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recursos humanos a luz da psicanalise uma reflexao possivel

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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU 
MESTRADO PROFISSIONAL EM PSICANÁLISE, SAÚDE E SOCIEDADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lucia Conceição Santos de Almeida 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECURSOS HUMANOS À LUZ DA PSICANÁLISE – 
UMA REFLEXÃO POSSÍVEL. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2011 
 
 
 
Lucia Conceição Santos de Almeida 
 
 
 
Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade 
 
 
Área de Concentração: Psicanálise, Sociedade e Práticas Sociais 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECURSOS HUMANOS À LUZ DA PSICANÁLISE – 
UMA REFLEXÃO POSSÍVEL. 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada à Banca 
Examinadora do Mestrado Profissional 
em Psicanálise, Saúde e Sociedade da 
Universidade Veiga de Almeida, como 
requisito ao Título de Mestre em 
Psicanálise, Sociedade e Práticas 
Sociais. 
 
 
 
 
 
Orientadora: Profª Drª Maria Cristina C. Poli 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2011 
 
 
FOLHA DE APROVAÇÃO 
 
Lucia Conceição Santos de Almeida 
 
 
 
 
 
 
RECURSOS HUMANOS À LUZ DA PSICANÁLISE – 
UMA REFLEXÃO POSSÍVEL. 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada à Banca 
Examinadora do Mestrado Profissional 
em Psicanálise, Saúde e Sociedade da 
Universidade Veiga de Almeida, como 
requisito ao Título de Mestre em 
Psicanálise, Sociedade e Práticas 
Sociais. 
 
 
 
Aprovada em 25 de março de 2011. 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
_______________________________________________________ 
Profª. Drª. Maria Cristina C. Poli 
Universidade Veiga de Almeida – UVA 
 
_______________________________________________________ 
Profª. Drª. Maria Alice Ferruccio 
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ 
 
_______________________________________________________ 
Profª. Drª. Sonia Xavier de A. Borges 
Universidade Veiga de Almeida – UVA 
 
 
 
DIRETORIA DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU E DE 
PESQUISA 
Rua Ibituruna, 108 – Maracanã 
20271-020 – Rio de Janeiro – RJ 
Tel.: (21) 2574-8871 - (21) 2574-8922 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FICHA CATALOGRÁFICA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA 
 Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho 
 
 
 
 
 
A447 Almeida, Lucia Conceição Santos de 
 
 Recursos humanos á luz da psicanálise; uma reflexão possível / 
Lucia Conceição Santos de Almeida, 2011. 
 85f. ; 30 cm. 
 Digitado (original). 
 Dissertação (Mestrado) – Universidade Veiga de Almeida, 
 Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade, Rio de 
 Janeiro, 2011. 
 Orientação: Profª. Drª. Maria Cristina C. Poli. 
 
1. Psicanálise. 2. Recursos humanos I. Poli, Maria Cristina C. 
(orientador). II. Universidade Veiga de Almeida, Mestrado 
Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade. III. Título. 
 
CDD –150.195 
Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA 
 Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho ao meu marido Sergio: 
grande incentivador e parceiro das minhas 
aspirações e desafios. 
A minha filha Ana Beatriz: luz da minha alma, 
grande exemplo de superação e amor à vida. 
A meus pais: mestres na vida. 
À minha amada avó Rosa: exemplo e 
saudade eterna. 
Aos meus amigos na MSA: apoio nas horas 
mais difíceis. 
A minha orientadora: pela paciência e apoio 
para que eu pudesse entender que não estava 
só neste percurso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
A partir da análise das atribuições da área de Recursos 
Humanos, propomos promover um debate interdisciplinar num 
diálogo com a psicanálise, pois, embora os estudos sobre as 
organizações tenham trazido inúmeras contribuições auxiliando 
as empresas em sua busca por espaços de trabalho mais 
humanizados, não queremos deixar de problematizá-las, na 
medida em que elas podem produzir um modelo 
instrumentalizado e instrumentalizador com tal rigor pragmático 
e metodológico, que acabe inviabilizando a escuta do 
trabalhador de um outro lugar senão de agente de 
padronização a serviço dos objetivos da empresa. A 
Psicanálise, por sua vez, nos traz conceitos que não só 
possibilitam novas significações do significante trabalho, como 
também um novo sentido para o que aprisiona o sujeito em 
significações como sofrimento e alienação. 
Refletindo sobre as mudanças na sociedade, nos movimentos 
da administração e analisando as características emergentes 
das relações de trabalho como a intensa flexibilidade; visão de 
curto prazo; ênfase em valores como cooperação e confiança 
em contraponto com o estímulo ao individualismo e a 
competitividade; o gradual desaparecimento de carreiras 
estáveis e de vínculos profissionais duradouros, discorremos 
sobre a possibilidade do profissional de Recursos Humanos 
poder ocupar um lugar de escuta fora do modelo de 
instrumentalização da subjetividade do trabalhador, utilizando a 
ótica da Psicanálise e seus referenciais teóricos. 
 
Palavras-chave: Psicanálise, Cultura, Recursos Humanos, 
Trabalho. 
 
 
 
ABSTRACT 
 
Analyzing the attributions of the Human Resources area, we 
proposed an interdisciplinary approach to promote a dialogue 
with psychoanalysis. Although studies on organizations have 
brought many contributions assisting companies in their 
challenges for more humane working spaces, we considered 
important to have another view of them, understanding that they 
can produce an instrumented model with such rigor and 
pragmatic methodology, which can cause a lack of listening of 
the worker and perform as an agent of standardization in the 
service of corporate objectives. Psychoanalysis, in turn, brings 
us not only concepts that allow new meanings of work 
significant, but also a new meaning for that imprisons the 
workers in significations such as suffering and alienation. 
Reflecting on the changes in society, in the movements of the 
administration and analyzing the characteristics of the emerging 
labor relations: intense flexibility, short-term vision, emphasis on 
values such as cooperation and trust as opposed to the 
encouragement of individualism and competitiveness, and the 
gradual disappearance of career stable and lasting professional 
ties, we discussed the possibility of a professional from Human 
Resources can occupy a place of listening outside the model of 
instrumentalization of the worker subjectivity, using the lens of 
psychoanalysis and its theoretical frameworks. 
 
 
 
Keywords: Psychoanalysis, Culture, Human Resources, Labor. 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................... .. 08 
 
2. O CONTEXTO SOCIAL DO TRABALHO ............................................ .. 15 
 
3. CONTEXTO DA ADMINISTRAÇÃO DO TRABALHO ......................... .. 32 
 
4. RECURSOS HUMANOS À LUZ DA PSICANÁLISE ............................. 43 
 
4.1. Psicanálise e RH – interlocuções possíveis .............................. 57 
4.2. France Telecom – um caso .......................................................... 66 
 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................71 
 
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁGICAS ........................................................ 82 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 8
1. INTRODUÇÃO 
 
Nestes últimos 20 anos, temos atuado na área de Recursos Humanos (RH) 
dentro de empresas dos mais diferentes segmentos de mercado, nos levando a 
entender que a sua função essencial é atender aos objetivos estratégicos da 
empresa no que se refere aos processos e instrumentos aplicados à Gestão de 
RH, tendo como resultado esperado maior incremento e manutenção da 
performance do trabalhador, garantindo assim a sobrevivência da empresa 
através das pessoas. 
 
Para alcançar esses objetivos, os teóricos da Gestão de RH compartimentaram 
sua atuação para que possam potencializar todos os pontos de contato com o 
trabalhador, desde a captação dos profissionais até os programas sociais, 
estabelecendo identificações positivas que reforcem comportamentos de alta 
performance. 
 
No sentido de uma melhor compreensão da atuação dos profissionais de 
Recursos Humanos nas empresas e, posteriormente, como a psicanálise pode 
contribuir com seus referenciais teóricos a esta área, descrevemos na Figura1, 
quais os principais pontos deste contato com o trabalhador, denominados de 
subsistemas de RH, que permeiam as práticas de RH. 
 
 
 
 
 
 
 
 
GESTÃO DE 
RECURSOS HUMANOS
 
 
RECRUTAMENTO 
& 
SELEÇÃO 
 
ALOCAÇÃO 
E 
AVALIAÇÃO DE 
DESEMPENHO 
 
REMUNERAÇÃO 
 
TREINAMENTO 
E 
DESENVOLVIMENTO 
 
RELACIONAMENTO 
INSTITUCIONAL 
 
SISTEMAS 
DE 
INFORMAÇÃO 
Figura1. Adaptado de (CHIAVENATO, 1999, p. 12) 
 
O primeiro deles é o subsistema voltado para agregar pessoas e tem como base 
o recrutamento e seleção de profissionais para as mais diversas funções dentro 
das empresas. Para tanto, utilizam-se técnicas de avaliação que pretendem tornar 
possível a verificação da adequação do candidato à função em aberto, sendo a 
 
 9
principal delas a entrevista individual. Porém outras técnicas também são 
utilizadas, como dinâmicas de grupo, testes comportamentais ou psicológicos, 
entrevistas em grupo e situacionais, entre outras. 
 
O segundo é aplicar pessoas, tendo como objetivo entender como cada elo da 
cadeia produtiva está dividido e como cada função precisa ser definida para 
garantir os resultados esperados. Neste subsistema também está inserida a 
avaliação de desempenho, que mede os resultados esperados versus os 
resultados obtidos e recompensa os trabalhadores por eles. Tanto no 
levantamento de cargos quanto na avaliação de desempenho o trabalhador tem a 
oportunidade de dizer o que faz, como faz sua atividade e as dificuldades que 
encontra para alcançar os resultados definidos. 
 
O terceiro é recompensar pessoas e trata-se da composição da definição e 
manutenção da remuneração do trabalhador, entendendo remuneração o salário 
e demais benefícios oferecidos pela empresa, como: previdência privada, plano 
de saúde e odontológico, participação nos resultados. Dentro deste subsistema 
também está incluída a pesquisa de remuneração que avalia junto ao mercado o 
quanto atrativa é a empresa para buscar novos profissionais e manter seus 
potenciais nos seus quadros. 
 
O quarto é desenvolver pessoas, sendo seu objetivo treinar e desenvolver os 
trabalhadores para suas funções, para desafios futuros e para as mudanças que 
surgem ao longo da história da empresa, como certificações, fusões e sucessões. 
Esta é uma atuação importante do RH, pois em geral se baseia em 
levantamentos das necessidades e expectativas pessoais e organizacionais, que 
possam ser atendidas essencialmente através do conhecimento. Nesta função a 
ação de comunicação é essencial para divulgar, sensibilizar e manter todos os 
envolvidos no mesmo foco. 
 
O quinto é manter pessoas. Este é o subsistema que trata da aderência do 
trabalhador junto à empresa, ou seja, o estilo de gestão, os programas de 
 
 10
reconhecimento, os programas de sugestões, os códigos de conduta e valores 
institucionais, os programas de qualidade de vida, as relações sindicais. 
 
E o último é monitorar pessoas através de um sistema de informações sobre os 
trabalhadores, que sustentam as decisões de gestão quanto às demissões, 
admissões, mudanças de estrutura, entre outros indicadores para a melhoria do 
desempenho individual ou coletivo. 
 
Analisados, mesmo que superficialmente, os subsistemas de RH, verificamos 
uma configuração de conceitos e práticas que apontam para uma possibilidade de 
incremento da performance do trabalhador e do aumento de satisfação no 
trabalho. Porém, ao longo do nosso percurso profissional, acompanhando os 
trabalhadores dentro da empresas, o que pudemos perceber é um distanciamento 
entre os resultados esperados dessas ações e o que se traduz em realidade. 
 
Esta percepção pôde ser captada a cada aplicação dos subsistemas acima 
referidos. Tomamos por exemplo, os processos de recrutamento e seleção, que 
são utilizados para seleção novos colaboradores na empresa. As tecnologias 
atuais de avaliação de seleção nos sugerem métodos quantitativos a fim de 
reduzir a subjetividade do recrutador. Porém, a avaliação de um candidato é 
composta de outros aspectos, como a adequação à cultura da empresa, aos 
futuros desafios profissionais, histórico familiar, entre outros que surgem de uma 
abordagem menos matemática do candidato. Sendo assim, se aquilo que 
diferencia em candidato de outro candidato é a sua singularidade, perguntamos 
como não escutá-lo para além do dado objetivo de seu percurso profissional. 
 
Em muitas entrevistas individuais e dinâmicas de grupo por nós realizadas, 
pudemos registrar algumas falas de candidatos, como: “existe vida após o 
trabalho”; “é importante separar a vida profissional da pessoal”; “precisamos ter 
um tempo depois do trabalho para se fazer aquilo que se gosta”. 
 
Pensando nestas falas extraídas do contexto de avaliação e exposição 
profissional do candidato sobre suas expectativas pessoais e profissionais, nos 
 
 11
questionamos, sem ainda aprofundar este assunto no momento, sobre as 
conseqüências da não escuta do que o candidato trás como significantes em 
relação ao trabalho e em relação a outros significantes como família e escolhas 
pessoais. 
 
Nas avaliações de desempenho, muito embora encontremos técnicas bastante 
convincentes de que o trabalhador está sendo avaliado em sua integralidade, 
percebemos que questões complexas, que a princípio poderiam ser ouvidas como 
um processo de identificação com o líder que requer outro endereçamento, 
podem estar causando uma redução nos resultados esperados e que não há 
quantificação que aponte para esta questão. 
 
Outra experiência importante em nossa atuação é o treinamento e 
desenvolvimento de profissionais. Este trabalho tem por objetivo a indicação de 
treinamentos que possam desenvolver as potencialidades do trabalhador nas 
suas atividades atuais e futuras. 
 
O mapeamento dos treinamentos é feito através de alguns indicadores 
importantes de gestão: 
1) Mapeamento de competências; 
2) Avaliação de desempenho; 
3) Mudanças estratégicas; 
4) Diagnósticos de cultura, clima, gestão, entre outros; 
5) Novas contratações ou progressões. 
 
Encontramos, em algumas empresas, situações onde os trabalhadores não são 
consultados quanto aos treinamentos que irão realizar e quando o são, (através 
de formulários ou em raros momentos em entrevistas) percebe-se que a visão da 
empresa sobre a capacitação e desenvolvimento daquele trabalhador está, 
muitas vezes, dissonante com a sua necessidade ou desejo. 
 
Comoexemplo, podemos mencionar alguns treinamentos, por nós ministrados, 
que atendem alguns itens de capacitação, e nos defrontamos por vezes com 
 
 12
profissionais que não sabem o que estão fazendo naquele evento, o que se 
espera dele, ou mesmo o que ele espera de seu futuro a partir das informações 
que estão sendo repassadas e do qual a empresa espera uma resposta. 
 
O trabalho que acreditamos ser uma das maiores fontes de inspiração para este 
trabalho é o diagnóstico de gestão. 
 
Ele tem por método entrevistas abertas e diretivas com os envolvidos, 
investigando primeiramente as expectativas do solicitante sobre o diagnóstico a 
ser realizado, a quem se destina e o contrato de confidencialidade. Com este 
trabalho realizamos um levantamento da história organizacional; situações 
importantes vividas pelos envolvidos no diagnóstico (tanto positivas como 
negativas); emoções ligadas a esses fatos; metáforas trazidas pelo entrevistado 
ou sugerida a partir de seu discurso e ao final a conciliação de demandas: 
empresa e gestor. Todo este levantamento gera um Relatório Final identificando 
oportunidades de reflexão e ações sobre as questões levantadas. 
 
Trazemos ainda, outra experiência que reforça nosso desejo de avançar em 
nossa atuação utilizando a psicanálise como referencial teórico: a assessoria a 
empresas que estão em processo de adequação de suas estruturas para receber 
pessoas com diferentes modalidades de deficiências. 
 
O trabalho é constituído de avaliação da cultura organizacional verificando 
impasses e valores restritivos ou flexíveis para aceitação da diferença, 
mobilização e sensibilização através de palestras e depoimentos, avaliação dos 
postos de trabalho para adequação de espaços e de instrumentos de trabalho. 
 
A questão central do trabalho de inserção de pessoas com deficiência está na 
possibilidade de aceitação por parte dos trabalhadores das diferenças, seja ela 
pela via aparente da deficiência física, seja pela via da singularidade como tratada 
na psicanálise. Neste embate entre o princípio da normalidade e o princípio da 
singularidade, há em causa um desconforto no confronto com o desconhecido. 
 
 
 13
Foi atuando, principalmente nos processos acima referidos, ouvindo as empresas, 
na figura de seus gestores, e ouvindo os trabalhadores; que consideramos uma 
pergunta recorrente: que relevância há neste ouvir que nos impele a contribuir 
para a melhoria das relações entre a organização e o trabalhador. 
 
Ao escutar os trabalhadores sobre suas questões profissionais e também aquelas 
de cunho mais pessoal, percebe-se que a função de escuta, nos processos de 
seleção, avaliação de desempenho, treinamento e outros subsistemas que nos 
confrontam com a fala do trabalhador, fica à deriva, não havendo porto seguro 
que a acolha dentro das organizações, no sentido de uma prática habitual dos 
profissionais que se dizem agentes da melhoria das relações humanas no 
trabalho. 
 
Nas possibilidades que se apresentam, dentro dos subsistemas de RH, temos 
atuado nesta função faltosa apoiando-nos na escuta dos trabalhadores para além 
dos dados quantitativos esperados, e traduzindo essas falas em ações concretas 
de melhoria de processos e relações de trabalho. 
 
Enfim, influenciados pela teoria psicanalítica em função de nossa atuação clínica 
e nos surpreendendo, muitas vezes, escutando o trabalhador para além do que 
seria próprio de nossa atuação como profissional de RH, nos propusemos a 
mergulhar na questão da escuta analítica nos subsistemas de recursos humanos, 
onde estão inseridos os processos de Recrutamento e Seleção, Avaliações 
Diagnósticas e Treinamento, acreditando que poderemos nos apropriar dos 
referenciais da psicanálise para instrumentalizar os profissionais de RH a serem 
melhores ouvintes de seus clientes internos. 
 
Numa das defesas de dissertação que assistimos, fomos surpreendidos com o 
tema a respeito do trabalho institucional com coveiros; recortamos uma fala que 
nos colocou em alerta sobre o nosso dilema dentro das organizações “onde existe 
sujeito de um sofrimento comum ali está a psicanálise como possibilidade de 
escuta e endereçamento para a cura”. 
 
 
 14
Impregnado pela instituição e suas formas de alienação, o sujeito fala na busca 
de um sentido. Mas fala em um espaço não próprio para a atuação de um 
psicanalista, pois, a princípio, não haveria espaço para tal nas organizações. 
 
Ele fala a um profissional que de alguma forma tem uma posição privilegiada de 
escuta, que codifica sua demanda e endereça-a a outro espaço. Mas esse 
endereçamento, esta primeira escuta, já não seria uma escuta preliminar em 
psicanálise? Não seria a demanda do trabalhador envolta de metáforas laborais 
para dar conta de suas questões mais subjetivas? 
 
Assim, esta dissertação se utiliza da pesquisa bibliográfica de artigos acadêmicos, 
aulas e palestras pertinentes ao tema, assim como de nossa experiência 
profissional, tendo um estudo de caso para ilustrar nossa hipótese. 
. 
 Iniciamos nossa trajetória de pesquisa, percorrendo os movimentos da produção 
industrial e os impactos sociais e políticos que influenciam as relações de trabalho 
até os dias de hoje, tendo como foco principal a problematização da atuação de 
Recursos Humanos, como possibilidade de ocupar um lugar de escuta fora do 
modelo de instrumentalização da subjetividade do trabalhador. 
 
Nos propomos em adição, promover um debate interdisciplinar num diálogo com 
a psicanálise, pois, embora a Psicologia Organizacional tenha trazido inúmeras 
contribuições para a atuação da área de Recursos Humanos, e auxiliando as 
empresas em sua busca por espaços de trabalho mais humanizados, não 
queremos deixar de problematizá-la, na medida em que ela pode produzir um 
modelo instrumentalizado e instrumentalizador com tal rigor pragmático e 
metodológico, que acabe inviabilizando a escuta do trabalhador de um outro lugar 
senão o de agente de padronização a serviço dos objetivos da empresa. 
 
Finalizando propomos a realização de um Seminário aos profissionais de RH, 
tendo como objetivo, ressaltar a escuta do trabalhador, como forma de qualificar 
nossa atuação e gerar resultados mais efetivos ao nosso trabalho. 
 
 
 15
2. O CONTEXTO SOCIAL DO TRABALHO 
 
Entendendo que as forças sociais estão intrinsecamente ligadas às 
transformações do processo laboral e, conseqüentemente, a uma mudança 
subjetiva da organização do trabalho, escolhemos três sociólogos que descrevem 
a modernidade e seus impactos nas relações de trabalho e as mudanças em suas 
representações. São eles: Anthony Giddens (1991), Richard Sennett (1999) e 
Zigmundt Bauman (2001). 
 
Iniciamos assim com uma questão, aparentemente simples, porém desafiadora, 
sobre o que é, afinal, a modernidade. Anthony Giddens (1991), em seu livro “As 
conseqüências da Modernidade” descreve a modernidade em referência ao estilo, 
costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do 
século XVII, tendo uma repercussão mundial. 
 
Sua característica fundamental é o desatar de todos os nós tradicionais da ordem 
social, tanto na sua extensionalidade estabelecendo formas de interconexão 
social que são globais quanto na sua intencionalidade alterando características 
pessoais de nossa existência. 
 
Como resultado mais específico, essa transformação social penetra nas 
organizações e altera a forma de produção e relações de trabalho. Dentro desta 
lógica, o desenvolvimento das organizações mundiais modernas criou mais 
oportunidades para os seres humanos gozarem de uma existência segura e 
gratificante.Porém, tanto Marx como Durkheim e Weber (apud GIDDENS, 1991, p.20) 
observavam a era moderna como fonte de fortes turbulências, sendo cada um 
mais ou menos otimista diante das mudanças e das perspectivas de alteração 
social. 
 
Marx via a luta de classes como fonte de dissidências na ordem capitalista, mas 
via ao mesmo tempo a emergência de um sistema social mais humano. Durkheim 
 
 16
acreditava na expansão para além do industrialismo estabelecendo uma vida 
social harmoniosa e gratificante, integrada através de uma combinação da divisão 
do trabalho e do individualismo moral. Já Weber (apud GIDDENS, 1991, p.21) era 
mais pessimista, vendo o mundo moderno como paradoxal onde o progresso 
material era obtido apenas à custa de uma expansão da burocracia que 
esmagava a criatividade e a autonomia individuais. 
 
“..., todos os três autores viram que o trabalho industrial moderno tinha 
conseqüências degradantes, submetendo muito seres humanos à 
disciplina de um labor maçante e repetitivo.” (GIDDENS, 1991, p.17) 
 
Para autores influenciados por Marx (apud GIDDENS, 1991, p.23), a força 
transformadora principal que modela o mundo moderno é o capitalismo. Neste, 
não só uma variedade de bens materiais, mas também a força de trabalho 
tornam-se mercadoria. 
 
A era moderna está intimamente ligada à transformação do tempo e do espaço, 
fomentando relações entre ausentes, localmente distante. “Em condições de 
modernidade, o lugar se torna cada vez mais fantasmagórico” (GIDDENS, 1991, 
p.27). Podemos perceber esta mudança através das transações virtuais 
financeiras com fusos horários díspares e relacionamentos cultivados à distância. 
 
Giddens nos leva a pensar também a questão do dinheiro como mais um dos 
mecanismos de afastamento simbólico da pura mercadoria. O dinheiro pode ser 
qualquer coisa em qualquer lugar. Entendendo assim “dinheiro”, como um 
significante cultural, que vai além de seu uso, mas desencadeia uma percepção 
de que uma ação deverá ter uma reação que está diretamente ligada a sua 
recompensa. 
 
Assim, a lógica estabelecida entre trabalho e recompensas estabelece uma 
certeza: de que se os sistemas sociais funcionam como se espera que o façam, 
que existem padrões e regras a serem cumpridos e que nada poderá alterar o 
curso desta relação. Esta certeza, porém, tem por base uma atitude de alienação, 
 
 17
onde se perde algo em benefício da segurança da coletividade, e de confiança de 
que não haverá ruptura nestes sistemas sociais, negligenciando por vezes as 
contingências da vida. Assim, nos resta ou vivermos alienados ou em um estado 
de incertezas onde não há garantias de atendimento as nossas necessidades de 
existência. 
 
Para Giddens (1991), o que é característico da modernidade não é uma adoção 
do novo por si só, mas a suposição de uma reflexividade, desdobrando a reflexão 
sobre a própria natureza da reflexão. Assim, não estamos seguros, como em 
outras eras, onde verdades eram estabelecidas e as relações eram dogmáticas. 
O que conhecemos hoje talvez possa ser refutado amanhã. Estamos vivendo no 
campo do devir e, assim, no campo da angústia, onde não podemos estar 
seguros do conhecimento que nos é dado. 
 
Pressupõe ainda um cenário de alta tecnologia, que não tão somente alteram as 
formas de produção, mas toda a sociedade (transportes, vida doméstica, relações 
sociais, internet, etc.). A natureza fortemente competitiva e expansionista do 
empreendimento capitalista implica que a inovação tecnológica tende a ser difusa, 
mas constante. 
 
O sistema administrativo do estado capitalista, e dos estados modernos em geral, 
tem que ser interpretado em termos de controle coordenado, onde nenhum outro 
estado pré-moderno conseguiu se aproximar do nível de coordenação 
administrativa da modernidade. Isto implica em um desenvolvimento de condições 
de vigilância, que, como o capitalismo e o industrialismo, ascendem da 
modernidade. Com isso, a supervisão é inserida como uma ferramenta de 
controle, como descrito por Foucault (apud GIDDENS, 1991, p.47) – prisões, 
escolas, locais de trabalho, mas caracteristicamente baseada no controle da 
informação. 
 
Cabe aqui esclarecer que para Giddens o capitalismo e o industrialismo são 
entendidos da seguinte forma: 
 
 
 18
“O capitalismo é um sistema de produção de mercadorias centrado na 
relação entre a propriedade privada do capital e o trabalho assalariado sem 
posse de propriedade, esta relação formando o eixo principal de um 
sistema de classes. O empreendimento capitalista depende da produção 
para mercados competitivos...” (GIDDENS, 1991, p.61) 
 
“A característica principal do industrialismo é o uso de fontes inanimadas 
de energia material na produção de bens, combinado ao papel central da 
maquinaria no processo de produção.” (GIDDENS, 1991, p.61) 
 
“O industrialismo pressupõe a organização social regularizada da produção, 
no sentido de coordenar a atividade humana, as máquinas e as aplicações 
e produções de matéria-prima e bens”. (GIDDENS, 1991, p.62) 
 
A emergência do capitalismo, como diz Marx (apud GIDDENS, 1991, p.67), 
precedeu ao desenvolvimento do industrialismo e na verdade forneceu o ímpeto 
para sua emergência. A produção industrial e a constante revolução na tecnologia, 
a ela associada, contribuem para processos de produção mais eficientes e 
baratos. 
 
A transformação em mercadoria da força de trabalho foi um ponto de ligação 
particularmente importante entre o capitalismo e o industrialismo, porque o 
“trabalho abstrato” pode ser diretamente programado no projeto tecnológico de 
produção. O contrato de trabalho capitalista envolve a contratação de trabalho 
abstrato, ao invés de servidão da “pessoa inteira” (escravidão) – daí a mão-de-
obra; uma proporção da semana de trabalho, ou do produto. 
 
A globalização está intrinsecamente ligada à idéia de modernidade, dentro do 
conceito de tempo e espaço, com conexões presença/ausência. Ela se refere 
essencialmente a este processo de alongamento mundial do tempo e espaço. 
Este é um processo dialético, onde as conseqüências não caminham em uma 
mesma direção. 
 
 
 19
Muitas empresas multinacionais podem imprimir, pelo seu imenso poder 
econômico, mudanças culturais nas regiões em que se instalam, visto que muitas 
vezes têm orçamentos maiores do que as nações em que se estabelecem. 
Se por um lado temos os estados-nação como principais atores dentro da ordem 
pública, as empresas são agentes dominantes dentro da economia mundial. 
Porém em suas relações comerciais entre si, com estados e consumidores, as 
empresas têm como principal objetivo, e dependência, o lucro. 
 
O desenvolvimento industrial teve como aspecto mais óbvio, a expansão global 
do trabalho, não apenas no que diz respeito à especialização da indústria, mas 
também à difusão mundial de tecnologias de máquinas, afetando a vida cotidiana, 
influenciando o caráter genérico da interação humana com o meio ambiente 
material. 
 
A difusão do industrialismo criou um mundo ameaçador, com mudanças 
ecológicas reais que afetam todo o planeta, porém também transformou as 
tecnologias de comunicação nos colocando nesta referência de mundo. No 
mundo moderno, o futuro está sempre em aberto, não somente em termos da 
contingência comum das coisas, mas em termos da reflexividade do 
conhecimento em relação aos quais as práticas sociais são organizadas. 
 
Nos momentos de crise, o verdadeiro repositório de confiança está no sistema 
abstrato, na idealização, e não nos indivíduos que o representam. Porém os 
pontos de acesso a estes sistemas abstratos trazem lembretes deque são 
operadores de carne e osso, por isso mesmo falível, como ouvidorias, gestores, 
profissionais de RH, centrais de atendimento, etc.. Giddens toma como exemplo o 
ar descontraído da tripulação de um avião que surte mais efeito do que as 
estatísticas sobre as quedas de avião. 
 
Por isso o compromisso com o “rosto”, no sentido do contato visual com o outro, 
mantém a sensação de confiança, mais do que os códigos de ética envolvidos 
nas diversas profissões. Podemos nos lembrar a célebre frase de César sobre 
 
 20
sua mulher Pompéia, mesmo sabendo de sua inocência: “À mulher de César não 
basta ser honesta, tem que parecer honesta.” 
 
Essas características de segurança são encontradas na primeira infância, quando 
recebemos uma dose básica de confiança que elimina ou neutraliza as 
suscetibilidades existenciais. A confiança aqui referida não implica somente em 
contar com a uniformidade e continuidade dos provedores externos, mas também 
que na possibilidade de confiar em si mesmo. Assim a previsibilidade das rotinas 
sem importância da vida cotidiana está profundamente envolvida com um 
sentimento de segurança psicológica, e quando alteradas a ansiedade transborda. 
 
Podemos evidenciar esta ansiedade nos processos de mudanças organizacionais, 
quando são inseridos novos padrões de trabalho ou nos movimentos da 
economia, que tem como conseqüência reestruturações não só verticais como 
horizontais. Aquilo que se entendia como certeza de atendimento de expectativas, 
a organização, se traduz como também submetido a incertezas, seja pela via das 
demandas diferenciadas do mercado, seja pelo desenvolvimento tecnológico. 
 
De forma mais intensa, observamos este fenômeno nos processos demissionais, 
tanto para aqueles que são desmobilizados quanto para os que permanecem na 
organização, visto que há uma identificação direta destes últimos com os 
primeiros, ou seja, “se aconteceu com o outro pode acontecer comigo”. 
 
Neste momento, onde não há certezas de respostas adequadas às necessidades 
do trabalhador, vem à tona a fragilidade desta confiança básica, inaugural da 
primeira infância. Uma intervenção mínima de escuta, por parte dos profissionais 
de Recursos Humanos, nos parece que traria resultados de, no mínimo, amparo e 
acolhimento deste trabalhador, apontando para uma visão mais reflexiva do 
trabalho e do seu papel dentro deste contexto. Além disso, trazer uma outra 
perspectiva sobre o trabalho e suas relações, tendo em vista que a rotina não é 
parte estrutural de nossa vida e sim as contingências. “só temos uma certeza: que 
tudo muda”. 
 
 
 21
Enfim, a rotina exige uma vigilância constante e um refazer contratual, entre 
indivíduos, também constante, de forma que, caso o contrato seja quebrado, o 
transbordamento inevitável de sentimentos como mágoa, perplexidade e traição, 
junto com suspeita e hostilidade, seja amenizado. 
 
A segurança da rotina e a confiança em sistemas abstratos se colocam como 
substitutos da relação que já não mais se estabelece na vida cotidiana, visto que 
a vida privada reduziu suas referências estáveis e a vida pública as acrescentou 
em suas relações. Para Horkheimer, no capitalismo organizado “a iniciativa 
pessoal desempenha um papel sempre menor em comparação aos planos 
daqueles com autoridade”. (apud GIDDENS, 1991, p.118) 
 
Nesta transição a honra é substituída pela lealdade, tendo como apoio o afeto 
pessoal e a sinceridade é substituída pela autenticidade, uma exigência de ser 
aberto e bem intencionado. 
 
Considerando este cenário, Richard Sennett (1999), em seu livro “A corrosão do 
caráter”, indica que o novo capitalismo é marcado pelo mercado global e o uso 
maciço de novas tecnologias que tornam a vida mais dinâmica obrigando as 
pessoas a se prepararem para freqüentes mudanças, incluindo trocas de 
emprego. 
 
A nova forma do capitalismo também se caracteriza pela quebra de tabus antigos 
- podemos citar o maior número de mulheres que passam a trabalhar, algumas 
até mesmo com a responsabilidade de sustento do lar. 
 
Porém, o capitalismo atual trouxe também efeitos indesejados, como o medo de 
perder o controle sobre a própria vida, pois o mercado cada vez mais é motivado 
pelo consumidor, e, para manter sua competitividade e produtividade, as 
empresas, e, conseqüentemente, seus trabalhadores, se tornam em maior grau 
subservientes aos horários dos clientes. 
 
 
 22
O medo da perda de controle está intrinsecamente referido ao controle de tempo. 
Tendemos a operar com horários mais flexíveis reinventando o ciclo circadiano 
trazendo em decorrência a secundarização da vida emocional e declínio das 
carreiras tradicionais. O mundo se tornou mais dinâmico e as mudanças de 
emprego, ou mesmo de carreira durante a vida se tornam cada vez mais comuns. 
O mercado se torna mutável como nunca antes visto, passando cada vez mais a 
se pensar no curto prazo. 
 
Segundo Sennett (1999), as empresas se caracterizam pela "força dos laços 
fracos", o emprego passa a ser utilitário e sem vínculo, há uma falta de 
perspectiva de compromisso duradouro com a empresa gerando assim uma certa 
falta de lealdade institucional. Os trabalhadores tendem a ficar "negociáveis" 
assim que descobrem que não podem contar com a empresa. Enfim, o mundo 
anterior ao "novo capitalismo" era mais burocrático, previsível. O atual tem a 
marca da flexibilidade e do dinamismo, das relações líquidas. 
 
Dois filósofos contemporâneos, no século XVIII, Denis Diderot (apud BORGES, 
2008), francês, e Adam Smith (apud BORGES, 2008), escocês, tinham posições 
diferentes sobre a rotina no trabalho. Diderot considerava que a rotina laboral não 
era degradante, ao contrário, era igual a qualquer outra forma de aprendizado, 
indo além afirmando que a rotina estava em constante evolução, pois repetindo 
uma tarefa haveria a possibilidade de se descobrir como reduzir seus tempos ou 
criar novos procedimentos. Um modelo similar de estudo de uma determinada 
tarefa é reinstaurada nos anos 80, pelo modelo japonês de melhoria contínua, 
chamado kaisen (termo japonês que indica que é sempre possível se fazer 
melhor). 
 
Já Adam Smith via a rotina de forma negativa, algo degradante, fonte de 
ignorância mental por falta de conhecimento de como fazer a mudança. A rotina, 
portanto se tornava autodestrutiva porque os trabalhadores perdiam o controle 
sobre seus próprios esforços. 
 
 
 23
No capitalismo atual, a rotina é de outra ordem, não mais das certezas de 
realização de uma tarefa de forma repetida ou da manutenção de 
relacionamentos duradouros. Passa a dar lugar à falta de segurança no emprego, 
do futuro incerto, da costumeira reavaliação da carreira, e essa "rotina dinâmica" 
é tão ou mais destrutiva quanto a rotina sob o ponto de vista de Smith (apud 
BORGES, 2008). 
 
Para minimizar os impactos desta nova demanda de dinamismo e enfrentamento 
de incertezas, as organizações se tornaram mais flexíveis a partir do 
remodelamento de sua gestão. Antenadas às demandas do mercado, as 
organizações se reinventam de forma descontínua, mobilizando e desmobilizando 
recursos a cada novo desafio. 
 
Outro fato importante é a especialização flexível da produção sendo um sistema 
de inovação permanente. A finalidade é inserir no mercado, cada vez mais rápido, 
produtos variados, sendo uma forma de adaptação à mudança permanente e não 
uma forma de controlar essa mudança. 
 
Para implantar esta modalidade de gestão é necessário que as decisões sejam 
tomadas de forma rápida, com suporte de alta tecnologia, rapidez nas 
comunicações e fundamentalmente ter disposição de deixarque as demandas de 
mercado externo determinem a estrutura da empresa, que obviamente poderá ser 
mutante, ao sabor do mercado. 
 
A concentração de poder sem centralização é uma técnica moderna de dar 
liberdade, mas ao mesmo tempo manter o controle. Esta é uma técnica muito 
utilizada para grupos de trabalhos, empresas com filiais, prestadores de serviço 
ou agências. 
 
Na maioria dos casos é imposta uma meta a ser atingida e é dada liberdade para 
o grupo atingir essa meta da forma que achar mais conveniente. Geralmente 
essas metas estão além do que normalmente seria alcançável e o controle se dá 
através de planilhas ou mapas de acompanhamento. Essa é uma forma de dar 
 
 24
mais controle às pessoas sobre as suas atividades diminuindo a burocracia e 
envolvendo o trabalhador no negócio da empresa. 
 
Na verdade, esses sistemas de informação oferecendo total controle sobre os 
atos "independentes" do grupo é uma nova forma de poder aparentemente 
libertador, mas na realidade desigual, pois aumenta o poder da alta administração 
de forma dissimulada tornando o trabalhador único responsável pelo seu êxito ou 
fracasso. 
 
O trabalho se torna ilegível no capitalismo flexível porque há perda da 
identificação entre o ato e o ator do trabalho. O trabalho passa a ser frio, 
mecânico, asséptico. A alienação e a indiferença, no que se refere ao produto do 
trabalho, se instauram e o trabalhador não tem mais o domínio do processo, não 
sabe mais o seu ofício original, ou seu valor no processo produtivo, o que 
acarreta em identificação fluida com o trabalho. Outro aspecto observado quando 
o trabalhador se torna alienado do trabalho é a falta de vínculos dentro do grupo. 
 
Uma nova ética do trabalho se estabelece no trabalho em equipe, onde se 
destaca a capacidade de ouvir e de se adaptar as diversas circunstâncias 
exigidas no ambiente interno e externo, sendo necessário maior cooperativismo. 
Porém, o que poderia ser um catalisador para um retorno aos vínculos mais 
densos, se traduz na evitação desses vínculos, onde os grupos tendem a manter-
se juntos na superfície das coisas. "O trabalho em equipe deixa o reino da 
tragédia para encenar as relações humanas como uma farsa". (SENNETT, 1991, 
p.91) 
 
Outro ponto deste momento na ordem do trabalho é que o fracasso não é mais a 
perspectiva apenas dos pobres ou desprivilegiados, tornou-se mais conhecido 
como um fato regular na vida da classe média. 
 
Sennett discorre sobre sua experiência com alguns profissionais da IBM que 
acreditavam que suas carreiras seriam quase que vitalícias, mas depois de 
demitidos descobriram no próprio fracasso certa revelação sobre suas vidas. 
 
 25
Este é um mito importante nas relações de trabalho: que o vinculo de trabalho é 
para sempre. Não há uma visão transitória de relação, por isso tanta mágoa 
envolvida nas demissões. A empresa se apropria não só do trabalhador como do 
seu desejo e quando a relação utilitária já não é mais produtiva, o vínculo se 
rompe e se rompe o mito, despedaçando o trabalhador em sua existência. 
 
A IBM era administrada por Thomas Watson Sr., que administrava de forma 
feudal e dirigida como um exército. Como as relações feudais, os empregos são 
vitalícios para a maioria dos trabalhadores e uma espécie de contrato social entre 
administração e mão-de-obra. 
 
Em 1956, Thomas Watson Jr, assumiu o lugar do pai, implantando uma 
administração com maior delegação e escuta dos trabalhadores, proporcionando 
maiores benefícios. Após 1980 houve grandes perdas para o mercado da IBM, 
Thomas Watson Jr. se aposentou, entrando outros presidentes em seu lugar. 
 
Em 1993, a IBM procurou substituir as rígidas estruturas hierárquicas por formas 
mais flexíveis de organização, e com uma produção flexível orientada para maior 
diversidade de produtos no mercado com maior rapidez. A estabilidade dos 400 
mil trabalhadores mudou dentro desta nova realidade acarretando demissões em 
grande escala. 
 
Depois de algum tempo os trabalhadores que foram demitidos sentavam-se em 
um café em Nova York para discutir o fracasso em suas carreiras. Quando 
Sennett (1991) se junta a eles, no começo todos se achavam vítimas passivas da 
empresa, mas depois mudam o foco para seu próprio comportamento. Esses 
trabalhadores acreditavam que tinham sido traídos pela IBM e que a lealdade à 
empresa havia morrido. 
 
Como uma das formas de se tornar competitiva, reduzindo em especial os custos 
com trabalhadores, a IBM passou a contratar mão-de-obra indiana, onde pagava 
muito menos do que aos americanos. Esses mesmos homens que se juntavam 
num bar, ressentidos de suas demissões, reconheceram a qualidade de trabalho 
 
 26
que vinha da Índia e passaram a pensar no que deveriam ter feito antes de suas 
carreiras chegarem ao ponto que chegara. 
 
O tema, porém, das discussões ainda era mais o fracasso e a falta de controle 
sobre as suas vidas. Eles julgavam que estiveram errados em não se qualificar e 
acreditavam que deveriam ter corrido mais riscos. Sennett (1991) percebeu que 
aos poucos os programadores estavam tentando enfrentar a realidade do 
fracasso e de seus próprios limites. Para eles o que importava não era mais o que 
aconteceu, mas o que eles deveriam ter feito há alguns anos: ter tomado suas 
vidas em suas mãos e se responsabilizarem por elas. Após algum tempo a 
percepção quanto ao ocorrido na IBM tornou-se mais realista. 
 
O regime flexível talvez pareça gerar uma estrutura de caráter constantemente 
em recuperação. Exige-se um senso maior de comunidade, e um senso mais 
pleno de caráter, do crescente número de pessoas que, no capitalismo moderno, 
estão condenados a fracassar. Cabe aqui destacar a definição de caráter para 
Sennett: “traços pessoais a que damos valor em nós mesmos, e pelos quais 
buscamos que os outros nos valorizem” (SENNETT, 1991, p.10). 
 
Sennett passa a então a questionar as relações de trabalho contemporâneo e 
suas implicações nos valores pessoais como a lealdade e os compromissos 
mútuos. Não é possível construir um caráter em um capitalismo flexível, onde não 
há metas a longo prazo, pois a construção deste depende de valores e relações 
duradouras e isto não é possível em uma sociedade onde as instituições vivem se 
desfazendo ou sendo continuamente reprojetadas. 
 
A partir desta experiência, o que fica de alerta é a exigência de uma resiliência do 
eu, sendo entendida como a capacidade de resistir à pressão das situações 
adversas dentro das organizações, na medida em que precisamos estar 
preparados para enfrentar um constante correr de riscos a partir do 
estabelecimento de relações mais flexíveis, em todos os níveis. 
 
 
 27
Sennett (1991) coloca que diante da destruição da esperança e do desejo, a 
preservação de nossa voz ativa é a única maneira de tornar o sofrimento 
suportável, assim a narrativa dos ex-trabalhadores tentou uma espécie de saída 
através da palavra. 
 
Podemos compreender, a partir deste relato, a importância de um espaço de 
possibilidade de verbalização das questões que perpassam a vida do trabalhador 
na empresa, desde sua admissão até a sua demissão. 
 
As propostas práticas mais convincentes que existem para enfrentar os 
problemas do novo capitalismo concentram-se nos lugares onde ele opera, ou 
seja, nas organizações sociais ou privadas. 
 
Hoje a dependência é uma condição vergonhosa: o ataque à rígida hierarquia 
burocrática quer libertar estruturalmente as pessoas da dependência; o assumir 
riscos destina-se mais a estimular a auto-afirmação que a submissão ao que 
existe. Dependência vira sinônimo de fracasso.Porém, a ideologia do parasitismo social, termo apropriado da Biologia que 
descreve organismos que vivem em associação com outros aos quais retiram os 
meios para a sua sobrevivência, normalmente prejudicando o organismo 
hospedeiro, é um instrumento utilizado no local de trabalho. Ou seja, enquanto as 
organizações estimulam a autonomia e o trabalhador precisa demonstrar que não 
está se aproveitando do trabalho dos outros, este ainda está subjugado à 
hierarquia organizacional. Em muitas sociedades havia pouca vergonha de 
depender de outras pessoas. O fato de o fraco necessitar do forte, como na 
sociedade indiana e japonesa, não é considerado humilhação. 
 
No mercado moderno a maioria da massa laborativa trabalha para os outros. A 
vergonha da dependência tem uma conseqüência prática, corrói a confiança e o 
compromisso de qualquer empreendimento coletivo. Os laços de confiança são 
testados quando as coisas dão errado e a necessidade de ajuda se torna aguda. 
A falta de confiança também pode ser criada pelo exercício flexível do poder. 
 
 28
No trabalho em equipe supõe-se que todos partilham da mesma motivação, e é 
essa suposição que enfraquece a verdadeira comunicação, fortes laços entre as 
pessoas significam enfrentar com o tempo suas diferenças. A comunidade aberta 
em seus conflitos é exatamente o que um regime flexível deveria inspirar. 
 
A grande questão no capitalismo moderno é: "Quem precisa de mim?", isso reduz 
o sujeito ao sentido de sermos necessários, a falta de resposta é uma reação 
lógica ao sentimento de que não somos necessários, sendo sua conseqüência o 
adoecimento do trabalhador tanto de forma física como mental. 
 
Dentro desta visão podemos considerar que o que se pede é que não exista a 
falta como elemento singular do ser humano. Considerando o Seminário 7 
(LACAN, 1960), Lacan irá criticar esse ideal de autonomia, como uma 
possibilidade de escapar à falta para ser Um com o Outro: ser sem falta em um 
gozo narcísico. 
 
Porém, na experiência psicanalítica, tratamos este ponto como um lugar de 
impossibilidade, objeto almejado e objeto obtido são diferentes. O objeto da Lei 
(das ding) não são os objetos dos nossas vontades, mas o objeto para sempre 
perdido, que instaura o desejo como falta que procura ser preenchida com objetos 
causa de desejo, categorizado por Lacan como objeto a. Assim deslizamos 
através de objetos em torno dessa falta, buscando significá-la. 
 
Ora se a completude é a ausência da falta original, o que se oferece a este 
trabalhador é o adoecimento, a morte ou, se articularmos os modos de gozo 
tratados por Lacan, tendo no centro o objeto a, teremos o que nos parece ser o 
principal modo de gozo da sociedade contemporânea, onde o sujeito procura a 
completude não no sentido, mas nas coisas. Desta forma, a sociedade capitalista 
estaria vinculada a um modo de gozo a partir da aquisição, ter em detrimento do 
ser e, consequentemente, ao consumismo. 
 
Zygmundt Bauman (2001), em seu livro “Modernidade Líquida”, faz um recorte da 
sociedade traduzindo-a como indivíduos colecionadores de experiências e 
 
 29
sensações. Pela propriedade de não fixação no espaço e por não se prenderem 
ao tempo, utilizou-se da metáfora da “fluidez” ou “liquidez” para definir a era 
moderna. 
 
A modernidade fluida, segundo Bauman, produziu uma profunda mudança na 
condição humana e em seus conceitos básicos de individualidade, relação 
tempo/espaço, vínculos de trabalho e a participação em comunidade. 
 
O tempo adquire importância singular pela velocidade do movimento através do 
espaço, da imaginação e da capacidade humana. Não há limites neste contexto, 
pois o que existe é um esforço contínuo, rápido e irrefreável para que todo e 
qualquer limite seja ultrapassado. 
 
O acesso a meios mais rápidos de mobilidade na modernidade é a principal 
ferramenta de poder e dominação, principalmente no que tange a mobilidade 
virtual. 
 
A definição de homem moderno a ser incapaz de parar e de ficar parado, tendo 
necessidade de estar sempre à frente de si mesmo, significando também, ter uma 
identidade que só pode existir como um projeto não realizado. Estamos tratando 
de um ser em devir. 
 
 Há que se fazer, porém, uma distinção histórica entre a condição na 
modernidade em que vivemos e a condição da modernidade de nossos ancestrais. 
Bauman se utiliza de duas características para apresentar diferenças na situação 
atual. A primeira diz respeito ao declínio da crença de que há um estado de 
perfeição a ser atingido no fim do caminho. A segunda diz respeito à auto-
afirmação do indivíduo, que se reflete no discurso ético/político do quadro da 
“sociedade justa” para o dos “direitos humanos”. 
 
Ou seja, se a modernidade era densa em suas ideologias, a modernidade atual é 
fluida, livre de deveres libertários. Diferente da individualização de cem anos atrás, 
a individualização na modernidade atual, consiste em transformar a identidade 
 
 30
humana em uma tarefa, onde seus autores serão responsáveis pela realização 
dessa tarefa e das conseqüências advindas com a mesma. 
 
Em “O Mal-Estar na Civilização”, Freud (1930) concebeu um mundo no futuro 
regido pela segurança no qual uma ordem social extrema daria incontestável 
forma a um desejo coletivo de controle e justiça. A estabilidade social romperia o 
fluxo constante do afloramento das pulsões; a sexualidade e a agressividade, 
entre outras exigências, e sofreriam com a renúncia que o processo civilizatório 
demanda, porém essa renúncia seria acatada em troca de um pouco de 
felicidade, para não perder a segurança iminente nesse arcabouço de perigos em 
um trajeto desconhecido. 
 
Mas, no pensamento de Bauman (1998), em particular no livro “O Mal-Estar da 
Pós-Modernidade”, encontraremos um mundo repleto de incertezas onde o ser 
humano troca a segurança, outrora desejada, pela liberdade, mas não uma 
liberdade qualquer: a liberdade individual engendrada por uma vontade suprema. 
 
Porém esta vontade suprema reduz o homem a um estado de insegurança, de 
medo universal, de tecnologia excludente, de ameaças constantes e desemprego 
crescente. Mudanças repentinas, aonde o tempo é o senhor que tudo pode. 
Mudanças econômicas, políticas, culturais transformam o cotidiano em 
ambivalente. A rotina e a estabilidade das relações que traduz um sentimento de 
confiança já não existem e o sentimento de incompletude, de vazio é mais um 
fantasma a assombrar os humanos “pós-modernos”. 
 
As incertezas apontadas por Bauman contagiam todos os setores de atuação 
humana. Os pressupostos que nos regem, e indicam um pseudo ideal de 
liberdade totalizante, são o do mercado consumidor, competitividade, indiferença, 
verdades múltiplas, que salientam diferenças, mas não respeitam as 
singularidades. 
A globalização como veículo de enquadramento e padronização, despersonaliza 
as diversas culturas alimentando-as de produtos para consumo rápido, liberdade 
de escolha que não alcança a satisfação prometida, pois parece impossível o 
 
 31
prazer nesta época de constante oferta de oportunidades de satisfação através 
das coisas e das pessoas. 
 
Neste contexto encontramos um mundo de guerras preventivas, como são 
preventivas as ofertas de produtos que nem se sabia precisar, levando ao 
consumismo exacerbado. Assim o homem pós-moderno no sentido de combater 
o vazio que incessantemente tenta ser preenchido pelo outro, busca um 
prolongamento de sua vida em novas formas de comunitarismo (nos quais estão 
incluídos o nacionalismo e o fundamentalismo religioso – e até terrorista), neste 
mundo onde o homem sonhacom o prolongamento de sua vida, essas formas de 
comunitarismo são tentativas legítimas de combater os excessos da liberdade, da 
falta de ética, da invasão de um livre mercado internacional, onde os países 
desenvolvidos fazem as regras. 
 
O mundo “pós-moderno” nos desafia a refletir sobre quais os benefícios da 
desapropriação do ser para a apropriação do ter. Além disso, o quanto devemos 
abrir mão de nossa individualidade em prol de uma sociedade que nos massifica 
e enquadra para seu próprio prazer e benefício. 
 
Se por um lado Giddens (1991) nos leva a considerar a noção de reflexividade 
como ponto de possibilidade de ver e agir criticamente no mundo, por outro 
Bauman (2001) nos apresenta uma visão de sociedade crua considerando os 
caminhos da sociedade apontando para uma padronização do ser e uma 
valorização do ter. Já Sennett (1999) contextualiza as organizações e seus 
impactos nas relações de trabalho. 
 
Por fim, o que pretendemos é nos apropriar da visão de Giddens trazendo a 
reflexividade como ponto de atenção para a atuação dos profissionais de RH, 
utilizar Sennett como base para a contextualização das organizações na 
sociedade moderna e Bauman, trazendo uma visão crítica da sociedade, 
impactando o sujeito que é convocado a trabalhar nas organizações, 
estabelecendo diferentes formas de relações de trabalho. 
 
 
 32
3. O CONTEXTO DA ADMINISTRAÇÃO DO TRABALHO 
 
Temos presenciado profundas transformações no mundo do trabalho, tanto nas 
formas de estrutura produtiva quanto nas formas sociais e políticas. Nos 
arriscamos a dizer que essas repercussões influenciaram tanto a materialidade do 
trabalho quanto a sua subjetividade. 
 
O grande salto tecnológico, a automação, as tecnologias da informação, 
invadiram o ambiente organizacional revirando os paradigmas do trabalho e de 
suas relações. 
 
Mas para entender a realidade do mundo do trabalho é necessário entender os 
movimentos históricos que nortearam a sua estrutura e que ainda estão presentes, 
de forma residual ou integral. Seja através dos tempos e movimentos pelo 
cronômetro fordista ou pela produção em série taylorista, ou pela especialização 
flexível do toyotismo, temos elementos que nos indicam possíveis hipóteses para 
discutir o sofrimento do trabalhador frente às mudanças no processo produtivo ou 
a manutenção de estruturas de trabalho que reforçam a coisificação da 
subjetividade. 
 
Trataremos basicamente das mudanças nos trabalhos produtivos da indústria em 
seus principais movimentos como o Taylorismo, Fordismo, Toyotismo, entre 
outros, entendendo os diferentes focos que engendram o trabalhador e sua 
posição diante do trabalho. 
 
O Taylorismo, ou a chamada Administração Científica, foi desenvolvido por 
Frederick W. Taylor (apud BORGES, 2008), engenheiro americano do início do 
sec. XIX e é constituído basicamente de um modelo de desenvolvimento dos 
trabalhadores e seus resultados, através de instruções e procedimentos, para que 
pudessem fazê-los produzir mais e com qualidade melhor. 
 
Esta era uma época onde os trabalhadores eram desqualificados e tratados com 
desprezo, pois não havia interesse em investir já que a demanda de 
 
 33
trabalhadores era enorme. Taylor (apud BORGES, 2008) então identifica, a partir 
de sua análise da singularidade da tarefa, que trabalhadores desqualificados 
eram trabalhadores de baixa produtividade e, conseqüentemente, menos lucro, 
forçando a um maior número de contratações. 
 
Além disso, instituiu o modelo de planejamento de produção para que pudesse ter 
maior controle sobre o produto final, visando sempre potencializar a cadeia 
produtiva, assim sendo acreditava que os melhores resultados refletiriam em 
menores custos e, conseqüentemente, em salários mais altos. 
 
Dentro desta lógica científica, de análise e controle de dados, introduziu o 
conceito de “tempos e movimentos”, que tinha por objetivo fazer com o que o 
trabalhador executasse uma determinada tarefa dentro de uma seqüência e 
tempos pré-programados de modo a ter um desperdício mínimo de produção. 
Eliminando movimentos inúteis e fazendo o trabalho se tornar mais rápido e 
eficaz. 
 
É neste momento em que a figura do supervisor se inaugura dentro das fábricas 
com a função de verificar se os trabalhadores estão desenvolvendo duas 
atividades dentro dos procedimentos definidos. Institui-se também a separação 
entre aqueles que executam e aqueles que planejam. A noção do bom 
trabalhador se traduz naquele que cumpre ordens e não as discute, tendo o 
supervisor como aquele que dá as ordens. 
 
Dentro do seu método existia um olhar sobre o trabalhador para além das 
questões da produção. Ele estabelece alguns preceitos até hoje difundidos na 
administração moderna. 
 
Uma relação entre a fadiga e a diminuição da produtividade, com perda de 
qualidade de resultados, doenças e aumento da rotatividade de pessoal. 
Estabelece ainda que todas as instruções programadas devam ser transmitidas a 
todos os trabalhadores, definindo as aptidões de cada trabalhador para 
determinada tarefa na direção da especialização e divisão do trabalho. 
 
 34
Incentivos salariais e prêmios por produtividade, para aqueles que se 
destacassem além do estabelecido (atualmente chamado de meritocracia) e a 
melhoria do ambiente físico para maior conforto do trabalhador e, por 
conseqüência; maior produtividade. 
 
Entra em cena a noção do homem econômico, motivado por recompensas 
salariais e materiais e que hoje em dia ainda é foco de todas as empresas para 
que se possa estimular o aumento da produtividade. 
 
Este método traz em si maior controle sobre os trabalhadores e desapropriação 
do trabalhador em relação ao seu trabalho, visto que a segmentação das tarefas 
era vital para maior produtividade. 
 
Analisando os sistemas de gerenciamento e controle da qualidade dos resultados 
nas últimas duas décadas, nos deparamos com a permanência da administração 
científica nas atuais ditas inovações de gestão. O treinamento contínuo, as 
certificações que garantem o resultado final, a função da supervisão como ponto 
chave para a manutenção de um processo produtivo com resultados de 
excelência, são ainda a base da administração contemporânea, mesmo se 
travestida de outros nomes. 
 
Um exemplo do resquício do Taylorismo na atualidade são as normas 
International Organization for Standardization-9000 (ISO-9000), que garantem, 
através de itens de controle da qualidade, o produto entregue ao cliente, a forma 
de gestão, o treinamento a ser aplicado para cada função. 
 
Quando da nossa atuação como Auditora da Qualidade para as normas ISO-9000 
(grupo de normas técnicas que estabelecem um modelo de gestão da qualidade 
para organizações em geral, qualquer que seja o seu tipo ou) e do Prêmio 
Nacional da Qualidade (PNQ), a padronização dos macro fluxos de processo, a 
descrição das atividades e sua real aplicação no trabalho, a definição de 
indicadores de qualidade e de técnicas estatísticas que pudessem garantir esses 
resultados eram, e são, fatores decisivos para o controle da produção e do 
 
 35
controle da atuação do trabalhador. A Área de Recursos Humanos sofreu uma 
valorização pela necessidade de “motivar” seus trabalhadores para as novas 
práticas de trabalho, além de analisar outras formas de gestão. 
 
Henry Ford (apud BORGES, 2008), fundador da Ford Motor Company, 
revolucionou a indústria automobilística a partir de 1914, quando introduziu a 
automatização da linha de montagem de seus carros, utilizando os princípios de 
padronização e simplificação de Frederick W. Taylor. Seu grande objetivo erapopularizar o automóvel através da redução dos custos da produção. 
 
No filme “Tempos Modernos” de Charles Chaplin, podemos verificar como a linha 
de montagem do modelo fordista operava. Esteiras rolantes movimentavam-se 
com as peças, enquanto os operários ficavam estáticos realizando uma parte da 
tarefa da produção. Assim não era necessária nenhuma qualificação dos 
trabalhadores. 
 
Fixo em seu posto de trabalho, o trabalhador era parte da máquina, sem que 
houvesse necessidade de elaboração mental para o exercício de sua função. 
Sem interferência da mente, novamente desapropriando o trabalhador de seu 
trabalho, a linha de produção homem-máquina se constituía em uma só entidade. 
 
Enquanto no Taylorismo ainda havia a preocupação de se adequar as 
potencialidades às necessidades de especialização da tarefa, no Fordismo, pela 
implantação de movimentos repetitivos e sem atuação mental, volta-se a 
desprestigiar a qualificação e a prestigiar somente a “mão-de-obra”, mais barata e 
substituível. Ford, em 1913, relata: 
 
“Para certa classe de homens, o trabalho repetido, ou a reprodução 
contínua de uma operação idêntica, por processos que não variam nunca, 
constitui um espetáculo horrível. A mim me causa horror. Por preço algum 
do mundo poderia fazer todos os dias as mesmas coisas. 
Entretanto, atrevo-me a dizer que para a maioria a repetição nada tem de 
desagradável. Para certos temperamentos, a obrigação de pensar é uma 
 
 36
verdadeira tortura, porque o ideal consiste em operações que de modo 
algum exijam instinto criador.” (apud BORGES, 2008, slide 25) 
 
Ford traduz uma realidade de mão-de-obra marginalizada, sem capacitação, que 
se assujeitava a realizar qualquer tipo de trabalho em troca de uma remuneração. 
Aqui ele já inaugura uma tentativa de avaliar as tendências do trabalhador para 
uma ou outra atividade, porém ainda com a visão segmentada entre elaboração 
mental e trabalho braçal, como se ambas pudessem ser dicotomizadas. 
 
O Fordismo teve seu ápice na Segunda Guerra Mundial, nas décadas de 1950 e 
1960, conhecidas também como Os Anos Dourados. Porém o mundo mudou 
após a guerra e com isso o modelo rígido de gestão e de produção de um único 
produto que atendesse a todos os potenciais compradores, levou o Fordismo ao 
declínio. 
 
Em 1970, a General Motors flexibiliza sua gestão e sua produção, cria diversos 
modelos de carro com cores variadas e adota um sistema de gestão 
profissionalizado, assim ultrapassando a Ford como maior montadora do mundo. 
Neste mesmo período com a crise do petróleo e a entrada de competidores 
japoneses neste mercado, um novo modelo de produção se inicia baseado no 
Toyotismo e em 2007, a Toyota se torna a maior montadora de veículos do 
mundo colocando fim ao Fordismo. 
 
O Japão, após a Segunda Guerra Mundial, apesar de destruído, encontrou 
condições favoráveis para retomar sua economia e mudar o curso da história 
dentro das organizações. Diferentemente dos EUA e da Europa, o Japão tinha um 
mercado consumidor pequeno, com capital e matéria-prima escassos e grande 
disponibilidade de mão de obra especializada. Nesta conjuntura, a aplicação do 
modelo americano de administração de produção em massa era inviável. 
 
O que se configurou como resposta foi o aumento da produtividade através da 
fabricação de pequenas quantidades de numerosos modelos de produtos, 
 
 37
voltados para o mercado externo, de modo a gerar divisas para a sua 
reconstrução pós-guerra. 
 
O Toyotismo, como modelo de organização produtiva, foi elaborado por Taiichi 
Ohno, que tem como base a filosofia orgânica da produção industrial. Em seu 
sistema foram identificados alguns aspectos importantes de sustentação, como a 
introdução de uma mecanização flexível onde a produção é realizada a partir da 
necessidade da entrega, em contraponto com o Fordismo que privilegiava o 
estoque de excedentes da produção, sendo assim flexível a demanda do 
mercado. 
 
Além disso, a estruturação de processos multifuncionais ou de polivalência de 
seus trabalhadores, incentivando o enriquecimento do trabalho e investimento em 
educação, visto que com mercados muito segmentados a função de especialista 
restringia a produção. 
 
O envolvimento do trabalhador no pensar a produção, foi extremamente 
estimulado com a implantação de sistemas de controle de qualidade total, 
promovendo ciclos de palestras onde o trabalhador desenvolve a visão de todo o 
processo produtivo e sua importância dentro dele. 
 
Hoje ainda verificamos a utilização do sistema “Just in time”, originalmente 
idealizado por Henry Ford (apud BORGES, 2008), porém implantada por ele, 
baseado em controles estatísticos de processo produzindo o necessário, na 
quantidade e no momento necessários. 
 
Apesar das maravilhas e novidades que o Toyotismo trouxe através da tecnologia 
nos modos de produção atual, esse mesmo modo desencadeou um elevado 
aumento das disparidades socioeconômicas e uma necessidade desenfreada de 
aperfeiçoamento constante para simplesmente se manter no mercado. 
 
 
 38
Alguns pensadores, entre eles Richard Sennett (1999), concordam que a nova 
crise econômica mundial, deflagrada em setembro de 2008, representa uma 
profunda ruptura com a visão de trabalho predominante no século XX. 
 
Esta ruptura vinha se processando com a emergência das novas tecnologias da 
era digital que, por si, já modificaram a natureza do trabalho contemporâneo. No 
ambiente de crise, essas mudanças derivadas da técnica, criam um quadro 
potencialmente explosivo em curto prazo. 
 
Onde a globalização impetra um nova ordem social e econômica, não há espaço 
para as relações de confiança estabelecidas de forma clara e transparente. As 
ações dentro do contexto do trabalho são documentadas virtualmente para que se 
possa garantir que a mensagem foi enviada, porém não está em questão o 
recebimento e o entendimento da mensagem e sim a emissão 
descompromissada da informação, pois uma vez enviada, já não faz mais parte 
da responsabilidade daquele que enviou. 
 
Os espaços verbais de discussões e análise tornaram-se espaços vazios de 
elaboração. Hoje se seguem os twitters pessoais ou corporativos, mas que 
elaborações subjetivas efetivas se traduzem deste colóquio virtual? 
 
No isolamento de seus computadores, cada trabalhador se coloca como um 
espectro para o outro, protegido pela máquina. As relações aumentam em 
quantidade e diminuem qualidade. Chega-se ao máximo do distanciamento do 
outro ao serem enviados e-mails aos colegas que estão ao seu lado fisicamente. 
 
O tempo é uma variável que se expande na medida em que as pessoas e as 
corporações, envolvidas no trabalho, estão em diversas partes do mundo e o 
acesso às informações é online. Os profissionais estão conectados através de 
seus computadores fixos ou móveis de forma que são acessados em todo o 
tempo e lugar. A pressão por resultados de excelência e pela manutenção do 
trabalho desloca o tempo do trabalho para o tempo livre, sem que o inverso seja 
uma verdade. 
 
 39
Os vínculos que se estabelecem com as empresas já não são mais fantasiosos, 
cumprindo uma promessa de convivência eterna e de plena satisfação. A relação 
de uso entre as coisas e as pessoas, muito bem colocado por Bauman (2001), é 
também vivenciada nas relações de trabalho que estabelecem vínculos frágeis e 
sem envolvimento subjetivo. 
 
Muitos têm sido os estudos que procuram desvendar a natureza de novas formas 
de trabalho imaterial – mais associativas e coletivas liberadas dos locais de 
emprego, com novas recomposições entre o manual e o intelectual. E a 
perspectivapara os próximos anos traz reformulações importantes tanto para o 
trabalhador quanto para aqueles que fazem a arquitetura das relações de trabalho. 
 
Assim, neste item nos interessa refletir sobre as características do "novo 
capitalismo": a exigência de flexibilidade; a visão de curto prazo; a contradição 
entre enaltecer valores como lealdade, ajuda mútua e confiança e estimular o 
individualismo e a competitividade; o desaparecimento de carreiras estáveis e de 
vínculos profissionais duradouros; questionando se tais condições não estariam 
contribuindo para corrosão do caráter, criando novas subjetividades. 
 
Muito se tem falado sobre novas formas de subjetivação na atualidade, se 
utilizarmos como parâmetro a tradição ocidental do individualismo iniciada no 
século XVII, tendo as noções de interioridade e reflexão sobre si mesma como 
eixos constitutivos. Mas o que nos parece mais apropriado é inferir que com todas 
as mudanças na sociedade até agora descritas, não se trata de uma nova forma 
de subjetividade, mas a forma reativa a uma sociedade que trás para cada sujeito 
a necessidade de sobreviver em meio à fluidez de ideais, vínculos frágeis, 
descrenças nas autoridades e tantas outras inconstâncias advindas do Outro. 
 
Talvez seja importante que repensemos os fundamentos de nossa leitura da 
subjetividade atentando para os "destinos do desejo" na atualidade, na medida 
em que tais destinos podem nos levar a perceber o que se passa nas 
“subjetividades”. Se conseguirmos, por exemplo, identificar os destinos do desejo 
assumindo uma direção auto-centrada e exibicionista, onde há um esvaziamento 
 
 40
e um não investimento nas relações humanas, podemos inferir que a 
subjetividade latente é a impossibilidade de reconhecer o outro em sua diferença 
radical, característica fundamental na cultura narcísica. 
 
Quando nos referimos à cultura do narcisismo, é importante utilizarmos o 
historiador e crítico social Christopher Lasch (1983). Pode-se definir a “cultura do 
narcisismo” como uma cultura que requer a sobrevivência de um mínimo eu 
diante dos sentimentos de impotência em que somos jogados diariamente através 
dos meios de comunicação ou de nossos contatos sociais. A decadência dos 
vínculos, o descrédito nas instituições públicas, privadas ou religiosas, o consumo 
estimulando o prazer imediatista e a perda das ideologias podem ativar nossas 
defesas narcísicas para que o ego, confrontado exaustivamente com a frustração, 
possa sobreviver. Temos aqui a supervalorização da realização individual em 
detrimento dos ideais coletivos. 
 
Freud, no texto “Introdução ao Narcisismo” (FREUD, 1914), aborda a questão da 
constituição do ego, que consiste de um afastamento do narcisismo primário, 
como processo de individuação. A libido é deslocada em direção ao ideal do ego, 
que está diretamente ligado a identificações com os pais ou outras figuras 
substitutivas e depois com os ideais da cultura. O ideal do ego representa o 
modelo a ser atingido e as realizações a serem alcançadas. 
 
“A busca do atingimento do “ideal do ego” implica, enfim, o 
desenvolvimento, crescimento e transformação do ego narcísico; implica 
também a renúncia e adiamento do “prazer imediato” em função de um 
“modelo ideal”, ele próprio “libidinizado”, mas que aponta para projetos 
futuros e requer a inserção do sujeito no real. Por outro lado, o recurso 
ao “ego ideal” consiste numa saída que envolve uma renúncia do 
enfrentamento da realidade e um fascínio por um “objeto-engodo” que 
encerra o sujeito num pseudo-estado a-conflitivo mediante o processo 
de “idealização”.” (SEVERIANO, 2006, p.1) 
 
 
 41
Freud (1921) afirma ainda, no texto, “Psicologia das Massas e Análise do Eu”, 
que somente através da identificação mútua entre os membros da massa e do 
controle da expansão narcísica pode haver possibilidade de coesão social, 
indicando a importância dos vínculos libidinais para a limitação do narcisismo e os 
compromissos primordiais para a existência de um grupo. 
 
Mas se esses mesmos compromissos estão dissolvidos em relações virtuais e 
frágeis, se o princípio da impessoalidade colocou os líderes em uma posição 
ilusória, percebemos que a saída para a sobrevivência deste ego é a emersão de 
defesas narcísicas, que coloca o outro no lugar de objeto para satisfação de seus 
desejos na busca da realização do ideal a ser alcançado, porém sem sentido. 
 
Podemos talvez dizer que há ainda uma saída, pois se por um lado o sujeito na 
cultura do narcisismo encerra o outro como objeto para seu usufruto, por outro, as 
experiências de perda e o reconhecimento da incompletude do sujeito têm a 
possibilidade de abrir caminho para a subjetivação permanente, para a alteridade 
e temporalidade e, consequentemente, para um futuro que tenha sentido. 
 
Porém, no ambiente de trabalho, essa esperança de subjetivação permanente, 
que Giddens (1991) chamou de reflexividade, está capturada pelas organizações 
capitalistas, amarrando o trabalhador no ideário narcisista, tendo em vista que 
quanto mais fluidas são as relações, muito bem descrito por Bauman (2001), mais 
submetido às regras como ponto de apoio para sua sobrevivência e mais 
submetido aos seus próprios interesses em detrimento do todo, gerando uma 
competitividade por vezes doentia e que adoece o trabalhador, para o alcance de 
resultados cada vez melhores, com reconhecimento também maior. Como em um 
círculo vicioso, temos o trabalhador que precisa produzir mais, para ser 
reconhecido e alavancar seu status profissional. 
 
Assim, como Sennett (1999) coloca, a corrosão do caráter acontece para fazer 
frente a constante desconstrução do que se é diante de um vínculo de trabalho. 
Se o trabalhador não pode mais criar laços com a empresa, pois não há mais 
garantias de longo prazo, se não pode criar laços com seus colegas de trabalho, 
 
 42
pois existe uma competição acontecendo por melhores resultados, se o ideário da 
empresa pode mudar a qualquer momento devido a fusões, compra, venda ou 
internacionalização de outras culturas, o que resta é a sustentação de um mínimo 
de narcisismo para a proteção do ego. 
 
Quanto menos vínculos existirem, quanto mais contarmos somente conosco, 
quanto mais autônomo e auto-suficiente o trabalhador for, maior a possibilidade 
de ele sobreviver tanto no mundo do trabalho quanto emocionalmente, visto que a 
insistência das organizações capitalistas é a redução ou coisificação da 
subjetividade do trabalhador. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 43
4. RECURSOS HUMANOS À LUZ DA PSICANÁLISE 
 
Após caminharmos pelas interlocuções com a administração e a sociologia no 
que diz respeito ao trabalho, finalmente chegamos à Psicanálise, saber que mais 
nos interessa para embasar esta dissertação. 
 
Iniciemos, assim, nosso percurso pelo entendimento dos complexos laços que se 
estabelecem nas empresas através dos textos de Freud sobre a cultura, 
percorrendo a linha do tempo em que ele discorre sobre o assunto. 
 
Destacamos os textos Totem Tabu (1913); Psicologia das Massas e Análise do 
eu (1921); O Futuro de uma Ilusão (1927) e O Mal estar da Civilização (1930), 
como fundamentais para entender a cultura através da visão da psicanálise. 
 
Em Totem e Tabu (1913), Freud faz uma reflexão sobre a origem da civilização, 
abordando o mito da horda primeva e da morte do pai totêmico que levam a 
hipóteses acerca da origem das instituições sociais e culturais, além da religião e 
da moralidade. 
 
São escolhidas, como objeto de estudo, as tribos primitivas da Austrália

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