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FÍSICA – ÓTICA E PRINCÍPIOS DA FÍSICA MODERNA AULA 1 Prof. Bruno Charneski 2 CONVERSA INICIAL Historicamente, uma classe de pesquisadores defendia o comportamento corpuscular da luz, enquanto outra parcela defendia o comportamento ondulatório. O experimento de Young demonstra a difração da luz, fenômeno tipicamente associado a ondas, o que reforça a ideia de a luz ser uma onda. Atualmente, sabemos que a luz exibe um comportamento dual de onda-partícula. As ondas eletromagnéticas são representadas por funções trigonométricas, usualmente denominadas funções de onda. Vamos verificar, a seguir, os fenômenos de interferência, isto é, o encontro de duas ou mais ondas em determinado ponto. Veremos que a descrição matemática desses fenômenos pode ser realizada por meio da soma algébrica de cada uma das funções de onda das ondas que se encontram. Nesta aula aprenderemos o conceito de coerência associada a fontes luminosas e sua importância na formação de figuras de interferência. Estudaremos o efeito da difração da luz através de duas fendas estreitas, através de uma fenda larga, por duas fendas largas e, finalmente, veremos o conceito de redes de difração. TEMA 1 – INTERFERÊNCIA E COERÊNCIA A óptica física estuda o comportamento ondulatório da luz. Do ponto de vista matemático, representamos as ondas, em geral, por funções trigonométricas. A interferência é um dos fenômenos típicos do comportamento ondulatório, ou seja, as partículas não exibem essa característica. Na prática, a interferência se deve ao encontro de duas ou mais ondas em determinado ponto, tal que a diferença de fase entre elas tem efeito direto sobre a amplitude da onda resultante (imagine que duas ondas, de mesma amplitude e mesma frequência, encontram-se em um determinado ponto. Se nesse ponto tivermos dois picos ou dois vales, a interferência será construtiva, e a diferença de fase entre as ondas será de ou graus ou 1 comprimento de onda. Caso uma onda esteja em um pico e a outra em um vale, a interferência será destrutiva e a diferença de fase entre as ondas será de ou graus ou meio comprimento de onda). Para formar figuras de interferência estáveis, é 3 necessário que as ondas que se combinam sejam produzidas por fontes coerentes, isto é, a diferença de fase entre as ondas deve ser constante. A luz de uma lâmpada não produz uma figura de interferência estável porque a radiação emitida pelos átomos é aleatória, ou seja, a diferença de fase entre as ondas que interagem não é constante, portanto, a fonte não é coerente. Exercício: Duas fontes coerentes de micro-ondas cujo comprimento de onda é estão no plano , uma sobre o eixo dos , em , e a outra no ponto , . Se as fontes estão em fase, calcule a diferença de fase na origem entre as ondas provenientes destas fontes. Resolução A distância de uma das fontes até a origem é de . A distância da outra fonte à origem corresponde à hipotenusa de um triângulo de Pitágoras, com catetos de e . Sendo assim, A diferença de percurso entre as ondas é de . A diferença de fase pode ser obtida por uma regra de proporção simples, isto é TEMA 2 – INTERFERÊNCIA PRODUZIDA POR DUAS FENDAS (EXPERIÊNCIA DE YOUNG) Atualmente, sabemos que a luz exibe um comportamento dual, isto é, de acordo com de Broglie, ela se comporta como onda e como partícula. Contudo, anteriormente a essa ideia, uma classe de cientistas acreditava que a luz se comportava como onda (Christiaan Huygens), outra classe afirmava que seu 4 comportamento era de partícula (Isaac Newton). No início do século XIX, Thomas Young realizou o experimento da dupla fenda, no qual um faixo de luz incide sobre uma chapa com duas fendas muito pequenas e muito próximas, resultando em uma figura de difração para a luz, como pode ser visto na Figura 1.1 (lembre-se de que fenômenos de interferência são característicos das ondas). Figura 1.1 – Difração da luz por duas fendas (experimento de Young). Fonte: <http://carlosorsi.blogspot.com.br/2015/11/fenda-dupla-consciencia-mente- materia.html>. Este experimento foi muito importante para a Física e, do ponto de vista histórico, praticamente consolida o comportamento da luz como sendo o de uma onda (Figura 1.2). 5 Figura 1. 2 – A luz se propaga como uma onda eletromagnética formada por campos elétricos e magnéticos que se alternam. Fonte: < http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/o-que-sao-ondas-eletromagneticas.htm>. Dada a importância do experimento de Young, faremos uma análise mais cuidadosa dos conceitos envolvidos e dos resultados obtidos. Sabe-se que, para produzir uma figura de interferência estável, é necessário que as fontes sejam coerentes. De fato, quando montamos um aparato de dupla fenda e a luz proveniente de uma única fonte incide sobre ele, o resultado é a geração de duas fontes de luz coerentes. De acordo com o princípio de Huygens, esse comportamento se deve ao fato de que, quando uma onda encontra uma barreira com pequenas aberturas, cada abertura se comporta como se fosse uma fonte pontual. Pois bem, se determinada onda encontra dois orifícios, cada um deles se comportará como uma fonte pontual de ondas, cujas características são as mesmas da onda original, ou seja, mesma amplitude, mesma frequência e ambas terão a mesma fase (veja a Figura 1.1). Agora que temos duas fontes coerentes, veremos que a diferença no percurso de cada onda é o fator responsável pelo surgimento de uma disparidade de fase entre elas, resultando na formação de uma figura de difração estável. Sendo assim, considere a situação esquematizada na Figura 1.3. 6 Figura 1.3 – Esquema de difração da luz por duas fendas. Tendo em vista que a distância do aparato ao anteparo é muito maior que a distância entre as fendas, podemos considerar que as retas que ligam cada fenda ao ponto , no anteparo, são paralelas e a diferença de percurso entre as ondas se deve somente ao pequeno triângulo evidenciado na Figura 3. Sabendo que os máximos de interferência ocorrem quando há o encontro de picos ou vales, a diferença de percurso entre as ondas deve ser de comprimentos de onda inteiros, isto é: 1.2.1 Onde é o comprimento de onda e é o número de ordem, o qual está associado à posição de cada franja de interferência. De maneira semelhante, os mínimos de interferência ocorrem quando a diferença de percurso é de meio comprimento de onda, então teremos: 1.2.2 De acordo com a Figura 1.3, podemos relacionar a distância e a posição de uma determinada franja para encontrar o ângulo , o que fornece: 1.2.3 7 Note que estamos considerando valores pequenos do ângulo , nesse caso, a expansão em série de Taylor da tangente nos diz que , então, , o que permite reescrever a equação 1.2.1 da seguinte maneira: 1.2.4 Observe que são fixos, assim, determina a ordem da franja e sua posição e, de acordo com esse resultado, vemos que a distribuição das franjas de interferência é uniforme. A intensidade da luz em um ponto qualquer da tela pode ser calculada por meio da soma das funções de onda que se interferem. Assim como fizemos anteriormente, vamos considerar que as ondas são paralelas e, além disso, elas possuem a mesma amplitude e a mesma frequência, tendo em vistaque são produzidas pela mesma fonte. Sendo assim, considere duas ondas eletromagnéticas representadas pelas funções a seguir: 1.2.5 e Onde representa a diferença de fase entre as ondas devido à diferença de percurso entre elas. Somando-se as equações acima, obtemos a função de onda resultante, isto é: 1.2.6 Note que usamos a identidade trigonométrica A partir da equação 1.2.6, podemos ver que a amplitude da onda resultante é , ou seja, o valor máximo é obtido quando as ondas estão em fase e o valor mínimo, zero, quando estão defasadas de . Sabendo que a intensidade de uma onda é proporcional ao quadrado da amplitude, teremos 1.2.7 8 tal que é a intensidade de luz produzida por apenas uma das fendas e pode ser obtido por meio de uma simples regra de proporção direta, ou seja 1.2.8 Exercício A luz de um laser de hélio-neônio, cujo comprimento de onda é , incide normalmente em um plano onde existem duas fendas. O primeiro máximo de interferência está a do máximo central em uma tela a de distância. a) Calcule a distância entre as fendas. b) Quantos máximos de interferência podem ser observados? Resolução A distância entre as fendas pode ser obtida por meio da equação 1.2.1. O ângulo referente ao primeiro máximo de interferência será dado por . Com isso, O número de máximos também pode ser obtido da equação 1.2.1, considerando o maior ângulo possível para o último máximo de interferência, ou seja, , então: Isso implica que, a partir do máximo central (m = 0), existem 14 franjas para um lado e mais 14 franjas para o outro lado, totalizando 29 máximos. TEMA 3 – DIFRAÇÃO PRODUZIDA POR UMA ÚNICA FENDA 9 Diferentemente do caso de interferência, em que as fendas são estreitas e cada uma delas se comporta como uma fonte de mesma intensidade , no caso da difração, a fenda é larga e a intensidade luminosa da figura projetada varia com a posição (Figura 1.4). Figura 1.4 – Intensidade luminosa na difração por uma fenda larga. Para descrever o fenômeno da difração, vamos considerar uma fenda de largura . Podemos imaginar que, ao longo da fenda, está distribuído um grande número de fontes pontuais, as quais emitem ondas coerentes com mesma intensidade. Com o intuito de encontrar os mínimos de intensidade, vamos considerar a interferência dessas fontes aos pares, isto é, um zero de intensidade se deve ao encontro das ondas oriundas da primeira fonte, localizada na borda da fenda, e de uma fonte central, situada no meio da fenda (Figura 1.5). 10 Figura 1.5 – Esquema de difração da luz por uma fenda larga. Dessa maneira, um raciocínio semelhante pode ser aplicado às fontes subsequentes. Assim como no experimento de Young, os mínimos se devem à interferência destrutiva resultante da diferença de percurso entre as ondas, o qual deve ser de meio comprimento de onda. Sendo assim, para o primeiro zero de intensidade teremos: 1.3.1 Para determinar a posição do segundo mínimo, podemos aplicar um procedimento semelhante; contudo, devemos formar os pares de interferência com a primeira fonte, e outra localizada a uma distância de , o que resulta em: 1.3.2 Seguindo esse esquema, a expressão geral para os zeros de interferência será dada por 1.3.3 11 Figura 1.6 – Posição do mínimo de difração. A posição do primeiro mínimo está relacionada ao ângulo através da trigonometria (Figura 1.6), de fato 1.3.4 Tendo em vista que é pequeno, podemos considerar . Assim, a equação 1.3.1 pode ser reescrita como 1.3.5 a qual fornece a largura do máximo central da imagem de interferência, como pode ser visto na Figura 1.6. Exercício Um feixe de micro-ondas incide normalmente em uma fenda longa e estreita com de largura. O primeiro mínimo de difração é observado para . Qual é o comprimento de onda das micro-ondas? Resolução O comprimento de onda pode ser obtido através da equação 1.3.1, ou seja 12 TEMA 4 – DIFRAÇÃO PRODUZIDA POR DUAS FENDAS LARGAS A imagem de interferência formada pela difração da luz através de duas fendas de largura é uma composição dos fenômenos de interferência e difração, como pode ser visto na Figura 1.7. Figura 1.7 – Imagem de difração produzida por duas fendas de largura . A distância entre cada fenda é dez vezes maior que seu tamanho. Note que a parte central da ilustração é formada por uma linha mediana e outras nove franjas de cada lado. Além disso, as franjas das extremidades delimitam o primeiro mínimo de intensidade (devido ao efeito da difração), o qual é dado pela equação 1.3.1, resultando em: Sabemos que a posição dos máximos de interferência são dados pela expressão 1.2.4, assim como a posição do primeiro zero de intensidade, por conta da difração, está representado por 1.3.5. Podemos combinar esses resultados para estabelecer o número de franjas existentes na parte central da figura. Sendo assim, 1.4.1 13 Nesse caso da Figura 1.7, . Contudo, a décima franja, a partir do centro, não é visível, o que implica que o número de franjas na parte central da figura é dado por 1.4.2 Exercícios Uma figura de interferência e difração produzida por duas fendas é observada com uma luz cujo comprimento de onda é . As fendas têm largura e estão separadas por uma distância de . a) Calcule qual deve ser a largura para que o quinto máximo de interferência ocorra para o mesmo ângulo que o primeiro mínimo de difração. b) Nas condições do item (a), quantas franjas claras de interferência serão observadas na região central da figura de difração? Resolução A largura da fenda pode ser encontrada a partir da equação 1.4.1, sendo assim: O número de franjas é dado pela equação 1.4.2 TEMA 5 – REDES DE DIFRAÇÃO Uma rede de difração consiste em um aparato com uma sequência de pequenas fendas, muito próximas, tal que, quando iluminadas por uma fonte, cada fenda se comporta como uma fonte pontual. A imagem projetada é semelhante àquela produzida por duas fendas, contudo linhas menos intensas aparecem entre os máximos, como pode ser visto na Figura 1.8. 14 (Figura 1-8: imagem de interferência produzida por uma fenda, duas fendas e dez fendas, de largura e distância entre elas.) Fonte: < http://sites.ifi.unicamp.br/laboptica/roteiros-do-laboratorio/3-difracao- de-fendas/>. Além disso, as figuras apresentam uma resolução maior, tendo em vista que a amplitude da onda resultante é vezes a amplitude produzida por uma única fenda , consequentemente, a intensidade máxima, que é proporcional ao quadrado da amplitude, será . Para encontrar a posição dos máximos na figura de interferência vamos admitir a existência de fendas separadas por uma distância . Considere que as fontes interagem em pares contíguos, dessa forma, a análise da localização dos máximos se dá como no caso da experiência de dupla fenda (figura 1-3), isto é 1.5.1 Note que a posição dos máximos não é afetada pela quantidade defendas, mas, como veremos, a espessura das linhas sim (veja na figura 1-8). Para demonstrar esse fato, dessa vez adotaremos um tratamento semelhante ao da difração por uma única fenda. Sendo assim, a largura da fenda , do caso da difração, deve ser substituída pela distância entre a primeira fenda e a de ordem , dada por . De acordo com a equação 1.3.3, a espessura do meio-máximo central será Tendo em vista que o ângulo é muito pequeno, podemos a expandir a função seno, então 15 Note que o resultado acima se refere à largura da linha em relação ao centro. Devemos considerar, portanto, seu simétrico oposto, o que pode ser feito multiplicando o resultado por dois, ou seja, a largura total será . Com isso, vemos que quanto maior o número de fendas, menor será a espessura das linhas. Uma das principais aplicações das redes de difração se dá no espectroscópio. Este aparelho é utilizado para determinar o comprimento de onda emitido por fontes luminosas através da medida do ângulo (figura 1-9). Figura 1.9 – Esquema de funcionamento de um espectrômetro. Fonte: < http://player.slideplayer.com.br/1/333696/data/images/img34.jpg >. Outra função importante do espectroscópio está relacionada à sua capacidade de separar linhas espectrais de comprimentos de onda muito próximos. Duas linhas do espectro podem ser vistas separadamente se seus máximos de difração não estiverem superpostos. Como vimos na figura 1-8, a largura dos máximos de difração estão associados ao número de fendas da rede, sendo assim, o poder separador , que é a capacidade de distinguir duas linhas de comprimentos de onda distintos, é definido por 1.5.2 onde é o número de ordem e a quantidade de fendas. 16 Exercício Uma lâmpada de vapor de sódio tem duas linhas amarelas intensas, com comprimentos de onda muito próximos, de e . Qual é a quantidade mínima de fendas para que essas linhas sejam vistas separadamente em primeira ordem? Resolução De acordo com o a equação 1.5.2 o número de fendas será Sendo assim, serão necessárias 1000 fendas para observar as linhas separadamente. Exercício Qual é o maior comprimento de onda que pode ser observado no espectro de quinta ordem usando uma rede de difração com 4.000 fendas por centímetro? Resolução Podemos empregar a equação 1.5.1 para encontrar a solução. Nesse caso, o maior comprimento de onda será obtido quando assumir seu valor máximo, 1. Além disso, a distância entre as fendas será . Sendo assim, 17 SÍNTESE Nesta aula, analisamos o comportamento das ondas eletromagnéticas nos fenômenos de interferência. Vimos como se dá difração da luz através de fendas dupla, simples e múltiplas fendas. Estudamos as imagens projetadas, calculamos a intensidade e a espessura da franja principal, além da posição dos mínimos de interferência. REFERÊNCIA PAUL, A. T. Física – Volume 2. 4. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000.
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