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Ensaio sobre a Arquitetura

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Ensaio sobre a Arquitetura 
Marc-Antoine Laugier 
Gravura de 
Charles-Dominique-Joseph Eisen para a segunda edição de "Essai sur l’architecture" de Marc-
Antoine Laugier 
Existem vários tratados de arquitetura que desenvolvem com bastante exatidão as 
medidas e as proporções arquitetônicas, que entram nos detalhes das distintas ordens e 
que provêm de modelos para as distintas formas de construir. Porém não existe ainda 
nenhuma obra que estabeleça solidamente os princípios da arquitetura, que manifeste 
seu verdadeiro espírito e que proponha regras adequadas para dirigir o talento e definir o 
gosto. Entendo que nas artes que não são puramente mecânicas não basta saber 
trabalhar, é importante sobretudo aprender a pensar. Um artista tem que poder 
dar-se a si mesmo razão de tudo o que faz. Para isso, necessita de princípios fixos que 
determinem seu juízo e justifiquem sua eleição; de modo que possa dizer que uma coisa 
está bem ou mal não só por instinto, senão por meio da razão e como homem instruído 
nos caminhos do belo. 
Avançou-se bastante em quase todas as artes liberais. Um grande número de pessoas 
com talento dedicou-se a nos fazer apreciar suas sutilezas. Escreveu-se, com grande 
conhecimento, sobre poesia, sobre pintura, sobre música. Aprofundou-se tanto nos 
mistérios destas artes engenhosas que restam poucos descobrimentos por fazer neste 
campo. Possuímos preceitos refletidos e críticas judiciosas que determinam sua 
verdadeira beleza. A imaginação possui guias que a dirigem e freios que a retém nos 
limites. Podemos apreciar com exatidão tanto a excelência de seu engenho como a 
desordem à que levam seus extravios. Se não tivéssemos bons poetas, bons pintores ou 
bons músicos, não seria absolutamente por falta de teoria, mas por falta de talento. 
Só a arquitetura foi abandonada, até agora, ao capricho dos artistas, que estabeleceram 
seus preceitos sem discernimento. Fixaram as regras ao azar, baseando-se apenas na 
análise dos edifícios antigos. Copiaram seus defeitos com tanto escrúpulo como suas 
belezas: desprovidos de princípios que os permitissem apreciar a diferença entre uns e 
outras, se viram confinados a confundi-los; servis imitadores, declararam como legítimo 
tudo o que foi autorizado com exemplos; limitando todas suas investigações a consultar 
o fato, concluíram equivocadamente sua legalidade e, deste modo, suas lições não foram 
mais que uma fonte de erros. 
Vitrúvio, na realidade, só nos ensinou o que praticava em sua época, e ainda que nele se 
vislumbre o fulgor que anuncia uma inteligência capaz de penetrar nos verdadeiros 
mistérios de sua arte, não tenta em absoluto rasgar o véu que os cobre, e afastando-se 
sempre dos abismos da teoria, nos conduz pelos caminhos da prática, que mais de uma 
vez nos distanciam da meta. Todos os modernos, à exceção do Sr. Cordemoy, se 
limitam a comentar Vitrúvio e a segui-lo com confiança em todos os seus erros. Digo à 
exceção do Sr. Cordemoy, pois este autor, mais profundo que a maioria, advertiu a 
verdade que se ocultava aos demais. Seu tratado de arquitetura é extremamente breve, 
mas contém princípios excelentes e pontos de vista extremamente meditados. Haveria 
podido, desenvolvendo-os um pouco mais, extrair conclusões que haveriam iluminado 
as obscuridades desta arte e que haveriam desenterrado as fastidiosas incertezas que 
fazem que suas regras pareçam arbitrárias. 
É pois de se esperar que algum grande arquiteto tente salvar a arquitetura da 
excentricidade das opiniões, descobrindo suas leis fixas e imutáveis. Toda arte, toda 
ciência, tem um objetivo determinado. Para chegar a este objetivo, não todos os 
caminhos são igualmente bons; há apenas um que leva diretamente à meta, e é este 
caminho único o que há que conhecer. Em todas as coisas há apenas uma maneira de 
obrar bem. O que é a arte senão esta maneira, assentada nuns princípios evidentes e 
posta em prática mediante preceitos invariáveis? 
Enquanto esperamos que alguém, muito mais capacitado que eu, se encarregue de 
ordenar o caos das regras da arquitetura, para que já não reste nenhuma à qual não se 
possa dar uma razão sólida, eu tentarei lançar um leve raio de luz. Ao observar 
atentamente nossos maiores e nossos mais belos edifícios, minha alma experimentou 
impressões diferentes em cada ocasião. Às vezes, o encanto era tão intenso que produzia 
em mim um prazer mistura de êxtase e entusiasmo. Outras, sem me sentir tão 
fortemente arrastado, me sentia satisfatoriamente pleno, era um prazer menor, no 
entanto um verdadeiro prazer. Frequentemente, permanecia completamente insensível, 
muitas vezes, também, me sentia enfastiado, chocado, revoltado. Meditei muito sobre 
todos esses distintos efeitos. Repeti minhas observações até que me assegurei de que os 
mesmos objetos causavam em mim sempre as mesmas impressões. Consultei o gosto de 
outros e, submetendo-os à mesma prova, encontrei que as impressões que 
experimentava eram as mesmas que eles sentiam, com maior ou menor vivacidade 
segundo os diferentes temperamentos que a natureza os havia outorgado. A partir disso, 
deduzi: 1º. Que na arquitetura existe uma beleza absoluta, independente do 
costume e do preconceito humano. 2º. Que a criação de um elemento arquitetônico 
é, como sucede em todas as obras do espírito, suscetível à frieza e à vivacidade, à 
perfeição e à desordem. 3º. Que tem que haver para esta arte, como para todas as 
demais, um talento que não se adquire, uma capacidade de gênio que a natureza 
outorga, e que este talento, este gênio, tem, entretanto, que se submeter a umas leis 
e ser governados por elas. 
Meditando repetidamente sobre as distintas impressões que me causavam as diferentes 
obras arquitetônicas, quis aprofundar na causa destes efeitos. Pedi conta dos meus 
sentimentos a mim mesmo. Quis saber por que uma coisa me entusiasmava e outra eu 
apenas gostava, por que esta não possuía para mim nenhum encanto e aquela me 
resultava insuportável. Esta busca, a principio, só me ofereceu escuridão e incertezas. 
Não me desanimei, penetrei no abismo até que acreditei descobrir o seu fundo, não 
deixei de perguntar à minha alma até que me deu uma resposta satisfatória. De repente, 
caiu sobre meus olhos uma imensa luz. Vi claramente objetos onde antes só percebia 
nuvens e neblina. Apoderei-me destes objetos com ardor e, mediante sua luz, vi 
desaparecer pouco a pouco minhas incertezas e se desvanecer minhas dificuldades. 
Finalmente, alcancei o estado em que pude provar a mim mesmo, através de princípios e 
consequências, a inevitabilidade destes efeitos cujas causas desconhecia. 
Este é o caminho que segui para me satisfazer. Pareceu-me que não seria inútil 
compartilhar com o público o êxito de meus esforços. A arquitetura ganharia 
infinitamente apenas com o fato de haver incitado os meus leitores a comprovar se não 
me deixei enganar, a criticar severamente as minhas conclusões, a procurar por si 
mesmos aprofundar ainda mais neste mesmo abismo. Posso dizer sinceramente que 
minha principal intenção é dar lugar para que o público e sobretudo os artistas duvidem, 
conjeturem, não se contentem facilmente. Afortunado serei se os induzo a uma busca 
que os coloque numa situação de me encontrar em falta e de corrigir minhas 
inexatidões, assim como de ir além em minhas reflexões. 
Isto não é mais que um ensaio no qual unicamente estabeleço algumas indicações e abro 
um caminho, deixando a outros o cuidado de dar aos meus princípios toda a sua 
extensão e toda sua aplicação, com uma inteligência e uma sagacidade das que eu não 
seria capaz. Nele digo o suficiente para prover os arquitetos de regras fixas de trabalho 
e meios infalíveis para alcançar a perfeição. Tentei sero mais inteligível possível. Não 
pude evitar empregar com frequência termos de arte. Quase todos são bastante 
conhecidos. Em qualquer caso, no dicionário adjunto se encontrará a explicação de 
todos aqueles não suficientemente conhecidos pela maioria. Como meu principal 
propósito é formar o gosto dos arquitetos, evito todos os detalhes que podem ser 
encontrados em outra parte e, para tornar esta obra mais instrutiva, acrescentei, nesta 
segunda edição, um número de gravuras suficiente para mostrar ao leitor todos os 
objetos cuja simples descrição tivesse dado somente uma ideia imperfeita. 
Introdução 
A arquitetura é, de todas as artes utilitárias, a que exige as aptidões mais brilhantes e os 
conhecimentos mais amplos. Talvez seja necessário tanto gênio, espírito e gosto para 
formar um grande arquiteto como para formar um pintor e um poeta de primeira 
linha. É um erro crer que na arquitetura tudo se reduz à mecânica, tudo se limita a cavar 
fundações, a levantar muros; que com base em algumas normas convertidas em rotina, 
apenas se exigem olhos habituados a examinar um aprumo e mãos feitas para manipular 
a espátula. 
Quando se fala sobre a arte de construir, montes confusos de escombros incômodos, 
imensas pilhas de materiais informes, um espantoso ruído de martelos, andaimes 
perigosos, um pavoroso conjunto de máquinas, um exército de operários sujos e 
cobertos de terra, isso é tudo o que vem à imaginação do vulgar; é o córtex pouco 
agradável de uma arte, cujos mistérios engenhosos que pouca gente aprecia, excitam a 
admiração de todos aqueles que os penetram. Eles descobrem inventos cuja ousadia 
supõe um gênio vasto e fecundo, proporções cuja serventia anuncia uma precisão severa 
e sistemática, ornamentos cuja elegância revela um sentimento delicado e requintado. 
Quem for capaz de captar tantas verdadeiras belezas, longe de confundir a arquitetura 
com as artes menores, se verá mais tentado a inclui-la no rango das ciências mais 
profundas. A visão de um edifício construído em toda a perfeição da arte provoca um 
prazer e um encantamento dos quais não é possível se defender. Este espetáculo revela 
na alma ideias nobres e tocantes. Ele nos faz experimentar essa doce emoção e esse 
agradável êxtase que excitam as obras que carregam a marca de uma autêntica 
superioridade de espírito. Um belo edifício fala eloquentemente por seu arquiteto. O 
Sr. Perrault, em seus escritos, é acima de tudo um sábio: a colunata do Louvre o define 
como um grande homem. 
A arquitetura deve o que tem de mais perfeito aos gregos, nação privilegiada, a quem 
esteve reservado não ignorar nada sobre as ciências e inventar tudo nas artes. Os 
romanos, dignos de admiração, capazes de copiar os excelentes modelos que a Grécia os 
proporcionou, quiseram acrescentar algo próprio, e só conseguiram ensinar a todo o 
universo que quando o grau de perfeição é atingido, não resta mais que imitar ou decair. 
A barbárie dos séculos posteriores, depois de enterrar todas as belas artes sob as ruinas 
do único império que havia conservado o gosto e os princípios daquelas, deu origem a 
um novo sistema de arquitetura, que tendo as proporções ignoradas, os ornamentos 
bizarramente configurados e puerilmente amontoados, não ofereceu mais que pedras 
agrupadas, o informe, o grotesco, o excessivo. Esta arquitetura moderna (gótica) fez 
durante bastante tempo as delícias de toda a Europa. A maioria de nossas grandes 
igrejas está infelizmente destinada a conservar suas marcas para a mais distante 
posteridade. Digamos a verdade, apesar de seus inumeráveis defeitos, esta arquitetura 
teve suas belezas. Ainda que em suas mais magníficas produções reine uma torpeza de 
espírito e uma bruteza de sentimentos de todo lamentável, podemos não admirar a 
audácia de seus traços, a delicadeza do cinzel, o ar majestoso e a abertura que se aprecia 
em algumas peças que, por tudo isto, têm algo de desesperador e inimitável? Mas enfim, 
gênios mais afortunados souberam perceber nos monumentos da Antiguidade provas do 
equívoco universal e recursos para resolvê-lo. Capazes de saborear algumas maravilhas 
expostas em vão por séculos a todos os olhares, refletiram sobre suas proporções e 
imitaram seu artifício. À custa de pesquisas, de exames, de tentativas, acabaram por 
fazer renascer o estudo das boas regras e reestabeleceram a arquitetura com todos os 
seus antigos cânones. Abandonaram-se os ridículos caprichos do gótico e do arabesco 
para substitui-los pelos adornos viris e elegantes do dórico, do jônico e do coríntio. Os 
franceses, lentos em imaginar, porém rápidos em seguir as boas imaginações, invejaram 
a gloria italiana em ressuscitar estas magnificas criações da Grécia. Estamos rodeados 
de monumentos que testemunham o entusiasmo, que reconhecem o êxito dessa 
emulação de nossos pais. Tivemos nossos Bramantes, nossos Michelangelos, nossos 
Vignolas. O século passado, século em que, em tema de talento, a natureza espalhou 
entre nós, e talvez tenha esgotado, toda a sua fecundidade, produziu em arquitetura 
obras primas dignas das melhores épocas. Porém, no momento em que tocávamos a 
perfeição, como se a barbárie não houvesse perdido todos os seus direitos entre nós, 
recaímos no baixo e no defeituoso. Tudo parece nos ameaçar enfim com uma total 
decadência. 
Esse perigo que se torna dia a dia mais próximo, que nós podemos, contudo, prevenir 
ainda, me incita a oferecer aqui modestamente minhas reflexões sobre uma arte pela 
qual sempre tive muito amor. No desígnio que me proponho, não sou animado nem pela 
paixão de censurar, paixão que eu detesto, nem pelo desejo de dizer coisas novas, desejo 
que creio no mínimo frívolo. Cheio de estima por nossos artistas, dos quais vários têm 
uma habilidade reconhecida, eu me limito a comunicar-lhes minhas ideias e minhas 
dúvidas, das quais eu os suplico que façam uma avaliação refletida. Se ressalto como 
verdadeiros abusos alguns usos universalmente aceitos entre eles, não pretendo que eles 
se refiram unicamente à minha opinião que submeto de todo coração à sua judiciosa 
crítica. Peço apenas que eles queiram se despojar de certos preconceitos bastante 
ordinários, e sempre nocivos ao progresso das artes. 
Que não digam que, não sendo do ofício, não sei falar deste com conhecimento 
suficiente; essa é seguramente a mais vã das dificuldades. Todos os dias julgamos uma 
tragédia sem haver jamais feito versos. O conhecimento das regras não está 
proibido a ninguém, embora a execução não seja entregue mais que a alguns. Não 
me oponham autoridades respeitáveis como infalíveis. Seria arruinar tudo julgar o que 
deve ser pelo o que é. Os maiores homens já se equivocaram alguma vez: não é pois um 
modo de evitar o erro, tomar sempre o exemplo por regra. Não me detenham pelas 
supostas impossibilidades. A preguiça encontra muitas onde a razão não vê nenhuma. 
Estou convencido que aqueles de nossos arquitetos que têm um verdadeiro zelo pela 
perfeição de sua arte me serão gratos pela minha boa vontade. Eles talvez encontrem 
nestes escritos reflexões que lhes haviam escapado: e se as jugam sólidas, não 
desdenhem utilizá-las; é tudo o que peço. Pois, ver só com pesar que uma mão estranha 
leve a chama da verdade em mistérios nos quais ainda não se havia aprofundado, 
rejeitar uma luz por antipatia à fonte de onde vem, opor um desprezo cego ao zelo de 
um aficionado que tenta discernir os caminhos que levam ao objetivo daqueles que nos 
distanciam dele, irritar-se diante do êxito que pode ter seus esforços por temor a ter 
adiante censores mais atentos, juízes mais severos; tais atitudes só são próprias de 
artistas carentes de gênio e de sentimento. 
Princípios gerais da arquitetura 
Isto é da arquiteturacomo de todas as outras artes: seus princípios são fundados na 
simples natureza, e no proceder desta se encontram claramente marcadas as regras 
daquela. Consideremos o homem em sua primeira origem, sem outro auxílio, sem outro 
guia que o instinto natural de suas necessidades. Ele precisa de um lugar de repouso. À 
beira de um tranquilo riacho ele avista um campo; seu verdor nascente agrada seus 
olhos, sua terna lanugem o convida; ele vem, e comodamente estirado sobre este tapete 
esmaltado, sonha somente em desfrutar em paz dos dons da natureza: nada lhe falta, ele 
não deseja nada. Mas logo o ardor do sol que o queima, o obriga a procurar um abrigo. 
Avista um bosque que lhe oferece o frescor de suas sombras; ele corre para se esconder 
em sua espessura, e aqui está satisfeito. No entanto, mil vapores suspensos ao azar se 
encontram e se reúnem, de espessas nuvens se cobre o ar, uma chuva espantosa se 
precipita como uma tormenta sobre este bosque delicioso. O homem mal coberto ao 
abrigo de suas folhas não sabe mais como se defender de uma umidade incômoda que o 
penetra de toda parte. Uma caverna apresenta-se, ele rasteja, e se encontrando a seco, 
aplaude por sua descoberta. Mas novos dissabores ainda o desagradam nessa morada. 
Ele se vê nas trevas, respira um ar insalubre, e sai resolvido a suprir, com seu engenho, 
as desatenções e negligências da natureza. O homem quer construir para si um 
alojamento que o cubra sem enterrá-lo. Uns galhos caídos no bosque são os materiais 
apropriados ao seu propósito. Escolhe quatro dos mais fortes que levanta 
perpendicularmente e que dispõe em quadrado. Em cima, põe quatro outros 
atravessados; e sobre estes levanta outros que se inclinam e se unem num ponto em dois 
lados. Esta espécie de telhado é coberta de folhas suficientemente juntas para que nem o 
sol e nem a chuva possam penetrá-lo; e eis aqui o homem alojado. É verdade que o frio 
e o calor o farão sentir desconforto em sua casa aberta em todos os lados; mas então ele 
preencherá o intervalo entre os pilares e se encontrará protegido. 
Tal é a marcha da simples natureza; é à imitação do seu proceder que a arte deve seu 
nascimento. A pequena cabana rústica que acabo de descrever é o modelo a partir do 
qual imaginamos todas as magnificências da arquitetura, é em se aproximando à 
execução da simplicidade deste primeiro modelo que evitamos os defeitos essenciais, 
que agarramos as perfeições verdadeiras. Os pedaços de madeira levantados 
perpendicularmente nos deram a ideia das colunas. Os pedaços horizontais que os 
coroam, nos deram a ideia dos entablamentos. Finalmente, as peças inclinadas que 
formam o telhado nos deram a ideia dos frontões: eis aqui o que todos os mestres da arte 
têm reconhecido. Mas sejamos cautelosos. Jamais princípio algum foi mais fecundo em 
consequências. É fácil agora distinguir as partes que entram essencialmente na 
composição de uma ordem da arquitetura daquelas que são introduzidas apenas por 
necessidade ou que acrescentadas apenas por capricho. São nas partes essenciais que 
consistem todas as belezas. Nas partes introduzidas por necessidade consistem todas as 
licenças. Nas partes acrescentadas por capricho consistem todos os defeitos: isso pede 
esclarecimentos. Tentarei lançar sobre isso toda a luz possível. 
Não percamos de vista nossa pequena cabana rústica. Nela só vejo colunas, uma trave 
ou entablamento, um telhado pontudo cujas duas extremidades formam cada uma isso 
que nós chamamos um frontão. Até agora nada de abóbada, menos ainda de arco, nada 
de pedestais, nada de ático, nem mesmo de porta, nada de janela. Concluo então e 
digo: em toda ordem da arquitetura, não há mais que a coluna, o entablamento e o 
frontão que possam entrar essencialmente na composição. Se cada uma dessas três 
partes se encontra localizada na situação e com a forma convenientes, não haverá nada a 
se acrescentar para que a obra seja perfeita. Resta-nos na França um belíssimo 
monumento dos antigos, o que chamamos em Nîmes a Maison Quarrée. Conhecedores 
ou não conhecedores, todo o mundo admira a beleza desse edifício. Por quê? Porque 
nele tudo existe segundo os verdadeiros princípios da arquitetura. Um retângulo onde 
trinta colunas suportam um entablamento e um telhado rematado nas duas extremidades 
por um frontão, eis tudo em que consiste: este conjunto possui uma simplicidade e uma 
nobreza que surpreendem todos os olhares. 
x x x 
© Tradução: Igor Fracalossi. Colaboração: Flora Paim. 
Referência: Marc-Antoine Laugier, Essai sur L’Architecture, Paris, 1753, pp.i-15

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