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Danos Morais na responsabilida civil

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Universidade de Brasília 
Natália Caliman Vieira 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DANOS MORAIS DECORRENTES DO ABANDONO 
AFETIVO NAS RELAÇÕES PATERNO-FILIAIS. 
A Tutela Jurisdicional dos Danos à Pessoa Humana. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Brasília 
2009 
 2
Natália Caliman Vieira 
Matrícula: 05/22015 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DANOS MORAIS DECORRENTES DO ABANDONO 
AFETIVO NAS RELAÇÕES PATERNO-FILIAIS. 
A Tutela Jurisdicional dos Danos à Pessoa Humana. 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Graduação 
em Direito da Universidade de Brasília, como 
requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em 
Direito. 
Área de Concentração: Direito de Família, 
Responsabilidade Civil e Direito Constitucional. 
Orientadora: Suzana Borges Viegas de Lima. 
 
 
 
 
Brasília 
Universidade de Brasília 
2009 
 3
Sumário 
 
Introdução .......................................................................................................................... 04 
 
CAPÍTULO I 
1. A Família ........................................................................................................................ 06 
1.1 Conceito e Relevância Jurídica ........................................................................ 06 
1.2 A Família inserida no ordenamento jurídico brasileiro.................................. 09 
1.3 O afeto e o cuidado como valores jurídicos ..................................................... 12 
1.4 A constitucionalização do direito civil no âmbito familiar ............................. 15 
 
CAPÍTULO II 
2. Os Princípios no Direito de Família ............................................................................. 16 
2.1 Os princípios em espécie .................................................................................. 16 
 2.1.1 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ..................................... 17 
 2.1.2 O Princípio da Paternidade e da Maternidade Responsável ................ 19 
 2.1.3 O Princípio da Afetividade .................................................................... 20 
 2.1.4 O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente ............ 21 
2.2 A ponderação dos princípios jurídicos na perspectiva civil-constitucional .... 22 
 
CAPÍTULO III 
3. A Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo nas Relações Paterno-Filiais ...... 27 
3.1 Noções de Responsabilidade Civil .................................................................... 27 
3.1.1 Conceito e finalidade da Responsabilidade Civil .................................... 27 
3.1.2 Pressupostos da Responsabilidade Civil ................................................. 29 
3.2 Danos morais ou danos à pessoa? ................................................................... 31 
3.3 A problemática da conceituação dos Danos Morais ....................................... 32 
3.4 Os danos morais como danos à cláusula geral de tutela da pessoa humana . 35 
3.5 Os danos morais compensáveis ........................................................................ 37 
3.6 A Responsabilidade Civil no Direito de Família ............................................. 39 
3.7 A omissão de afeto e cuidado como dano à pessoa humana compensável ..... 44 
3.8 Os requisitos da condenação a título de danos morais decorrentes do 
abandono afetivo nas relações paterno-filiais ....................................................... 48 
 3.8.1 O pressuposto da condenação: a existência de uma efetiva relação de 
filiação ..................................................................................................................... 48 
 3.8.2 Dos deveres da condição de pai: a conduta omissiva ............................ 49 
 3.8.3 O nexo de causalidade entre a conduta omissiva e o evento danoso ..... 52 
 
CAPÍTULO IV 
4. A posição da jurisprudência pátria .............................................................................. 53 
 
Conclusão ........................................................................................................................... 57 
 
Referências Bibliográficas ................................................................................................ 60 
INTRODUÇÃO 
O presente estudo é obra de reflexões que nos atormentaram na etapa final 
do curso de graduação, durante a qual entramos em contato com o dia-a-dia das Varas e 
Tribunais do Poder Judiciário. As relações de filiação nos chamaram a atenção ante o descaso 
com que genitores1 lidam com a paternidade/maternidade, muitas vezes negando-se a 
proporcionar aporte material, quem dirá afetivo à prole. Em face desse quadro, passamos a 
questionar como poderia o Poder Judiciário proteger menores e adolescentes que sofrem pelas 
negligências e omissões paternas e maternas. Assim, buscando mecanismos de amparo, 
tivemos ciência que a tutela da pessoa humana se daria por meio da Responsabilidade Civil, 
mais especificamente pela condenação a título de danos morais. Dessa maneira, passamos a 
examinar acaso seria cabível tal condenação por danos decorrentes de abandono afetivo nas 
relações paterno-filiais. 
Após realizarmos uma retrospectiva histórica do Direito de Família 
Brasileiro, estabelecemos os contornos atuais desse ramo no ordenamento, tendo em vista a 
nova perspectiva civil-constitucional do sistema, pautada na dignidade humana; em cotejo 
com os novos valores jurídicos que permeiam os laços familiares, que são o afeto e o cuidado. 
Em seguida, traçamos os princípios constitucionais aplicados à questão, com 
destaque a dignidade da pessoa humana, a afetividade, a paternidade/maternidade responsável 
e o melhor interesse do menor e do adolescente, tecendo considerações sobre a colisão entre 
princípios no caso concreto. 
Uma vez findo o processo em que estabelecemos os conceitos, a legislação 
pertinente ao caso e os fundamentos do nosso estudo, passamos à temática da 
Responsabilidade Civil no Direito de Família. Nesse ponto, primeiramente traçamos algumas 
noções gerais do ramo da Responsabilidade para então dissertarmos sobre os danos morais 
propriamente. 
Acuramos que “danos à pessoa” é o termo que melhor qualifica as lesões de 
ordem extrapatrimonial, mas optamos por utilizar sem discrição tanto “danos morais” como 
“danos à pessoa”, como se sinônimos fossem. 
 
1Ressalte-se que por vezes fizemos referência apenas à figura paterna do genitor, mas tal opção se deu apenas 
por motivos de conveniência, pelo que não descartamos em momento algum que a figura materna possa ser 
agente causadora de danos morais decorrentes do abandono afetivo. 
 
 5
Em seguida, fizemos a abordagem das críticas de que o instituto dos danos 
morais foi alvo em face da ampliação desmesurada do rol das hipóteses ressarcitórias, haja 
vista o novo paradigma do ordenamento ser a tutela da pessoa humana. Em sentido oposto, 
verificamos também a propagação de julgados que impedem a criação de situações 
indenizáveis, sob a premissa de que os precedentes poderiam inspirar uma infinidade de novas 
demandas que abarrotariam o Poder Judiciário. 
Compartilhando da preocupação acerca da banalização do instituto e 
entendendo também que o aumento do número de ações a esse título é resultado direto de que 
os cidadãos estão mais cientes das possibilidades de luta e defesa de seus próprios direitos, 
procuramos delinear limites aos danos morais indenizáveis. 
Tais limitações foram traçadas partindo do desenvolvimento da 
problemática da conceituação dos danos morais, em que ao final optamos pelo conceito que 
os vincula à lesão da dignidade humana em algum de seussubstratos materiais. Nessa esteira, 
verificamos as teses que lidam com a qualidade de interesses merecedores de tutela, 
concluindo que a mais cabível é a que considera indenizável dano que, segundo uma 
ponderação dos interesses em jogo à luz dos princípios constitucionais, seja injusto a ponto de 
que não deva a vítima suportar sozinha os efeitos da lesão. 
Assim, partimos à hipótese de responsabilizar alguém civilmente nos 
vínculos familiares, concluindo pelo posicionamento favorável. 
Passada essa fase, buscamos demonstrar a possibilidade da inserção dos 
danos morais decorrentes do abandono afetivo nas relações de filiação no rol de danos 
passíveis de compensação, tendo em conta a ponderação dos interesses contrapostos, quais 
sejam a autonomia paterna, a integridade psicofísica do infante e a solidariedade familiar e 
social à luz dos princípios próprios do Direito de Família que conferem proteção integral 
prioritária aos menores e adolescentes. 
Seguidamente, enquadramos a conduta omissiva do genitor que mereça ser 
condenada, adaptando os deveres da paternidade à noção de culpa normativa da 
Responsabilidade Civil. Estabelecemos, além disso, a importância da averiguação do nexo de 
causalidade entre a negligência parental e o evento danoso, destacando a necessidade de a 
conduta ser adequada a gerar lesão para que incida o dever sucessivo de indenizar. 
Por fim, fizemos uma breve análise comentada da jurisprudência pátria, que 
hoje se encontra dividida, expondo alguns julgados, com seus fundamentos e dispositivos. 
 6
CAPÍTULO I 
1. A Família 
1.1 Conceito e Relevância Jurídica 
Dentre todos os ramos jurídicos, o Direito de Família é tido como o mais 
ligado à vida, haja vista que, normalmente, o ponto de origem das pessoas, assim como o 
lugar ao qual se mantêm vinculadas durante sua existência, é o seio familiar2. 
Nesse contexto, a família aparece como o núcleo fundamental em que 
repousa toda a organização social. A instituição é muitas vezes considerada como a base do 
Estado, motivo pelo qual, como não poderia deixar de ser, merece ampla proteção estatal. 
Com efeito, esse é o conceito de família dado pela lição de JOÃO DE MATOS 
ANTUNES VARELA: 
A família é o grupo social primário mais importante que integra 
a estrutura do Estado. Como sociedade natural, correspondente a uma 
profunda e transcendente exigência do ser humano, a família antecede nas 
suas origens o próprio Estado. Antes de se organizar politicamente através 
do Estado, os povos mais antigos viveram socialmente em famílias3. 
Na medida em que a família constitui a menor célula do corpo estatal, não 
poderia passar despercebida pelo o ordenamento jurídico. Em verdade, “ela é um veículo 
funcionalizador à promoção da dignidade de seus membros4”. É que, sendo o ambiente 
familiar o lugar em que os indivíduos nascem e se desenvolvem, a dinâmica estabelecida entre 
seus membros é determinante quanto à construção da personalidade do indivíduo; e, também, 
quanto ao modo como este indivíduo se relaciona com os demais componentes da sociedade. 
Em que pesem as variadas formas assumidas, bem como as transformações 
sofridas pelo instituto durante a evolução histórica dos povos, a família segue como condição 
à humanização e à socialização das pessoas5. CANEZIN defende que o agrupamento por laços 
 
2GOLÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume VI: Direito de Família. 5ª ed, revista e 
atualizada. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1. 
3VARELA, João de Matos Antunes. Direito de Família. In.: Czajkowoski, Reiner. União Livre à luz das Leis 
8.971/94 e 9.278/96. Curitiba: Juruá, 1997, p. 21. 
4TEPEDINO, Gustavo. Novas Formas de entidades familiares: efeitos do casamento e da família não fundada no 
matrimonio. In.: TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 372-373. 
5Em relação à importância da convivência familiar nos primeiros anos de vida da pessoa, certifica CLAUDETE 
CARVALHO CANEZIN o seguinte: “É a família que possibilita a emergência de significado, de valores e critérios 
de conduta, sentimento de pertença, respeito e diálogo em contexto afetivo, o que irá refletir em seus futuros 
relacionamentos com o mundo que o rodeia, além de constituir-se como requisito indispensável ao 
desenvolvimento saudável das potencialidades do indivíduo”. (CANEZIN, Claudete Carvalho. Da Reparação do 
 7
de parentesco não seria somente uma estratégia de sobrevivência dos grupos; mas seria, ao 
mesmo tempo, uma condição ao desenvolvimento e realização pessoal do ser humano6. 
No que concerne às mudanças na organização familiar, notadas a partir do 
século XIX, RODRIGO DA CUNHA PEREIRA elucida que a entidade sofreu alterações após as 
Revoluções Burguesas, principalmente em função do declínio do patriarcalismo, assim como 
do individualismo, o que culminou no abalo das antigas estruturas do Direito de Família, 
marcando a Idade Contemporânea7. 
 PEREIRA assevera que as alterações na família moderna ocorreram porque a 
razão de ser das relações familiares foi modificada para dar origem a um berço no qual 
importam valores tais como o afeto, a solidariedade e a mútua constituição de uma história em 
comum8, deixando de lado a concepção preexistente da família como um núcleo econômico e 
de reprodução. 
Nessa mesma orientação, a jurista GISELDA MARIA FERNANDES NOVAES 
HIRONAKA destaca que outras ciências humanas, como a antropologia e a psicologia, 
contribuíram decisivamente para que o novo enfoque jurídico, pautado nas relações familiares 
estabelecidas em função de um elo afetivo, tomasse os contornos atuais9. 
Atualmente, a normatização das relações familiares cuida de regular o modo 
como interagem os membros desse agrupamento e as conseqüências que resultam das relações 
por eles estabelecidas, quanto às pessoas e aos seus bens, respeitando princípios jurídicos 
próprios do Direito de Família, que prezam pelas relações baseadas no afeto. 
 É possível dizer que as normas vigentes que regem o Direito de Família são 
multifacetárias, por regularem relações pessoais, patrimoniais e assistenciais, a depender da 
sua finalidade ou do seu objetivo. Significa dizer que este ramo disciplina relações pessoais 
entre cônjuges, ascendentes, descendentes e parentes fora de linha reta; relações patrimoniais 
que se desenvolvem no seio familiar e em decorrência dele; e, finalmente, relações 
 
dano existencial ao filho decorrente do abandono paterno-filial. In.: Revista Brasileira de Direito de Família, v. 
8, n. 36, jun/jul, 2006, p.71) 
6Idem, ibidem, p. 72. 
7PEREIRA [1], Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais do Direito de Família. Belo Horizonte. Del Rey, 
2005, p. 3. 
8Idem, ibidem, p. 4. 
9HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressuposto, Elementos e Limites do Dever de Indenizar por 
Abandono Afetivo. In.: A ética da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. 
Coordenação: Tânia da Silva Pereira e Rodrigo da Cunha Pereira. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 418. 
 8
assistenciais, como entre cônjuges entre si, pais e filhos e também nos casos de tutoria e 
curatela10. 
Em poucas palavras, diz-se que “o objeto do direito familiar é, pois, o 
complexo de disposições, pessoais e patrimoniais, originado do entrelaçamento das várias 
relações estabelecidas entre os componentes da entidade familiar11”. 
 É notório que cada uma dessas figuras possui um papel próprio a 
desempenhar no seio familiar. O papel dos genitores, por exemplo, é de dispor meios para o 
pleno desenvolvimento da sua prole. 
A razão disso é que, do ponto de vista da infância e da juventude, aos 
menoresé conferida maior proteção, haja vista a sua vulnerabilidade face aos demais 
membros do corpo social. O escopo das normas que resguardam os direitos dos infantes é 
garantir as assistências material, moral e intelectual, de maneira que essas pessoas em 
desenvolvimento possam crescer e se tornarem adultos física e mentalmente saudáveis. 
Na medida em que a criança cresce em um ambiente proveitoso, permeado 
de afeto, se tornará um ser humano mais completo e psiquicamente melhor estruturado. É 
inegável, portanto, o reconhecimento de que os membros da família merecem plena proteção, 
tendo em vista que é interesse da sociedade que seus agentes sejam o mais bem incorporados 
no corpo coletivo possível. Nesse sentir, compreensível se torna a ingerência estatal nas 
relações familiares. De fato, “atualmente, os deveres dos pais são determinados pelo Estado, 
independente de sua escolha, a relação deve ser direcionada para o resguardo dos interesses 
dos filhos12”. 
Como aponta HIRONAKA, o Direito de Família contemporâneo tem voltado 
seu foco ao reconhecimento da família como o lugar privilegiado para a ampliação de 
relações interpessoais mais justas, através do desenvolvimento de seres humanos (sujeitos de 
direito) mais completos e psiquicamente melhor estruturados13. 
Tendo por arcabouço teórico o princípio da dignidade da pessoa humana, 
esse ramo passou a conferir valor jurídico ao afeto e ao cuidado, criando mecanismos de 
proteção aos direitos e interesses dos membros familiares, principalmente os de que são 
titulares crianças e adolescentes, marcados pela vulnerabilidade. 
 
10GOLÇALVES, op. cit. p. 3. 
11Idem, ibidem, p. 2. 
12CANEZIN, op. cit, p. 72. 
13HIRONAKA, op. cit., p. 418. 
 9
Sendo assim, resta claro que a evolução dos estudos e do tratamento 
legislativo acerca dos direitos da pessoa humana afetou o Direito de Família, ampliando os 
mecanismos de tutela desse instituto, principalmente no que toca os direitos da prole. 
1.2 A Família inserida no Ordenamento Jurídico Brasileiro 
Em se tratando da legislação e do tratamento jurídico brasileiro, a proteção 
estatal conferida à família está prevista, principalmente, nos textos da Constituição Federal, 
do Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente. 
Ocorre que nem sempre o Direito de Família teve a amplitude dada hoje no 
ordenamento jurídico do nosso país, como se percebe pelo fato de que as questões pertinentes 
à família passaram praticamente despercebidas pelo poder constituinte das duas primeiras 
Constituições Federais Brasileiras14. CLÁUDIA MARIA DA SILVA afirma, em estudo sobre 
indenizações aos filhos, que essas duas Constituições não faziam nenhuma referência à 
família, na época marcadamente patriarcal15. 
A primeira alusão ao grupo familiar em sede constitucional ocorreu na Lei 
Maior de 1934. Naquela Carta, o constituinte ateve-se a questões formais e relativas ao 
casamento, não conferindo maior importância à substância da instituição16. 
No corpo da Lei Maior de 1937 vieram mudanças significativas relativas ao 
tratamento dos pais quanto aos seus filhos. Esse texto previa o tratamento igualitário entre 
filhos naturais e filhos legítimos e, ainda, a necessidade de se conferir cuidados e garantias 
especiais à infância e à adolescência, a fim de que os menores pudessem dispor de uma vida 
digna17. 
Apesar do grande avanço do texto de 1937, as Constituições de 1946, 1967 
e 1969 não deram continuidade às inovações no campo da tutela infantil e do adolescente, 
 
14MARIA DA SILVA, Cláudia. Descumprimento do dever de convivência familiar e indenização por danos à 
personalidade do filho. In.: Revista de Brasileira de Direito de Família, v. 6, n. 25. Porto Alegre: Síntese, 
IBDFAM, ago/set, 2004, p. 124. 
15Idem, ibidem, p. 124. 
16Idem, ibidem. p. 125. 
17O artigo 127 do referido texto tratou, pioneiramente, acerca da responsabilização dos pais pelo abandono dos 
filhos, dispondo que os abandonos moral, intelectual ou físico da infância e da juventude importaria em falta 
grave dos responsáveis por sua guarda e educação O texto do artigo mencionado assim dispunha: “Art. 127. A 
infância e a juventude devem ser objeto de cuidados especiais por parte do Estado, que tomará todas as medidas 
destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas 
faculdades. O abandono moral, intelectual ou físico da infância e da juventude importará falta grave dos 
responsáveis por sua guarda e educação, e cria ao Estado o dever de provê-las de conforto e dos cuidados 
indispensáveis à sua preservação física ou moral.Aos pais miseráveis assiste o direito de invocar o auxílio e 
proteção do Estado para a subsistência e educação de sua prole”. 
 10
sendo que a única mudança merecedora de destaque do período foi a promulgação da Lei do 
Divórcio, na vigência da Carta de 1969, permitindo a dissolução do vínculo matrimonial e a 
celebração de um novo casamento. 
Seguidamente, em 05 de outubro de 1988, foi promulgado o imperativo 
constitucional ora vigente, usualmente reconhecido por Constituição Cidadã. Esta Carta 
passou a lidar de maneira mais efetiva acerca da questão familiar. CANEZIN considera o texto 
aludido como “um marco histórico fundamental no que se relaciona à abordagem da 
família18”. 
A importância da família é reconhecida na Lei Maior vigente, como 
facilmente se depreende da leitura dos dispositivos que tratam sobre a temática, em especial 
do artigo 226, que prevê a família como a base da sociedade, merecendo especial proteção do 
Estado19. 
Adiante, no artigo 227, a Carta de 1988 determina como dever da família, 
da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos 
os direitos que lhes confiram uma vida digna. É o que estabelece a redação do dispositivo 
aludido: 
Art. 227. É dever da família, da sociedade, do Estado assegurar à criança e 
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à 
alimentação, à educação e ao lazer, à profissionalização, à cultura e à 
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, 
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, 
exploração, violência, crueldade e opressão. 
Note-se, da escrita desse artigo, que criança e o adolescente ganharam lugar 
de destaque no ordenamento jurídico brasileiro. 
Na mesma orientação da Carta Magna, quanto ao especial apreço conferido 
aos menores, foi editada a Lei no. 8.069 de 1990, denominada de Estatuto da Criança e do 
Adolescente – ECA. 
O artigo 3° do referido Estatuto prevê que a criança e o adolescente gozam 
de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, assegurando-se-lhes, por meio 
da lei ou por outros meios, todas as formas de oportunidades e facilidades, a fim de lhes 
 
18CANEZIN, op. cit., p. 127 
19Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 
 11
facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de 
liberdade e de dignidade20. 
O ECA, nos artigos 4º e 5º, determina que cumpre à família, à sociedade e 
ao Estado a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao 
esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à 
convivência familiar e comunitária, a salvo de qualquer forma de negligência. Ademais, 
decide que qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais será 
punido na forma da lei21. 
Mais especificadamente, sobre o direito à convivência familiar, o Estatuto, 
pelo que dispõe seu artigo 19, estabelece que toda criança tem direito a ser criada e educadano seio da sua família e, apenas excepcionalmente, em família substituta. Assegura-se, por 
meio deste dispositivo, a convivência familiar, bem como a comunitária22. Em relação aos 
deveres dos pais, o ECA articula o seguinte: 
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos 
menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e 
fazer cumprir as determinações judiciais. 
Finalmente, sobre os diplomas que tratam do Direito de Família, em 2002 o 
novo Código Civil veio a substituir o antigo de 1916, que há muito se encontrava 
ultrapassado. A nova Lei Civil prevê deveres dos pais em relação aos filhos nos dispositivos 
que tratam do exercício do poder familiar, em capítulo próprio, nos artigos 1.630 a 1.63823, e 
também em outros artigos esparsos, como é o caso do artigo 1.566, IV, que lida do dever 
 
20Art. 3° A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem 
prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por meio de lei ou por outros meios, 
todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e 
social, em condições de liberdade e dignidade. 
21Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta 
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à 
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
(...) 
Art.5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, 
violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos 
fundamentais. 
22Art. 19 Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, 
excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da 
presença de pessoas dependentes de substancias entorpecentes. 
23
 Vale citar, dentre tais determinações, o artigo 1.634, CC, que prevê o seguinte: “Compete aos pais, quanto à 
pessoa dos filhos menores: 
I- dirigir-lhes a criação e a educação; 
II- tê-los em sua companhia e guarda”. 
 12
recíproco dos cônjuges quanto ao sustento, à guarda e à educação dos filhos24, dentre outras 
várias disposições. 
Ademais, o Código Civil de 2002 alterou o antigo “pátrio poder” para dar 
lugar a um novo poder familiar livre da concepção romana, segundo a qual o pai tinha pleno 
direito de vida e de morte sobre seu filho. A evolução desse pensamento abandonou a noção 
de poder nas relações paterno-filiais e acatou a noção de que essas relações decorrem de uma 
autoridade natural dos pais com relação a sua prole, esta dotada de dignidade. Assim, o poder 
familiar passou a ser menos um poder e mais um dever25. 
Ressalte-se que a determinação da parentalidade responsável como um 
múnus é uma direção dos textos civis, bem como da Carta Magna, de modo que toda a 
sistemática orienta-se nesse sentido. É que, a partir do pós-modernismo e da 
constitucionalização do direito privado, o Código Civil de 2002 não é apenas uma nova 
codificação que trata do regramento das relações privadas, ele é, na realidade, um mecanismo 
para conferir efetividade às disposições constitucionais. Esse também é o caso dos princípios 
norteadores do Direito, em especial ao tema ora posto, os do Direito de Família, pautados na 
dignidade da pessoa humana, na ética da responsabilidade e da solidariedade e, além disso, na 
convivência familiar e no melhor interesse dos menores. 
1.3 O Afeto e o Cuidado como Valores Jurídicos 
A mudança de paradigma no que toca os direitos vinculados às relações de 
filiação nos convida a identificar tanto o afeto quanto o cuidado como valores jurídicos, vez 
que em diversas passagens do ordenamento tais valores aparecem como deveres de provisão 
do Estado, dos pais e da sociedade26 aos menores, por quem aqueles são responsáveis. 
 
24
 Art. 1.566 São deveres dos cônjuges: 
(...) 
IV -sustento, guarda e educação dos filhos. 
25O exercício da paternidade, efetivamente “converteu-se em um múnus, concebido como encargo legalmente 
atribuído a alguém, em virtude de certas circunstancias, a que se não pode fugir. O poder familiar dos pais é ônus 
que a sociedade organizada a eles atribui, em virtude da circunstância da parentalidade no interesse dos filhos. O 
exercício do múnus não é livre, mas necessário no interesse de outrem (ANGELUCI, Cleber Affonso [1]. Amor 
tem preço? In.: Revista CEJ, n. 35, out./dez. Brasília: 2006. p. 48). 
26
 Inclusive, TÂNIA DA SILVA PEREIRA destaca que o Brasil ratificou a Convenção Internacional sobre os Direitos 
da Criança, obrigando-se a estabelecer novos caminhos para que os direitos dos infantes fossem resguardados. A 
autora cita diversas passagens da Convenção que identificam o “cuidado” como valor jurídico, como é o caso do 
artigo 3º, para o qual “os Estados Partes se certificarão que as instituições, os serviços e os estabelecimentos 
encarregados do cuidado ou da direção das crianças cumpram com os padrões estabelecidos pelas autoridades 
competentes”. Por essas normas internacionais, depreende-se que o cuidado e o afeto são valores jurídicos não só 
na sistemática brasileira. PEREIRA, Tânia da Silva. O cuidado como valor jurídico. In.: A ética da convivência 
familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Coordenadores: Tânia da Silva Pereira e Rodrigo da Cunha 
Pereira. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 231. 
 13
NICOLA ABBAGNANO indica que o uso do termo valor, segundo a filosofia, 
tem início quando seu significado é generalizado para indicar qualquer objeto de preferência 
ou de escolha27. Inserir um determinado valor no ordenamento jurídico é uma escolha do 
legislador, que dá preferência a um valor em detrimento de outro. Neste caso, a previsão em 
lei, geral e abstrata, do afeto e do cuidado tem a sua razão de ser no fato de que é papel do 
Direito estabelecer proibições e permissões que viabilizem o convívio social, coibindo 
condutas reprováveis e estimulando comportamentos adequados. Assim, valores como o 
cuidado e o afeto são preferíveis aos valores individualistas e patrimonialistas nas relações 
familiares. 
A importância do cuidado e do afeto ao ordenamento jurídico, 
especialmente no que toca as relações parentais, parte da concepção de que a capacidade de 
desenvolver-se como sujeito e bem se relacionar socialmente depende diretamente de se ter 
recebido tais valores nos primeiros anos de vida, quando o menor, vulnerável, está a moldar 
sua personalidade. Por assim dizer, o papel paterno/materno tem função estruturante do filho 
como sujeito28. Em sentido oposto, a falta desses valores repercute negativamente não só no 
indivíduo, mas também na sociedade. Em relação ao indivíduo, a repercussão da falta de afeto 
e de cuidado dá-se na possibilidade da criança desenvolver uma personalidade agressiva, 
deprimida, rebelde e indisciplinada29; ao passo que, na esfera social, essa falta é apontada, 
inclusive, como possível causa do aumento da delinqüência juvenil30. De tal feita, a ausência 
de tais valores nas primeiras etapas da vida não é maléfica apenas à criança, mas a todo o 
ambiente em que ela irá conviver, pelo que se justifica o interesse público na questão. 
Tendo isso em mente, a Constituição Cidadã de 1988, em seu artigo 227, 
determina, dentre outros deveres dos pais, a convivência familiar e comunitária, a salvo de 
todas as formas de negligência, como um dever dos genitores. Por fazê-lo, resta claro que, 
para o nosso ordenamento, o exercício da paternidade não poderá limitar-seao aporte material 
direcionado à prole, devendo ir além, no que toca a provisão aos menores do aporte afetivo, a 
 
27ABBAGNANO apud ANGELUCI, Cleber Afonso [2]. Abandono Afetivo: Considerações para a constituição 
da dignidade da pessoa humana. Revista CEJ, Brasília, n. 33, abr./jun. 2006, p. 51. 
28PEREIRA, Rodrigo da Cunha [2]. Pai, Por que me Abandonaste? In.:Temas Atuais de Direito e Processo de 
Família – Primeira Série. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004, p. 389. 
29PEREIRA, Tânia. op. cit., p. 234. 
30PEREIRA, Rodrigo [2]. op. cit., p. 389. 
 14
fim de que bem se desenvolvam. Em assim sendo, como já se disse, a 
paternidade/maternidade é encarada como um múnus31. 
Sobre a relevância do afeto nas relações familiares, TÂNIA DA SILVA 
PEREIRA afirma ser a relação afetiva o diferencial definidor da entidade familiar, sendo um 
sentimento entre duas ou mais pessoas que se afeiçoam pelo convívio em virtude de uma 
origem ou de um destino comum32. Hoje, já não restam dúvidas de que os vínculos familiares 
deixaram de ter razão nas questões patrimoniais e que as relações dessa ordem passaram a se 
constituir pelo elo afetivo. Dessa maneira, reconhece-se o princípio da afetividade como 
princípio implícito do ordenamento constitucional33, o que demonstra sua importância 
valorativa ao sistema jurídico brasileiro. 
Quanto ao cuidado, TÂNIA DA SILVA PEREIRA demonstra que este também 
merece lugar como valor jurídico, sendo uma responsabilidade humana como pessoa e como 
cidadã. A referida autora alerta que considerá-lo como tal ocorre em nome do interesse 
público e da ética da co-responsabilidade, fundada na solidariedade e na cidadania, a fim de 
que o cuidado seja usado como informante das relações privadas e institucionais, conduzindo 
a efetivos compromissos34. 
Além dessa característica marcante nas relações parentais, que é a 
responsabilidade, tais elos caracterizam-se também pela permanência do vínculo. A 
responsabilidade decorre da assimetria da relação, ou seja, das posições diferentes que as 
partes ocupam no elo, sendo uma delas dotada de particular vulnerabilidade (o menor ou o 
adolescente). A permanência é, pelo menos, a tendência, pois o término dessa relação é 
custoso e excepcional, ocorrendo, por exemplo, nos casos de risco elevado ou de abuso, que 
 
31A propósito dessa matéria, MARIA CELINA BODIN DE MORAES conclui: “O poder familiar hoje é concebido 
como um poder-dever posto no interesse exclusivo do filho e com finalidade de satisfazer as suas necessidades 
existenciais, consideradas mais importantes, conforme prevê a cláusula geral de tutela da dignidade humana. 
Este também é, não por acaso, o teor do artigo 227 da Constituição Federal, ao determinar ser dever da família 
assegurar, com absoluta prioridade, às crianças e aos adolescentes os direitos à vida, saúde, alimentação, 
educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade e convivência familiar e comunitária”. 
(BODIN DE MORAES, Maria Celina [1]. Danos Morais em Família? Conjugalidade, Parentalidade e 
Responsabilidade Civil. In.: A ética da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. 
Coordenadores: Tânia da Silva Pereira e Rodrigo da Cunha Pereira. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.194-195.) 
32PEREIRA, Tânia. Ibidem, p. 236 
33LÔBO, Paulo Luiz Netto. [3] Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. In.: 
Rodrigo da Cunha Pereira (Coord.) Família e cidadania. O Novo CCB e a vacatio legis. Anais do III Congresso 
Brasileiro de Direito de Família. IBDFAM. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 97. 
34PEREIRA, Tânia. op. cit., p. 237. No mesmo sentido, LEONARDO BOFF considera o cuidado como uma atitude 
de ocupação, preocupação, responsabilização e envolvimento com o outro (BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética 
do humano, compaixão pela terra. Petrópolis, Vozes: 2003, p. 34). 
 15
ensejam a perda do poder familiar35. Ademais disso, ainda existem as hipóteses em que há o 
rompimento do vínculo de filiação em conseqüência do fim do matrimônio entre os genitores, 
podendo ser esse corte voluntário ou até mesmo decorrente da pressão a favor do afastamento 
exercida pelo ex-cônjuge guardião do infante. 
Por essas características das relações parentais, a legislação vigente, em 
diversas passagens, determina que aos pais é dada a incumbência de guarda, sustento e 
educação dos infantes, bem como o dever de assegurar-lhes direitos como a vida, o lazer, a 
saúde, entre outros. Assim, pela idealização da parentalidade exercida em prol do melhor 
interesse do menor e da “defesa da ordem social a partir da criança36”, é trazida à esfera 
pública a discussão da condução dos deveres da parentalidade, restando claro que o 
ordenamento determina a dedicação paterna/materna na criação de seus filhos, dadas 
implicações individuais e sociais decorrentes de uma possível omissão. Conclui-se, destarte, 
que a atitude cuidadosa, sobretudo nas relações parentais, recebe estímulos vários pelo 
sistema jurídico, o que demonstra o valor que o Direito lhe resguarda. 
1.4 A Constitucionalização do Direito Civil no âmbito familiar 
MARIA CELINA BODIN DE MORAES observa que, desde a promulgação da 
Constituição Federal de 1988, o Direito Civil sofreu uma reviravolta para se adaptar à nova 
orientação que confere eficácia normativa ao texto constitucional. Esse novo rumo do 
constitucionalismo pós-moderno somente foi possível por dois motivos. Em primeiro lugar, 
em razão do afastamento da concepção de que a Constituição seria mera carta política e, em 
segundo lugar, através do desenvolvimento dos estudos da teoria geral do direito acerca da 
aplicação dos princípios constitucionais e da metodologia de sua ponderação37. 
Significa dizer que no pós-positivismo do Estado Democrático de Direito 
abandonou-se a legalidade em sentido estrito em direção a opções mais seguras, nas quais os 
princípios da democracia, da liberdade e da solidariedade são preponderantes. O regramento 
civil deve respeito à Lei Maior tanto do ponto de vista formal, quanto do ponto de vista 
material, devendo as normas infraconstitucionais refletir o valor sobre o qual se funda, qual 
seja o mais importante, o da dignidade da pessoa humana. 
 
35BODIN DE MORAES [1], op. cit., p. 195. 
36POCAR e RONFANI apud BODIN DE MORAES [1]. Ibidem. p. 194. 
37BODIN DE MORAES, Maria Celina [2]. A constitucionalização do direito civil e seus efeitos sobre a 
responsabilidade civil. In.: Direito, Estado e Sociedade – v.9, n. 29, p. 233 – jul/dez 2006. Disponível em: 
http://publique.rdc.puc-rio.br/direito/media/Bodin_n29.pdf Acesso: 11/11/2009. 
 16
A consagração da dignidade da pessoa humana como princípio elevado ao 
topo do ordenamento jurídico, além de provocar uma releitura das relações jurídicas, 
modificou a estrutura tradicional civilística na medida em que determinou o predomínio das 
relações jurídicas existenciais em detrimento das relações patrimoniais38. 
Verdadeiramente, o paradigma civil-constitucional hodierno reza pela 
conservação da humanidade. Trata-se de um cenário em que surge um humanismo renovado, 
cuja prioridade é a tutela das pessoas, principalmente das crianças e dos adolescentes, sendo 
abandonadas as interpretações normativas meramente individualistas. 
Como a tutela da pessoa é a prioridade da sistemática civil-constitucional, 
conclui-se que pretensões patrimonialistas ou individualistas sucumbem se em conflito com 
pretensões referentes à dignidade humana. Por esse novo contexto, verifique-se a 
imperiosidade de que seja explorada a dimensão atribuída pelo ordenamento jurídico vigente 
ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, dada sua peculiar capacidade de conferir 
unidade valorativaà sistemática civil, bem como as implicações que o desrespeito a este 
princípio dão ensejo. 
CAPÍTULO II 
2. Os Princípios no Direito de Família 
O positivismo jurídico não é capaz de acompanhar a realidade e a evolução 
social da família, pelo que esta, além de ter grande amplitude de possíveis relações, sofre 
mutações com facilidade tamanha que o regramento é incapaz de contemplar todas as 
hipóteses de situações possíveis, tão pouco de se adaptar a tempo. 
É por esse pretexto que, em muitos casos, as leis não trazem os elementos 
necessários e suficientes para que o mais próximo ao justo seja alcançado. Desse modo, os 
operadores do direito partem em busca de fontes outras, como os princípios gerais, a fim de 
encontrar aquilo que mais se aproxime do ideal de retidão. Nesse sentido, PEREIRA entende 
 
38
 Sobre esse assunto, BODIN DE MORAES disserta: “A transposição de normas diretivas do sistema de Direito 
Civil do texto do Código Civil para o da Constituição acarretou relevantíssimas conseqüências jurídicas que se 
delineiam a partir da alteração da tutela, que era oferecida pelo Código ao “indivíduo”, para a proteção, garantida 
pela Constituição, à dignidade da pessoa humana, elevada à condição de fundamento da República Federativa do 
Brasil. O princípio constitucional visa garantir o respeito e a proteção da dignidade humana não apenas no 
sentido de assegurar um tratamento humano e não-degradante, e não conduz exclusivamente ao oferecimento de 
garantias à integridade física do ser humano. Dado o caráter normativo dos princípios constitucionais, princípios 
que contém valores ético-jurídicos fornecidos pela democracia, isto vem a significar a completa transformação 
do Direito Civil, de um Direito que não mais encontra nos valores individualistas codificados o seu fundamento 
axiológico”. (BODIN DE MORAES, Maria Celina [3]. Danos à pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, 
p. 74). 
 17
que são os princípios gerais do direito, dentre todas as demais fontes, o lugar em que se 
encontra a melhor viabilização para a adequação da justiça, especialmente no que corresponde 
ao ramo familiar39. 
O autor aduz ainda que os princípios exercem dupla função, sendo a 
primeira delas a função de otimização do direito. Em outras palavras, a sua força deve 
alcançar toda organização jurídica, inclusive preenchendo lacunas legislativas, independente 
de serem expressos ou não expressos. Já a segunda função dos princípios jurídicos é a de 
possuírem papel sistematizador do ordenamento, dando-lhe suscetibilidade de valoração, bem 
como dinamicidade, na proporção em que conferem axiologia à interpretação das regras 
positivas40. 
Com efeito, a utilização dos princípios como norte em casos concretos é o 
que afasta o engessamento e a sobreposição do direito sobre os fatos, conduzindo-nos à 
essência do direito, na direção de resguardar o sujeito, em detrimento de seu formalismo. 
Portanto, a partir da nova hermenêutica civil-constitucional, os princípios ganharam força 
normativa para apaziguar as relações familiares, sempre tendo em vista a pessoa humana. 
 2.1 Os Princípios em espécie 
2.1.1 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana 
O princípio que mais importa ao presente estudo é o da dignidade da pessoa 
humana, previsto no artigo 1º, III, da Constituição Federal de 1988, como fundamento da 
República Federativa do Brasil. Na atualidade é impossível pensar em direito sem considerar 
o conceito de dignidade da pessoa humana, pois hoje a dignidade é vista como um 
macroprincípio sob o qual irradiam e estão contidos os demais41. 
A palavra “dignidade” tem a raiz etimológica proveniente do latim dignus – 
aquele que merece estima e honra, aquele que é importante. É o que distingue os seres 
humanos dos demais, sendo a dignidade inerente à espécie humana como um todo42. 
A dignidade da pessoa humana é um conceito que tomou os contornos 
presentes em 1788 através do pensamento de IMMANUEL KANT, em Fundamentação da 
 
39PEREIRA, Rodrigo [1] op. cit. p. 36. 
40Idem, ibidem, mesma página. 
41PEREIRA, Rodrigo [1]. op. cit. p. 94 
42BODIN DE MORAES [3], op. cit.. p. 77. 
 18
Metafísica dos Costumes e Outros Escritos43. Nessa obra, o filósofo estabeleceu a moralidade 
em bases novas através do que chamou de “imperativo prático”, que determina aos sujeitos 
que ajam de maneira tal que possam usar a humanidade, própria e alheia, sempre e 
simultaneamente, como um fim e nunca simplesmente como um meio44. 
É que, a partir do raciocínio kantiano, o homem passou a ser considerado 
como um ser dotado de valor intrínseco, de dignidade, pois “o que se faz condição para 
alguma coisa que seja fim em si mesma, isso não tem simplesmente valor relativo ou preço, 
mas um valor interno, e isso quer dizer, dignidade45”. 
Sobre a temática, a Ministra CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA considera a 
dignidade como o pressuposto da idéia de justiça humana. Explica que assim o faz por 
entender a dignidade como ditadora da condição superior do homem como ser de razão e de 
sentimento e que, por sê-lo assim, independe de merecimento pessoal ou social. Sintetiza 
elucidando que a dignidade é inerente à vida e um direito pré-estatal46. 
Para KANT, no mundo social existem duas categorias de valores, o preço e a 
dignidade. Na proporção em que as coisas têm um preço, um valor exterior (de mercado), as 
pessoas tem dignidade, cujo valor é interior (moral) e de interesse geral47. Sendo o valor 
moral infinitamente superior ao valor de mercadoria, então impõe-se o “imperativo prático” 
segundo o qual as pessoas devem agir de tal sorte que seja considerada a humanidade, própria 
e alheia, sempre e simultaneamente como um fim e jamais como um meio48. 
Conclui-se, por tal noção filosófica do que seja dignidade, que se trata de 
tudo que não tenha preço e que não possa ser objeto de troca, porquanto inestimável e 
indisponível49. É a dignidade que posiciona o homem em uma condição superior, como ser de 
 
43KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. Tradução: Leopoldo 
Holzbach. São Paulo: Martin Claret, 2005. 
44Idem, ibidem, p. 59. 
45
 Idem, ibidem, p. 65. 
46ANTUNES ROCHA, Carmem Lúcia. O princípio da dignidade humana e a exclusão social. In.: Anais do 
XVII Conferência nacional dos Advogados – Justiça: realidade e utopia. Brasília: OAB, Conselho Federal, v. I, 
2000. p. 72. 
47
 Efetivamente, é o raciocínio do filósofo alemão na célebre passagem: “No reino dos fins tudo tem ou um preço 
ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente; 
mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem dignidade”. 
(KANT, op. cit., p. 65) 
48PEREIRA DA COSTA, Maria Isabel. Família: Do Autoritarismo ao Afeto – Como e a Quem Indenizar a 
Omissão do Afeto? In.: Revista Brasileira de Direito de Família, v. 7, n. 32, out/nov., Porto Alegre: Síntese, 
IBDFAM 2005, p. 55. 
49CANEZIN, Ibidem, mesma página. 
 19
razão e de sentimento50, motivo pelo qual é papel do julgador e do legislador ter em vista o 
valor humano no exercício de suas atribuições. 
Tendo em conta que o princípio da dignidade da pessoa humana assenta o 
sujeito de direito e a sua dignidade como o núcleo de uma teoria de justiça, em que o Direito é 
considerado o instrumento de ordenação racional indissociável da realização do justo, não é 
razoável que instituições humanas sejam constituídas sem que a pessoa humana tenha a sua 
dignidade resguardada. 
Com efeito, PEREIRA assegura que como a dignidade do homem é 
intangível, é papel do Poder Público respeitá-la e protegê-la51. O autor expõe ainda que a 
dignidade é o atual paradigmado Estado Democrático de Direito, a determinar a 
funcionalização de todos os institutos jurídicos condicionada à pessoa humana. E é nesse 
mote que o Estado assume o papel de protetor do respeito à dignidade da pessoa humana, 
tanto do ponto de vista de conceder direitos, quanto de garantir que estes não sejam violados. 
Conforme já dito, uma vez que a família é a base da sociedade, e também 
elemento indispensável ao desenvolvimento do ser humano, a organização estatal deve ser 
orientada para livrar seus membros de quaisquer medidas que venham a supri-los da 
convivência em ambiente familiar permeado de valores tais como o afeto e o cuidado. 
Dizemos isso por entendermos que a supressão desses valores, principalmente nos primeiros 
estágios de vida da pessoa, reduz as possibilidades de que essa pessoa desenvolva todas as 
suas capacidades psicofísicas. Como crianças e adolescentes são vulneráveis e dependem de 
outros ao seu redor a fim de que possam crescer física e mentalmente, daí a importância 
desses valores e a relevância dos genitores no papel estruturante da personalidade da prole. 
Portanto, o interesse público na conservação dos papéis paterno e materno 
reside na repercussão do exercício das atividades de cuidado e afeto precípuas do encargo dos 
genitores, em favor da dignidade dos menores. 
2.1.2 O Princípio da Paternidade e da Maternidade Responsável 
O princípio da paternidade ou da maternidade responsável decorre do 
imperativo constitucional, no que toca o dever de se fazer um planejamento familiar, 
preexistente ao próprio nascimento da criança52. 
 
50PEREIRA, Rodrigo [1], op. cit., p. 95. 
51Idem, ibidem, p. 99 
52PEREIRA DA COSTA, op. cit., p. 52. 
 20
A responsabilidade paterna ou materna não se esgota neste planejamento e 
na conscientização da importância do instituto. Ademais disso, a paternidade/maternidade 
responsável pressupõe o cumprimento das obrigações materiais e morais para com os filhos, a 
fim de propiciar o seu desenvolvimento regular. Com efeito, o normal desenvolvimento da 
pessoa somente é possível se ela tiver condições dignas de sobrevivência, motivo pelo qual 
não basta que sejam destinados recursos materiais a fim de criar e educar a prole, há que 
respeitá-la em sua dignidade. 
Isso porque pais e a mães responsáveis têm consciência de que o 
inadequado exercício de suas funções interfere de maneira prejudicial ao crescimento dos 
infantes. De fato, o desprezo, a indiferença e a falta de afeto interferem na formação da 
personalidade e, conforme apontado por MARIA ISABEL PEREIRA DA COSTA, resultam como 
conseqüência em uma pessoa agressiva, insegura, infeliz, o que é danoso não só para o 
indivíduo, como também para toda a sociedade, dada a maior criminalidade de indivíduos 
nessas condições53. 
A paternidade/maternidade responsável, portanto, se manifesta na 
consciência dos pais acerca dos encargos decorrentes da decisão de se ter um filho e na 
efetiva disposição do suporte material, moral, espiritual e afetivo para o pleno 
desenvolvimento da personalidade da prole, formando indivíduos aptos ao convívio social. 
2.1.3 O Princípio da Afetividade 
O princípio da afetividade é um dos desdobramentos do princípio do 
respeito à dignidade da pessoa humana, na medida em que toda a orientação jurídica 
desenvolve-se no sentido de garantir ao indivíduo uma vida digna, atribuindo valor jurídico ao 
afeto, sobretudo nas relações entre pais e filhos. 
Conforme destacado por PEREIRA, a família até o século XIX era claramente 
patriarcal e estruturava-se em torno do patrimônio, sendo um agrupamento de indivíduos cuja 
razão de ser era precipuamente de cunho econômico54. Com a nova ordem civil-
constitucional, a estrutura familiar deixou de lado as motivações econômicas, que 
anteriormente tinham importância primária nessas relações, dando lugar a elos afetivos, 
justificados pela solidariedade mútua55. 
 
53Idem, ibidem, p. 53. 
54PEREIRA, Rodrigo [1], op. cit., p. 179. 
55Realmente, sobre o novo escopo das relações familiares PAULO LUIZ NETTO LÔBO sintetiza desse modo: “A 
realização pessoal da afetividade e da dignidade humana, no ambiente de convivência e solidariedade, é a função 
 21
É o princípio da afetividade que confere substrato material à convivência 
familiar como direito-dever, nos moldes do artigo 227 da Carta Magna. É dito isso, pois, a 
convivência familiar é um direito da criança e do adolescente, no melhor interesse desses 
menores, bem como dever dos pais para com sua prole, tendo em vista a 
paternidade/maternidade responsável. 
A ratio desse dispositivo está no reconhecimento da família como o locus 
de realização do indivíduo, onde ele inicia seu desenvolvimento pessoal, seu processo de 
socialização, tomando suas primeiras lições de cidadania56. A convivência em ambiente 
familiar, permeado de afeto, é de especial essencialidade na vida dos menores; uma vez que, 
dada a sua peculiar condição de seres em desenvolvimento, merecem dispor do apoio e do 
afeto de seus pais a fim de que tenham uma formação adequada. 
No que toca os deveres paternos quanto aos filhos, este princípio é corolário 
do princípio da paternidade/maternidade responsável, pelo que determina que aos pais cumpre 
realizar o planejamento familiar. Já em relação aos filhos, o respeito ao princípio da 
afetividade, quanto à convivência familiar, é o que concretiza o melhor interesse dos menores, 
porquanto o afeto seja imprescindível em sua formação. 
Dessa maneira, a partir dos fenômenos da despatrimonialização, decorrente 
da repersonalização das relações privadas, o foco das relações jurídicas passou a ser a pessoa 
humana, a realização dos membros da família e o relacionamento baseado no afeto, na 
importância da convivência familiar e na solidariedade mútua. 
2.1.4 O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente 
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é um resultado 
da nova família cuja relação está pautada na afetividade e no companheirismo. Nesse 
contexto, o menor ganhou destaque especial pelo fato de ser imaturo e vulnerável, precisando 
que os pais o conduzam em direção à autonomia57. 
Este princípio tem suas raízes na doutrina da proteção integral, que segue as 
orientações do já mencionado artigo 227 da Lei Maior, segundo o qual é assegurado como 
 
básica da família de nossa época. Suas antigas funções econômica, política religiosa e procracional feneceram, 
desapareceram, ou desempenham papel secundário. Até mesmo a função procracional, com a secularização 
crescente do direito de família e a primazia atribuída ao afeto, deixou de ser sua finalidade precípua”. (LÔBO, 
Paulo Luiz Netto. [1] A repersonalização das relações de família. Revista brasileira de Direito de Família. Porto 
Alegre: Síntese, IBDFAM, v. 6, n. 24, p. 155, jun/jul 2004). 
56PEREIRA, Rodrigo [1], op. cit. p. 182 
57PEREIRA, Rodrigo [1], op. cit. p. 127 
 22
dever dos pais, do Estado e da sociedade, e também como direito fundamental dos infantes, o 
convívio familiar, na mesma medida em que assegura os direitos à vida, à saúde, à educação, 
à liberdade, ao respeito e à dignidade, além de colocá-los a salvo de toda forma de 
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 
De acordo com MARIA ISABEL PEREIRA DA COSTA, a proteção integral é um 
conceito pós-moderno, por tratar a criança e o adolescente em sua integridade, deliberando a 
convivência familiar, bem como a comunitária, como um direito fundamental dessas pessoas 
em desenvolvimento58. 
O especial apreço conferido aos infantes funda-se no reconhecimentode que 
a família tem por objetivo a promoção do menor, enquanto pessoa frágil e vulnerável, para 
que bem desenvolva suas potencialidades no tocante a sua educação, formação moral e 
profissional. 
Seguindo a orientação constitucional, foi elaborado o Estatuto da Criança e 
do Adolescente. O art. 1º do ECA elucida que suas disposições tratam da efetivação da 
doutrina da proteção integral. Dentre os direitos garantidos àqueles que se submetem ao ECA, 
está o direito à saúde. Conforme as normas do Estatuto, a saúde garantida aos menores 
abrange não só a física, alcançando a saúde emocional e espiritual. A preservação da saúde 
mental das pessoas em desenvolvimento – isto é, de sua integridade psicofísica - tem por 
escopo garantir a formação de uma personalidade sadia de um indivíduo realizado e integrado 
à sociedade. 
Nesse diapasão, note-se que cabe aos pais, no cumprimento dos seus 
deveres legais, proteger a criança e o adolescente de forma integral, não omitindo afeto e 
cuidado no exercício da paternidade, porquanto sejam tais valores elementos indispensáveis à 
formação plena da personalidade das pessoas em desenvolvimento. 
2.2 A ponderação dos princípios jurídicos na perspectiva civil-constitucional 
É certo, como defende RODRIGO DA CUNHA PEREIRA, que vivemos em uma 
sociedade pluralista e multicultural e que, por isso, a Carta Magna muitas vezes contempla 
interesses contrapostos59. 
Em várias situações jurídicas subjetivas lados em conflito parecem ter 
alguma orientação que venha a assegurar o ponto de vista de cada qual, sugerindo um conflito 
 
58COSTA, op. cit. p. 58 
59PEREIRA, Rodrigo [1], op. cit., p. 33. 
 23
intransponível. Todavia, a solução dessa circunstância subjetiva encontra o interesse que 
merece proteção jurídica através da ponderação dos princípios que circundam o caso. 
Sendo inevitável o choque de interesses, representados pelos princípios em 
jogo, cuidou-se de buscar vias que solucionem a suposta encruzilhada. De tal maneira, 
estudos jurídico-filosóficos elaborados por ROBERT ALEXY, em Teoria dos Direitos 
Fundamentais60, trouxeram à baila a corrente de pensamento que resolve a colisão de 
princípios jurídicos através da ponderação, feita pelo intérprete, dos bens jurídicos em jogo. 
Para ALEXY: 
Se dois princípios colidem – o que ocorre, por exemplo, quando 
algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com outro, 
permitido-, um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, 
nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele 
deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é 
que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas 
condições. Sob outras condições, a precedência pode ser resolvida de forma 
oposta. Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, 
os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com maior peso tem 
precedência61. 
Assim, havendo uma situação jurídica subjetiva, na qual dois ou mais 
princípios entram em conflito, é por meio do sopesamento entre os interesses conflitantes que 
será resolvida a controvérsia e decidido o princípio e interesse prevalecente no caso 
concreto62. 
Nesse viés, percebemos que o “fiel da balança” tende a apontar em direção 
ao princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista a pessoa como centro do 
ordenamento jurídico, ainda que não exista uma hierarquia entre os princípios jurídicos 
constitucionais. A respeito desse tema, PEREIRA comenta que não se proclama a hierarquia 
absoluta entre princípios, devendo-se observar a ascensão da dignidade humana na ordem 
jurídica, tendo em conta a prevalência do sujeito em detrimento do objeto nas relações 
jurídicas63. 
Dito isso, no caso de ocorrer uma colisão entre princípios, é papel do 
intérprete buscar a melhor forma de alcançar a dignidade da pessoa humana. Desse modo, no 
caso concreto, em havendo choque, a tendência é que o princípio a ceder em face de outro 
 
60ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução da 5ª ed. alemã por Virgílio Afonso da Silva. 
Malheiros: São Paulo, 2008. 
61
 Idem, ibidem, p. 93. 
62
 Idem, ibidem, p. 95. 
63PEREIRA [1], op. cit., p. 35 
 24
será aquele que se relacionar com a dignidade humana em menor amplitude. Logicamente, 
aquele que estiver mais ligado à dignidade tenderá a prevalecer. 
Considerando que diversos são os setores da ordem jurídica que são 
alcançados pelo valor da dignidade, é imprescindível que sejam traçados os corolários desse 
princípio constitucional, sob pena de atribuir-lhe um grau de abstração tamanho que 
impossibilite sua aplicação64. 
Para tanto, desdobra-se o substrato material da dignidade em quatro 
postulados. São eles: a) o reconhecimento, por parte do sujeito moral (ético), de que existem 
outros sujeitos, iguais a ele; b) a consideração de que esses sujeitos iguais são merecedores do 
mesmo respeito à integridade psicofísica de que é titular; c) a ciência de que ele, como sujeito, 
é dotado de vontade livre, de autodeterminação; d) e, por fim, estar convencido de que ele é 
parte do grupo social, o que o garante de não vir a ser marginalizado. Esta elaboração tem por 
corolários os princípios jurídicos da igualdade, da integridade física e moral – psicofísica, da 
liberdade e da solidariedade65. 
Importa tal decomposição a fim de se mostrar que, em havendo conflitos 
entre duas ou mais situações jurídicas subjetivas, em que cada uma delas tem por amparo um 
desses princípios de igual importância hierárquica, então “o fiel da balança, a medida de 
ponderação, o objetivo a ser alcançado, já está determinado, a priori, a favor do princípio, 
hoje absoluto, da dignidade humana66”. 
Em outras palavras, cumpre demonstrar que, embora possa haver um 
conflito entre duas situações subjetivas amparadas pelos princípios que conferem substrato 
material ao da dignidade humana, tal conflito é apenas aparente. Em verdade, se corretamente 
for feita a ponderação entre esses subprincípios no caso concreto, então é possível determinar 
aquele que prevalecerá. 
Primeiramente, sobre o princípio da igualdade, este deve ser analisado sob 
seus dois aspectos, formal e material. Do ponto de vista formal, primeiro a ser concebido, o 
princípio reza pela garantia de que o sujeito não venha a receber qualquer tratamento 
discriminatório, tendo direitos iguais aos de todos os demais. Quanto à feição material, as 
diferenças entre os sujeitos de direito são reconhecidas, de modo a lhes conferir tratamento 
desigual na medida de suas desigualdades. 
 
64BODIN DE MORAES, [3], op. cit., p. 84. 
65Idem, ibidem, p. 85. 
66Idem, ibidem, mesma página. 
 25
Acerca do princípio de proteção à integridade psicofísica da pessoa humana, 
contemplavam-se, tradicionalmente, apenas os direitos de não ser torturado e de ser titular de 
garantias penais. Todavia, na esfera cível moderna, trata-se também da garantia de diversos 
direitos da personalidade, compreendendo o “direito à saúde” em sentido amplo, que abrange 
o bem-estar psicofísico e social67. O termo “integridade” vem do latim integritas, que 
significa inteireza, completude, totalidade. É um estado de característica daquilo que está 
inteiro, que não sofreu qualquer diminuição. Transportada essa noção ao ordenamento 
jurídico, como princípio, a integridade psicofísica diz respeito ao direito de não ter a harmonia 
das capacidades físicas e psíquicas lesionadas ou diminuídas. 
A respeito do princípio da liberdade e da autonomia privada, este passou por 
uma grande mudança desde as primeiras décadas do século XX. Isso porque, na época liberal, 
este princípio tinha como valor fundamental o indivíduo livree igual, submetido à sua própria 
vontade. Naquele cenário, o direito cuidava de regular situações precipuamente patrimoniais e 
as restrições à liberdade ampla do indivíduo apenas existiam para proteger as liberdades dos 
demais particulares68. 
Na medida em que o Direito passou a cuidar de relações extrapatrimoniais, 
essa conjuntura deu lugar a uma nova, segundo a qual a autonomia privada encontra limites 
na ordem pública. É que, antes as limitações às situações subjetivos individuais constituíam 
exceção, passando, no quadro contemporâneo, a receber a tutela do ordenamento se e 
enquanto estiverem não apenas em conformidade com a vontade do titular, mas também se 
estiverem em sintonia com o interesse social69. 
Por fim, quanto ao direito-dever de solidariedade social, a concepção 
humanista, decorrente do pós-guerra no século XX, veio a combater todas as formas de 
agressão contra a coletividade. Por solidariedade, deve-se entender, em última análise, como 
“o conjunto de instrumentos voltados para garantir uma existência digna, comum a todos, em 
uma sociedade que se desenvolva como livre e justa, sem excluídos ou marginalizados70”. 
 
67Idem, ibidem, p. 93 e 94. 
68
 Acerca da matéria, BODIN DE MORAES elucida: “A autonomia dos privados se contrapunha à ordem pública 
e/ou aos interesses da coletividade, os quais somente em pouquíssimos setores, considerados estratégicos, 
podiam prevalecer sobre os interesses privados. Tal concepção, denominada liberalismo jurídico, apresentava o 
Direito privado como “o coração de toda vida jurídica” e o Direito Público uma “leve moldura que devia servir 
de proteção ao primeiro”. (Idem, ibidem, p. 104). 
69Idem, ibidem, p. 106. 
70Idem, ibidem, p. 114 
 26
Destaque-se o caráter inovador do princípio da solidariedade esculpido no 
imperativo constitucional, a ser levada em conta na elaboração legislativa, na execução de 
políticas públicas e, também, na interpretação e aplicação do direito por seus operadores e 
demais destinatários71. Na realidade, o princípio da solidariedade social tem força normativa 
capaz de tutelar o respeito a cada um do grupo, sendo, inclusive, “fundamento daquelas lesões 
que tenham no grupo sua ocasião de realização72”. 
Nesse ponto, levantamos a temática da contraposição entre dois dos 
princípios corolários da dignidade, quais sejam o direito de liberdade da pessoa e o direito de 
solidariedade social. A primeira vista, são incompatíveis, de modo que em situações 
subjetivas possam facilmente entrar em colisão. A solução do suposto conflito entre 
princípios se dá através da ponderação entre eles, tendo em mente o fim último do 
ordenamento, que é a realização da dignidade humana. Feito isso, ora um princípio 
prepondera, ora outro, a depender do caso concreto73. 
Na temática proposta no presente estudo, verificaremos que esses princípios 
entram em conflito nas ações que versam sobre a condenação a título de danos morais 
decorrentes do abandono afetivo nas relações paterno-filiais. 
Uma situação subjetiva passível de reparação deve estar amparada em, ao 
menos, um dos quatro princípios corolários da dignidade humana, quais sejam igualdade, 
liberdade, integridade psicofísica e direito-dever de solidariedade social, para que seja 
possível conferir tutela jurisdicional dos danos à pessoa humana. Caso nessa situação 
subjetiva mais de um desses em princípios estejam em conflito, há que ser feita a ponderação 
entre eles no caso concreto para que seja encontrada a solução mais justa, mais próxima da 
proteção à dignidade74. 
Em relação às crianças e aos adolescentes e à garantia constitucional ao 
convívio familiar em ambiente permeada de afeto, vislumbramos na esfera dos menores a 
afronta ao seu bem-estar psicofísico e social, pautado no princípio da integridade psicofísica, 
além do desrespeito, tocante ao princípio da solidariedade familiar, garantia de que o sujeito 
 
71Idem, ibidem, p. 110 e 111. 
72Idem, ibidem, p. 116. 
73Se assim não fosse, a excessividade de imposição da solidariedade anularia a liberdade; enquanto a liberdade 
sem arbítrios seria incompatível com a solidariedade. Em verdade, a ponderação, se bem feita, permite que os 
conteúdos desses princípios tornem-se complementares, pois, quando regulamentada a liberdade em prol da 
solidariedade social, restam reduzidas as desigualdades, possibilitando o livre desenvolvimento da personalidade 
de cada um dos membros da comunidade. (Idem, ibidem, p. 108). 
74Idem, ibidem, p. 117 
 27
não seja marginalizado. Já na esfera dos pais omissos em prover afeto à prole, verifica-se o 
princípio da liberdade/autonomia. 
Com tal atitude omissiva, o pai ou a mãe que abandona afetivamente o 
menor desrespeita, além da dignidade da pessoa do filho, princípios específicos do Direito de 
Família, como o da paternidade/maternidade responsável e o da afetividade, em que o 
agrupamento familiar se dá com base planejamento familiar, no afeto e na solidariedade entre 
seus membros. 
Nesse contexto, há que se verificar a possibilidade dos danos sofridos por 
tais “grandes traumatizados”, decorrentes da inatividade dos pais em prover afeto à sua prole, 
de serem enquadrados dentre os danos que geram a obrigação de compensar a vítima a título 
de danos morais. Isto é, cumpre examinar se estão os danos por abandono afetivo nas relações 
paterno-filiais entre os danos morais indenizáveis, levando em conta as construções 
doutrinárias e jurisprudenciais hodiernas sobre o tema posto. 
CAPÍTULO III 
3. A Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo nas Relações Paterno-
Filiais 
3.1 Noções Gerais de Responsabilidade Civil 
3.1.1 Conceito e Finalidade da Responsabilidade Civil 
RUI STOCCO traz o significado etimológico da palavra responsabilidade, 
afirmando que a noção do que ela exprime pode ser haurida de sua própria origem, do latim 
respondere, responder a alguma coisa. Ou seja, é a necessidade de que alguém dê uma 
resposta, por ser responsável pelo advento de atos danosos, próprios ou alheios75. 
De acordo com os ensinamentos de SERGIO CAVALIERI FILHO, o objetivo 
principal da ordem jurídica é proteger o lícito e reprimir o ilícito através do estabelecimento 
de deveres jurídicos. Tais deveres dependerão da natureza do direito a que correspondem, 
bem como das pessoas a quem atingem. A imposição desses deveres se dá em virtude da 
necessária convivência social e importam na criação de obrigações76. 
 
75STOCCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 5ª ed. São Paulo: RT, 2001, p. 89. 
76CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª edição, revista e ampliada. São Paulo: 
Atlas S.A, 2009, p. 1-2. 
 28
Os deveres impostos pelo ordenamento jurídico dividem-se em deveres 
originários e deveres sucessivos. Os deveres jurídicos originários dizem respeito à conduta 
positivada no ordenamento, a qual o sujeito deve seguir. Caso não o faça, em acarretando 
danos a outrem, os deveres originários impõem o dever sucessivo de reparação do dano77. 
É neste mote que surge a noção de responsabilidade civil, segundo 
CAVALIERI FILHO, que a conceitua sinteticamente como o “dever jurídico sucessivo que surge 
para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário78”. A relação 
jurídica da qual decorre o dever originário a que se alude pode tanto advir de um contrato (que 
enseja a responsabilidade contratual), quanto de uma lei ou do ordenamento (que dá origem à 
responsabilidade extracontratual). 
Falaremos no presente estudo da responsabilidade civil extracontratual, mais 
especificadamente da subjetiva. Os fundamentos legais da responsabilidade civil subjetiva 
estão previstos nos artigos 186 e 927, do Código Civil de2002. O primeiro dispõe que 
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e 
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. O segundo 
determina o seguinte: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a 
repará-lo”. 
Em outras palavras, o civilmente responsável tem a obrigação, imposta 
legalmente, de indenizar a vítima do dano a que ele deu causa. É esta indenização, pois, a 
finalidade precípua da noção de responsabilidade. 
À primeira vista, o fim da obrigação de indenizar é colocar a vítima na 
situação em que estaria sem a ocorrência do fato danoso79. Esta pretensão de obrigar o agente 
causador do dano a repará-lo tem por inspiração sentimento de justiça tal que restabeleça o 
equilíbrio jurídico-econômico anteriormente existente entre vítima e agente80. 
Importante destacar que o dano pode ser extrapatrimonial ou patrimonial. 
Nos casos em que o dano é extrapatrimonial, esse equilíbrio não diz tanto respeito à natureza 
econômica, vez que a condenação por responsabilidade civil não é de cunho indenizatório, 
mas sim compensatório. Assim, propõe-se retribuir à vítima do dano moral em pecúnia de 
alguma maneira que possa a dor sentida ser compensada. 
 
77Idem, ibidem, mesma página. 
78Idem, ibidem, mesma página. 
79Idem, ibidem, p. 4. 
80Idem, ibidem, p. 13. 
 29
3.1.2 Pressupostos da Responsabilidade Civil Subjetiva 
O conjunto de pressupostos apontados comumente pela doutrina, que 
caracterizam o dever de indenizar por responsabilidade civil subjetiva, são: a conduta culposa 
ou dolosa do agente, o dano e o nexo causal entre este dano e o ato81. 
Primeiramente, acerca da noção de ato, pela redação do artigo 927, CC, o 
ato, para que ensejasse o dever sucessivo de indenizar, deveria ser ilícito. No entanto, a noção 
de ato ilícito foi abandonada em favor do que entendemos hoje por dano injusto82, de modo 
que a redação deste artigo não pode ser considerada em sua literalidade. 
Esse dano, a princípio, era conceituado como sendo a efetiva diminuição do 
patrimônio da vítima. Contudo, com o advento da noção de danos morais, esse conceito foi 
modificado para considerar também os danos de ordem extrapatrimonial. Hoje, dano é visto 
como “a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja sua natureza, quer se 
trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da 
vítima83”. Logo, para o ordenamento atual, o dano é a efetiva lesão a um bem jurídico, 
podendo ser este bem de ordem tanto patrimonial como moral. 
Sobre a conduta, cujo conceito é “comportamento humano voluntário que se 
exterioriza através de uma ação ou omissão, produzindo conseqüências jurídicas84”. Note-se 
que a conduta pode ser tanto uma ação, sendo esta um comportamento comissivo e positivo, 
quanto uma omissão, que é a inatividade ou abstenção de uma conduta devida. 
 
81Idem, ibidem, p. 18 
82ORLANDO GOMES, há cerca de vinte anos, já anunciava que uma das grandes novidades no campo teórico da 
responsabilidade civil foi o giro conceitual de ato ilícito para a noção de dano injusto. Antes, o ato ilícito 
desdobrava-se em dois elementos, objetivo e subjetivo. O elemento objetivo consistia na violação de um direito 
legal que atribuísse direito subjetivo a particular, enquanto o subjetivo dizia respeito à culpabilidade na atuação. 
Os dois elementos conjuntamente considerados eram vistos como o fato gerador da responsabilidade. Essa 
construção lógica não mais prospera na perspectiva atual e foi TUCCI quem primeiro visualizou essa alteração. A 
perspectiva da responsabilidade civil mudou, deixando de ter o foco no agente causador do dano para a pessoa 
que sofre o dano. Logo, o comportamento reprimido na lei civil não é mais somente a atuação antijurídica, 
reprime-se também a injustiça do dano (GOMES, Orlando. Tendências modernas na teoria da responsabilidade 
civil. In.: Estudos em homenagem ao Professor Sílvio Rodrigues. Prefácio e organização José Roberto Pacheco 
di Francesco. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 292 e ss.). A expressão “dano injusto” tem origem na doutrina da 
Itália e está prevista no artigo 2.043 do Código Civil de 1942 daquele país, cuja redação é “Qualinque fatto 
doloso o colposo, che cogiona ad altri um danno ingiusto, obbliga colui che há commesso il fatto a risarcire il 
danno” (BODIN DE MORAES [3], op. cit., p. 177. A autora traduz o artigo assim: “Qualquer fato doloso ou 
culposo que cause a outros um dano injusto obriga quem cometeu o fato a ressarcir o dano.”). Nesse diapasão, 
GOMES define dano injusto como “a alteração in concreto de qualquer bem jurídico do qual o sujeito é 
titular”(GOMES, op. cit. p. 192), prescindindo de que tal alteração seja resultado de uma conduta ilícita. Entre 
tais bens jurídicos, o autor elenca direitos da personalidade, certos direitos de família e os interesses legítimos. 
Sendo assim, na busca de critérios mais amplos de proteção, que englobassem interesses dignos de tutela, e não 
somente direitos subjetivos, modernamente desvinculou-se da idéia da atuação antijurídica para a idéia da 
injustiça do dano (BODIN DE MORAES [3], Ibidem, p. 178) . 
83Idem, ibidem. p. 71. 
84CAVALIERI FILHO, op. cit.,p. 24. 
 30
A omissão torna-se juridicamente relevante quando o omitente responsável 
tinha dever jurídico de agir. Neste caso, não impedir o resultado tem a mesma conseqüência 
prática de permitir que a causa opere, aceitando que o resultado se concretize85. 
A conduta humana pode se dar por dolo ou por culpa. SÍLVIO RODRIGUES vê 
o dolo como a ação ou omissão do agente que antevê o dano e deliberadamente prossegue 
com o propósito mesmo de alcançar o resultado danoso86. Relativamente à culpa em sentido 
estrito, pela concepção normativa, caracteriza-se esta como sendo uma omissão de diligência 
exigível, que nem sempre coincide com uma violação da lei87. 
O Desembargador CAVALIERI FILHO destaca que a vida em sociedade obriga 
o homem a viver de modo a não causar dano a ninguém, sendo esta a premissa do dever de 
cuidado objetivo88. Este dever compreende dois momentos. O primeiro desses momentos é a 
compreensão de qual seja o comportamento adequado para atingir o fim que lhe é proposto, 
fazendo juízo de ponderação entre as vantagens e os inconvenientes das diversas atuações 
possíveis. O segundo momento, após o primeiro de compreensão e ponderação, abrange a 
efetiva atuação nos moldes do comportamento adequado89. 
A inobservância do dever de cuidado, quando o agente devia e podia agir de 
outro modo, causando dano, é que caracteriza a conduta culposa. Diferentemente do que 
ocorre no dolo, não se procede com intuito de causar o ato ilícito. Em verdade, atua-se de 
maneira lícita; mas, por adotar uma conduta inadequada aos padrões sociais, que poderia 
evitar, acaba causando um dano. Tal dano poderá ser fato gerador de responsabilidade. 
A conduta adequada pode estar prevista na lei ou não, haja vista a 
incapacidade do ordenamento de prever todas as hipóteses de violação de cuidado das 
atividades humanas. É por isso que, em alguns casos, há culpa mesmo que não haja um dever 
previsto em texto expresso de lei ou regulamento. 
Nesse sentido, o ordenamento impõe ao homem comum o dever jurídico 
genérico para que ele aja de modo a não violar o direito de ninguém, em prol da harmonia 
social. Por esta razão, CAVALIERI FILHO assegura que o dever de cuidado enseja a 
 
85Idem, ibidem. p. 24 
86Idem, ibidem. p. 31 
87CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 31. 
88
 -se que o dever de cuidado objetivo tem por padrão o homem médio, levando em consideração os 
conhecimentos e a capacidade ou aptidão exigíveis das pessoas (Idem, ibidem,

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