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1 O valor semântico das preposições Chico Viana A preposição estabelece uma relação de subordinação entre dois termos. O segundo termo, ou consequente, é um substantivo, um pronome ou um verbo no infinitivo. Exemplos Gosto de cinema. Espero por você. Penso em viajar. Poucos atentam para o fato de que esses conectivos têm valor semântico. Embora sejam vocábulos relacionais, preservam um discreto conteúdo significativo e exigem rigor em seu emprego. Quando “se conversa com alguém”, a ideia de contato entre os interlocutores (presente no prefixo) se confirma ou reitera no uso da preposição “com”, que introduz o objeto indireto – ninguém conversa “em alguém” ou “por alguém”. O mesmo ocorre com o verbo “concordar”. Já em “discordar”, o prefixo significa “afastamento”, que é um dos valores da preposição “de”. Então, discorda-se “de alguém” ou “de alguma coisa”. Ninguém precisa saber etimologia para usar bem as preposições. Basta ficar atento à regência, ou seja, ao tipo de conectivo que os verbos transitivos indiretos “pedem” antes de seus complementos. Por vezes, mais de uma preposição é possível; por vezes, não. Exemplo: Luta-se com/contra alguém. Alguns problemas frequentes na escolha das preposições aparecem nas seguintes passagens, retiradas de redações: 2 1. Discordo plenamente com seu ponto de vista. É inadequado, como vimos, dizer que alguém “discorda com alguém ou alguma coisa”. Certamente, o engano se deve à influência do verbo “concordar”, cujo complemento é introduzido por essa preposição (curiosamente, ninguém diz “concordo de alguém ou algo”). 2. É preciso refletir em cima das razões que levam nossa educação a ser tão ruim. Na construção “refletir em cima de”, em vez de “sobre”, ocorre uma tradução errônea deste último conectivo. Ele tem, entre seus sentidos, o de “posição superior”, mas esse valor só aparece quando a preposição introduz adjunto adverbial. Exemplo: O livro está sobre a mesa. (= “em cima da mesa”). Não tem cabimento estendê-lo a construções com objetos indiretos. 3. Nietzsche critica o fato de as pessoas basearem a autoestima de acordo com a imagem que os outros têm de nós. O verbo “basear” rege complemento com a preposição “em”. Sendo assim, baseia-se a autoestima “na imagem” – e não “de acordo com a imagem” – que os outros têm de nós. 4. A prova foi adiada em função do alto número de candidatos. Semelhantemente ao caso anterior, é inadequado trocar “em razão de” por “em função de”. A primeira locução tem valor causal. Por isso, ajusta-se melhor à frase do aluno: A prova foi adiada por causa do alto número de candidatos. A segunda, que significa “na dependência de”, seria pertinente em uma construção do tipo: Ele vive em função do dinheiro dos pais. 5. Papai sempre deu valor ao estudo. Essa herança foi herdada por meu avô. O uso da preposição “por” – e não “de” – sugere que o hábito do estudo se transmitiu, hereditariamente, do pai ao avô. Isso mostra que o emprego indevido das preposições não apenas infringe a norma culta mas também pode afetar a coerência. 3 Usar corretamente esses e outros conectivos – como as conjunções e os pronomes relativos – concorre para conferir unidade ao texto ou, como diz Umberto Eco, para lhe dar “beleza lógica”. Fonte REVISTA Língua Portuguesa. Blog Na Ponta do Lápis. Disponível em: <http://revistalingua.com.br/textos/blog-ponta/o-valor-semantico-das-preposicoes-323840-1.asp>. Acesso em: 21 jul. 2015.
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