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2 CONTRAPONTO INOVANDO E COMPETINDO POR MEIO DA GESTˆO DE PESSOAS ' 2 00 1, R AE - Re vis ta d e Ad m in ist ra çª o de E m pr es as / EA ES P / F GV , S ªo P au lo , B ra sil . RAE Light v. 8 n. 1 p. 2-7 Jan./Mar. 2001 Guilherme Rhinow Na atualidade, vÆrios fatores tŒm demonstrado a elevada importância da gestªo de pessoas nas organiza- çıes. É possível perceber o signifi- cativo aumento da quantidade de publicaçıes e estudos sobre o tema, enfocando elementos relacionados à atraçªo, à retençªo e ao desenvolvi- mento de profissionais-chave para as empresas. Paralelamente ao movimento de estudos e publicaçıes, Ø interessan- te verificar, como diretor de recur- sos humanos de uma empresa mul- tinacional, o nœmero expressivo de consultorias cujas atividades e cuja prestaçªo de serviços estªo relacio- nadas diretamente com a gestªo de pessoas, focalizando principalmen- te questıes de capacitaçªo e desen- volvimento. Apesar da repetiçªo de diversas tØcnicas cognitivas tradici- onais voltadas para o ensino em sala de aula, algumas empresas diferen- ciam-se por apresentar abordagens arrojadas de educaçªo e aprendiza- gem. Algumas trazem elementos ar- tísticos para o dia-a-dia dos execu- tivos, incluindo teatro e mœsica. Outras tŒm o enfoque voltado para artes marciais como caratŒ e kung fu, alØm de esportes como rally, tri- lhas e rafting. Antes de questionar a eficÆcia desse tipo de programa, Ø importante criar algumas bases para entender as razıes do surgimento de açıes como essas. O aumento da oferta desses serviços, juntamente com a elevaçªo do mercado potencial gerado pela receptividade das organizaçıes para a sua implementaçªo, merece uma reflexªo estruturada. Para contex- tualizar tal reflexªo, Ø importante discutir as razıes da importância da gestªo de pessoas no momento atu- al assim como os seus desdobramen- tos nas empresas. O discurso predominante nas or- ganizaçıes sobre o aprimoramento da gestªo de pessoas estÆ relaciona- do com a obtençªo de diferenciais competitivos. É evidente, na atuali- dade, a necessidade de tais diferen- ciais como uma condiçªo fundamen- tal para a sobrevivŒncia no turbulen- to mundo dos negócios. O acirra- mento da concorrŒncia, decorrente dos efeitos da globalizaçªo nas em- presas e no desenvolvimento tecno- lógico, leva as organizaçıes a pro- cessos complexos de reflexªo e identificaçªo de elementos e variÆ- veis que devem ser utilizados para ganhar competitividade nos seus mercados. Tem sido muito interessante ve- rificar o movimento das empresas nessa incessante busca. Dentre as vÆrias açıes implementadas, notam- se esforços ligados à excelŒncia ope- racional, ao desenvolvimento tecno- lógico de novos produtos e ao apri- moramento do relacionamento com clientes e mercado em geral a partir dos serviços prestados. Alguns ca- sos interessantes em indœstrias es- pecíficas podem ser observados. 33 INOVANDO E COMPETINDO POR MEIO DA GESTˆO DE PESSOAS RAE Light v. 8 n. 1 Jan./Mar. 2001 As tradicionais empresas quími- cas, assim como as emergentes do advento do conceito de ciŒncias da vida, sempre foram reconhecidas pelo componente científico e tecno- lógico do seu portfólio de produtos, gerado com intensos esforços de pesquisa e desenvolvimento mundi- ais. Essas empresas, implementan- do movimentos de renovaçªo e bus- ca da competitividade, tŒm desloca- do o seu foco de atençªo para a ex- ploraçªo de novos elos na sua ca- deia produtiva. No caso da indœstria de defensivos agrícolas, novos elos da cadeia, considerados focos poten- ciais de parceria, sªo os distribuido- res, a produçªo de alimentos e, em alguns casos, o consumidor final. AlØm disso, nessas empresas, a com- plexidade das ofertas para os pro- dutores agrícolas tem aumentado de maneira bastante significativa, mi- grando do conceito de produtos para o de soluçıes. Em vez de apenas vender os produtos, estabelece-se uma aliança estratØgica com o pro- dutor agrícola, cuja eficÆcia depen- de da compreensªo da realidade do cliente, da estruturaçªo das ativida- des da empresa para atendimento das expectativas do cliente e tambØm da criaçªo de novas necessidades para aumentar o valor agregado no esta- belecimento da relaçªo estratØgica. Outra indœstria que tem chama- do a atençªo Ø a de bens de consu- mo, sempre reconhecida pelo dife- rencial de competitividade baseado no desenvolvimento dos seus servi- ços e das relaçıes com os clientes, seja pelas avançadas campanhas de marketing, seja pelos conceitos ar- rojados de supply chain e distribui- çªo, que criam interfaces eficazes com os elos relevantes da sua cadeia de negócios. Isso sem esquecer da criaçªo dos conceitos de parceria emergentes como os key account managers, ou gerentes de grandes contas, que possibilitam o estabele- cimento de alianças estratØgicas com grandes revendedores e distri- buidores. As empresas dessa indœs- tria, de maneira anÆloga às empre- sas de defensivos agrícolas, tambØm tŒm deslocado o seu foco de obten- çªo de vantagens competitivas. Per- cebe-se, nas empresas do setor, o aumento do foco na inovaçªo dos seus produtos por meio da criaçªo de centros regionais e locais de pes- quisa e desenvolvimento, para a concepçªo de produtos com diferen- ciais competitivos para os seus seg- mentos-alvo com características de- correntes de variÆveis e elementos locais. Essa revoluçªo nªo se encerra nesses dois casos e pode ser verificada tambØm na indœstria fi- nanceira, na qual alguns bancos apresentam diferenciais de excelŒn- cia operacional, mas tŒm na quali- dade dos serviços prestados uma fonte de diferenciais ao estabelecer um bom relacionamento com os seus clientes. Para a concretizaçªo des- ses diferenciais, o potencial tecno- lógico e as vantagens decorrentes do e-business aparecem como fatores fundamentais a serem considerados, como a possibilidade de acesso ao banco no exterior conforme a re- cente iniciativa de um banco nacio- nal, que abriu terminais eletrônicos em outros países ou mesmo a dis- ponibilizaçªo de avançados serviços na Internet. É interessante notar que a aber- tura de terminais eletrônicos no ex- terior e a disponibilizaçªo de servi- ços na Internet sªo facilmente replicÆveis por instituiçıes financei- ras concorrentes. De maneira seme- lhante, os diferenciais competitivos focados no desenvolvimento tecno- lógico de produtos e aprimoramen- to de serviços, característicos das empresas citadas anteriormente, nªo constituem uma vantagem competi- tiva sustentÆvel. Fica evidente, des- sa forma, a importância do constan- te questionamento da eficÆcia dos diferenciais competitivos vigentes e da formulaçªo de hipóteses sobre a sua sustentaçªo no futuro. Esse tipo de raciocínio estratØgico, seguido da validaçªo ou deslocamento dos fo- cos de obtençªo de diferenciais com- petitivos, caracteriza a aprendiza- gem da organizaçªo, instaurada como um processo de reflexªo e açªo contínua, o qual cria as condi- çıes para a construçªo de um futuro repleto de oportunidades e conquis- tas para a empresa. A valorizaçªo da aprendizagem decorre da conscientizaçªo da co- munidade empresarial sobre uma afirmaçªo capaz de gerar insights nas suas açıes estratØgicas: a ca- pacidade de aprender antes dos con- correntes tende a ser a œnica vanta- gem competitiva sustentÆvel para as organizaçıes no momento atual (Senge, 1990, 1994). Decorrente das pesquisas do MIT e publicada nos trabalhos de Peter Senge, essa cons- tataçªo torna-se bastante valiosa, uma vez que a rØplica de diferenci- ais competitivos aparece como uma ameaça extremamente preocupante. Essa conscientizaçªo reforçou as pesquisas sobre questıes de apren- dizagem dos indivíduos e das orga- nizaçıes.Tais estudos alimentaram a prÆtica organizacional e, ao longo dos œltimos cinco anos, tem sido Ora, quando fica evidente a necessidade de aprendizado organizacional, o foco de gestªo estratØgica das empresas desloca-se para as pessoas, consideradas a fonte de aprendizado nas organizaçıes. 4 CONTRAPONTO possível identificar, em vÆrias em- presas, mençıes ao conceito de aprendizagem nas suas diretrizes estratØgicas, como conteœdos de vi- sªo e missªo organizacionais. A identificaçªo de definiçıes concre- tas em planos de implementaçªo e diretrizes de atuaçªo em gestªo do conhecimento ou mesmo recursos humanos, entretanto, torna-se mais escassa. Vista ainda como um con- ceito abstrato para muitas empresas, a sua traduçªo em açıes concretas torna-se um grande desafio para pes- quisadores e consultores orientados para esse poderoso campo de estu- dos, viabilizando que a aprendiza- gem passe a fazer parte do cotidia- no das organizaçıes, nas suas prÆti- cas, nos seus instrumentos e no com- portamento das pessoas. Ora, quando fica evidente a ne- cessidade de aprendizado organiza- cional, o foco de gestªo estratØgica das empresas desloca-se para as pes- soas, consideradas a fonte de apren- dizado nas organizaçıes. Dessa for- ma, as pessoas aparecem como um fator de alta relevância para a com- petitividade e, conseqüentemente, devem ser gerenciadas de forma bas- tante cuidadosa. Nªo Ø por acaso que as questıes de atraçªo e retençªo de talentos tŒm aparecido com tanta freqüŒncia em reportagens de desta- que em revistas de negócios no Bra- sil. É uma verdadeira guerra pelos talentos das pessoas entre as empre- sas e, nessa batalha, os perdedores reduzem significativamente as suas chances de permanŒncia nos merca- dos competitivos atuais. A anÆlise desse movimento de- monstra a valorizaçªo dos ele- mentos do contexto interno das em- presas. O foco de competitividade a ser estabelecido, baseado ante- riormente no posicionamento do mercado e no atendimento de gru- pos de clientes, passa a ocupar re- levante papel na reflexªo sobre as capacidades da organizaçªo para o alcance de vantagens competitivas. As core competences propostas por Prahalad e Hamel (1990,1995) for- necem subsídios bastante ricos para as organizaçıes refletirem estrate- gicamente sobre as suas potencia- lidades internas que viabilizam o alcance de resultados diferenciados no mercado. Essas potencialidades internas, refletidas pelas competŒncias da or- ganizaçªo, produzem um impacto direto no desenvolvimento das com- petŒncias das pessoas. Dessa forma, podem ser observados, em vÆrias empresas, processos avançados de diagnóstico de competŒncias das pessoas assim como exercícios sis- temÆticos de formulaçªo e imple- mentaçªo de açıes de desenvolvi- mento. A tradicional avaliaçªo dos profissionais pelos seus respectivos gerentes Ø substituída por sistemas arrojados de avaliaçªo realizada na horizontal, utilizando pares e clien- tes, bem como, em outros casos, uti- lizando tambØm a dimensªo da equi- pe para configurar os processos de- nominados avaliaçªo 360°. A in- formÆtica tem facilitado esse apri- moramento ao possibilitar a avalia- çªo de profissionais localizados em diferentes países, mas que, pelo seu efetivo relacionamento em determi- nada atividade ou processo, devem ter participaçªo no mesmo processo de avaliaçªo. Outra característica relevante da informÆtica consiste na viabilizaçªo de uma premissa fundamental para esse tipo de processo: a confiden- cialidade. Essa condiçªo Ø funda- mental para que as pessoas se sin- tam à vontade para expressar a sua verdadeira opiniªo em relaçªo à performance de outros profissionais. Os sistemas informatizados possibi- litam a inserçªo e consolidaçªo dos dados de avaliaçªo com confiden- cialidade, inclusive para a Ærea de recursos humanos. O resultado Ø composto pela mØdia das avaliaçıes aplicadas por todos os avaliadores, sem distinçªo individual, deixando os avaliadores à vontade para ex- pressar a sua verdadeira opiniªo. As ferramentas implementadas trazem outro grande benefício: cri- am condiçıes efetivas para a iden- tificaçªo de demandas pelo desen- volvimento de competŒncias dos profissionais. O exercício sistemÆ- tico de avaliaçªo, contando com di- versas dimensıes como pares, cli- entes e equipe, alØm dos tradicionais gerentes, leva a uma percepçªo con- sistente do conjunto de conhecimen- tos, habilidades e atitudes que pre- cisam ser desenvolvidos. Paralelamente ao diagnóstico avançado de necessidades de capa- citaçªo, pode ser percebido um avanço nas açıes de suprimento des- sas demandas. Evoluindo das tradi- cionais açıes de treinamento e de- senvolvimento, as empresas come- çam a implementar universidades corporativas, concebendo açıes integradas e altamente coerentes com as diretrizes organizacionais. Essas universidades jÆ aparecem no Brasil com bastante freqüŒncia, tendo sido implementadas em algu- mas empresas como BankBoston, Grupo Accor, Orbitall e Novartis, entre outras. Um dos elementos im- portantes dessas universidades con- siste na evoluçªo das açıes de trei- namento e desenvolvimento como um centro de custos para um centro de resultados. AlØm disso, diversas açıes de capacitaçªo extrapolam os limites do pœblico interno da orga- nizaçªo e passam a alcançar clien- tes e fornecedores, atingindo, assim, diversos elos da cadeia de negócios na qual a empresa estÆ inserida. Esses processos formatam com bastante eficÆcia o processo de de- senvolvimento das pessoas, criando condiçıes para que, de maneira bas- tante eficaz, sejam mapeadas as de- mandas por desenvolvimento e trei- namento dos profissionais. Diante das contingŒncias do mo- mento atual, as açıes a serem im- plementadas para o suprimento des- RAE Light v. 8 n. 1 Jan./Mar. 2001 55 INOVANDO E COMPETINDO POR MEIO DA GESTˆO DE PESSOAS sas necessidades devem ser bastan- te abrangentes e diversas, atenden- do às demandas complexas dos pro- fissionais e das empresas. Tendo em vista esses desafios, alguns pontos devem ser destacados no que diz respeito à eficÆcia das açıes. Em primeiro lugar, a falŒncia do mode- lo cognitivo utilizado em aulas expositivas, palestras e leituras, seja em sala de aula, seja em ambiente eletrônico, como œnica alternativa para a capacitaçªo dos profissionais. A partir dessa constataçªo, começa a aparecer, no mercado, uma quanti- dade significativa de empresas pres- tando serviços de consultoria com a utilizaçªo de tØcnicas de desenvol- vimento focadas em artes, esportes e outras vivŒncias, visando à transfe- rŒncia de conhecimentos, incremen- to de habilidades ou modificaçªo de atitudes dos profissionais. Entre as açıes concebidas e im- plementadas por organizaçıes arro- jadas nas suas prÆticas de capacita- çªo e desenvolvimento dos seus pro- fissionais, podem ser identificadas a utilizaçªo de desafios ao ar livre, artes marciais e teatro como forma de desenvolvimento de competŒnci- as requeridas para o desenvolvimen- to profissional. Alguns consultores e pesquisa- dores começam a analisar esse tipo de questªo. O evento denominado CafØ do Conhecimento, iniciativa desenvolvida pela Idea Consultoria para dirigentes de empresas e exe- cutivos estratØgicos de recursos hu- manos, tem estimulado a reflexªo sobre essas açıes desenvolvidas pe- las empresas. Após promover a dis- cussªo sobre tØcnicas de story telling e utilizaçªo de artes marci- ais para aumentar a eficÆcia dos exe- cutivos no ambiente de trabalho, planejou como próximo evento uma discussªo sobre teatro. Curioso em relaçªo à expressªo dessa tendŒncia, resolvi entrevistar alguns profissionais que estªo pres- tando esse tipo de serviço para as organizaçıes. Foram entrevistados profissionais de empresas de consul- toria que estruturaramprogramas de desenvolvimento focados em artes marciais assim como experiŒncias vivenciais e esportivas ao ar livre e, por fim, nªo foram esquecidos os profissionais que tŒm levado o tea- tro para as organizaçıes como uma forma de desenvolvimento das pes- soas e da empresa. Por meio de entrevistas, foi pos- sível reunir um conjunto bastante rico de informaçıes sobre as condi- çıes necessÆrias para a realizaçªo dos programas, assim como sobre os resultados atingidos e os obstÆculos a serem superados. A anÆlise dos resultados das entrevistas demons- trou a existŒncia de duas instâncias principais relacionadas com os tra- balhos de desenvolvimento nas em- presas: os indivíduos e os grupos. Os elementos dos programas re- lacionados com o desenvolvimento dos indivíduos dizem respeito sobre- tudo ao alcance do bem-estar pes- soal, pelo equilíbrio entre as carac- terísticas do profissional, no que se refere ao nível de complexidade do trabalho, e os desafios encontrados. Quando questionados sobre compe- tŒncias a serem desenvolvidas pelos profissionais, os consultores entre- vistados mencionaram, com uma freqüŒncia significativa, a questªo da orientaçªo para o autodesenvol- vimento, autoconhecimento e esta- belecimento efetivo de relaçıes in- terpessoais. É possível notar, por meio dos programas implementados, evidŒn- cias de que as empresas estªo bus- cando cada vez mais condiçıes para que os profissionais estejam bem consigo mesmos. Dessa forma, di- ante de situaçıes cada vez mais complexas, decorrentes da elevaçªo das pressıes externas pela competi- tividade da empresa e do alcance incessante de resultados, o equilí- brio do profissional, obtido com o autoconhecimento e autodesenvolvi- mento gradativo, caracteriza-se como um fator fundamental para a obten- çªo do sucesso pessoal e profissio- nal. Esse equilíbrio cria tambØm as condiçıes para que as relaçıes esta- belecidas no ambiente de trabalho sejam mais produtivas e eficazes. Os programas de desenvolvimen- to focados em artes marciais, por exemplo, buscam o equilíbrio por meio da identificaçªo do eixo de cada um dos profissionais. Utilizan- do a busca da expressªo autŒntica de cada uma das pessoas, as artes marciais recriam valores culturais por meio de movimentos do corpo, configurando sinais de combate, defesa e interaçªo humana. Na em- presa, essa busca significa desenvol- vimento de capacidades, habilidades e sabedoria, visando a criar as con- diçıes físicas e psicológicas para lidar com os desafios presentes no trabalho diÆrio. O gerenciamento eficaz dos desafios encontrados Ø resultante da compatibilizaçªo entre a energia utilizada e os resultados alcançados, ou seja, despender os esforços físicos e psicológicos ne- cessÆrios para tornar efetivas as açıes, de acordo com a sua comple- xidade. Outro elemento relevante desse tipo de programa consiste na supe- raçªo de limites. A recriaçªo de va- lores culturais, por meio de movi- mentos e seqüŒncias, demonstra que As pessoas aparecem como um fator de alta relevância para a competitividade e, conseqüentemente, devem ser gerenciadas de forma bastante cuidadosa. RAE Light v. 8 n. 1 Jan./Mar. 2001 6 CONTRAPONTO grande parte do seu potencial pode encontrar-se adormecida e sem uti- lizaçªo efetiva no dia-a-dia. Ao per- ceberem-se capazes de realizar mo- vimentos que atØ entªo pareciam difíceis ou mesmo impossíveis, co- meçam a questionar a impossibili- dade de superar os limites e barrei- ras que sªo impostos para as suas conquistas e desafios. A integraçªo entre o equilíbrio e a superaçªo de limites pode ser ob- servada na anÆlise etimológica do termo artes marciais. Derivada do latim ars, arte significa criaçªo, imaginaçªo e mesmo adaptaçªo. Paralelamente, o termo marcial remete a guerra e deriva de Marte, nome romano do deus Ares, consi- derado o Deus da Guerra na mitolo- gia grega. De acordo com informa- çıes encontradas em um dos progra- mas de artes marciais, a guerra re- presentada por esse deus correspon- de à guerra interior, tambØm conhe- cida como guerra maior. É a guer- ra que as pessoas travam consigo mesmas para atingir a sua própria identidade e, a partir desta, superar os seus limites. A superaçªo de limites tambØm pode ser verificada nos programas vivenciais ao ar livre, cada vez mais utilizados pelas empresas em hotØis e atØ mesmo em ambientes hostis como florestas e rios. Colocadas di- ante de situaçıes de risco modera- do, como escalar uma montanha, subir em Ærvores ou construir em- barcaçıes para atravessar rios, as pessoas refletem sobre os seus limi- tes assim como questionam as ma- neiras pelas quais abordam os seus problemas. Nesse tipo de dinâmica, a segunda instância verificada nas entrevistas os grupos começa a definir-se com maior precisªo. Com os desafios propostos, sobressai a importância do papel do grupo para o alcance dos objetivos e a obten- çªo do sucesso. Nesse caso, alØm do autoconhecimento individual, no- tam-se tambØm os pontos fortes e as limitaçıes de cada um dos integran- tes da equipe, visando a potencia- lizar os talentos e as competŒncias disponíveis para atingir os objetivos definidos. O questionamento das relaçıes estabelecidas pelas pessoas, nesse tipo de trabalho de desenvolvimen- to, nªo se limita simplesmente aos relacionamentos internos na organi- zaçªo mas tambØm às interaçıes externas, com outros profissionais da mesma cadeia de negócios, como clientes, fornecedores, alØm de re- presentantes de outras entidades re- levantes para a cadeia identificada. A uniªo de forças para a obten- çªo do objetivo comum Ø bastante explorada pelos trabalhos de teatro inseridos nas organizaçıes. Essa atitude de vanguarda pode trazer dois tipos bÆsicos de benefícios: conceitual e processual. Os bene- fícios de natureza conceitual cor- respondem à conscientizaçªo dos profissionais sobre um conteœdo relevante para aquele grupo profis- sional como higiene e segurança no trabalho, qualidade de vida e mes- mo prevençªo de doenças como al- coolismo e Aids. O segundo tipo de benefício estÆ mais focado no pro- cesso de trabalho, e por meio dele os profissionais percebem a potencialidade das equipes coesas e sinØrgicas para a potencializaçªo dos resultados a serem atingidos. Os mØtodos dos grupos de teatro de improviso, como o playback theatre, pelo qual histórias da pla- tØia sªo improvisadas com bastante rapidez (em apenas alguns minutos), mostram para os espectadores o po- tencial que um grupo tem para atin- gir resultados quando apresenta ca- racterísticas de sinergia resultantes do conhecimento mœtuo e respeito por cada um dos integrantes. Diante da anÆlise dos resultados de tais tØcnicas, a exploraçªo efeti- va das duas instâncias indivíduo e grupo , no que diz respeito às bar- reiras encontradas e à criaçªo de condiçıes para a maximizaçªo dos resultados dos trabalhos, verifica-se o aparecimento de uma terceira ins- tância, citada por grande parte dos consultores e especialistas como uma condiçªo-chave para o sucesso dos trabalhos mencionados. É a ins- tância organizacional, definida por Peter Senge (1994) como infra-es- trutura organizacional, caracteriza- da pelo conjunto de estratØgias, prÆ- ticas e instrumentos da empresa, delineadores e, ao mesmo tempo, reflexo da cultura de cada uma das organizaçıes. Fica evidente que o bem-estar e equilíbrio individual, paralelamen- te à expansªo grupal dos benefícios atingidos, nªo sªo suficientes para o alcance e a manutençªo desses benefícios se nªo forem trabalhadas algumas variÆveis organizacionais. A criaçªo de uma cultura de apren- dizagem, maximizando os benefíci- os individuais e grupais, depende da revisªo dos sistemas e instrumentos de gestªo vigentes, de forma que possam ser perpetuados na organi- zaçªoos comportamentos e os sen- timentos positivos vivenciados ao longo dos programas. Um outro ponto relevante a ser salientado corresponde ao carÆter estrutural desse tipo de açªo. Por É uma verdadeira guerra pelos talentos das pessoas entre as empresas e, nessa batalha, os perdedores reduzem significativamente as suas chances de permanŒncia nos mercados competitivos atuais. RAE Light v. 8 n. 1 Jan./Mar. 2001 77 INOVANDO E COMPETINDO POR MEIO DA GESTˆO DE PESSOAS Guilherme Rhinow Ø Mestre em Administraçªo de Empresas pela Faculdade de Economia e Administraçªo (USP) e Diretor de Recursos Humanos da Novartis Agribusiness. E-mail: guilherme.rhinow@cp.novartis.com serem consideradas alternativas em relaçªo às tØcnicas tradicionais de treinamento e desenvolvimento, a sua aplicaçªo pontual pode nªo gerar os resultados pretendidos por falta de sustentaçªo. Surge como soluçªo, portanto, a estruturaçªo e a implementaçªo de açıes de maior envergadura envolvendo um grupo mais amplo de profissionais dentro da organizaçªo. Esse grupo, a partir da sinergia efetiva e uniªo de esfor- ços, tem maiores chances de promo- ver mudanças significativas no con- texto de trabalho. A questªo estrutural citada reme- te a outro ponto relevante salienta- do por um dos consultores, que cor- responde à necessidade de envolvi- mento e comprometimento da alta direçªo em um processo como esse. Os benefícios de um programa de desenvolvimento podem ser perdi- dos se nªo houver o apoio dos diri- gentes da organizaçªo. AlØm da for- ça do grupo, Ø fundamental o apoio da alta direçªo. Nªo obstante, o envolvimento da alta direçªo deve ser tambØm muito bem planejado, uma vez que pode diminuir o real aproveitamento do programa, dificultando o desenvol- vimento de determinadas habilida- des e atitudes para transformar-se em um ritual burocrÆtico de suposta uniªo e sinergia. O momento do envolvimento da alta direçªo, entretanto, aparece como um argumento diverso na opi- niªo dos consultores entrevistados. Um dos profissionais salientou que sempre recomenda a participaçªo efetiva de toda a direçªo, sem a qual o programa dificilmente quebrarÆ as barreiras instaladas. Significa dizer, na opiniªo do entrevistado, que a barreira deve ser quebrada no pri- meiro momento. É uma prÆtica in- teressante de algumas consultorias, inclusive, promover um contato prØ- vio do consultor que farÆ o trabalho na organizaçªo com os dirigentes, por meio de entrevistas individuais, para se fazer um diagnóstico que, alØm de mapear as forças políticas favorÆveis e contrÆrias ao processo de mudança, tem como objetivo ini- ciar a venda do tipo de trabalho que serÆ realizado para uma das poten- ciais fontes de resistŒncia mais sig- nificativa. O contato realizado com as em- presas de consultoria e os profissio- nais foi bastante rico e demonstrou a diversidade de opçıes disponíveis no mercado para alinhar o perfil dos profissionais da empresa com os desafios impostos pelo momento atual. O objetivo deste artigo, entre- tanto, nªo se limitou ao simples mapeamento de consultores e iden- tificaçªo de açıes de capacitaçªo e desenvolvimento disponibilizadas por esses profissionais. A anÆlise das entrevistas permitiu o questio- namento dos resultados e benefíci- os desse tipo de açªo para as em- presas, assim como demonstrou a necessidade de repensar a abrangŒn- cia e o foco do trabalho dos consul- tores para a criaçªo de processos consistentes de aprendizagem orga- nizacional. A proposiçªo da instância orga- nizacional, adicionada às dimensıes individual e grupal indicadas pelos entrevistados, constitui um elemen- to fundamental para a verificaçªo da eficÆcia e sustentaçªo dos resulta- dos das açıes de capacitaçªo e de- senvolvimento nas empresas. Essas açıes, tradicionais ou alternati- vas, nªo devem ser concebidas como esforços pontuais para aten- der a demandas específicas de indi- víduos ou grupos. A sua efetivaçªo, gerando movimentos concretos de aprendizagem, depende da integra- çªo das açıes às prÆticas e aos ins- trumentos de gestªo de pessoas vi- gentes nas empresas, bem como ali- nhamento às suas diretrizes estratØ- gicas e aos seus padrıes culturais. A responsabilidade pela criaçªo e sustentaçªo da aprendizagem or- ganizacional, fundamental para ala- PRAHALAD, C. K., HAMEL, G. The core competence of the corporation. Harvard Business Review, v. 68, n. 3, p. 79-91, May/June 1990. PRAHALAD, C. K., HAMEL, G. Competindo pelo futu- ro: estratØgias inovadoras para obter o controle do seu setor e criar os mercados de amanhª. Rio de Janeiro : Campus, 1995. SENGE, P. M. A quinta disciplina. Sªo Paulo : Best Seller, 1990. SENGE, P. M. et al. The fifth discipline: fieldbook. New York : Currency Doubleday, 1994. REFER˚NCIAS BIBLIOGR`FICAS vancar a competitividade das empre- sas, deve ser compartilhada por con- sultores, na proposiçªo do formato das açıes, e profissionais de recur- sos humanos, responsÆveis pela de- limitaçªo da demanda e aplicaçªo ao contexto organizacional. Diante da complexidade da relaçªo estabe- lecida, a abordagem de intervençªo dos consultores deve ser repensa- da, assim como o processo de iden- tificaçªo do melhor profissional para atuar como prestador de ser- viços na organizaçªo. Paralelamen- te, torna-se fundamental a revisªo do perfil dos profissionais de recur- sos humanos para, a partir de uma percepçªo ampla das características do negócio e do estÆgio de desen- volvimento da organizaçªo, tradu- zir as variÆveis relevantes relacio- nadas a estratØgias, padrıes cultu- rais e sistemas de gestªo vigentes para modelar efetivamente a atua- çªo dos consultores. m RAE Light v. 8 n. 1 Jan./Mar. 2001
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