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TCC A AUSÊNCIA CORPORAL NO COTIDIANO MARGINAL LIMA, Viviane Gomes de

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Prévia do material em texto

1 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA 
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL 
JORNALISMO 
 
VIVIANE GOMES DE LIMA 
 
 
 
 
 
 
 
A AUSÊNCIA CORPORAL NO COTIDIANO MARGINAL: 
SEMIÓTICA, IMAGEM E MINORIAS. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Boa Vista 
2004 
2 
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA 
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL 
JORNALISMO 
 
VIVIANE GOMES DE LIMA 
 
 
 
 
 
A AUSÊNCIA CORPORAL NO COTIDIANO MARGINAL: 
SEMIÓTICA, IMAGEM E MINORIAS. 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Departamento 
de Comunicação social como requisito 
para a obtenção do grau de bacharel em 
Comunicação Social, com habilitação em 
Jornalismo, sob a orientação do professor 
Maurício Zouein. 
 
 
 
 
Boa Vista 
2004
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esta monografia a minha família, 
em especial à minha mãe e minha irmã, e 
a meus amigos que me apoiaram em 
todos os momentos difíceis da pesquisa. 
4 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Ao Senhor criador, por proporcionar um momento tão especial em minha 
vida, pela força e coragem para alcançar este objetivo. 
À Maria V. Lima Souza, mãe maravilhosa, que em todos os momentos está 
ao meu lado, sejam eles bons ou ruins. 
À minha irmã Liduina Guilarducci, meu cunhado Everaldo Guilarducci e 
meus sobrinhos Yan, Ytallo e Ygor que mesmo distantes estão presentes no meu 
coração, obrigada pelo incentivo. 
Aos meus amigos Roque Facioni, Robson Oliveira, Andréia Cruz, Newton 
Leite e Denise Cristian pelo apoio e pela força. 
Aos colegas e amigos Isa Wanderley, Cynthia Rodrigues, Eliane Rocha, 
Rodrigo Baraúna, Fernando Quintella e Humberto Almeida. Obrigada por todos os 
momentos felizes que vocês me proporcionaram, pela ajuda e força. 
Ao meu (por enquanto) namorado Alberto Júnior, obrigada de coração por 
estar ao meu lado nesse momento tão especial, obrigada pelas palavras de 
otimismo, pela força e incentivo que me destes e principalmente por ouvir meus 
lamentos nas horas de desespero e de tanta ansiedade. Suas palavras foram todas 
perfeitas e na hora certa. 
A todos os colegas e professores do curso em especial aos professores 
Vângela Moraes, Damião Marques, Goretti Leite, Noujain Pereira e Áurea Lúcia. 
Ao saudoso Professor Alexandre Borges, dono de uma das vozes mais 
lindas que já ouvi, meu primeiro contato na UFRR e no curso, suas primeiras 
palavras estão guardadas no meu coração. Que Deus o conserve em um lugar 
especial. 
Ao meu orientador Maurício Zouein, que mais que isso foi amigo e 
conselheiro, falava as coisas nas horas certas e quando eu mais precisava ouvir. 
Obrigada pelo apoio, pela paciência, incentivo, força, idéias, por tudo. 
5 
À comunidade do Bairro Caetano Filho. 
A todas as pessoas que estiveram ao meu lado e me ajudaram de forma 
direta ou indireta, em especial Rodrigo Ávila e Ana Paula Vasconcelos, na 
montagem do trabalho escrito e Vicente de Paula e Ana Paula Cruz por todas as 
informações prestadas. 
 
6 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Quando você ganhar, comemore: é importante um 
rito de passagem.” 
Esta vitória custou momentos difíceis, noites de 
dúvidas, intermináveis dias de espera. Desde os 
tempos antigos, celebrar um triunfo faz parte do 
próprio ritual da vida. 
A comemoração marca o final de uma etapa. Se a 
evitarmos – por incrível que pareça, muita gente a 
evita por medo de decepção, de atrair mau-olhado – 
não estaremos nos beneficiando do melhor presente 
que a vitória nos dá: a confiança. 
Celebre hoje suas pequenas vitórias de ontem, por 
mais insignificantes que pareçam. “Amanhã uma 
nova luta se aproximará e irá exigir toda sua atenção 
e esforço.” A “lembrança de uma vitória sempre 
ajuda a ganhar a próxima batalha”. 
(COELHO,1999, p.21) 
 
7 
A AUSÊNCIA CORPORAL NO COTIDIANO MARGINAL: 
SEMIÓTICA, IMAGEM E MINORIAS. 
 
TERMO DE APROVAÇÃO 
 
 
 
Banca examinadora: 
 
 
 
Prof. Mauricio Zouein (Orientador) 
 
 
 
Prof.ª Especialista Áurea Lúcia Melo Oliveira Corrêa 
 
 
 
Profª Mestra Vângela Maria Isidoro de Morais 
8 
SUMÁRIO 
 
APRESENTAÇÃO 10 
1 – UMA REALIDADE LOCAL 12 
1.1 - A CRIAÇÃO DO TERRITÓRIO 12 
1.2 – SURGE BOA VISTA 16 
1.3 - DERENUSSON E A CIDADE PLANEJADA 18 
1.4 – A BOA VISTA DOS TEMPOS MODERNOS 23 
1.5 - FRANCISCO CAETANO FILHO – UM BAIRRO? 25 
1.6 – PERFIL ESTATÍSTICO DO BAIRRO CAETANO FILHO 31 
2 – A BUSCA DO SENTIDO 39 
2.1 – A SENSAÇÃO DA REALIDADE 39 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 54 
REFERÊNCIAS 57 
ANEXOS 58 
 
 
 
 
9 
LISTA DE FOTOS 
 
FOTO 1 – Vista aérea do Rio Branco 
FOTO 2 – Início de Boa Vista 
FOTO 3 – Casa onde morou Francisco Caetano Filho 
FOTO 4 – Primeiro contato com o Bairro 
FOTO 5 – Casa de Maria Euvina 
FOTO 6 – Banheiro isolado pela enchente 
FOTO 7 – Rotina das crianças do Bairro 
FOTO 8 – Manhã de uma quarta-feira no Bairro 
FOTO 9 – Entrada do Bairro Francisco Caetano Filho: ausência de pessoas 
FOTO 10 – Esgoto a céu aberto 
FOTO 11 – Crianças próximo ao esgoto 
FOTO 12 – A vida continua no Bairro Francisco Caetano Filho 
10 
 
APRESENTAÇÃO 
 
O Estado de Roraima é uma das mais novas unidades federadas do Brasil. 
Sua criação, em outubro de 1988, representou um passo definitivo pela independência 
administrativa, como relatam diversos autores. 
Em pouco mais de cem anos de existência, a capital, Boa Vista, se transformou 
de uma pequena vila em cidade planejada, que recebe elogios de todos que a visitam. 
Mesmo assim, os problemas existem, muitos deles bem perto do centro da cidade e 
não na periferia, como é comum acontecer. 
O caso mais falado é o do bairro que não é bairro. Ele fica no centro da cidade, 
perto de onde nasceu Boa Vista, como veremos adiante. Ganhou o nome de Francisco 
Caetano Filho em homenagem a um morador, assassinado na campanha política de 
1958. Mas também é conhecido como Beiral, porque fica na beira do Rio Branco. 
O bairro tem muitos problemas, sendo o principal deles as enchentes que 
alagam as poucas ruas e acabam fazendo com que os moradores tenham que sair de 
lá, porque as casas ficam inundadas. Mas o que mais aborrece as pessoas que moram 
lá é a falta de atenção das autoridades com o bairro. Junto com a fama de lugar de 
gente envolvida com problemas policiais, como tráfico de drogas e prostituição, vem a 
ausência do olhar das autoridades oficiais para aquela comunidade. 
Nossa pesquisa procurou retratar os problemas a partir do depoimento 
daquelas pessoas e o contato pessoal da autora com a comunidade pesquisada. 
11 
Dedicamos vários dias de pesquisa de campo, onde pudemos colher a opinião 
de quem mora num bairro onde todos os problemas acabam sem solução imediata, 
quando conseguem encontrar uma solução ideal. 
A autora usou a semiótica e seus pensadores para analisar todos os fatos 
apurados durante a pesquisa. Procuramos ver como a base teórica da semiótica 
enquadra a situação dos moradores do bairro e quais as perspectivas de futuro que 
eles podem ter a partir de seu próprio posicionamento. 
Com a orientação do professor Maurício Zouein, trabalhamos com o foco da 
ausência. Procuramos ver como essa ausência é sentida pelos moradores e como ela 
se manifesta nos problemas existentes no bairro. 
O bairro é pequeno, tem poucos moradores, mas não encontra apoio nas 
autoridades tanto do estado quanto do município. A ausência é mesmo sentida. 
A autora ficou emocionada com os depoimentos daquelas pessoas pobres, 
mas quetêm muita vontade de ter apenas uma vida feliz, com o respeito das 
autoridades que têm a responsabilidade de dar àquelas pessoas uma estrutura que 
garanta a sua dignidade enquanto cidadãos. 
 
 
12 
1 – UMA REALIDADE LOCAL 
1.1 - A CRIAÇÃO DO TERRITÓRIO 
 
Os primeiros anos da República trouxeram uma novidade em termos de divisão 
da base física do país: a figura do território federal, unidade federada ainda sem 
condições de independência econômico-financeira, como os estados membros da 
Federação. 
O primeiro território criado foi o do Acre. Em 13 de setembro de 1943, o então 
presidente Getúlio Vargas criou, através do Decreto nº 5.812, cinco Territórios Federais 
de uma só vez: Rio Branco (depois Roraima), Guaporé (depois Rondônia), Amapá, 
Iguaçu e Ponta Porã1. 
O objetivo da criação dos territórios federais visava ocupar os espaços vazios do 
território nacional, em especial aqueles localizados na Amazônia. Entendiam os 
administradores do Brasil de então que a consolidação dos estados em tais regiões se 
daria com um modelo especial, mais do que município e menos que estado. 
O Território Federal de Roraima está situado no extremo setentrional do país 
com uma área de 230.104 Km². A região que hoje compreende o Estado de Roraima 
abrigava apenas dois distantes municípios, ambos pertencentes ao Estado do 
Amazonas: Boa Vista do Rio Branco e uma parte de Moura e Barcelos.
 
1
 MAGALHÃES, 1997, p. 84 
13 
Como vimos antes, o Território Federal do Rio Branco foi criado em 1943. Mas 
somente no ano seguinte teve sua instalação concretizada, mais precisamente no dia 
20 de junho de 1944. 
A princípio, teve dois municípios: Boa Vista, escolhido para ser a capital, e 
Catrimani, que nunca foi instalado. Em seu lugar foi criado o município de Caracaraí, 
pela Lei federal nº 2.495, de 28 de maio de 19552. 
De 1943 a 1964, Roraima teve 15 governadores titulares, entre militares e civis, 
nenhum deles eleito pelo povo. Afinal, os administradores dos territórios federais eram 
nomeados pelo presidente da República, sem qualquer necessidade de participação do 
povo nesse processo de escolha. O presidente nomeava e pronto. 
Tal processo de escolha recebia a influência de políticos ligados a quem estava 
no poder. Um dos maiores exemplos foi o senador Vitorino Freire, do Maranhão, que 
indicou, direta ou indiretamente, dez desses governadores, numa prova de sua 
influência política junto ao governo federal3. 
Cada governador, no entanto, ficou pouco tempo (média de 16 meses). Nesse 
espaço de tempo, aliado ao desconhecimento do Território, o governante quase nada 
podia realizar. Com tal descontinuidade, o Território Federal de Roraima teve uma de 
suas piores fases nesse período, graças à má-administração da maioria dos 
governantes. Poucos trabalharam com a competência desejada. 
 
2
 FREITAS, 2001, p. 73 
3
 ________, ______, p. 115-116 
14 
Em 1960, o deputado federal Valério Caldas de Magalhães apresentou o Projeto 
de Lei nº 1.433-A-1960, na Câmara dos Deputados, onde propunha a mudança do 
nome do Território Federal do Rio Branco para Território Federal de Roraima. 
Essa mudança teve como maior justificativa a grande confusão que era feita em 
todo o Brasil com a capital do Estado do Acre – Rio Branco – e o Território Federal de 
mesmo nome. Somente dois anos depois o PL foi transformado na Lei nº 4.182, de 13 
de dezembro de 1962. 
Político da mais alta seriedade, tendo sido, anteriormente, governador do Acre, 
Valério Magalhães contrariou seu próprio pensamento em atenção ao apelo dos 
eleitores: para ele, o Território Federal do Rio Branco não mudaria o nome. Mas seu 
compromisso com os que o elegeram, em campanha política onde até morte houve, 
como veremos adiante, foi mais forte. 4 
O antigo Território Federal foi transformado no atual Estado de Roraima, pelo Art. 
14, do Ato das Disposições Transitórias, da Constituição Federal do Brasil, promulgada 
em 1998. Terminava ali a tutela federal. Depois de 45 anos, surgia o estado membro da 
federação, com estrutura independente e poderes constituídos. Um novo tempo 
chegava. Se seria melhor, só o futuro poderia dizer. 
Como forma de baratear o custo da implantação do novo estado, o mesmo ato 
constitucional previu a instalação do estado para o dia 1º de janeiro de 1991, 
justamente quando todos os demais governadores e deputados estaduais eleitos no 
ano anterior tomariam posse. 
 
4
 MAGALHÃES, 1997, p. 98. 
15 
Eleito com vitória em dois turnos, o brigadeiro Ottomar de Sousa Pinto, ex-
governador nomeado de 9 de abril e 1979 a 9 de abril de 1983 e deputado federal de 15 
de março de 1987 a 31 de janeiro de 1991, renunciou ao mandato no legislativo e 
assumiu o governo de Roraima. Para cumprir os 31 dias restantes do mandato 
parlamentar de Ottomar Pinto, a Justiça Eleitoral convocou o primeiro suplente, Júlio 
Augusto de Magalhães Martins5. 
O segundo governador do estado foi o engenheiro civil Neudo Ribeiro Campos, 
empresário da construção civil nascido em Roraima. Sua posse ocorreu no dia 1º de 
janeiro de 1995. 
Apoiado pelo então governador Ottomar Pinto, Neudo derrotou nas urnas o ex-
governador Getúlio Cruz, em dois turnos eleitorais disputados no ano anterior. 
Beneficiado pela emenda constitucional que passou a prever a reeleição para os 
detentores de mandato executivo, ele foi reeleito em 1998, ao vencer a ex-prefeita e ex-
deputada federal Teresa Jucá, também em dois turnos6. 
Com a renúncia de Neudo Campos, em abril de 2002, para disputar um mandato 
no Senado Federal, o vice-governador Flamarion Portela assumiu o cargo de 
governador, ao qual concorreu à reeleição naquele mesmo ano. No primeiro turno, o 
ex-governador Ottomar de Sousa Pinto conseguiu ser o mais votado de todos os 
candidatos, seguido por Flamarion. 
 
5
 A GAZETA DE RORAIMA 
6
 FOLHA DE BOA VISTA, 
16 
Como não atingiu o percentual de 50% mais um dos votos válidos, houve 
necessidade de segundo turno, quando Flamarion se recuperou e venceu a eleição7. 
 
1.2 – SURGE BOA VISTA 
 
 
Foto 1 - Vista aérea do Rio Branco (1925, Hamilton Rice) 
 
A Freguesia Nossa Senhora do Carmo do Rio Branco surgiu em 1858, através 
de lei provincial. Construída em faixa de terra estreita, entre o rio e a baixa alagadiça na 
época das chuvas, ficava na proximidade da sede da fazenda Boa Vista (foto 1), 
fundada em 1830, pelo capitão Inácio Lopes de Magalhães. A freguesia era pertencente 
ao município de Moura, no Estado do Amazonas. 
 
7
 FOLHA DE BOA VISTA. 
17 
 
Foto 2 - Início de Boa Vista (1925, Hamilton Rice) 
 
No dia 9 de julho de 1890, o Governador do Estado do Amazonas, Augusto 
Ximeno de Ville Roy, assinou o Decreto n° 49/AM, elevando a Freguesia de Nossa 
Senhora do Carmo do Rio Branco à categoria de Vila, com a denominação de Vila de 
Boa Vista do Rio Branco (foto 2), mantendo os mesmos limites da antiga freguesia, com 
uma área total de 5.711,9 Km². 
Em 25 de julho de 1980, em uma sala do prédio pertencente a José Francisco 
Coelho, tomaram assento o capitão doutor Fabio Barreto Leite, comissionado para 
instalar a Intendência desta Vila e os cidadãos João Capistrano da Silva Mota como 
prefeito (superintendente), José Francisco Coelho e José Joaquim de Souza Junior 
como vereadores (intendentes), todos nomeados pelo Governador do Amazonas. 
A Lei Estadual nº 1.262, de 27 de agosto de 1926, elevou o distrito sede domunicípio de Boa Vista do Rio Branco à categoria de cidade. Através do Decreto-lei 
18 
Estadual, de 1º de dezembro de 1938, o município teve sua denominação definida para 
Boa Vista. 
Com a instalação do Governo de Território, em junho de 1944, o primeiro 
governador, capitão do Exército Brasileiro Ene Garcês dos Reis, convidou o urbanista 
Darcy Aleixo Derenusson para elaborar a planta da cidade de Boa Vista. 
Na época da criação do Território Federal do Rio Branco a cidade de Boa Vista 
tinha os seguintes bairros: Porto da Olaria (Francisco Caetano Filho), Rói-couro (São 
Pedro), Caxangá (Centro), Praça da Bandeira e Centro. 
 
1.3 - DERENUSSON E A CIDADE PLANEJADA 
 
O capitão Ene Garcez instituiu um concurso público para selecionar o melhor 
projeto para Boa Vista. Ele queria um novo tempo em matéria de urbanismo. Para 
surpresa geral, o vencedor foi o engenheiro civil carioca Darci Derenusson, com apenas 
28 anos de idade. Só para chegar ao território ele levou 30 dias viajando, desde o Rio, 
então capital da República. 
Na edição especial de 9 de julho de 1991, centenário da cidade, o jornal A 
GAZETA DE RORAIMA publicou entrevista com Derenusson, onde ele contou à 
repórter Kátia Brasil os detalhes de seu trabalho e a realidade boa-vistense daquela 
época: 
 
19 
Quando ele veio a Boa Vista pela primeira vez, em 1944, 
passava pouco mais de um ano que o governo federal transformara o 
município de Boa Vista, mais um pedaço de Moura, Estado do 
Amazonas, em Território Federal do Rio Branco. O engenheiro civil 
Darcy Aleixo Derenusson, então com 28 anos, conhecia uma pequenina 
cidade picheira, plantada às margens do Rio Branco, no extremo norte 
do Brasil e abrigando esparsos 1.800 brasileiros, pouco mais, pouco 
menos. Ruas de terra batida, vida pacata e tardes bucólicas, ‘Boa Vista’ 
- conta ele – ‘tinha umas oito casas cobertas com telhas, outras de 
zinco e a maioria com telhas de palhas de buritis. 
 
 
 
Sua preocupação foi sentir aquela cidade pacata, a qual deveria transformar no 
início de uma metrópole para o futuro, como explicou à repórter da GAZETA: 
 
 
 
Quando cheguei em Boa Vista – conta Darcy Derenusson -, 
passei sete meses fazendo levantamentos sobre as necessidades da 
cidade e colhendo dados das carências da população, ouvindo a 
comunidade. Depois voltei ao Rio, formei uma equipe de técnicos e 
começamos a trabalhar. 
 
 
 
O eixo do trabalho do engenheiro visava dotar Boa Vista de estrutura moderna 
de serviços básicos, como informa a mesma reportagem: 
 
 
 
As prioridades básicas eram os projetos para o abastecimento 
de água, energia elétrica, esgotos e Código de Obras. Darcy lembra
20 
 que a principal medida adotada pelo governo da época foi baixar um 
decreto proibindo qualquer construção na cidade até que fosse 
entregue o Plano Diretor de Urbanismo. Ele e sua equipe terminaram os 
projetos em 1946 e permaneceram em Boa Vista até 1951 para 
acompanhar sua execução. 
 
 
 
O orgulho de fazer um projeto de sucesso permaneceu com Derenusson por 
quase cinco décadas, como podemos perceber em suas palavras naquela entrevista: 
 
 
 
Boa Vista manteve uma simetria horizontal e vertical, porque 
foram seguidas as linhas da planta que fiz’ – explica o engenheiro, 
lembrando que ‘qualquer obra de construção para moradia e comércio 
obedecia ao Código de Obras. Ele estabelecia que as construções só 
podiam ter dois andares e em terrenos de 15 x 40 e 20 x 40 metros. 
Isso explica porque Boa Vista apresenta essas belezas de jardins e não 
tem favelas, como ocorre nas principais capitais do país’, enfatiza 
Derenusson. 
 
 
 
O segredo da qualidade de vida existente desde aqueles tempos da Boa Vista do 
pós-guerra, e até recentemente ainda disponível ao boa-vistense, estava na infra-
estrutura essencial a qualquer cidade que se pretenda desenvolver com respeito à 
saúde e ao bem-estar da comunidade. Derenusson assim definiu seus passos no 
projeto: 
 
 
 
21 
Ele ressalta que o principal fator para o sucesso de seu trabalho 
em Boa Vista foi ter concluído antes o projeto da rede de águas pluviais 
e esgotos sanitários antes das construções. ‘Rasgamos todas essas 
ruas existentes hoje e colocamos canos de águas e esgotos. É por isso 
que não temos as valas negras. Na década de 70, Boa Vista chegou a 
ser apontada como a cidade de melhor qualidade de vida em todo o 
Brasil’ orgulha-se o engenheiro. 
 
 
 
Quando concedeu a entrevista, aos 74 anos de idade, Derenusson continuava 
convicto da importância da rede de esgotos como ponto de partida para qualquer 
projeto urbanístico bem sucedido. 
Esse é um serviço essencial para propiciar melhor qualidade de vida. Foi isso 
que tornou Boa Vista uma cidade sadia e agradável. O núcleo da capital planejada em 
1944 contou com um sistema de abastecimento de água e coleta de esgotos e de 
águas pluviais. Foi por isso que a população teve e tem uma melhor qualidade de vida 
do que em outras cidades da região Amazônica. 
 Uma cidade que nasce sob o signo do respeito à história e com aproveitamento 
de sua estrutura já existente, só pode dar certo. 
Pelo menos foi com esse pensamento que o engenheiro carioca executou seu 
trabalho, como ele mesmo enfatiza ainda na reportagem já citada. 
 
 
 
Hoje sou grato à população daquela época, que cobrou dos 
governantes a execução do projeto. Cobrou e fiscalizou o que resultou 
numa Boa Vista com traços urbanísticos modernos, sem deixar para 
22 
trás suas origens. Minha preocupação foi de não destruir os prédios já 
existentes e, com isso, destruir a memória de uma cidade. 
 
 
 
Derenusson planejou a cidade com um traçado em que rasgava radiais, 
cortadas por perimetrais, ligando os vários extremos da cidade. Segundo ele explicou 
ao jornal, o epicentro do desenho foi a Praça do Centro Cívico, com a construção do 
antigo Palácio 31 de Março, hoje Palácio Senador Hélio Campos. 
E o que Derenusson quis dizer com seu desenho? Ele mesmo respondeu, em 
texto por ele escrito, na mesma página de A GAZETA DE RORAIMA: 
 
 
 
Partindo de um cinto gerador, buscam os confins de Norte de 
nosso território, irradiando a energia de seu povo, como a protegê-lo. 
Roraima, guardião do Norte. 
Lembrem-se: na época em que foi projetada a planta da cidade 
de Boa Vista (1944/1946) estávamos no fim de uma guerra. E já muito 
antes disso, não poucos olhos gulosos invadiam nossas fronteiras, com 
missões exploradoras e uma variedade de expedientes, para se 
firmarem e ocupar nossa terra. 
Mais do que simples radiais, mais do que um simples leque 
seria a própria alma brasileira, presente, com o corpo e o coração, a 
integridade de nossos limites. É, portanto, o sistema radial o símbolo de 
união territorial, social, lingüístico e ideário do povo brasileiro do 
Extremo Norte. 8 
 
 
8
 Artigo “O que representam as radiais” - Darcy Aleixo Derenusson 
 
23 
Darcy Derenusson morreu há pouco mais de dois anos, no dia 27 de maio de 
2002, no Rio de Janeiro, aos 85 anos. Falando em homenagem póstuma ao idealizador 
da Boa Vista moderna, o então vereador Flávio dos Santos Chaves assim se 
manifestou ao plenário da Câmara Municipal de Boa Vista, em trecho de seu discurso: 
 
 
 
No necrológio publicado em O Globo, na seção Obituária, foi 
destacada, como sua maior obra, exatamente a elaboração do Plano 
Urbanístico de Boa Vista. Muito antes de Juscelino Kubistcheck sequer 
pensar em ser presidente da República e, muito menos, transferir a 
capital do Rio de Janeiro para uma Brasília encravada no PlanaltoCentral onde nada havia, senão a esperança dos brasileiros que lá 
moravam, Derenusson já criava uma cidade planejada, com um 
desenho moderno até para os dias de hoje. Uma cidade humanizada, 
horizontal, privilegiando os espaços ainda existentes. 
 
 
 
1.4 – A BOA VISTA DOS TEMPOS MODERNOS 
 
A cidade de Boa Vista possuía, no ano 2000, exatos 200.383 habitantes9. Os 
dados estatísticos do IBGE mostram a miscelânea de origens de seus atuais 
habitantes. 
Formada por indígenas de diferentes etnias, imigrantes de vários estados da 
Federação e alguns estrangeiros que aqui fixaram residência, agrega traços culturais 
de todas as tendências. 
 
9
 Censo IBGE - 2000 
24 
Desde 1981 temos o Centro de Tradições Gaúchas Nova Querência, implantado 
pelos imigrantes vindos do Rio Grande do Sul, a grande maioria constituída por 
profissionais formados pela Universidade Federal de Santa Maria, que mantinha em 
Boa Vista um campus avançado, desativado logo após a implantação dos cursos de 
nível superior no então território. 
Os nordestinos também fundaram centros de tradição, além de grupos artísticos 
de músicas e danças típicas, como “Os Cangaceiros do Tianguá”. São tentativas de 
manter os laços com suas origens, mesmo à distância. 
Infelizmente, o plano urbanístico de Darci Derenusson acabou descaracterizado, 
a partir da BR-174. Os novos bairros ali implantados (Liberdade, Buritis, Tancredo 
Neves e outros mais afastados) não levaram em consideração os cuidados tomados 
pelo engenheiro carioca ao planejar a capital. 
O sistema de esgotos só recentemente chegou à parte da periferia da cidade. 
Grandes valas abertas nas ruas substituíam o sistema de águas pluviais. Os lotes de 
terreno ficaram cada vez menores, reduzindo o conforto das famílias e criando um novo 
agrupamento de imóveis com menor espaço físico para o lazer (áreas externas) 
Graças à disponibilidade de terrenos vazios, ainda não temos uma tendência de 
verticalização dos imóveis, registrando um ou outro edifício de apartamentos de até três 
andares, o máximo permitido pelo Código de Postura do município. 
Mesmo assim, a urbanização de Boa Vista continua sendo uma das melhores da 
região, senão a melhor. O aproveitamento das áreas públicas tem sido feito com 
habilidade pelos administradores municipais. 
25 
Obras como os Complexos Sócio-Esportivos Aírton Sena (no centro) e Mané 
Garrincha (no bairro Caimbé) ou a Praça das Águas, também no centro, criaram novas 
opções de lazer para o boa-vistense, além de revitalizar áreas até então abandonadas 
à própria sorte. 
 
1.5 - FRANCISCO CAETANO FILHO – UM BAIRRO? 
 
O bairro Francisco Caetano Filho é quase um segmento do núcleo inicial da 
cidade de Boa Vista. Seu início fica a menos de duzentos metros da sede da antiga 
Fazenda Boa Vista, já referenciada anteriormente. 
Mas, nos primeiros tempos, a cidade cresceu mesmo para o outro lado, em 
direção à Praça da Bandeira. Somente uns anos mais tarde os pescadores iniciariam a 
ocupação do bairro então chamado de Olaria, por concentrar aquela atividade 
industrial, implementada de forma artesanal. 
Na verdade, o regime de chuvas determinava quando e onde os moradores 
poderiam construir e/ou permanecer em suas casas. Por estar localizado num baixão, o 
bairro constantemente era alagado pelas águas do Rio Branco. Mesmo em décadas 
recentes tal quadro permanecia. 
Também por causa da proximidade com o rio, o Francisco Caetano Filho ganhou 
outra denominação, pela qual é até mais conhecido: Beiral. Ocupado depois do 
planejamento da cidade por Derenusson, não ganhou, nos primeiros anos, rede de 
esgotos e águas pluviais. 
26 
A geografia do lugar era incompatível com ocupação por moradias. Com tanto 
espaço físico disponível à época, seria inconcebível imaginar construções naquele lugar 
onde as inundações eram, como vimos, uma constante em períodos de chuvas fortes. 
O nome do bairro é homenagem ao antigo morador Francisco Caetano Filho 
(foto 3), assassinado durante a campanha eleitoral de 1958, por um pistoleiro 
contratado pelo então deputado federal Félix Valois, general do Exército e segundo 
parlamentar federal roraimense, para intimidar seus adversários políticos, como 
veremos adiante. 
 
 
Foto 3 - Casa onde morou Francisco Caetano Filho (Viviane Lima, 2004)
27 
Em 1946, o Território Federal do Rio Branco passou a ter um representante na 
Câmara Federal, já que até 1943 toda essa área pertencia ao Estado do Amazonas. O 
primeiro deputado federal eleito pelo povo foi Antônio Augusto Martins, na época 
gerente da filial da firma J.G. Araújo, localizada onde hoje se encontra a Loja Esquina 
do Rio (no final da Avenida Jaime Brasil com a Rua Floriano Peixoto). 
 Em 1950, foi eleito o tenente-coronel Felix Valois de Araújo, depois reeleito em 
1954. Este jamais apresentou ao Congresso Nacional qualquer projeto. No pleito 
eleitoral de 1958, com o abuso de poder do então general-deputado Felix Valois, 
pistoleiros foram trazidos de Goiás, exclusivamente para intimidar, bater, espancar e 
até matar, caso as coisas não acontecessem como previstas pelo parlamentar. 
Um daqueles pistoleiros, de nome Claudionor, andava com uma lista de 32 
nomes de pessoas que, em comícios ou em reuniões, falariam contra Valois. A ordem 
recebida (e sempre rigorosamente cumprida) era surrar, cortar uma orelha ou, se a 
vitima oferecesse resistência, matar todo aquele que se atrevesse contestar o 
deputado. 
Segundo informações de quem viu a tal lista da época, o pistoleiro Claudionor 
vinha agindo pela ordem numérica decrescente. Contava ainda, com a ajuda de alguns 
elementos da antiga Guarda Territorial (que posteriormente seria transformada na 
Polícia Militar). 
Claudionor, um outro comparsa e alguns elementos da Guarda agiam de 
surpresa. O "escolhido" era conduzido em um jipe do governo para algum lugar ermo. 
Uma versão antiga do atual local para desova de corpos conhecidos como "Banho da 
Tieta". 
28 
O primeiro a passar pelo suplício foi o senhor Manoel dos Passos. O segundo 
da lista levou somente uma surra. "Mas uma surra caprichada", como disseram os 
agressores em tom de deboche. O terceiro da lista era o velho conhecido como 
Pingarrilho, uma figura folclórica, considerado boa pessoa. Pingarrilho, além da surra 
que levou, ainda teve uma das orelhas cortadas pelo pistoleiro Claudionor, a quem teve 
de jurar que manteria segredo do que ocorrera. 
Passou-se a usar o estratagema da clandestinidade para as reuniões políticas. 
A oposição adotou a espionagem e conseguiu infiltrar um elemento da coligação 
oposicionista no grupo adversário, a fim de ouvir tudo e repassar as informações para 
outro lado. 
Este era o clima político em Boa Vista nos anos de 1957 e 1958. 
Determinado dia, um dos espiões conseguiu embriagar o pistoleiro e copiar a 
lista dos perseguidos. Rapidamente, repassou-a aos que estavam nela relacionados. 
Todos eles, então, passaram a andar armados, como forma de proteção pessoal. Não 
era uma eleição, era mesmo uma guerra sem quartel. 
Quando o pistoleiro descobriu a armadilha de que fora vítima, determinou a três 
guardas territoriais que, na Avenida Jaime Brasil, segurassem o "relacionado" de 
número 4 na lista (José Pereira Maia). 
O pobre infeliz, seguro pelo pescoço – no conhecido golpe de luta denominado 
gravata - e arrastado pelos três policiais, foi colocado contra uma parede, ali, bem no 
centro da cidade. O pistoleiro Claudionor chegou pelo outro lado, sacou um revólver 
Taurus, calibre 38, e o usou como porrete na cabeça de José Pereira. Este, depois da 
sétima pancada, conseguiu reagir. Numasacudidela, jogou a arma do pistoleiro para 
longe. Mas o pistoleiro não desanimou: puxou uma faca-peixeira. Os relatos assim 
29 
definem a luta entre os dois: “Foi briga de macho de verdade”. No meio da confusão, os 
guardas correram. 
Nesse ínterim, chegou o "listado" de número 5. Sem pensar duas vezes, ele 
disparou dois tiros de pistola no coração do pistoleiro Claudionor. Quando o 
relacionado de número 6 chegou para ajudar, o pistoleiro já estava morto. 
Na noite seguinte, houve um comício no local onde hoje é a entrada do bairro 
Francisco Caetano Filho (no final da Avenida Sílvio Botelho, próximo ao terminal de 
ônibus). Com poucas casas, para se chegar lá se atravessava uma pequena ponte de 
madeira, onde havia um grande terreno baldio. Ali mesmo morava o Chico Caetano. 
Apesar de todo o medo existente na cidade, Francisco Caetano cedeu às 
pressões de alguns moradores do bairro, alinhados com o candidato da oposição, para 
permitir uma reunião no quintal de sua casa. No início ele até descartou a idéia. Depois, 
concordou. Na reunião, discutiram sobre a atuação dos pistoleiros e do deputado 
Valois. 
A partir daí, conseguimos duas versões da história, com o mesmo final: Chico 
Caetano baleado e morto na porta de casa. 
A primeira versão, contada pela Pesquisa Qualitativa feita pelo Programa 
Braços Abertos, da Prefeitura de Boa Vista, informa que, alguns dias depois da reunião, 
Caetano estava na porta de sua casa, como já dissemos localizada na entrada principal 
do bairro, quando foi baleado e morto pelo simples fato de ter abrigado aquela reunião 
política. 
30 
A outra foi relatada em depoimento pessoal do economista Valério Caldas de 
Magalhães Sobrinho, como o próprio nome indica, sobrinho do candidato da oposição, 
concedido à autora deste trabalho. 
Ele era menino quando ocorreu o crime. Sua versão é de que a esposa de 
Caetano estava na porta de casa quando passou um correligionário de Valois e a 
ofendeu. O marido saiu de dentro de casa e devolveu a ofensa ao adversário político. 
Este sacou de um revólver e disparou contra Chico Caetano. 
O crime abalou toda a cidade de Boa Vista. O medo que as pessoas sentiam do 
general transformou-se em revolta. Se já havia brigas constantes entre partidários de 
oposição e situação, com a morte de Caetano o ambiente ficou muito pior. 
Como única forma de conter a violência chegaram à capital do território algumas 
figuras políticas importantes da época. Entre elas o senador Juracy Magalhães, o 
deputado federal Antônio Carlos Magalhães (hoje senador da República) e o deputado 
Carlos Lacerda, um dos mais combativos jornalistas de todos os tempos. A viagem do 
grupo foi chamada de "Caravana da Liberdade". 
Chegou o dia da eleição. Nas urnas, a chamada Coligação (eram vários 
partidos contra Valois) saiu vitorioso Valério Caldas de Magalhães. Este, enquanto foi 
parlamentar, apresentou mais de vinte projetos importantes, entre estes o que permite 
a transferência do servidor público do Território para qualquer unidade da Federação, 
com o mesmo salário. 
O mais conhecido de todos foi o projeto que mudou o nome de Território 
Federal do Rio Branco para Território Federal de Roraima (sancionado em 13 de 
setembro de 1962). Por sua obra em benefício desta terra, Valério Magalhães foi 
31 
homenageado pela Câmara Municipal de Boa Vista, dando seu nome a uma rua no 
bairro São Francisco. 
Como vimos, o bairro Francisco Caetano Filho sempre teve uma trajetória 
difícil. Até mesmo seu nome tem relação com uma tragédia. Mesmo assim, as pessoas 
que lá residem valorizam o lugar. 
Quando, em final de 1988, o então prefeito José Maria Carneiro, preocupado 
com a situação do bairro ante um dos mais rigorosos invernos já vistos na cidade, 
tentou transformar o bairro em espaço público, transferindo seus moradores para 
outras áreas, a pesquisa por ele feita entre os que lá moravam apontou a resistência ao 
projeto, que foi descartado. 
 
1.6 – PERFIL ESTATÍSTICO DO BAIRRO CAETANO FILHO 
 
Com objetivo de melhor apresentar o bairro Caetano Filho realizou-se um 
levantamento estatístico em campo, tendo como base dados de 2001, do programa social 
da Prefeitura de Boa Vista, denominado ‘Braços Abertos’. 
Nele foi possível avaliar aspectos relevantes sobre a população da comunidade, 
faixa etária, escolaridade, nível de renda, conforme os gráficos a seguir10: 
 
10
 Fonte: Banco de Dados do Programa Braços Abertos - 2001 
32 
POPULAÇÃO
33 
CHEFES DE FAMÍLIAS 
 
34 
FAIXA ETÁRIA DOS HABITANTES 
 
35 
ESCOLARIDADE DA POPULAÇÃO ACIMA DE 07 ANOS DE IDADE 
 
36 
SITUAÇÃO OCUPACIONAL ACIMA DE 16 ANOS 
 
 
37 
FUNÇÃO DA POPULAÇÃO ACIMA DE 16 ANOS 
 
 
 
38 
NÍVEL DE RENDA 
 
 
39 
2 – A BUSCA DO SENTIDO 
2.1 – A SENSAÇÃO DA REALIDADE 
 
O primeiro contato da pesquisadora com o bairro Francisco Caetano Filho (foto 
4) foi marcado por grande emoção. Começávamos ali a parte prática do trabalho de 
conclusão de curso, sentindo de perto a vida das pessoas que moram lá, por opção ou 
por necessidade. 
 
 
 Foto 4 - Primeiro contato com o Bairro (Viviane Lima, 2004) 
 
40 
 Procuramos entrar sem idéias preconceituosas sobre os moradores. Todas as 
informações que recebemos antes serviriam apenas como um alerta para aquela 
realidade, mas sem interferir na avaliação final. 
Já conhecíamos o bairro. Passamos por lá algumas vezes, sempre de 
passagem. Agora era diferente. Nosso olhar deveria estar atento para os detalhes. 
Antes nem nos preocupávamos com aquela realidade. A pesquisa nos obrigou a mudar 
a forma de olhar para as pessoas que lá encontramos. 
A princípio, a pesquisadora sente, ao olhar o ambiente pesquisado, a ausência 
de uma preocupação dos que moram fora para com a comunidade. A própria 
comunidade sente a ausência dessa preocupação. 
Vários moradores acreditam que os políticos dedicam pouca atenção ao bairro. 
Também a má fama do Francisco Caetano Filho incomoda seus moradores, como se 
todos que lá moram fossem traficantes ou prostitutas (o noticiário dos jornais registra, 
toda semana, casos de prisões por tráfico na área). 
Algumas pessoas com as quais tivemos um contato mais próximo, são pessoas 
simples, e também atenciosas para com quem busca informações sobre o bairro. Elas 
procuram mostrar, de maneira bem clara, o que realmente é viver naquela comunidade 
e isso nos deixou surpresos. 
Já vimos que o bairro não existe oficialmente. Mas as pessoas que moram lá não 
se incomodam com isso. Elas têm certeza de que moram no bairro Francisco Caetano 
Filho, mesmo que algumas vezes algumas sintam vergonha de admitir isso, por causa 
da má fama da área. O fato de não ter lei criando o bairro não impede os moradores de 
ter identidade com ele. 
41 
Todos nós esperamos ter no bairro onde moramos alguns serviços essenciais, 
como água, luz, esgoto, saneamento básico, transporte fácil, segurança, escolas, 
postos de saúde e bom comércio. Alguns desses serviços não existem no Francisco 
Caetano Filho. 
O problema das enchentes, por exemplo, marca a vida de todos por lá. Foi assim 
em nossa primeira visita ao bairro para esta pesquisa. Choveu muito naqueles dias e 11 
famílias estavam alojadas no Ginásio Hélio Campos. Apesar de aborrecidos com o 
problema, mostravam-se conformados. Eles sabiam que morar lá tem seus riscos. 
Fomos ao ginásio entrevistar as pessoas. 
Elisamar Mafra dos Santos, 25 anos, foi com quem primeiro falamos. Ela saíra 
da região do Apiaú (Mucajaí) com o marido e três filhos, havia um anoe nove meses, 
vindo direto para Boa Vista. A família construiu um pequeno barraco, sobre palafitas, 
em uma das partes mais críticas do bairro, no leito do igarapé Caxangá onde existe 
uma ponte onde está entendido que o bairro termina. Eles não eram donos de nenhum 
terreno. Invadiram a área para morar próximo à mãe dela, mesmo sabendo dos riscos 
que correm. 
Pelo segundo ano consecutivo, Elisamar é obrigada a deixar seu bairro e 
mudar-se para o alojamento do Ginásio Hélio Campos, onde a Defesa Civil aloja os 
desabrigados das enchentes ocorridas na cidade. 
Como dissemos antes, naquela época estavam lá 11 famílias vindas do bairro 
Francisco Caetano Filho. 
Se chover muito, o acesso ao seu barraco é feito através de canoa. Fomos lá 
para ver a situação no local. Tivemos que embarcar numa canoa para chegar. Após 
42 
alguns minutos de travessia, chegamos à casa de sua mãe, dona Maria Euvina Mafra 
dos Santos, que não trabalha. 
 
 
 Foto 5 - Casa de Maria Euvina (Viviane Lima, 2004) 
 
Ela mora com o marido, seu pai e também com sua irmã, que é deficiente. Seu 
barraco, sobre palafitas (foto 5), mede uns 9m². Um espaço muito pequeno para tanta 
gente. O terreno também fica no leito do igarapé e é invasão. 
Para eles, a situação é quase normal. Já estão acostumados em enfrentar as 
dificuldades da vida. Há anos lutam por coisa melhor, mas ainda não deu para 
melhorar. 
43 
Naquele dia, faltavam uns 20 centímetros para a água entrar no barraco. Se 
isso acontecesse, eles seriam transferidos para o Ginásio Hélio Campos, como ocorreu 
com a filha, Elisamar. 
A falta de saneamento básico também é um problema. Sem esgoto ou fossa 
nas casas, os dejetos vão direto para o rio (foto 6). Com a enchente, os contatos com 
esses dejetos provocam a contaminação do ambiente, com risco de doenças de pele e 
outros tipos de moléstia. 
 
 
 
Foto 6 - Banheiro isolado pela enchente (Viviane Lima, 2004) 
 
Essa situação poderia criar um ambiente infeliz e de revolta na família. Mas 
não foi isso que encontramos. Mesmo aborrecidas com os problemas enfrentados, elas 
sabiam que aquele espaço representa uma conquista para quem não tem patrimônio. 
44 
Não pagam aluguel, estão próximos ao centro da cidade, os filhos têm onde 
estudar, e mais uma série de vantagens que talvez não tivessem antes. 
A explicação para esse quadro está em: 
 
 
 
A vila, a cidade e a metrópole são construções humanas feitas a 
partir das necessidades, interesses e condições objetivas e que se 
revelam, pelo menos, em duas esferas distintas, porém interligadas: em 
sua estrutura física e na articulação das relações que ocorrem em seu 
interior.11 
 
 
 
A vida dessas pessoas que, ao nosso primeiro olhar e contato, parece 
representar algo triste, infeliz, nos faz mudar de idéia quando passamos a conviver com 
as crianças que ali estão. Seu mundo se resume no que vivem, pois muitas não saem 
nunca do próprio bairro. 
 Na sua inocência de crianças, brincam com seus mais simples brinquedos, a 
maioria por eles inventados na medida do que precisam. São felizes; o sorriso é 
estampado em suas faces como se nada de ruim, nenhuma necessidade complicasse 
suas vidas. 
Muitas delas passam a maioria do dia sozinhas em casa. Seus pais saem para o 
trabalho e os mais velhos são responsáveis pelos mais novos (foto 7). Às vezes um 
vizinho mais amigo colabora, com uma “olhada” de vez em quando. Como vimos antes, 
as relações da comunidade também são solidárias. 
 
11
 SANTAELLA,1996, p. 282 
 
45 
 
Foto 7 - Rotina das crianças do Bairro. (Viviane Lima, 2004) 
 
Elisamar serviu de cicerone em nossa segunda visita. A convite da autora, ela 
acompanhou-nos até o bairro. Não foram poucas as pessoas que procuraram saber o 
que fazíamos por lá. 
Senti medo, pois percebi que a preocupação deles era impedir que a autora 
falasse mal do bairro em seu trabalho. Os olhares são de desconfiança, coisa bastante 
natural para quem vive sendo visto com olhos de reprovação e repúdio pela sociedade. 
Outra moradora, dona Maria das Graças, 49 anos, costureira, está no bairro 
desde 1979. Para ela, o Francisco Caetano Filho necessita de algumas coisas, porém 
não pensa em sair dele, pois lá se sente bem, lá conheceu o seu esposo, casou-se, 
teve seus filhos, hoje todos criados. Ela avalia o local e sua vida. 
 
 
46 
O bairro é tranqüilo, pelo menos para nós. Moro aqui por todo 
esse tempo e nunca nos aconteceu nada de ruim. Todos nós nos 
conhecemos. Mas falta algo; os políticos devem olhar mais por nós. 
Eles só aparecem aqui na época da campanha; depois eles somem até 
outra eleição. 
 
 
 
Outro problema enfrentado por dona Maria e por outros moradores é a questão 
da discriminação. Como dissemos antes, o bairro é discriminado pela má fama, por 
conta das ocorrências policiais. 
Quando tentam matricular seus filhos nas escolas de Ensino Médio do centro da 
cidade (lá só existe uma escola de ensino fundamental), percebem a rejeição das 
pessoas que não moram no Francisco Caetano Filho, como se as crianças fossem uma 
influência ruim para os filhos daquelas pessoas. 
Outro morador da comunidade que ajudou na pesquisa tem 18 anos, é estudante 
e filho da dona Maria das Graças. Ele gentilmente se dispôs a percorrer todo o bairro 
conosco, enquanto fazíamos as fotos para este trabalho. 
Conhecedor de vários detalhes do bairro, sua ajuda foi de grande valia para nós. 
Contou-nos, sob o mais absoluto sigilo, de como a maioria das pessoas ganha suas 
vidas de maneira fácil. 
 
 
47 
 
Foto 8 - Manhã de uma quarta-feira no Bairro (Viviane Lima, 2004) 
 
 
Eles vivem assim: passam o dia todo e até a noite nos bares 
(foto 8), jogando, bebendo e jogando conversa fora. ‘Se envolvem’ em 
brigas constantemente e o motivo são as drogas. Aqui, quem você 
menos imagina vende drogas. Para eles é o único meio de 
sobrevivência. Na verdade, querem ganhar a vida facilmente. As 
mulheres usam seus corpos. Isso você pode observar pela maneira que 
elas se vestem e os lugares que costumam freqüentar. 
 
 
 
O morador quando fala nas mulheres que se prostituem em seu bairro reflete a 
linguagem de que fala Lúcia Santaella12: 
 
 
 
12
 SANTAELLA, 1996, p. 313. 
48 
Se levarmos o termo linguagem tão longe quanto possível, não 
é difícil chegarmos à conclusão de que tudo é linguagem. A mais 
esquemática definição de linguagem seria a de qualquer coisa que é 
capaz de tornar presente um ausente para alguém, produzindo nesse 
alguém um efeito interpretativo. 
 
 
 
A autora também teve a mesma sensação. Chegamos no bairro e vimos três 
mulheres sentadas debaixo de um cajueiro, vestidas com roupas provocantes, tendo 
como companhia uma garrafa de cachaça 51. 
Conseguimos ouvir um pouco da conversa. Falavam de futilidades, com 
palavras de baixo calão, às gargalhadas. Quem estivesse procurando um programa 
sexual nem precisaria perguntar se elas o fariam. Seus gestos, suas roupas e suas 
atitudes demonstravam isso. 
Seu comportamento era bem diferente das senhoras ‘de família’ com quem 
tivemos contato no bairro. Duas formas de viver num mesmo bairro. Elas convivem, 
mas não se misturam. Daí a revolta das moradoras que não se prostituem com a fama 
que, sem querer, recebem da sociedade. 
 
2.2 – O BAIRRO QUE NÃO EXISTE 
 
Ao iniciar a pesquisa, muitas foram as surpresas. Porém, uma das que mais 
marcou foi quando fomos ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 
busca de informações sobre obairro Francisco Caetano Filho e descobrimos a não 
existência do bairro. 
49 
Por mais absurdo que possa parecer, o bairro não existe. Para que isso ocorra 
é preciso que conste do Plano Diretor do Município, conforme preceitua a Lei nº 244, de 
06 de Setembro de 1991. A Câmara Municipal de Boa Vista jamais aprovou qualquer 
projeto nesse sentido. Nem por iniciativa própria, nem por mensagem do Executivo 
Municipal. 
 
 
Foto 9 - Entrada do Bairro Francisco Caetano Filho: ausência de pessoas (Viviane Lima, 2004) 
 
 
Na verdade ele existe mais dentro de um outro bairro, o Centro. Recentemente 
a PMBV, através da Secretaria Municipal de Gestão Participativa, vem desenvolvendo 
um trabalho nos bairros periféricos da cidade e, para nossa surpresa, o “bairro” 
Francisco Caetano Filho, mesmo não sendo oficialmente um bairro, recebeu a equipe 
50 
da secretaria onde foi feito um trabalho em cima do que, para eles, moradores, se 
resume no bairro. 
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como vimos 
anteriormente, não tem o bairro como existente em seu cadastro. Nem poderia ser 
diferente, pois também não há aprovação de sua criação pela Prefeitura ou pela 
Câmara de Vereadores. 
Como o IBGE só trabalha com a situação formal da sociedade, suas pesquisas 
mantêm a área onde se localiza o Francisco Caetano Filho como bairro Centro, mesmo 
que os moradores, a sociedade, a imprensa e todos os demais segmentos saibam que 
o Francisco Caetano Filho exista como bairro no imaginário popular. Poderíamos defini-
lo como a presença da ausência. 
Na época das enchentes, a ausência existe mesmo (foto 9), pois os moradores 
são obrigados a deixar suas casas por causa das águas do rio invadindo as ruas e até 
chegando ao telhado das casas situadas na parte mais baixa do bairro. É quando o 
Francisco Caetano Filho deixa de existir não apenas oficialmente, mas também pela 
saída de seus moradores, até que o nível das águas volte ao normal. 
Quando isso acontece, o bairro volta a ter seus moradores, embora continue a 
não existir na burocracia municipal. Porque ninguém quer sair de lá, apesar de todos os 
problemas que o bairro enfrenta. 
No final deste mês de julho e início de agosto, o bairro está envolvido em mais 
uma polêmica, onde fica bastante clara a ausência de responsabilidade das autoridades 
locais nos problemas do bairro. 
51 
O jornal Folha de Boa Vista publicou reportagem denunciando uma rede de 
esgotos clandestina, jogando os detritos direto no Rio Branco (foto 10), criando um foco 
de poluição. 
 
 
Foto 10 - Esgoto a céu aberto (Folha de Boa Vista, 2004) 
 
 
O local foi fotografado pela equipe de reportagem, inclusive com crianças 
brincando próximo à saída do esgoto, na margem do rio (foto 11). A Prefeitura de Boa 
Vista diz que o caso é da alçada da Companhia de Águas e Esgotos de Roraima 
(CAER), a quem caberia a responsabilidade de cuidar das redes de esgotos da cidade. 
 
 
52 
 
Foto 11 - Crianças próximo ao esgoto (Folha de Boa Vista) 
 
 
A CAER acusa a prefeitura de tentar se livrar de sua responsabilidade de 
cuidar da rede de águas pluviais, onde teria sido conectada a rede clandestina. 
No meio da polêmica, apareceu o ex-prefeito Barac Bento confirmando que 
construiu, em 1989, uma rede de águas pluviais, porque pretendia transformar a área 
em espaço de lazer. Disse que os comerciantes de peixe tomaram conta do lugar. Ele 
não sabe quem construiu a rede clandestina, mas garante que a rede pluvial tem até 
placa de inauguração. 
Entre tantas acusações e omissões, surge uma palavra de bom senso, vinda 
de uma comerciante do bairro. Perguntou ela, na reportagem publicada na Folha de 
Boa Vista do dia 31 de julho de 2004: “Quem teria dinheiro aqui para construir uma rede 
de esgotos onde gastamos 80 reais só para desentupir quando entope?” 
53 
Até o momento em que a autora encerrou sua pesquisa, ninguém havia tomado 
providências para resolver o problema. Enquanto isso, a comunidade do bairro 
Francisco Caetano Filho continuava exposta à poluição gerada pelo despejo dos 
detritos das fossas direto para o Rio Branco, onde as crianças brincam. 
 
54 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
O bairro Francisco Caetano Filho não é um bairro. Como bairro, é considerado 
Centro. Mas seus moradores insistem que o bairro existe com aquele nome, ou como 
Beiral, sua outra denominação. 
Para eles, não interessa se as autoridades deixaram de oficializar o que o povo 
considera certo. Os moradores não têm ilusão sobre os políticos. Eles sabem que 
poucos cumprem o que prometem, como aconteceu com o prefeito que prometeu 
mudar o nome do bairro para Francisco Caetano Filho e nunca tomou as providências 
que a lei exige para tornar oficial o ato. 
Os moradores continuam acreditando que a vida vai melhorar no bairro (foto 
12). Eles insistem em ficar por lá mesmo depois das enchentes que alagam o bairro e 
fazem com que eles tenham que sair para abrigos improvisados, como o que 
encontramos no ginásio Hélio Campos, com as famílias dividindo espaço, enquanto as 
águas cobriam suas casas. Eles têm identidade com o bairro e querem continuar 
mantendo essa identidade, apesar dos problemas. 
A imagem que a sociedade faz do bairro incomoda seus moradores. Eles não 
gostam de ser comparados a traficantes ou prostitutas, também moradores do bairro. 
Fazem questão de dizer que todo lugar tem bons e maus elementos. O 
Francisco Caetano Filho não é diferente. Quando os jornais divulgam notícias com 
crimes ocorridos no bairro, os cidadãos de bem ficam chateados, porque acabam sendo 
atingidos pela notícia, mesmo sem ter nada a ver com o caso. A maioria da sociedade
55 
 passou a acreditar que todo morador do bairro está envolvido com problemas policiais, 
de tanta notícia ruim que sai de lá. 
Os moradores se orgulham de seu bairro, pelo que vimos em todas as visitas 
que fizemos. A diferença de comportamento entre os que cumprem a lei e os que levam 
uma vida marginalizada já foi explicada por Lúcia Santaella, citada anteriormente. 
 
 
 
Foto 12- A vida continua no Bairro Francisco Caetano Filho (Viviane Lima, 2004) 
 
 
O grupo social determina seus limites de ação, para o bem ou para o mal. O 
grupo cria as condições que acha adequada para seu bairro. Se houver diferença de 
comportamento entre as pessoas do grupo, poderemos ter duas realidades diferentes. 
56 
No caso do bairro Francisco Caetano Filho, encontramos um bairro feliz lá 
dentro, mas com má fama do lado de fora, porque o noticiário sempre dá destaque ao 
que de ruim acontece lá dentro. 
A vida daquela comunidade poderia ser melhor se as autoridades dessem mais 
assistência ao invés de empurrarem os problemas uns para os outros nos jornais e 
resolverem a situação das pessoas. 
São administradores também ausentes no que se refere ao cotidiano de um 
bairro ausente no projeto urbano estadual e municipal 
O tempo passa e os moradores continuam ausentes das políticas públicas, em 
especial, durante o inverno por suas residências e ruas estarem sob as águas do Rio 
Branco. 
Porém a história de homens, mulheres e crianças não está ausente da história 
de Roraima. 
57 
REFERÊNCIAS 
 
 
COBLEY, Paul.Semiótica para principiantes. Buenos Aires, 1997. 
COELHO, Paulo. Contos do Alquimista. São Paulo: Melhoramentos,1999 
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário Aurélio Século XXI 
Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001. 
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