberta foi publicada em 1900, pelo brilhante físico alemão Max Planck. Juntamente com a constante de Planck estava um conceito quântico extremamente importante que é o fato de que a energia não é uma grandeza contínua, como era aceito até fim do século XIX, mas sim discreta. Em princípio, Planck buscava explicações para a radiação emitida por corpos aquecidos. Apesar de resultados que batiam com a experiência, seu trabalho não foi muito bem aceito pela comunidade científica da época; até mesmo ele admitia não possuir bases teóricas convincentes que justificasse seus resultados. Como veremos, apesar de não vincular e nem basear sua pesquisa com a hipótese que levou Planck à quantização da energia, Albert Einstein e suas unidades indivisíveis de energia 17 localizadas em pontos do espaço se mostraram eficazes para explicar fenômenos como o efeito fotoelétrico, a ionização de gases pela radiação ultravioleta e o fato que o calor específico de sólidos cai e se torna praticamente nulo quando estes são resfriados próximos à temperatura do zero absoluto; estes dois últimos a posterior. Entretanto, nem tudo foram flores belas e perfumadas... A hipótese de Einstein não era capaz de esclarecer fenômenos como a difração e a interferência. Foi absolutamente estranho e um tanto indigesto admitir que a radiação eletromagnética apresentara comportamento dual. Mas o pior, ou o melhor, ainda estava por vir... Louis de Broglie foi além da imaginação “normal” e colocou uma infinidade de pulgas atrás das orelhas dos cientistas, postulando em sua tese, em 1924, que a dualidade aplicava-se não só à radiação, mas também à matéria... 18 1.2 A TEORIA DA RADIAÇÃO DE CORPOS NEGROS DE PLANCK À temperatura ambiente, a maioria dos corpos não emite luz; eles apenas refletem a luz incidente sobre eles. Sabemos que não é possível ver uma barra de ferro num quarto escuro. Aquecendo-a gradualmente, passamos a senti-la antes de sermos capazes de enxergá-la. Continuando com o aquecimento da barra, observamos que ela toma cor avermelhada, além de continuarmos sentindo o calor emitido por ela. Com o aumento da temperatura, sua coloração passa até tornar-se branco-azulada. Em suma, corpos aquecidos irradiam em várias faixas do espectro eletromagnético ao mesmo tempo e, como veremos em seguida, para cada temperatura do corpo, a emissão de radiação é dada preferencialmente numa dada região, cuja frequência na qual a radiação é emitida aumenta. O espectro da radiação emitida por um corpo depende de sua composição e forma. Estamos interessados num grupo cujo 19 espectro de emissão é o mesmo para uma dada temperatura. Tais corpos são denominados corpos negros, e suas superfícies absorvem toda radiação incidente sobre eles. Abaixo, segue um gráfico que mostra que a radiância espectral de um corpo negro em função da frequência da radiação para algumas temperaturas. Tal grandeza expressa a energia emitida por unidade de tempo cuja frequência de emissão está compreendida no intervalo , por unidade de área da superfície do corpo que está a uma temperatura absoluta T. Figura 1.1: Radiância espectral de um corpo negro em função da frequência da radiação, mostrada para temperaturas de 900 K, 1200K e 1500 K. Observa-se que a frequência na qual a radiância máxima ocorre aumenta linearmente com a temperatura e a potência total emitida (área sob a curva), aumenta muito rapidamente com a temperatura. 20 Duas leis físicas estão ligadas à análise destes dados experimentais. Uma é a lei de Wien, a qual diz que a frequência em que a energia irradiada é máxima varia linearmente com a temperatura absoluta da superfície do corpo. Levando em conta a relação entre comprimento de onda (dado em metros), frequência e velocidade da luz, a lei de Wien pode ser expressa por: A outra é a lei de Stefan-Boltzmann; esta estipula que a potência total P emitida por unidade de área, ou ainda a integral da radiância total sobre todas as frequências, vai com a quarta potência da temperatura absoluta, isto é, No final do século XIX, Rayleigh e Jeans obtiveram a fórmula para a teoria da radiação de corpos negros1. Como mostra o esboço abaixo, a teoria concorda com a experiência 1 Para mais detalhes veja “Recuperando o caso clássico”. 2 No sentido de não tratar de maneira contínua, mas sim discreta. 3 A energia cinética é kT/2 e a energia potencial tem o mesmo valor, o que nos leva a energia total 21 no limite de baixas frequências. No entanto, ocorre a chamada catástrofe do ultravioleta à medida que as frequências vão crescendo. Pelo gráfico vemos também que a energia emitida não diverge, como prevê a fórmula clássica de Rayleigh e Jean. E foi aí que entrou a genialidade de Max Planck...Figura 2.1: A previsão de Rayleigh- Jeans, linha azul, em comparação com os resultados experimentais, linha vermelha para a densidade de energia de uma cavidade de corpo negro, mostrando a famosa chamada catástrofe do ultravioleta 22 Indo direto ao ponto, a grande sacada dele foi “modificar” 2 a lei de equipartição de energia clássica, que atribuía uma energia média3 kT para ondas estacionárias, onde k é a constante de Boltzmann. Planck supôs que a energia distribuída para cada partícula que compunha a rede cristalina de um sólido deveria ser dividida em quantidades mínimas, os quanta de energia. Dessa forma, foi necessário associar uma frequência para os minúsculos osciladores, as partículas em vibração, tal que essa energia mínima fosse diretamente proporcional a , de tal forma que sua energia média total tendesse a zero quando a frequência tendesse ao infinito e que também conservasse o resultado clássico para baixas frequências.4 A fórmula que 2 No sentido de não tratar de maneira contínua, mas sim discreta. 3 A energia cinética é kT/2 e a energia potencial tem o mesmo valor, o que nos leva a energia total média igual a kT. 4 No curso de Eletromagnetismo, você estudará com detalhes como a radiação eletromagnética interage com um átomo. Quando a onda eletromagnética incide sobre um átomo, tanto o campo elétrico como o campo magnético interagem com os elétrons livres do átomo. Para uma onda plana, sendo v a velocidade do elétron, a interação magnética é v/c vezes a interação elétrica. Portanto, para velocidades não relativísticas (v<<c), o efeito do campo magnético pode ser desprezado. Em regiões do espaço que são pequenas quando comparadas ao comprimento de onda, onde 23 Planck obteve para a densidade de energia u (por unidade de volume) foi5 A radiância espectral fica escrita como A constante de proporcionalidade h, a famosa constante de Planck, foi calculada em seguida, cujo valor é h = 6,63 x 10 -34 J s. De acordo com sua suposição inicial, a energia de vibração do elétron no sólido era , 2 , 3 , etc.; ou seja, a energia total dos osciladores seria distribuída em quantidades finitas . Assim, a diferença entre dois níveis consecutivos de energia é as variações são desprezíveis, o campo elétrico pode ser escrito, em módulo, como . Dessa forma, um elétron livre com carga e que interage com um campo dessa forma experimenta uma força de módulo , executando uma oscilação forçada. Se não houvesse interação com o campo, ele permaneceria com , que é a freqüência natural do oscilador, isto é, não amortecida. Podemos concluir que o elétron absorverá toda radiação incidente sobre ele quando , ou seja, na ressonância de energia. 24 sempre Em suma, Planck obteve que os possíveis estados de energia6, os estados quânticos, onde o número inteiro n é chamado número quântico principal, são EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – A TEORIA DA RADIAÇÃO DOS CORPOS NEGROS DE PLANCK Obtenha a densidade de energia de Planck em termos do comprimento de onda . Resolução Basta substituir em Isso nos leva a Supondo que a superfície do sol se comporta como um corpo negro tal que emita radiação cujo comprimento de onda máximo observado seja . Calcule sua temperatura e a seguir sua radiância irradiada por metro quadrado. 6 Uma explicação desse termo ficará mais clara em “Modelo de Bohr”. 25 Resolução Para calcular a temperatura da superfície do sol, utilizamos a lei de Wien, a qual nos fornece . Em seguida, a partir da lei de Stefan, obtemos trivialmente que a radiância irradiada por metro quadrado é . Mostre que a razão entre a radiância espectral e a densidade de energia de Planck é c/4. Resolução Basta tomar o quociente entre as duas últimas equações da aula. O resultado é imediato. 26 Obtenha o comportamento da densidade de energia de Planck para o limite de altas energias. Resolução No limite de altas energias, temos que , o que nos leva a desprezar o segundo termo do denominador em . Portanto, nesse regime, EXERCÍCIOS PROPOSTOS 1. Escreva a radiância espectral de Planck em função do comprimento de onda . A seguir, integrando a radiância sobre todos os seus valores possíveis, escreva a constante da fórmula de Stefan-Boltzmann em função de constantes universal: 27 2. Considerando que a superfície do sol tem área de aproximadamente , estime a energia total irradiada por unidade de tempo por metro quadrado. 3. Deduza a lei de Wien a partir da equação de Planck. 4. Supondo que a superfície de uma estrela se comporta como um corpo negro tal que emita radiação cujo comprimento de onda máximo observado seja á , calcule sua temperatura e a seguir sua radiância irradiada por metro quadrado. 5. Suponha que a área superficial de um corpo humano de altura h pode ser aproximada para um cilindro também de altura h e raio R = h/15. Calcule a potência irradiada por metro quadrado de um indivíduo de altura h=1,7m tal que seu corpo esteja em equilíbrio térmico com o ambiente, estimado que o corpo emita radiação com comprimento de onda até 0,00001 m. (Lembre-se de que a temperatura deve estar em K.) Compare esse valor com o obtido para o sol, por exemplo! 28 1.2.1 A Dedução da Energia Média de Planck Na seção “A teoria da radiação de corpos negros de Planck”, numa nota de rodapé, foi comentado sobre a lei clássica da equipartição de energia. Olhando com atenção para as fórmulas de Rayleigh-Jeans e Planck para a radiação de corpos negros, nota-se que a energia média do caso clássico, foi substituída por . O objetivo dessa aula é mostrar como fazer essa dedução. Uma quantidade média pode ser obtida tomando-se a soma de todas as quantidades possíveis multiplicadas cada uma por sua respectiva probabilidade de ocorrer e dividindo-a pela soma de todas as probabilidades possíveis. Ou seja, para calcular a energia média de Planck, tomemos 29 Da distribuição de Boltzmann da teoria cinética clássica, é possível deduzir que Levando em conta que , como propôs Planck, recebemos Com a substituição , tal que segue que Mas, 30 Assim, Finalmente, chegamos à Note que quando foi dito que Planck “modificou” a lei da equipartição de energia, esta expressão foi usada para ressaltar que a energia clássica para cada ente contido na cavidade, a onda estacionária eletromagnética, não era mais , resultado oriundo do eletromagnetismo clássico. Agora, a energia média do conjunto de osciladores que constituem o corponegro deve ser dada pela fórmula acima. 31 1.1.2 Recuperando o Clássico A fórmula clássica para a radiação de corpos negros foi proposta por Rayleigh-Jeans. Como você já sabe, ela era inconsistente para o limite de baixas frequências; tal fato é conhecido como “catástrofe do ultravioleta”. Entretanto, a fórmula de Planck (3 da seção “A teoria da radiação de corpos negros de Planck”) corrige este erro, concordando totalmente com a experiência. Ao invés de deduzirmos a fórmula de Rayleigh-Jeans utilizando as leis do eletromagnetismo clássico, vamos tomar o limite na própria fórmula de Planck, com , tendo consciência da ordem histórica que as coisas aconteceram. A ideia utilizada para deduzir era considerar o resultado da teoria eletromagnética clássica de que a radiação existente 32 dentro de um corpo negro deveria existir na forma de ondas eletromagnéticas estacionárias com nós em suas paredes. Contando-se o número dessas ondas dentro de um intervalo de frequências, é possível, com o suporte da teoria cinética clássica, obter sua energia total, claro, com o sistema em equilíbrio térmico, a qual depende da temperatura absoluta T do corpo. Logo, multiplicando-se a quantidade de ondas pela energia total média e dividindo pelo volume do corpo, obtém-se a fórmula acima. 33 2-PROPRIEDADES CORPUSCULARES DA RADIAÇÃO 34 2.1 INTRODUÇÃO Nessa unidade estudaremos processos de interação entre a radiação a matéria. O efeito fotoelétrico, o efeito Compton e a produção de pares envolvem absorção ou espalhamento de radiação pela matéria. O efeito bremsstrahlung e a aniquilação de pares envolvem a produção de radiação. Em cada caso é mostrado que a radiação se comporta como uma partícula quando interage com a matéria e isso é diferente do seu comportamento ondulatório, apresentado quando se propaga. Antes de atacarmos a dualidade onda-partícula, lembremo-nos de como os conceitos de onda e partícula são definidos na Física clássica. Quando falamos em onda, talvez a primeira coisa que nos vêm à mente é o mar. Ele e suas ondas são fontes de inspiração dos mais macios amores e das mais ardentes paixões; de lá surgem nossas sereias e canções, como “Azul da cor do mar”, de Tim Maia, “É doce morrer no mar” e “O mar”, de Dorival 35 Caymmi, dentre outras. Emoções à parte, fisicamente as ondas são propagações de energia e quantidade de movimento que ocorrem no espaço, em associação com a vibração das moléculas e/ou átomos que o compõem7. As ondas não descrevem um percurso, uma trajetória; elas são espalhadas, não se localizam em um ponto do espaço. Elas, ainda, são indivisíveis, no sentido de não podermos parti-las e obtermos mais delas. Em geral, as ondas se caracterizam em fenômenos como a difração e a interferência. Respectivamente, consistem grosseiramente no seu espalhamento quando passam por obstáculos da ordem de grandeza de seu comprimento de onda e na soma ou subtração de suas amplitudes quando duas ou mais ondas se encontram. As partículas podem ser definidas como qualquer objeto cujas dimensões espaciais podem ser desprezadas quando em comparação com as do sistema. Por meio da segunda lei de Newton, é possível descobrir todo o passado e ainda prever o 7 Ondas eletromagnéticas podem se propagar no vácuo. 36 futuro de uma partícula, dadas certas condições iniciais. Lembre-se de que por passado e futuro designamos sua trajetória, a qual é descrita por uma curva bem definida no espaço-tempo; é possível, portanto, localizar pontualmente uma partícula. Relembradas as definições de onda e partícula, vamos ao que interessa. A natureza mostra que é impossível que um fenômeno seja corpuscular e ondulatório ao mesmo tempo. Como veremos, algumas experiências evidenciam o caráter corpuscular da radiação e outras o comportamento ondulatório da partícula. É certo que isso gera estranheza! Em outras palavras, a dualidade onda-partícula diz que DEPENDENDO DO ARRANJO EXPERIMENTAL, O SISTEMA QUÂNTICO OU SE MANIFESTA CORPUSCULARMENTE OU EXIBE SEU ASPECTO ONDULATÓRIO, EMBORA NUNCA AMBOS AO MESMO TEMPO. 37 Mas como assim? A natureza manifesta caráter corpuscular ou ondulatório; de que evidências vem isso? E onde será que entra a quantização da energia nessa estranha história? No decorrer da leitura, serão encontradas respostas a esses questionamentos. 2.2 O ANO DE 1905 E O EFEITO FOTOELÉTRICO 8 No seu trabalho de 1905, “Sobre um ponto de vista heurístico a respeito da produção e transformação da luz”, Albert Einstein essencialmente explorou a ideia de que a luz pudesse ser constituída por partículas, indagando-se por que a radiação deveria ser contínua, preenchendo o espaço em forma de ondas. Mais tarde, quando obteve a famosa relação entre massa e energia (E=mc²) avigorou ainda mais sua busca por uma teoria corpuscular para a luz. 8 Propõe-se como atividade a pesquisa sobre fotocélulas. 38 Primeiramente, então, concentrou-se em analisar a radiação dos corpos negros. Entretanto, Einstein não se baseou na ideia de Planck, como alguns livros apontam; lembre-se de que Planck quantizou a energia dos osciladores, e não da radiação incidente! Foi inspirado pela relação de Wien, fazendo uma análise estatística da radiação, que Einstein provou que a luz se comportara como um gás de partículas independentes, concluindo que a energia de cada partícula era diretamente proporcional à frequência da radiação. Com o êxito alcançado, ele dispôs dessa relação para tentar explicar fenômenos que a teoria ondulatória era incapaz de fazer, como o efeito fotoelétrico. Esse efeito foi observado pela primeira vez por Heinrich Hertz e consiste na emissão de elétrons por uma superfície metálica devido à incidência de luz sobre ela. Referindo-se aos quanta de luz como pacotinhos indivisíveis de energia, os quais mais tarde vieram a ser chamados de fótons, Einstein supôs 39 que a energia de cada fóton era expressa pela relação (onde C é uma constante a ser determinada). Figura 2.1: Emissão de elétrons por uma superfície metálica devido à incidência de luz sobre ela. Segundo Einstein, o elétron tem sua energia cinética aumentada devido à incidência do fóton sobre a superfície metálica, o qual transfere toda sua energia a ele. A experiência mostra que existe certo valor máximo para a energia cinética adquirida pelo elétron, que é igual a . Na relação anterior, e é a carga e V0 é a diferença de potencial limiar aplicada ao elétron. Elétrons ejetados Superfíci e metálica Radiação incidente 40 Em geral, quando há a emissão de um elétron, sua energia cinética é a diferença entre a energia do fóton incidente e o potencial atrativo da placa, superando as perdas de energia devido às colisões internas com outros elétrons: (onde w é o trabalho necessário para remover o elétron do metal). Fazendo w0 o trabalho mínimo para desprender o elétron, sua energia cinética será máxima e, utilizando o resultado experimental, obtém-se que . A explicação da Física clássica previa que o aumentoda intensidade da luz (o módulo do vetor campo elétrico cresce) faria a energia cinética máxima crescer, aumentando a corrente fotoelétrica. Einstein mostrou que aumentando a intensidade da luz, somente seria maior o número de fótons incidentes, o que não mudaria a energia associada, que é . Outra falha da teoria clássica é que ela não explicava a existência de uma frequência limiar característica de cada superfície. Einstein facilmente demonstrou que se K = 0, o fóton transferiria ao 41 elétron uma energia responsável somente por sua ejeção, sem nenhuma sobra de energia cinética. Apesar da majestosa beleza e precisão do trabalho, a ideia de Einstein somente prosperou em 1907, quando ela foi capaz de explicar a ionização de gases pela radiação ultravioleta e formular uma teoria para o calor específico de sólidos a baixas temperaturas. No entanto, isto é assunto para outra hora. *Ainda não sabemos quem é a constante ! Ela será calculada num exercício resolvido. Um fóton nada mais é do que um pacote indivisível que contém energia hν e momentum h⁄λ. O efeito fotoelétrico manifesta o comportamento corpuscular da radiação; o conceito de fóton sugere que a radiação 42 eletromagnética interage como uma partícula quando em colisão com um elétron, transferindo a este toda sua energia e quantidade de movimento. EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – EFEITO FOTOELÉTRICO Escreva uma expressão para o potencial aplicado ao elétron de uma rede em termos da frequência do fóton da radiação incidente. Resolução Sabemos que . Logo, dividindo ambos os lados da equação pela carga do elétron, é imediato que Sabe-se que o limiar de frequência para o sódio (um dos resultados de experiências realizadas por Millikan) é 43 . Estime o valor da constante , tendo que, para as frequências e , o potencial vale, respectivamente, e . Resolução Reescrevendo a equação para acima, recebemos Para o primeiro dos casos, temos Faça você o segundo e verifique que o resultado é coerente. Considerando os dados do sódio acima, verifique se um fóton de cor violeta, cuja frequência vale , fornece 44 energia suficiente para arrancar um elétron da superfície nessa experiência. Resolução É imediato que sim, pois . 2.3 EFEITO COMPTON No início da década de 20 do século passado, o físico americano A. H. Compton observou e analisou o efeito denominado como efeito Compton, o qual consiste no espalhamento de radiação eletromagnética por elétrons livres. Tal como o efeito fotoelétrico, ele mostra o comportamento de partícula da radiação, desde que este espalhamento seja visto como uma colisão entre o fóton incidente e o elétron. Assim, o fóton transfere tanto energia como momento para o elétron durante a colisão, o que, pela conservação da energia, requer que o fóton espalhado tenha energia menor do que o fóton incidente. Acesse o link abaixo para visualizá-lo. 45 http://www.unb.br/iq/kleber/EaD/Fisica-4/Aulas/Aula- 19/fig19-1c.gif Sabendo que a massa de repouso do fóton é nula, sua energia antes da colisão é e depois . Por outro lado, o elétron antes da colisão tem energia cinética nula e, portanto, energia total igual à sua energia de repouso, isto é, ; depois, . Logo, pela conservação da energia, temos 46 Agora, pela conservação da quantidade de movimento ao longo da horizontal, recebemos e, pela vertical, . Elevando ambas ao quadrado e em seguida somando-as Levando em conta a equação relativística para o elétron, proposta por Paul Dirac em 19279, temos Desse modo, substituindo as duas primeiras equações nesta anterior e, em seguida, realizando uma álgebra simples, concluímos que o deslocamento Compton é onde o comprimento de Compton é definido por . Note que a constante de Planck pode ser calculada da relação acima 9 A energia relativística do elétron é . Como , segue a relação acima. 47 também! De fato, com a confirmação experimental, a hipótese do pacotinho concentrado de energia é assegurada mais uma vez. Compreendido este efeito, brinque um pouco no link abaixo: http://www.if.ufrgs.br/~betz/iq_XX_A/efCompt/apsEC/ec_10_ 08_05.swf EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – EFEITO COMPTON A energia cinética transferida ao elétron é . Reescreva-a em termos do deslocamento Compton e do comprimento de onda da radiação incidente. Resolução 48 Vimos que, no efeito fotoelétrico, o elétron está ligado à superfície, e que, se o fóton incidente não tem energia suficiente para removê-lo, ele continua ligado, tendo sua energia cinética aumentada. Lembrando que o efeito Compton foi observado apenas para elétrons livres, discorra acerca disto. Resolução Note que na expressão do deslocamento Compton, o termo do denominador leva em conta a massa de repouso do elétron. Se este está ligado a uma estrutura maior e mais pesada (um átomo), é imediato que o deslocamento passa a ser desprezível, notado que o (1- uma ideia da ordem de grandeza envolvida, para o carbono, por exemplo, a massa de repouso do elétron é cerca de 22000 vezes menor do que a do átomo, o que gera um deslocamento de cerca de um milionésimo de angstrom. 49 2.4 PRODUÇÃO E ANIQUILAÇÃO DE PARES E SIMETRIA CROSSING 2.4.1 Partículas e Antipartículas Como veremos, aniquilação de pares é outro fenômeno que evidencia o caráter corpuscular da radiação. Mas, antes de o tratarmos quantitativamente, é importante ter o conceito de antipartícula entendido, o qual é fundamental para tal análise. Vejamos como esta ideia surgiu. No desenvolvimento da teoria relativística do elétron, um gigante da Física, Paul Dirac, em 1927, chegou a um resultado bastante curioso: , o qual admitia uma solução positiva e outra negativa para a energia do elétron. A primeira tentativa para contornar a existência dos estados de energia negativa foi a própria modificação da teoria ou a introdução à mão de algum postulado ou condição que os proibisse. Entretanto, ele percebeu que esse não era o caminho 50 correto e passou, portanto, a aceitá-los, procurando então por alguma interpretação física para eles. Levando em conta o princípio de exclusão de Pauling10, que diz que dois elétrons não podem existir num sistema cujo estado quântico é o mesmo, Dirac observou que, se os elétrons possuem todas as energias negativas permitidas do sistema, os que tivessem energia positiva não poderiam sofrer nenhum tipo de transformação, emitir radiação eletromagnética e ocupar uma vaga com energia negativa, pois isto violaria o princípio da exclusão. Daí surgiu a ideia do mar de elétrons! Essa hipótese era necessária, pois o Universo seria preenchido por esse mar, o qual não observamosporque está em toda parte, tal que seus buracos (falta de elétrons), caso existissem, deveriam ser preenchidos pelos elétrons com carga positiva, os quais deveriam ser observados experimentalmente. Mas havia um problema com essa proposta: na época só se conheciam elétrons e prótons, cuja massa era da ordem de 10³ vezes maior 10 Será contemplado na Unidade 2. 51 do que a do primeiro. Logo, devido à grande diferença, o próton não poderia ser a “antipartícula” do elétron, como Weyl observou a Dirac. Somente anos depois, a antipartícula do elétron foi observada, a qual foi batizada por pósitron, cuja representação é . Atualmente, em linguagem moderna, a extensão do mar de elétrons de Dirac para outras partículas pode ser expressa como: PARA CADA PARTÍCULA CORRESPONDE UMA ANTIPARTÍCULA DE MESMA MASSA, PORÉM DE CARGAS ELÉTRICAS IGUAIS EM MÓDULO E DE SINAL CONTRÁRIO. 52 2.4.2 Aniquilação de Um Par Elétron – Pósitron Em Dois Fótons Considere um par elétron-pósitron tal que eles estejam a uma distância suficiente para que haja interação. Antes Depois Considerando que o par estava em repouso antes da interação, a conservação da quantidade de movimento nos leva a concluir imediatamente que . Logo, é trivial que . Então, pela conservação da energia, recebemos que a energia de cada fóton vale a energia de repouso do elétron (ou do pósitron, se preferir, afinal eles têm a mesma massa de repouso!), isto é . 2.4.3 Simetria de Crossing: Um Sabor de Teoria Quântica de Campos No nível prático, a simetria de crossing pode ser entendida da seguinte forma: dado que o processo ocorre, é possível torcer/girar a partícula de um lado para o 53 outro da reação, desde que ela seja trocada, substituída por sua antipartícula . Assim, desde que todos os princípios de conservação sejam satisfeitos, é permitido, por exemplo, que ocorram também os processos e Em geral, a simetria de crossing se manifesta na igualdade abaixo, onde , a grosso modo, é uma amplitude de probabilidade de que se ocorra o processo da partícula de momento interagindo com outras partículas e dando como resultado, em geral, outras. Ou seja, a amplitude de espalhamento para qualquer processo que envolva inicialmente uma partícula com momento é a mesma que para o processo “torcido e/ou girado” com sua antipartícula com momento – no estado final; o que, segundo a interpretação de Feynman, significa que a antipartícula viaja para o passado com momento igual em módulo, porém com sentido contrário ao momento da partícula. Nesse contexto, é 54 possível dizer que o efeito Compton é o mesmo processo que a aniquilação de pares, embora sejam fenômenos totalmente diferentes. Vejamos como essa simetria se aplica para o Efeito Compton e para a aniquilação de pares. Como você já deve ter ouvido falar, existem quatro forças fundamentais na natureza: as forças nucleares forte e fraca, cujo domínio está no núcleo da matéria; a gravitacional, que é descrita pela teoria da gravitação de Newton e sua generalização é a teoria da relatividade geral de Einstein; e a eletromagnética, descrita classicamente pelas equações de Maxwell e, a nível quântico, pela TQC, a qual foi elaborada por grandes nomes da Física, como Richard Feynman. Cada uma delas é intermediada pelo que os físicos chamam de partícula mediadora. A nuclear forte é intermediada por glúons, enquanto a fraca, por bósons W e Z; a gravitação, por grávitons, e a eletrodinâmica pelos nossos velhos conhecidos fótons. Feynman propôs uma forma muito interessante e acessível de se representar essas interações, através dos 55 diagramas de Feynman. Vejamos como representar o efeito Compton (esquerda) e a aniquilação do par elétron-pósitron (direita) segundo esse formalismo. As linhas sólidas representam elétrons; as onduladas, fótons. No primeiro diagrama o elétron de momento interage com o fóton de momento , dando como resultado um elétron de momento e um fóton de momento . No seguinte diagrama, é a quantidade de movimento do pósitron, a antipartícula do elétron, viajando para o passado, que interage com o elétron de momento , tal que elas produzem um par de fótons, com momento e . Por convenção, o tempo flui no sentido vertical de baixo para cima. 56 Sem entrarmos em nenhum detalhe sobre como calcular a amplitude de espalhamento deste processo, limitemo-nos em ver a cara de seu resultado, o qual é dado basicamente por11 Por outro lado, a amplitude para o processo de aniquilação elétron-pósitron é Se torcermos o segundo vértice do diagrama que representa a aniquilação, recebemos um diagrama semelhante ao primeiro (confirme você). Note agora que, se fizermos neste “novo diagrama” do efeito Compton as substituições abaixo, 11 Optei por manter a consistência tensorial da fórmula. Não se preocupe em entendê-la, mas somente como fazer as substituições mencionadas acima. 57 que é o que diz a primeira fórmula desta secção, a nova amplitude para esse processo é basicamente igual à amplitude da aniquilação ! Assim, verifica-se que as regras de Feynman contêm a simetria de crossing. Além disso, podemos abusar um pouco e dizer que apesar desses dois fenômenos serem totalmente diferentes no laboratório, eles “são o mesmo processo”! Quem sabe você não toma gosto por isso e já começa a traçar planos para uma Pós em Física de partículas?! EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – PARTÍCULAS, ANTIPARTÍCULAS E SIMETRIA DE CROSSING Na aniquilação do par elétron-pósitron resolvido no texto, calcule qual o comprimento de onda associado ao fóton com . Resolução 58 Considerando o arranjo da questão anterior, discuta sobre os comprimentos de onda dos fótons. Resolução Sendo o sistema configurado como dito, a energia do par antes da aniquilação é somente de repouso. Entretanto, havendo alguma energia cinética K, a energia E seria maior e, portanto, os comprimentos de onda dos fótons seriam menores. No resultado anterior, por exemplo, os fótons emitidos se encontram na região do infravermelho; logo, não conseguiríamos enxergá-los. 59 3-PROPRIEDADES ONDULATÓRIAS DAS PARTÍCULAS 60 3.1 As ondas de De Broglie Depois do Efeito Fotoelétrico e Efeito Compton, não restava dúvida de que de fato ondas poderiam se comportar como partículas em certas situações. Apesar disso, até meados da terceira década do século passado, era confuso e divergente o entendimento acerca do comportamento dualístico da radiação. Inicialmente envolvido em estudos sobre a natureza dos raios X, os irmãos Louis e Maurice de Broglie estavam certos da necessidade de uma teoria que conciliasse ambos os aspectos. Em 1924, Louis de Broglie defendeu umas das mais importantes teses de doutoramento do século passado. O coração de sua ideia foiassociar uma espécie de sombra que acompanha a partícula. Essa sombra é uma onda que está ligada à probabilidade da partícula produzir efeitos observáveis, como a interferência, por exemplo. Em outras palavras, de Broglie postulou que partículas têm natureza ondulatória, associando a elas um comprimento de onda E: 61 . mv) o caráter ondulatório da matéria só seria perceptível para massas extremamente pequenas. Ou seja, seria um absurdo propor que se atirássemos inúmeras bolas de tênis numa fenda única, haveria difração. A interpretação para sua onda ainda não estava nem próxima de ser bege em suas publicações (dizer clara seria tão extravagante quanto a própria ideia de De Broglie para a época). Somente em 1927, ele apresentou o que chamou de “onda piloto” como tentativa de clarear seu postulado: sua ideia permitia compreender como um elétron se comportava como onda quando se movia e como partícula quando é emitido ou absorvido. Essa interpretação era consistente com seu modelo, pois ele associava dois tipos de ondas diferentes ao elétron: uma onda concentrada em torno de um ponto que localizava a energia da partícula e outra espalhada pelo espaço que dirigiria seu movimento. 62 A hipótese de De Broglie foi comprovada em 1927 (3 anos após a data em que De Broglie fez sua proposta), por Davisson e Germer ao estudarem a natureza da superfície de um cristal de Níquel. Eles perceberam que ao incidirem um feixe de elétrons (partículas) contra a superfície, ao invés de haver reflexão difusa, houve uma reflexão similar à observada na incidência de raios X. A incidência de raios X num cristal gera uma forte reflexão a certo ângulo de tal maneira que haja interferência construtiva e um reforço seja perceptível. Analisando os ângulos nos quais isso acontecia para o Raio X e os ângulos nos quais isso acontecia para os elétrons, percebeu- se que nessas situações os elétrons possuíam o exato comprimento de onda proposto por De Broglie. Ora, então De Broglie estava certo! A interferência construtiva observada nos cristais NUNCA ocorreria de acordo com a teoria corpuscular do elétron. Isto rendeu um Nobel para Louis de Broglie em dois anos, confirmando a existência das ondas de matéria. 63 Nos exercícios resolvidos, ficará claro porque é impossível para nós percebermos o nosso próprio comportamento de onda! Isto está ligado ao valor da constante de Planck. De fato, ele impõe um limite entre o nosso mundo e o microscópico. EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – ONDAS DE MATÉRIA Qual o comprimento de onda do seu/sua amado (a) quando ele/ela corre para os seus braços? Para calcular esta quantidade, estime sua massa em kg e suponha que sua velocidade de corrida seja 5 m/s. Resolução Se minha namorada pesa 55 kg, correndo a 7 m/s, sua quantidade de movimento será . E do/da seu/sua? 64 Seja um elétron com energia cinética igual a 100 eV. Qual seu comprimento de onda? Compare esse valor com o obtido no exercício anterior. Resolução O momento de um elétron com energia cinética T é . Então, Assim, Isso nos leva a concluir que nosso comprimento de onda de De Broglie é extremamente pequeno quando comparado ao do elétron. Perceba o poder da constante de Planck. O mundo microscópico vive coisas que não estão ao nosso alcance, mas 65 somente da nossa capacidade de abstração na tentativa de entendermos o mundo em que vivemos! EXERCÍCIOS PROPOSTOS 1. Uma arma dispara um projétil de 20 g a uma velocidade de 500 m/s . Determine o comprimento de onda de De Broglie associado ao projétil e explique por que o caráter ondulatório não é aparente nessa situação. 2. Um microscópio eletrônico pode resolver estruturas de pelo menos 10 vezes o comprimento de onda de De Broglie do elétron. Qual é a menor estrutura que pode ser resolvida num microscópio eletrônico, usando elétrons com energia cinética de 10000 eV? 66 4-SOBRE O ÁTOMO 67 4.1 O MODELO DE BOHR Os pioneiros na investigação da estrutura da matéria foram os filósofos gregos, os quais utilizaram a palavra átomo para designar o indivisível, a mínima parte, o quantum da matéria. Hoje sabemos que, menor do que ele existem os quarks, os glúons, os elétrons, dentre outras tantas, ditas elementares. Dando um grande salto na história, passando pelo calórico pudim de passas de Thompson, chegamos ao modelo do átomo de Rutherford, inspirado no modelo planetário. A ideia era bastante sofisticada para a época (1900): um átomo com um núcleo pequeníssimo e pesado, detentor de cargas positivas, tal que girando em torno dele havia os elétrons, cujas cargas eram negativas. Mas para que pouca complicação se era possível complicar mais? Niels Bohr interessou-se por tentar explicar o espectro descontínuo dos gases, que emitiam luz em determinadas frequências (o que sugeria que a vibração dos elétrons dentro 68 do átomo deve ser dada em determinadas frequências – perceba a semelhança com a sugestão de Planck para os corpos negros), e inspirado no modelo de Rutherford, Bohr postulou o seguinte: i. só é possível ao átomo permanecer em forma estável em um conjunto descontínuo de valores de energia, ditos estados estacionários. Assim, uma mudança de um para qualquer valor dessa série deve acontecer de maneira completa, incluindo emissão e absorção de radiação eletromagnética; ii. a relação define que a energia da radiação (absorvida ou emitida) mediante uma transição completa entre dois estados, “a” e “b”, é proporcional à frequência desta radiação, onde e são as respectivas energias em cada estado. No fundo o primeiro postulado, quantiza o momento angular do elétron, dizendo que ele é um múltiplo inteiro da constante de 69 , o qual deve ser constante para cada estado, ou órbita (não significa que são sinônimos!), visto que a força que atua neste sistema é central, a força de Coulomb. Note que ele também viola a Física clássica, pois, como você já estudou num curso de eletromagnetismo, toda carga acelerada irradia, desde que essas órbitas estacionárias que os elétrons percorrem tenham sentido clássico12, isto é, são circunferências com raio bem definido (isso será deduzido a seguir). Portanto, desde o momento angular, a energia, a velocidade da órbita e o raio sejam quantizados, é imediato que os espectros dos átomos também o são. Já o segundo postulado diz que quando um elétron cai da órbita “a” para uma “b” de menor raio, é emitida radiação com tal energia. Por outro lado, se o elétron recebe certa energia, ela deve ser suficiente para que vença o potencial de ligação com o núcleo e chegue até o raio de órbita maior; do contrário, ele somente adquire mais energia cinética de rotação, não 12 Entender isso fisicamente não é tão simples quanto dizer. Ao longo do curso você perceberá... 70 mudando, portanto, seu raio de órbita. Um ponto importante a ser percebido é que as frequências associadas à transição de estados e ao movimento do elétron não são as mesmas em princípio! Outra curiosidade é que Bohr não utilizou o termo quantumde luz, como Einstein o fez; no entanto, utilizamos essa denominação... o fóton nos persegue! Como será visto nas próximas seções, os resultados de Bohr foram divisores de água na pesquisa da Física, tanto teórica quanto experimental. E apesar de seus resultados não serem aplicáveis a estruturas mais complexas, isto não tira 71 nenhum mérito deste genial físico! Veremos também como Sommerfeld o refinou. Discussão Quantitativa do Modelo de Bohr A segunda lei de Newton aplicada ao elétron levando em conta a condição de estabilidade do átomo (isso contraria a Física clássica, no sentido de que toda carga acelerada deve irradiar), algo inegável, nos fornece. Então a energia cinética do elétron vem dada por Por outro lado, a energia potencial, considerando que ela é nula quando o elétron está muito longe do núcleo, o que é 72 razoável, já que a força de Coulomb vai com o inverso do raio ao quadrado, será onde o sinal negativo indica que o potencial é atrativo. Isolando a velocidade na expressão do momento angular, obtendo r, e substituindo-a na segunda lei, chegamos a. com . Logo, desde que a energia total seja , e substituindo em e , concluímos que o espectro da energia vem dado por 73 para . Para o átomo de hidrogênio (Z=1), a energia do estado fundamental (n=1) é -13,6 eV. À medida que o número quântico principal n aumenta de valor a energia, se aproxima cada vez mais de zero negativamente. Veja como representar isso num diagrama. Níveis de energia para H. Visite essa simulação abaixo! http://www.walter-fendt.de/ph14br/bohrh_br.htm 74 4.2 LINHAS ESPECTRAIS DO HIDROGÊNIO Na época já era bem conhecido o espectro do hidrogênio, entretanto, nem o modelo de Bohr foi capaz de explicar a sua estrutura fina. Em outras palavras, ainda não se sabia como explicar o fato de algumas linhas do espectro estarem muito próximas umas das outras. Veja a Figura abaixo – aparelhagem usualmente utilizada para se medir espectros. Lembre-se de que Newton foi o primeiro a observar que a luz branca do sol se dividia em várias outras cores ao passar por um prisma? Talvez você consiga observar também somente com uma fresta deixada pela cortina. De maneira empírica, Balmer conseguiu escrever uma fórmula para a série do hidrogênio, tal que corresponde à faixa de 75 comprimentos de onda na região do visível e também próximo ao ultravioleta. De forma análoga, Lyman, para a região do ultravioleta e Paschen, para o infravermelho obtiveram que Sommerfeld, ao tentar aprimorar o modelo de Bohr, utilizou a relatividade restrita ao invés da mecânica puramente 76 clássica13, substituindo as órbitas circulares por elípticas. Assim sendo, ele conseguiu explicar a existência da tal estrutura fina. Voltaremos a falar dela mais adiante do nosso curso, quando resolvermos a equação de Schroedinger em coordenadas esféricas, de tal forma que os números quânticos apareçam naturalmente (o número quântico principal n já vem da quantização da energia), incluindo o princípio de exclusão de Pauling. Até esse momento, vemos que conceitualmente a teoria quântica precisa ser mais desenvolvida, pois ela ainda mistura aspectos clássicos e estes novos princípios e resultados que temos visto ao longo de nossos estudos. Na próxima aula, vamos tentar começar a organizar as coisas. EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – SOBRE O ÁTOMO 13 Deixo para um trabalho de fim de curso o estudo das contribuições de Sommerfeld, incluindo as regras de seleção e seu modelo atômico. 77 Utilizando a fórmula de Bohr, calcule a energia de ligação (em J e eV) para os níveis de 1 até 5. Lembre-se de que . Em seguida, calcule os comprimentos de onda do fóton emitido na queda da órbita do quarto nível para o terceiro, segundo e primeiro (fundamental). Resolução Em joules, para o átomo de Hidrogênio (Z=1), a energia fica ; em eV, . Então em joules de n=1 até n=4, temos, respectivamente: Isto é Logo, 78 Como , segue que Verifique você que a fórmula de Balmer é satisfatória para a transição 4,2! Utilize a de Lyman para 4,1 e a de Paschen para 4,3 e veja a mágica que eles fizeram! 4.3 OS FORMALISMOS DA TEORIA QUÂNTICA A década de 20 do século passado foi crucial para o desenvolvimento da Teoria Quântica. Em 1926, Erwin Schroedinger, tendo estudado a tese de De Broglie, com uma sequência de artigos publicados, chegou à famosa Equação de onda de Schroedinger. Basicamente, ele modificou a ideia de que os elétrons descreviam órbitas circulares bem definidas propondo que estes não poderiam ser bem localizados, 79 ocupando todo o espaço em torno do núcleo em forma de uma nuvem, um mar em 3D, algo semelhante às ondas sonoras em um tubo. Com esta equação, Erwin recuperou os resultados de Bohr para o átomo de hidrogênio e também resolveu (mas não foi o único) o oscilador harmônico simples. Em paralelo com mecânica ondulatória de Schroedinger, mas de forma independente, outros grandes físicos desenvolviam outra abordagem para a Teoria Quântica: a mecânica matricial. Werner Heisenberg, Max Born e Pascual Jordan se apoiavam na hipótese de que a Física devesse trabalhar com grandezas observáveis e mensuráveis. A construção desse formalismo nem sequer questionara sobre a estrutura dos átomos, mas buscava por quantidades que deveriam ser básicas na teoria. Apesar de muito diferentes tanto nos aspectos conceituais como no formalismo matemático, ambas as teorias levavam a alguns resultados iguais, como o espectro do oscilador 80 harmônico simples. Portanto, surge uma pergunta chave: ambas as descrições da natureza são compatíveis? A resposta é sim: a Teoria Quântica é uma só, e ambas são maneiras diferentes de se descrever a mesma coisa. A Teoria Quântica é sustentada e blindada por dois princípios fundamentais: i. o princípio da complementaridade de Bohr, anunciado em setembro de 1927; ii. o princípio da incerteza de Heisenberg, publicado em março de 1927. 4.4 PRINCIPIOS DA CMPLEMENTARIEDADE E INCERTEZA 4.4.1 O Princípio da Complementaridade Neste intrigante cenário em que os físicos mais se bagunçavam do que organizavam e ligavam os fatos, Bohr teve 81 papel de retalhador. Vimos anteriormente que a radiação possui propriedade de partícula quando em interação, pois podemosassociar a ela uma energia que viaja no espaço em forma de pacotinhos concentrados, os fótons, os quais transferem toda essa energia em uma colisão. Lembre-se de que Einstein não procurou por uma onda que regesse o movimento da radiação no espaço, e sim explicou a emissão de elétrons devido à incidência da luz sobre numa placa metálica, onde os elétrons estavam inicialmente tranquilos, sossegadinhos. Por outro lado, a evidência de que os elétrons possuam uma forma de onda que evidenciasse efeitos típicos de onda, como sua difração observada por Thompson em 1927, constituía o outro lado da moeda. Assim sendo, onda e partícula são faces complementares e excludentes da natureza. Logo, a totalidade da compreensão de um ente físico só é possível quando levamos em conta esses dois aspectos. De fato, como disse Niels Bohr, isso nos mostra o quão limitada é nossa linguagem: ela só serve para descrever 82 coisas que estão ao nosso alcance, o que não ocorre com o mundo microscópico. Nossa maneira de representar o mundo em que vivemos é confinada por nossa incapacidade de abordar descrições que aparentemente são contraditórias, mas que na verdade são complementares e necessárias. Não há paradoxo nenhum, como erroneamente alguns livros introdutórios sobre o assunto mencionam; o que existe é um comportamento dual de tudo o que existe na natureza: a matéria e a radiação. É nesta interpretação a respeito da dualidade que consiste o princípio da complementaridade. 4.4.2 O Princípio da Incerteza No mundo quântico, a palavra fenômeno passa a ter um significado especial: ao contrário do usual, que significa qualquer coisa que possa ser observada, agora ela tem em sua acepção o seguinte: o ente físico; 83 o arranjo experimental, incluindo a aparelhagem e o observador; o experimento realizado, seguido de seu registro e interpretação macroscópicos. O que está por trás do princípio da incerteza de Heisenberg é que todo fenômeno observado é essencialmente diferente do não observado. A incerteza de uma medição é inevitável, é algo intrínseco à própria medida. Por exemplo, quando examinamos o movimento de uma partícula de poeira, é necessário luz para podermos enxergá-la. Então a incidência do fóton de luz fatalmente altera sua posição, pois lhe será transferida energia. Perceba o quão profundo conceitualmente ele é. Werner Heisenberg foi um cientista alemão que se propôs a mostrar, ou exprimir matematicamente, sua tese de que a posição e velocidade do elétron em torno do núcleo do átomo são impossíveis de precisar simultaneamente. Para medir experimentalmente a posição do elétron precisamos de 84 instrumentos de medidas (um dos métodos conhecidos na época consistia de incidir um tipo de radiação sobre o mesmo). Os instrumentos de medida, por sua vez possuem incertezas de medição. Quanto menor a incerteza, mais precisa é a localização do elétron. Suponha uma partícula que move retilineamente e que você mede seu momento p com uma incerteza . Segundo Heisenberg, não é possível determinar sua posição com mais precisão do que . Isto significa que as grandezas físicas são expressas por probabilidades, o que é totalmente contrário à Física clássica. Note que não há restrição quanto à precisão da medida de ou : há restrição quanto ao produto numa medida simultânea. Heisenberg enunciou que o produto da incerteza da posição pela incerteza do momento linear de um elétron não pode ser inferior (em ordem de grandeza) à metade da constante de Planck reduzida. Ou seja: A conclusão é que o elétron não está bem definido na sua órbita do átomo. Quanto mais preciso soubermos sua posição, 85 menos preciso para nós será sua velocidade, tornando assim impossível descrever o elétron em cada instante. Esse enunciado é conhecido como Princípio da Incerteza de Heisenberg Palavras Finais sobre o Começo O objeto que era manipulado na equação de Schroedinger, a função de onda , possuía uma dificuldade natural na sua interpretação, pois ela era dotada ao mesmo tempo de parte real e imaginária (estudaremos isso adiante). As partículas são representadas por funções de onda que nos dizem qual a probabilidade de encontrá-la em algum lugar do espaço ou de possuir certa velocidade ou certa energia. Segundo essa interpretação, a noção de trajetória, oriunda da Física clássica, perde totalmente sentido (você acha que Bohr estava errado na hipótese das órbitas estacionárias de seu modelo atômico? – assunto para o fórum!). Agora, as partículas podem estar em qualquer lugar do espaço a qualquer instante. 86 Evidente que ocorreram inúmeras discussões. O principal protagonista das batalhas intelectuais dos titãs da nova Física foi Bohr. Ele, de um lado, liderava o crescente movimento à adesão da interpretação de Copenhague. De outro, não havia um movimento, mas um grupo de brilhantes físicos que eram contrários à ideia da complementaridade. Einstein não acreditava na descrição probabilística da natureza, posição refletida com sua ilustre frase: “A Mecânica Quântica é de fato imponente. Porém, uma voz dentro de mim diz que ainda não é a verdadeira coisa. A teoria diz muito, mas não nos leva mais perto do segredo do Velho. Eu, de qualquer forma, estou convencido de que Ele não joga dados”. Em contrapartida, defensor da interpretação probabilística (Copenhague), Bohr a rebateu: “Pare de dizer a Deus o que ele deve fazer!” Talvez seja o mais significativo movimento científico com as mentes mais fantásticas que o mundo já presenciou, como Bohr, Schroedinger, De Broglie, Einsten, Heisenberg, Planck, 87 Dirac, Pauli, dentre outros. Essa migração não foi só modinha da época. Essa trilha culminou em uma das mais fascinantes teorias já formuladas: a Mecânica Quântica. E, talvez, por meio dela, a natureza, o Cara lá de cima nos mostra nossa pequeneza perante o todo, o cosmos: não devemos nos preocupar com as respostas que ela nos dará, mas em quais perguntas podemos fazer. EXERCÍCIOS RESOLVIDOS – PRINCÍPIO DA INCERTEZA De fato, a constante de Planck impõe uma barreira entre o mundo microscópico e o nosso. Verifique por sua vez que o princípio da incerteza de Heisenberg não impõe limites acerca da determinação da precisão na localização de um automóvel de Fórmula 1 de massa 680 kg (com piloto) que se move a 300 km/h, cuja incerteza na medida é de 1%. Resolução 88 Pelo princípio da incerteza, . Logo, Isto significa que este princípio não restringe nada no processo de medição de objetos macroscópicos. EXERCÍCIOS PROPOSTOS 1- Num experimento, foi de 5,0 x 10³ m/s a velocidade de um elétron, medida com precisão de 0,003%. Calcule a incerteza na determinação da posição do elétron, sendo conhecidos: massa do elétron 9,1 x10-31 kg e constante de Planck reduzida 1,1x10-34 Js. Resposta: A incerteza mínima é de, aproximadamente, 0,04 % 89 90 5.1 INTRODUÇÃO Nos capítulos anteriores, apresentamos evidências que as partículas microscópicas, como os elétrons, não se movem de acordo com as leis da mecânica clássica, dadas pelas Leis de Newton. Essas partículas se movem de acordo com as leis de algum tipo de movimento ondulatório com a propagação de ondas. Isso ficou claro pelo padrão de interferência criado quando um feixe de elétrons atravessa uma fendadupla. Nesta unidade, iniciaremos um estudo quantitativo da dinâmica dessas pequenas partículas, por meio de seus postulados e de uma formulação matemática precisa. Afinal, quais são as leis que regem o movimento das partículas microscópicas? A teoria de Schroedinger da Mecânica Quântica nós dá essas leis. Vamos analisar uma partícula microscópica (por exemplo, um elétron) que está livre para se movimentar nas três dimensões. Vamos considerar, como postulado, que o estado dessa partícula, em um instante de tempo t, é definido por um 91 parâmetro complexo chamada função de onda, e indicada pelo símbolo Ψ(x,y,z,t), em que (x,y,z) são as coordenadas espaciais e t a coordenada temporal. A teoria quântica especifica quais as leis do movimento ondulatório que regem o movimento das partículas de qualquer sistema microscópico. Para isto, cada sistema tem especificada a equação que rege o comportamento da função de onda, e também a relação entre esse comportamento e o comportamento da partícula. A teoria é uma extensão do postulado de De Broglie. Além disso, há uma relação íntima entre ela e a teoria de Newton para o movimento de partículas em sistemas macroscópicos. A teoria de Schroedinger é uma generalização, que inclui a teoria de Newton como um caso especial, no limite macroscópico, assim como a teoria da relatividade do Einstein é uma generalização que inclui a teoria de Newton como um caso especial (no limite de baixas velocidades). Vamos desenvolver os pontos essenciais da teoria 92 quântica de Schroedinger e utilizá-los para tratar esses sistemas microscópicos. 5.2 A EQUAÇÃO DE SCHROEDINGER Conforme vimos nos capítulos anteriores, a noção de dualidade (onda partícula) trouxe uma série de consequências para as ideias de radiação e matéria. No entanto, ainda havia muita coisa no ar após as propostas de Einstein para o fóton e a de De Broglie para as “ondas-guia” das partículas. Faltava um formalismo que fosse suficientemente abrangente, uma sustentação semelhante ao que são as leis de Newton para a mecânica clássica ou as equações de Maxwell para o eletromagnetismo. Werner Heisenberg, em 1925, formulou uma abordagem que ficou conhecida como mecânica das matrizes. Nesta abordagem, variáveis como posição, momento linear e energia são representadas através de matrizes, operadores não 93 comutativos. Esta característica dá suporte a aspectos quânticos, como as próprias relações de incertezas, que foram discutidas no capítulo anterior. Outra formulação foi proposta por um físico austríaco, Erwin Schroedinger. Esta formulação, que é um pouco mais acessível matematicamente, baseia-se numa equação diferencial de segunda ordem, cuja solução é a famosa função de onda . Esta função de onda é uma expressão matemática que rege o caráter ondulatório de uma partícula, algo que se buscava como vimos, desde a proposta de De Broglie. O próprio Schroedinger mostrou que esta formulação era equivalente à mecânica das matrizes, o que consolidou os esforços teóricos dos pioneiros dos quanta. Daqui para frente, analisaremos apenas a formulação baseada na equação da função de onda. A partir da equação de Schroedinger, podemos obter soluções ondulatórias que nos fornecem informações cruciais sobre o comportamento de uma partícula-onda. São contempladas influências de forças externas, o que indica 94 claramente o quão mais profunda é a concepção de Schroedinger em relação às ondas-guia de De Broglie. A equação de Schroedinger tem um papel análogo, na Mecânica Quântica, ao desempenhado pela segunda lei de Newton na Mecânica Clássica, que relaciona, através de uma equação diferencial, força e posição de uma partícula. Resolver esta equação diferencial significava conhecer o presente, passado e futuro de uma partícula ou de um sistema de várias partículas. Do mesmo modo, resolver a equação de Schroedinger significa conhecer a equação da onda associada a uma partícula qualquer. No entanto, não significa o que seria contraditório com o princípio da incerteza, conhecer arbitrariamente qualquer grandeza associada à partícula. Conhecer a expressão da função de onda, como veremos, é uma fonte de grande informação estatística sobre o estado de uma partícula qualquer. 95 Schroedinger não utilizou a expressão “ondas-piloto” ou “ondas-guia”, mas sim um termo mais conservador de “função de onda”, terminologia que adotaremos para . Bom, o primeiro problema que temos não é como resolver essa equação diferencial e sim, como encontrar essa equação. Aqui não será apresentada uma dedução da equação, mesmo porque a equação foi obtida através de um postulado. Apresentaremos apenas argumentos que façam com que a equação parece bastante razoável. Começamos nosso argumento fazendo uma lista de 4 hipótese: 1- Ela deve ser consistente com os postulados de Broglie- Einstein: h/p e E / h (6-1) 2- Deve ser consistente com a equação: E = p2 /2m + V (6-2) que relaciona a energia total de uma partícula de massa m com sua energia cinética e potencial V. 96 3- Deve ser linear em x,t) ou seja, se x,t) e x,t) são soluções da equação, então qualquer combinação linear c1x,t) + c2x,t) dessas duas equações também será uma solução. Assim, permite-se uma superposição de funções de onda, o que fornece uma explicação para padrões de interferência já observados nos experimentos. 4- A energia potencial V é uma função de x e até mesmo do tempo mas, existe um caso especial onde V é constante: V (x, t) = Vo Esse é o caso da partícula livre. Como lidamos com ondas, também é muito razoável buscar uma equação que forneça soluções com componentes senoidais que contêm o caráter oscilatório inerente à própria noção ondulatória Para que possamos continuar é preciso relembrar duas grandezas: k = 2e(6-3) 97 onde k é o número de onda, é a frequência angular e frequência linear. Usando as equações (6-1) da hipótese 1 e em seguida as relações acima (6-3) para escrever a equação (6-2) da hipótese 2 teremos: (6-4) Onde . A partir dessas hipóteses pode ser postulada a seguinte equação diferencial: (6-5) sendo, m a massa da partícula, V(x,t) a energia potencial, i a raiz de -1 e (x,t) a desejada função de onda. 98 Assim, conhecer V(x,t) é o ponto crucial: a partir dele, recorremos a (6-5) para obter a função de onda, da mesma forma que na mecânica clássica precisávamos conhecer a força exercida sobre a partícula para conhecer sua posição em todos os momentos que desejássemos. Vamos supor que a função de onda é composta por uma função dependente apenas da posição e outra função dependente apenas do tempo, ou seja: (6-6) A função (t) deve ser solução de uma equação de primeira ordem do tipo e, sendo assim, tem solução do tipo: (t) = exp(-2iCt/h) (6-7) sendo C um valor a determinar. A função (t) mostrou uma dependência simples com relação ao tempo. Falta ainda determinar (x), o que fazemos através da equação de Schroedinger independente do tempo: 99 (6-8) sendo E a energia total da partícula (cinética
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