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Artigo Original – Original Article AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 1 ANÁLISE DA EFETIVIDADE DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS E O TRÁFICO DE ANIMAIS NO BRASIL ANALYSIS OF THE EFFECTIVENESS OF ENVIRONMENTAL CRIMES LAW AND TRAFFICKING IN ANIMAL IN BRAZIL Vanessa Gonçalves Oki Graduanda do curso de Direito da Faculdade Itaboraí, Rio de Janeiro, Brasil vanessa.g.oki@hotmail.com Pando Angeloff Pandeff Doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, UFF, Brasil Mestre em Ciência Ambiental pela Universidade Federal Fluminense, UFF, Brasil Professor da Faculdade Cenecista de Itaboraí, FACNEC, da Faculdade Itaboraí, FAÍ Faculdade Cenecista de Rio Bonito, FACERB, Brasil Coordenador do Curso de Administração da Faculdade Itaboraí pandopandeff@cnecrj.com.br Resumo: O presente estudo promove uma breve discussão acerca do tráfico de animais com base na Lei de Crimes Ambientais, salientando a necessidade de uma tipificação penal da referida conduta, que ainda é vista de forma pouco relevante. Observa-se nesse contexto um incremento sistemático no comércio ilegal de animais, no Brasil e no mundo. O estudo se desenvolve inicialmente com uma breve exposição da evolução histórica da proteção à fauna na legislação brasileira e segue com a abordagem das principais questões que envolvem o tema proposto, principalmente no que se refere à organização do crime ambiental, sendo caracterizado como um problema grave e emergente. A metodologia utilizada para elaboração do presente estudo teve como supedâneo os estudos doutrinários e a legislação vigente, Lei 9605/98, que regula os crimes ambientais e material publicado na mídia em geral. O estudo é fruto de trabalho monográfico do curso de Direito da Faculdade Itaboraí. Palavras–chave: Lei de Crimes Ambientais; Tipificação penal; Tráfico de animais. Abstract: This study promotes a brief discussion about the trafficking of animals based on the Environmental Crimes Law, stressing the need for criminalization of such conduct, which is still seen in some relevant way. Observes in this context a systematic increase in the illegal trade in animals, in Brazil and worldwide. The study was initially developed with a brief account of the historical evolution of fauna protection under Brazilian law and follows the approach of the main issues surrounding the theme, particularly with regard to environmental crime organization, being characterized as a serious problem and emerging. The methodology used in preparing this study was footstool doctrinal studies and current legislation, Law 9605/98, which regulates environmental crimes and material published in the media. Not intended to exhaust here the discussions on the proposed topic. The monographic study and work Fruit Law Course of the Faculty Itaboraí. Keywords: Animal trafficking; Criminal classification; Environmental Crimes Law. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 42 1. INTRODUÇÃO O crime organizado no tráfico de animais movimenta bilhões de dólares todo ano, considerada a terceira atividade ilegal mais rentável do mundo segundo informações da Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (RENCTAS), superado apenas pelo tráfico de drogas e de armas. O Brasil é o país que possui uma das maiores biodiversidades do planeta, sendo grande atrativo para o comércio ilegal de animais silvestres. Nesse ambiente o Brasil tem tratado a temática com pouca significância pois o traficante de animais silvestres – considerado pela legislação de regência, como o comerciante habitual de animais silvestres capturados ilegalmente – tem sido responsabilizado penalmente como criminoso de menor potencial ofensivo (BRASIL, 1998). Segundo dados da INTERPOL 1 : A criminalidade ambiental não se restringe às fronteiras, e pode afetar a economia, a segurança de uma nação e até mesmo a sua existência [...]. As mesmas rotas usadas para o contrabando de animais selvagens em todos os países e continentes são muitas vezes utilizadas para contrabandear armas, drogas e pessoas. Na verdade, o crime ambiental ocorre frequentemente de mãos dadas com outros delitos, como a fraude de passaporte, corrupção, lavagem de dinheiro e assassinato. O comércio ilegal de animais silvestres se vê atraído pela sua alta lucratividade, combinada ao baixo risco, cuja punição é relativamente branda e com pouca especificidade (PIOLI, 2015). Além dos danos irreparáveis à natureza, necessário se faz salientar a crueldade inserida no tráfico de animais que, muitas vezes são mortos ou torturados no processo desde a captura até o transporte ao destinatário final. Vê-se a necessidade de uma tipificação penal para tal conduta, além de uma efetiva aplicabilidade da norma, em conjunto com uma fiscalização de fato, visando proteger, tanto o ser humano, quanto a fauna, desse crime organizado, vez que os recursos naturais, o meio ambiente, a fauna e a flora não são infinitos. 1 Organização Internacional de Polícia Criminal (International Criminal Police Organization), é uma organização internacional que ajuda na cooperação de polícias de diferentes países. Foi criada em Viena, na Áustria, no ano de 1923. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 43 1.1. OBJETIVO GERAL Promover pesquisa bibliográfica buscando subsídios para fundamentação de análise do modelo jurídico-penal sob a ótica da lei de Crimes Ambientais e do processo de criminalização das atividades de comércio clandestino de espécimes da fauna nacional. 2. METODOLOGIA O estudo busca compreender o modelo jurídico-penal atual, no âmbito da criminalização e punição do crime concernente ao comércio clandestino da fauna nacional. Para obtenção de dados utilizados se promoveu uma revisão bibliográfica da literatura disponível sobre o tema e acesso aos bancos de dados dos sites de periódicos que versavam sobre o tema proposto. Além das pesquisas mencionadas, procurou-se nos veículos de comunicação de massa, entrevistas realizadas com especialistas na repressão a crimes ambientais no âmbito federal, a fim de agregar os aspectos práticos à teoria apresentada nos ensaios publicados nas revistas jurídicas. A contextualização foi elaborada a partir das conclusões dos artigos científicos consultados de forma a ser o estudo, uma contribuição adicional do trabalho dos pesquisadores do tema, no sentido de confirmar suas conclusões e assim apresentar, conclusões mais próximas do objeto deste estudo associada ao dia-a-dia da repressão policial diante do tráfico de animais silvestres, com sugestões para melhoria do modelo jurídico-penal. 3. DESENVOLVIMENTO 3.1. BREVE HISTÓRICO DA PROTEÇÃO À FAUNA NO BRASIL A história da colonização do Brasil, destaca que comumente eram levadas espécies exóticas e exuberantes para a Europa. Principalmente os pássaros com suas plumagens inigualáveis, porquanto raras no velho mundo, os quais eram exibidos na corte hispano- lusitana como sinal de riqueza e poder. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 44 O historiador Roberto C. Simonsen (1944, p. 86), traz em suas obras relatos de que a Nau Bretoa, em 1511, voltou a Portugal lotada de papagaios, bugios e saguis,inaugurando a rota marítima das grandes explorações. Tal costume de exportar espécies exóticas persiste aos dias atuais, mas a legislação brasileira evoluiu, enxergando a necessidade de tutelar o patrimônio faunístico, seja por resguardo aos interesses econômicos, seja por interesse preservacionista, tendo em vista a exploração desordenada e a destruição em larga escala da fauna desde a colonização. O quadro 1 a seguir traz um resumo das principais Leis e Decretos relacionados à proteção da Fauna no Brasil. LEGISLAÇÃO DESCRIÇÃO DEC 23.793/1934- Código florestal de 1934 Foi o primeiro a utilizar o termo fauna, expondo uma necessidade de proteção desta, pelos poderes públicos. Decreto 24.645 de 1934 Trouxe a definição de animal e a proteção contra maus-tratos dolorosos causados a estes; Código de Pesca de 1938, e Decreto–lei n.º 794/1938 Cuidava da fauna aquática, considerando sua captura atividade econômica sujeita ao controle estatal; Decreto 50.620 de 1941 Assim como o Decreto 16.590/24, tratou de proibir as rinhas de galo; Código de Caça e Decreto–lei n.º 5.894, de 20 de outubro de 1943 Mantem a caça profissional como modalidade permitida, mesmo com regulamentação restritiva, o Estado incentivava o comércio de animais silvestres capturados no meio natural e perpetuava a cultura da caça Lei n.º 4.771 de 1965 - O novo Código Florestal. (já revogada pela Lei 12.651/2012) Tratava das florestas em território brasileiro e demais formas de vegetação, define a Amazônia Legal, os direitos de propriedade e restrições de uso para algumas regiões que compreendem estas formações vegetais e os critérios para supressão e exploração da vegetação nativa. Lei 5.197 de 1967 – Lei de Proteção à Fauna Aproximando-se do modelo constitucionalmente adotado em 1988. É com essa lei que foi estabelecida, no art. 36, a criação do Conselho Nacional de Proteção à Fauna, que só veio a ser regulamentado no ano de 1989 (Decreto Federal 97.633); Convenção do Meio Ambiente de 1972 Realizada em Estocolmo, traz à tona questões que tratam da necessidade de um meio ambiente equilibrado, visto que a fauna e a flora são elementos insubstituíveis; Lei de Vivissecção (Lei 6.638) de 08 de maio de 1979 Estabelece normas para a prática Didático-Científico da vivissecção de animais e determina outras providências. Lei nº: 6.938 de 1981 Estabelece a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), alterado pela Lei 7.804/89 Lei 7.643 de 1987 Instituída para coibir a pesca ou qualquer forma de molestamento intencional de cetáceos (golfinhos, botos e baleias); Constituição Federal de 1988 Trouxe uma visão mais ambientalista, em seu artigo 225 que protege o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, vedando práticas cruéis contra os seres vivos; Lei nº 9.605 de 1998 A Lei de Crimes Ambientais, cuja meta era a unificação dos principais delitos ambientais em um só corpo Quadro 1: Principais legislações protetivas dos animais Fonte: Adaptado de Planalto (2014) Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 45 Nota-se o grande progresso da legislação brasileira no que tange à proteção ao meio ambiente. Há pouco tempo a tutela ambiental era confiada tão somente ao Direito Administrativo. A proteção à flora nativa e aos biomas naturais também para as gerações futuras é um tema relativamente recente, portanto as leis anteriores eram esparsas e de difícil aplicação. A Constituição Federal de 1988 trouxe, em seu artigo 225 a tutela do meio ambiente, devendo este ser preservado para as presentes e futuras gerações. Estabeleceu a proteção do meio ambiente, marcado pela orientação nas seguintes vertentes: a vedação de práticas que ameacem a função ecológica de cada espécie e a prática que provoque a extinção das espécies ou que submetam os animais à crueldade. Além de tais previsões, elucidou que o dever preservacionista é tanto do Poder Público, quanto da coletividade, vez que o meio ambiente não é bem público ou particular, e sim de uso comum do povo. O surgimento da Lei de Crimes Ambientais, Lei 9.605/98, determinou a responsabilidade das pessoas jurídicas, permitindo que empresas fossem responsabilizadas criminalmente pelos danos que seus empreendimentos causassem à natureza. Todavia, ainda há lacunas e textos inespecíficos e inexatos na legislação. Falta um enquadramento típico específico para o caso do traficante de animais silvestres, o que ocasiona, novamente, uma brecha na proteção jurídico-penal quando da aplicação da norma. De forma genérica, a Polícia e o Ministério Público, quando não há transição penal, acabam processando o terceiro, o indivíduo que trabalha para o traficante propriamente dito, ficando este protegido por um esquema jurídico onde a própria Lei lhe é benéfica. Até o momento em que a norma penal chega a afetá-lo, o que fica a cargo de defesa é resolvido por advogado que tenha um pouco de conhecimento das questões penais ambientais. A lei dificilmente alcança o traficante. Em muitos casos o infrator é flagrado pela Polícia reincidentemente na prática de crime contra a fauna pouco depois de ser autuado. 3.2. O TRÁFICO DE ANIMAIS NO MUNDO O comércio ilegal de animais é um mercado lucrativo, e considerado de baixo risco, movimentando estimados US$ 19 bilhões por ano, conforme relatório da Word Wild Found (WWF) . Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 46 Segundo uma compilação do Instituto Inter-regional do Crime e Justiça de Investigação das Nações Unidas (UNICRI, 2000 p. 29 – tradução própria), há um envolvimento de peso no comércio ilegal de animais, entre gângsteres chineses, japoneses, italianos e russos. Além da combinação de cartéis de drogas e produtos de animais silvestres. O contrabando do chifre de rinoceronte hoje é extremamente rentável, devido ao mito de que cura o câncer e como afrodisíaco. Estima-se que um chifre de rinoceronte pode custar até 250 mil dólares. Em gramas, esse valor é superior ao ouro. O animal, quando não é morto, é gravemente ferido e tem seu chifre cruelmente arrancado. O que sobra do animal é largado para agonizar até a morte. O mesmo ocorre com o marfim do elefante africano. Figura 1 e 2: rinoceronte vítima do tráfico de chifre e apreensão de marfins de elefantes africanos. Fonte: <http://www.africa21online.com/artigo.php?a=12310&e=Economia> - <http://g1.globo.com/natureza>. O navio inspecionado que viajava para Laos continha 511 peças de marfim do elefante africano, avaliadas em US$ 6 milhões, anunciou a Alfândega tailandesa”. Ainda conforme dados do primeiro relatório da RENCTAS, devido às péssimas condições de transportes, cerca de 90% dessas espécies não chegam com vida ao seu destinatário final. Desta feita, a função ecológica que cada espécie capturada cumpre no ecossistema, mostra-se visivelmente abalada pela retirada de exemplares da fauna, que ocasiona um desequilíbrio ambiental de notório conhecimento, e afeta tanto as etapas de desenvolvimento, quanto os ciclos reprodutivos, levando o a espécie à extinção. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 47 Em pesquisa psicológica de comportamento animal e visual realizada cientificamente pelos ornitólogos da Universidade de São Paulo, constatou-se que existem aves que após serem retiradas dos pais, passam a vida inteira olhando parao céu à procura dos seus pais. Figura 3: aves vítimas das péssimas condições de transportes causadas pelo tráfico Fonte: (http://g1.globo.com/natureza/noticia/2015/05/indonesia-encontra-24-aves-em-extincao-presas-em- garrafas-plasticas.htm). Além dos problemas à própria espécie já citados, o comércio ilegal de animais silvestres acarreta ainda os tão conhecidos impactos ambientais, tais como a aceleração da extinção das espécies e o desequilíbrio ambiental. Essa atividade também é responsável por outros problemas que vão além da ameaça à biodiversidade, tais como o fortalecimento das redes de tráfico, a ameaça à segurança de outros países, uma vez que o dinheiro do tráfico é utilizado também para financiar células terroristas, e, ainda, problemas que ameaçam a saúde pública, tendo em vista que mais da metade das novas doenças infecciosas que atingem os seres humanos são de origem animal. 3.3. O TRÁFICO DE ANIMAIS NO BRASIL A fauna silvestre ou a flora primária representam riquezas de valor inestimável do planeta. Associadas elas formam os exuberantes biomas e ecossistemas naturais, que acabam por atrair a facilidade do lucro através do tráfico de animais. Contudo, principalmente no Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 48 decorrer das últimas décadas, verifica-se que houve uma evolução desse comércio ilegal, sendo efetivamente um ramo do crime organizado. Isso ocorre, justamente, porque o animal pode ser capturado por um valor bastante ínfimo, pois o capturador em si, normalmente moradores humildes do local e que vivem da caça, ganha pouco com o animal. Contudo, esse mesmo animal pode chegar a um criadouro já legalizado com documentação, a valer alguns milhares de dólares. Isso se dá devido ao esquema através do qual esse crime organizado trabalha, desde dos caçadores, até a corrupção de servidores do órgão ambiental, também através de manipulação de dados de criadouros legalizados. Em entrevista à rede globo de televisão, o Delegado Franco Perazzoni, chefe da divisão de repressão ao crime contra o meio ambiente da Polícia Federal, salienta que, diferentemente de outros ramos do crime organizado no qual tem-se: o ato ilícito, o dinheiro que vem desse ato ilícito e uma posterior lavagem do dinheiro, o crime ambiental possibilita uma coisa única que é a legalização do próprio objeto. Isso se dá porque o que é ilícito não é o objeto em si, mas a origem dele. Assim, se o traficante, através de sua rede organizada, conseguir dar ares de legalidade a ele através da documentação, o animal passa a tramitar livremente. Vê-se assim a participação de criadouros particulares e zoológicos no próprio tráfico de animais. Somente no Brasil, cerca de 1,5 bilhões de dólares são movimentados pelo tráfico de animais silvestres. Existem quatro tipos de tráfico de animais realizados no Brasil, divididos de acordo com sua destinação. São eles: O tráfico voltado para exemplares destinados à colecionadores e zoológicos. Este seleciona as espécies, pois quanto mais raras, maior o seu valor. Dentre as espécies procuradas temos o mico-leão-dourado, a arara azul, a jaguatirica. Outra modalidade é o tráfico para fins científicos (biopirataria). Quando se pensa em tráfico de animais, normalmente pensa-se no animal inteiro. Mas a biopirataria trata da produção de medicamentos com partes desses animais, por exemplo o veneno da cascavel e da jararaca. Estima-se que um grama do veneno da jararaca chega a valer de U$D 34 a 45 mil. Tem-se ainda o tráfico para criação doméstica. Esta modalidade é a que mais fomenta o tráfico do Brasil. Muitas pessoas sentem o desejo de ter um animal exótico como bicho de estimação. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 49 Por último, o tráfico destinado a produtos da fauna. Este varia de acordo com o a indústria da moda e do carnaval que busca matérias primas como: couro, pêlo, garras, penas e presas, entre outros fatores de incentivo à essa atividade ilícita. Somente no Rio de Janeiro são conhecidas inúmeras feiras livres nas quais se pode comprar espécies da fauna sem registro. A feira de Duque de Caxias é uma das mais conhecidas e inúmeras reportagens de denúncia foram feitas pela mídia. Contudo, a feira continua funcionando. Em Alcântara, no final do ano passado, várias espécies foram apreendidas em uma feira livre. Devido à globalização, é possível adquirir uma espécie “exótica” sem sair de casa, bastando uma breve busca em sites de pesquisa para se encontrar anúncios de aves como: arara azul, tucano, ararajuba, à venda e enviados pelos correios, como se verifica no anúncio destacado na figura 4 a seguir: Figura 4: Ararajuba - espécie ameaçada à venda. Fonte: https://bicholandiapetshop.iluria.com/cart-content.html A grande procura por espécies exóticas e raras, acaba por fomentar ainda mais o comércio ilegal, levando-se em conta que você adquire a espécie por um valor muito mais baixo do que de um criadouro legalizado, e também a burocracia do processo de compra e venda. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 50 3.4 O TRÁFICO DE ANIMAIS À LUZ DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS A Lei nº 9.605/98 teve como propósito proteger o meio ambiente do país. Contudo, o legislador tratou o tema de forma bastante branda e incompleta, no que se refere ao crime organizado no tráfico de animais silvestres. Os artigos que tratam especificamente dos maus tratos, da caça, do tráfico ilegal, da venda e do transporte de animais, dizem o seguinte: Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa. § 1º Incorre nas mesmas penas: I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida; II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural; III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. § 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. § 3° São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras. § 4º A pena é aumentada de metade, se o crime é praticado: I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; II - em período proibido à caça; III - durante a noite; IV - com abuso de licença; V - em unidade de conservação; VI - com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa. § 5º A pena é aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício de caça profissional. § 6º As disposições deste artigo não se aplicam aos atos de pesca. Art. 30. Exportar para o exteriorpeles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a autorização da autoridade ambiental competente: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. Art. 31. Introduzir espécime animal no País, sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida por autoridade competente: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. § 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 51 Observa-se que o caput do artigo 29, acompanhado ou não das causas de aumento previstas, se aplica aos caçadores e seus auxiliares, no que se refere na conduta de matar, caçar apanhar, perseguir, e aos consumidores finais ou meros possuidores que, por vezes, não têm consciência da origem criminosa dos animais. O § 1º, III, desse mesmo artigo, se aplica tanto a comerciantes e transportadores, quanto a consumidores finais, quando os animais são provenientes de criadouros ilegais ou clandestinos. O mesmo dispositivo, se atentamente analisado, não prevê, as condutas de “vender, expor à venda, exportar, adquirir, guardar, ter em cativeiro ou depósito e transportar” animais silvestres retirados da natureza, tratando apenas das espécies “provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente”. Outro ponto que convém salientar, é a falta de congruência entre a aplicação do art. 29 § 1º, III ao tráfico de animais e a previsão, no art. 30, da conduta de “Exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis, em bruto, sem autorização da autoridade ambiental competente”, cuja pena varia de um a três anos de reclusão. Observa-se que a conduta de exportar também encontra-se prevista, com relação aos animais, no art. 29, § 1º, III, porém com pena de seis meses a um ano. Desta feita, não se pode conceber que o legislador tenha previsto pena tão mais severa a exportação de peles e couros do que a exportação do próprio animal. Sob uma análise de valor e de ética, e até mesmo de bom senso, não se pode dar aos seres vivos uma importância menor do que um objeto proveniente do mesmo. Na mesma linha de raciocínio do Procurador da República Dr. Renato de Freitas Souza Machado, é lamentável que em um país biodiverso como o Brasil, o indivíduo que furta um aparelho de som de um veículo automotor responda por uma pena maior do que outro que furta centenas de animais silvestres de uma Unidade de Conservação, com a finalidade de obter lucro ilegalmente. Convém ressaltar que a lei 9.605/98 objetivou privilegiar a situação do caçador, pessoa que de um modo geral, possui baixo grau de instrução e escolaridade, e que vive no meio rural próximo às florestas, não tendo muitas outras opções de subsistência, combinada à própria cultura local e realidade social, transmitida de uma geração para outra. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 52 Contudo, o que agrava o caso proposto é que a Lei de Crimes Ambientais, em conjunto com a Lei nº 10.259/2001, prevê como crime de menor potencial ofensivo. Desta forma, se o autor da prática for primário, ou seja, não tiver condenação transitada em julgado por crime anterior, poderá beneficiar-se de acordo com o Ministério Público o para que não se instaure a ação criminal, instituto denominado: transação penal. Pela transação penal, será aplicada pena de multa ou restritiva de direitos, extremamente branda se comparada ao dano causado. Ainda no que tange à pena de multa, mesmo que aplicado o valor máximo, continuará sendo rentável ao autor do crime, tendo em vista a lucratividade auferida com o tráfico. Pergunta-se o porquê da tipificação de determinadas condutas com penas maiores. Para responder a questão de forma comparativa: a falsidade ideológica no dispositivo penal em seu artigo 299 prevê pena de 1 a 5 anos, já a falsidade ideológica no curso de um licenciamento ambiental prevê pena de 1 a 3 anos. O próprio tráfico de animais detém algumas figuras que muito se assemelham ao crime de receptação, esta prevê pena de 1 a 4 anos, enquanto aquela prevê pena de 6 meses a 1 ano. Exemplificando, o comércio de marfim é proibido no mundo inteiro, assim, se alguém tenta entrar no Brasil sem a licença do órgão competente, será responsabilizado por contrabando, art. 334-A do Código Penal, por tentar entrar com produto proibido, no país sem a licença do órgão competente, aplicando-se a pena de 2 a 5 anos. Observe-se que se essa mesma pessoa entrasse no país com a pele de uma onça pintada comprada na Europa, se aplicaria a ela o artigo 29 da Lei de Crimes Ambientais, respondendo de 6 meses a 1 ano. O § 4.º do art. 29 (aumento de pena nos crimes praticados contra espécies raras ou ameaçadas de extinção) consigna uma norma penal em branco. Este inciso I não nos fala o que pode ser considerado uma espécie rara (que é aquela que é dificilmente encontrada), tão pouco elenca quais as espécies ameaçadas de extinção. O rol destas últimas só será encontrado na Portaria nº 1.522/89, do IBAMA. Portanto, um traficante de animais, com diversos antecedentes criminais em crimes contra a fauna, que atua em verdadeira organização criminosa, capturando animais às centenas, acaba por ser beneficiado com uma tipificação penal que foi dirigida àqueles cidadãos que, infelizmente movidos por uma triste tradição ainda em vigor em nossa sociedade, possuem em sua residência pássaros da fauna silvestre sem autorização dos órgãos ambientais. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 53 Diante das lacunas encontradas na legislação, percebe-se a necessidade de normatizar de forma mais inexorável a conduta do tráfico ilegal de animais silvestres, sempre em conjunto com uma maior fiscalização e efetiva aplicabilidade da lei. 3.5 DA NECESSIDADE DE UM TIPO PENAL ESPECÍFICO PARA O TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES A atual legislação que prevê os crimes ambientais, mostra-se insuficiente para coibir os crimes contra a fauna, ora por sua imprecisão, ora por sua ineficácia, devido às medidas brandas quando comparadas à conduta. Além de ser uma das principais causas da diminuição dos exemplares na nossa fauna, o tráfico de animais tem se mostrado notadamente organizado, envolvendo outras práticas ilícitas. Em relatório emitido pela WWF, estimou-se que 40% dos transportes ilegais de substâncias entorpecentes tenham alguma relação com o transporte ilegal de animais sendo certo que em algumas situações os animais são levados juntamente com as substâncias entorpecentes e, em outros, são utilizados como moeda de troca. Ademais, também já se constatou que o tráfico de animais é praticado, substancialmente, no âmbito de organizações criminosas, em forma de rede, tal como qualquer espécie de tráfico ilegal, que intrinsecamente envolve produção, circulação e consumo. Assim, para que o tráfico se sustente, são necessárias as figuras do caçador e seus auxiliares, que capturam os animais silvestres nas florestas; dos transportadores, que levem o animal capturado até os grandescentros; do traficante propriamente dito, que pode tanto ser um comerciante de Feira Livre, como aquele que possui um pequeno estabelecimento irregular, ou que tão somente comande todas estas operações de casa, pelos diversos meios de comunicação, possuindo diversos vendedores intermediários; e por fim, do consumidor final, que é quem adquire o animal para as mais diversas finalidades. Trata-se de uma cadeia de ações que envolvem corrupção, suborno, violência, entre outras. As baixas penas não conseguem minorar o ímpeto dos criminosos, das pessoas físicas, das quadrilhas, e até mesmo uma eventual pessoa jurídica, que se dedicam ao tráfico da fauna. Há uma necessidade de se repensar incisivamente nesse certame. Sendo assim, é inegável a necessidade de um equilíbrio legislativo que deve ser devidamente aliado às políticas públicas Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 54 comprometidas na preservação da Natureza, bem como uma participação ativa dos órgãos de fiscalização e punição daqueles transgressores das normas. O professor Lélio Braga Calhau (2006, p.54) 2 afirma: “O tráfico de espécies protegidas é semelhante ao de drogas, mas o primeiro apresenta uma diferença: embora seja proibido, na prática não é penalizado”. O advento de um tipo penal específico para a conduta do traficante de animais facilitaria a proteção do meio ambiente. Isso se deve ao fato de tornar objeto de uma ação mais repressiva do Estado, as condutas mais lesivas ao meio ambiente, vez que traficantes de animais costumam ser muito mais agressivos ao meio ambiente, do que 100 possuidores de pequenos pássaros silvestres. Tal repressão deverá, ainda, agir de forma rígida na área administrativa e penal no tráfico de animais, além de buscar a ajuda e a conscientização da comunidade onde os animais estão inseridos, pois a realidade social não pode ser esquecida pelos legisladores. O advento de um tipo penal específico para o tráfico dos animais restabeleceria o equilíbrio de ponderação de condutas lesivas ao meio ambiente, possibilitando uma ação adequada em face da conduta dos traficantes de animais silvestres, o que não existe no tipo penal do art. 29 da Lei nº 9.605/98. 3.6 DAS MUDANÇAS NECESSÁRIAS Há uma necessidade de atitudes mais severas e contundentes, além de mais adequadas à conduta dos traficantes de animais no juízo de sua tipicidade. O tipo penal de tráfico de animais, deve ser regido pelo Princípio da Razoabilidade e o da Precaução, como remédio capaz de obstar o delito, e medida imediata na busca para se punir de forma rígida tanto o grande quanto o médio traficante de animais silvestres. As mudanças sugeridas se fundamentam no fato de que é notório que o traficante não tem a menor preocupação com a função ecológica de cada espécie capturada, nem dos benefícios destas ao ambiente e tampouco com o desequilíbrio ambiental acarretado pela retirada desses animais de seu habitat. Não respeitam também, os ciclos de reprodução nem as 2 Lélio Braga Calhau- Promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Professor e escritor. Professor de Criminologia do IOB e Criminologia e Psicologia Jurídica da Fundação escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais. Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 55 fases de desenvolvimento das espécies, sendo apenas levado pela alta lucratividade da conduta. Considera-se tão somente a “mercadoria” e seu valor de compra-e-venda. O enquadramento típico específico faz-se necessário, por ser o tráfico de animais silvestre, uma das práticas mais prejudiciais ao meio ambiente, como já constatado. Necessário se faz a distinção, já na própria tipificação, de quem detém a guarda doméstica de um animal silvestre, por exemplo, que cria um pássaro em seu quintal por longa data e demonstra notória afeição pelo mesmo, daquele que tem uma rede organizada para o processo de caça, transporte, venda, entrega de incontáveis exemplares da fauna, para serem comercializados ilegalmente. Da mesma forma, necessário se faz seguir o raciocínio jurídico lógico, devendo-se ter um juízo de distinção entre as condutas uma vez que matar é mais grave que perseguir, caçar, apanhar, não devendo ser englobado no mesmo pacote. Assim sendo, a necessidade de tipificação da conduta do traficante de animais silvestres deve ser estudada, observando-se os princípios da razoabilidade e da precaução, permitindo, assim, uma resposta jurídico-penal mais adequada. Pelo princípio da razoabilidade, pode-se dirimir o bom-senso jurídico necessário advindo do princípio da legalidade, a fim de aplicar a norma de forma justa em relação à gravidade do ato ilícito cometido. O princípio da precaução deve ser analisado, visando prolongar uma sadia qualidade de vida às presentes e futuras gerações, vez que não se pode mensurar o dano causado em decorrência do tráfico de animais, devendo-se, portanto, não medir esforços para preservar o meio ambiente, vez que os danos causados a este, por vezes, são irreversíveis. Assim a equiparação do tráfico de animais silvestres a crimes hediondos, seria eficaz no sentido de dar uma resposta mais hostil a esse tipo de crime, tal qual o tráfico de entorpecentes, até porque não teria como o infrator beneficiar-se da transação penal, que é o que ocorre na maioria dos casos. Reprimir rigorosamente o crime de tráfico de animais é o mais adequado, uma vez que a própria Constituição Federal prevê a importância de se preservar o meio ambiente não só para as gerações existentes, mas para as que ainda hão de vir. Portanto, é preciso a conscientização do próprio Poder Público, de todos os que atuam direta ou indiretamente na repressão ao crime de tráfico de animais. Somente através da perfeita consciência da gravidade dessa conduta, poder-se-á combatê-la de forma efetiva e Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 56 eficaz. Assim esse tipo de crime deve ser tipificado com punição severa, equiparado ao crime hediondo, portanto, inafiançável e insuscetível de graça, anistia ou indulto. O objetivo é tornar a conduta o mais reprovável o possível, de forma a estreitar e dificultar os que atuam na rede desse crime organizado. 3.7 DA CONSCIENTIZAÇÃO Na maioria dos casos, a pessoa que compra um animal silvestre em uma feira, não faz a menor ideia de que está fomentando uma cadeia ilegal tão bem estruturada quanto o tráfico de entorpecentes, e que esta conduta é resultante de inúmeros maus tratos e tamanha crueldade, além da extinção desses animais. Muitas pessoas adquirem um desses animais para simplesmente se darem ao deleite de tê-lo em casa, ignorando as consequências negativas que isso pode ter para o animal e para o meio ambiente. Há casos em que o sujeito realmente acredita estar fazendo um bem ao próprio animal ao criá-lo perto de si, achando que isso é uma demonstração de amor pelo mesmo. Ocorre que, normalmente, os animais silvestres não são cuidados da forma adequada, já que ficam em espaços reduzidos e comem alimentos inapropriados, e pelo convívio com os seres humanos estão sujeitos a doenças que para os animais são fatais, como é o caso da gripe e do herpes. Por outro lado, existe o risco de ataques e de transmissão de inúmeras doenças por parte desses animais em relação aos seres humanos. Fazer o consumidor final entendera gravidade da sua conduta é extremamente necessário, e fará uma diferença eficaz. O indivíduo que compra uma espécie ilegalmente achando que está salvando aquele animal, está cometendo um erro gravíssimo e alimentando um crime crescente. É preciso que se eduque a população no sentido de preservar, a fim de cumprir o que determina a Carta Magna. Além do consumidor final, a população que vive no entorno do patrimônio faunístico precisa ser acionada e constantemente conscientizada de forma a tornar-se um aliado à preservação e não um inimigo do meio ambiente. É preciso que cada pessoa que vive nessas áreas tenha a consciência de que o simples fato de retirar um animal de seu habitat natural causa danos irreparáveis à natureza e ao próprio animal, que passa por grande sofrimento e, Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 57 em grande parte das ocorrências, paga com a vida pelo prazer de algumas pessoas em tê-los na sua casa. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A questão vai muito além da falta de preparo para lidar com bens transindividuais, de interesses coletivos, difusos, bens ambientais. Vê-se que o jurista é preparado para lidar com conflitos entre pessoas, mas quando se trata de interesses muitos maiores do que o interesse individual de uma pessoa, torna-se notória a incapacidade de aplicar a hermenêutica jurídica aprendida. Assim acaba-se por ser bastante injusto, dando interpretações equivocadas, inclusive com chancela de grandes juristas, que embora tenham agregado conhecimento jurídico, raramente se assentam para trabalhar efetivamente o Direito Ambiental. O tratamento que se dá a quem tem um animal dentro de casa, as vezes até bem tratado, mas em desconformidade com a legislação e aquela pessoa que trafica, por exemplo, 100 micos-leões-dourados, é praticamente o mesmo. Há a necessidade de um trabalho interligado de diversos órgãoS para que esse tipo de crime organizado seja reprimido. Dessa forma, é essencial a capacitação em todos os níveis, pois de nada adianta a capacitação do policial ambiental que irá efetuar a prisão em flagrante se o delegado de polícia que for lavrar o auto de prisão em flagrante não estiver preparado para isto. De nada adianta, ainda, encaminhar o processo para justiça se o promotor e o juiz não tiverem sensibilidade ambiental. A integração vai muito além dos órgãos de repressão mediata. A grande verdade da conscientização social é que, de fato, há uma sensibilização das pessoas quanto ao animal, bem como da situação degradante em que ele é colocado, mas ainda não enxergam efetivamente tal conduta como crime. Extrai-se da própria legislação que inexiste um enquadramento típico específico para o caso do traficante de animais silvestres, permitindo, assim, ineficácia na efetiva proteção ao meio ambiente, vez que justamente aquele que tem o domínio do fato e quem extrai a maior lucratividade dessa cadeia de ato criminoso, não é punido. Dessa feita, observa-se que a lei de crimes ambientais, não deve ser aplicada isoladamente. Assim não há um princípio da especialidade, e sim, necessariamente, ser Vanessa Gonçalves Oki; Pando Angeloff Pandeff ISSN 2359-1366 AMPLIANDO Revista Científica da Facerb, v. 3. n. 1. Jan./Jun.2016 58 somada a norma, havendo um concurso de crimes, uma vez que se tem bens jurídicos distintos sendo atingidos pela mesma conduta delituosa. O presente estudo procurou promover uma discussão inicial sobre a questão da necessidade da tipificação penal do tráfico de animais, devido às inúmeras questões que esta conduta traz, tanto para o meio ambiente, quanto para a sociedade. Assim, trabalhou-se no sentido de expor, sem esgotar, a necessidade de uma maior punição, inclusive, de sua equiparação aos crimes hediondos, tal qual o tráfico de entorpecentes, a fim de se ter uma melhor aplicabilidade da pena à conduta, com intuito de que se chegue à conclusão de que esse crime não compensa. O presente estudo não pretende esgotar as discussões sobre o tema, sendo base para novas discussões e estudos a serem desenvolvidos pela autora em futuro próximo como aprofundamento necessário a um contexto complexo e dinâmico do tema crimes ambientais e em particular sobre o tráfico de animais. 5. REFERÊNCIAS AFRICA ONLINE. Disponível <http://www.africa21online.com/artigo.php?a=12310&e=Economia> Acesso em: 21/06/2015. BRASIL. Lei No. 9.605 de 12 de Fevereiro de 1998 – Dispõe sobre Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm> Acesso em: 14/06/2015 ______. Decreto No. 2.848 de 07 de Dezembro de 1940 – Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao indivíduo, e dá outras providências Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm> Acesso em: 14/06/2015. 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