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A natureza das experiências recalcadas Para entender melhor do que se trata, vamos nos transportar para a Viena de 1900 e tentar reproduzir sua atmosfera. Jovens senhoras casadas, condenadas desde jovens a reprimirem sua sexualidade dedicando-se a tarefas do lar enquanto seus maridos curtem o mundo lá fora. O que poderia acontecer se começassem a se sentir, por exemplo, atraídas por um cunhado, ou por um amigo do marido? Se a esposa pode fugir, resolve o problema mudando de ambiente. Se ela pode julgar, resolve o problema conversando consigo mesma e decidindo o que fará se pedirá o divórcio, se irá tornar-se adúltera, ou se reprimirá conscientemente seus impulsos em nome da felicidade de seu casamento. Porém, se a experiência não pode sequer ser pensada por ela, se ela não pode nem mesmo admitir para si mesma que tem sentimentos (que não deveria ter) por outro homem, então o recalque encontra sua oportunidade. Antes que a situação pudesse configurar-se como questão para a própria pessoa, é subtraída da consciência, pois o eu sente-se incapaz de administrá-la. Admitir a atração para então julgar o que fazer dela, já seria demais... O problema é que a experiência aconteceu e, embora afastada da consciência, continua no psiquismo e ativa, ou seja, buscando a reação que poderia levar à extinção da excitação que provoca. Uma experiência de atração sexual requer uma ação de satisfação. Uma vez não ocorrendo essa ação – dado que o eu não pôde configurar a situação adequadamente – inicia-se uma luta entre as forças do impulso original tornado inconsciente e as forças da resistência que protegem o eu do contato com ideias e afetos que excedem seu poder de administração. O resultado final dessa luta será o sintoma neurótico, desde cedo apontado por Freud como uma conciliação entre as forças do inconsciente e as forças do eu consciente. O sintoma surge assim como um modo de realização de um impulso desejante inconsciente. Modo este “disfarçado”, incompreensível para o sujeito, que não enxerga nele senão uma fonte de sofrimento. Porém, Freud é taxativo: os sintomas neuróticos são, pelo menos parcialmente, a vida sexual do neurótico.
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