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INTERPRETAÇÃO CULTURAL DO SABOR

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ALEX MEIRELLES
BRUNNA RODRIGUES BELLIENE
HELOISA ALVES PINTO
VICTOR FERREIRA MARTINS
INTERPRETAÇÃO CULTURAL DO SABOR
Trabalho da disciplina Introdução à Gastronomia, ministrada pela profa. Michele do Nascimento Sobral na Universidade Faculdade dos Guararapes. 
RECIFE
2017
INTRODUÇÃO
A diversidade de gostos não é uma novidade em se tratando do modo de viver dos seres humanos, em especial na gastronomia. São inúmeros os pratos desenvolvidos pela humanidade com o fim de alimentar corpos e padrões culturais, todavia, a reação de cada indivíduo frente a determinado tipo de preparação pode variar do anseio para comer à repulsa, aversão. E isso varia não somente individual, como coletivamente. 
A interpretação cultural do sabor é a forma de se analisar como pratos tipicamente conhecidos e desejados em determinadas civilizações podem ter um sentido completamente diverso se inseridos em outras localidades, cujos costumes, necessidades e crenças divirjam substancialmente. Para ilustrar tal afirmação o presente trabalho traz alguns pratos característicos de certas localidades do mundo como Coréia do Sul, Haiti e Filipinas que, se inseridos hoje no mercado brasileiro certamente despertariam sentimentos da estranheza ao nojo, dadas as diferenças culturais existentes entre cada uma desses povos e consequentemente de seus gostos culinários. 
 
INTERPRETAÇÃO CULTURAL DO SABOR
As preferências degustativas de cada lugar variam conforme o clima, aspectos culturais, religiosos e as necessidades da população em geral. É claro que a facilidade de locomoção alcançada pela modernidade favoreceu a internacionalização dos sabores, mas ainda hoje pode-se reconhecer em alguns lugares pratos que em seu berço são tido como verdadeiros manjares, mas que se levados para outro país dificilmente agradariam a população, chegando mesmo a causar repulsão. Isso é a interpretação cultural do sabor.
Essencial à sobrevivência do homem, a alimentação no início da história humana possuía apenas o viés nutritivo, possibilitando ao homem a manutenção de suas forças para o desempenho das atividades que lhe aprouvessem. Com o tempo, o alimento passou a ter outras importantes funções, como a de remédio, de diversão, socialização, entre outras. Mas o que fartamente se observa é que, apesar de todas as civilizações apresentarem funções similares quanto ao uso do alimento, no que concerne ao que se cozinha isso pode vir a divergir drasticamente.
Para começar pelo mais simples, basta dizer que peixe cru há cerca de 30 anos no Brasil era extremamente raro de ser servido e hoje há uma epidemia de restaurantes japoneses, food trucks, quiosques, todos prontos para servir os peixes de forma “mais natural”, por assim dizer. Mas os brasileiros não receberam tão passivamente esse produto, que foi adaptado ao paladar regional, sendo adicionados aos famosos “sushis” uma dose extra de frituras, cream cheese e doces como goiabada, entre outros, de modo a facilitar a aceitação canarinha do produto. E deu certo. Observe-se, por exemplo, a notícia abaixo:
A cidade de São Paulo tem mais restaurantes japoneses que churrascarias. São 600 estabelecimentos contra 500, respectivamente, segundo a Abresi (Associação Brasileira de Gastronomia, Hospedagem e Turismo). Por dia, a capital paulista chega a produzir mais de 400 mil sushis.[1: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/06/28/franquias-de-comida-oriental-faturam-r-400-milhoes-em-um-ano-veja-opcoes.htm]
Mas nem tudo toda tentativa de inserção é fácil. Especialmente quando se destoa muito da cultura, costumes e religião locais. Quem poderia imaginar uma churrascaria na Índia, onde a vaca é um animal sagrado? Mas existe! Apesar de raro, fato é que a globalização, a maior rapidez dos transportes, trouxe públicos diversos para lugares diversos e ao mercado coube atender a tais demandas. É o caso dessa churrascaria brasileira fundada em Nova Deli, como relata a notícia abaixo:
No dia 12 de junho de 2007, há dois meses atrás, foi inaugurado o primeiro restaurante brasileiro da Índia!
Isso mesmo, em toda a Índia há somente um único restaurante brasileiro, que para minha sorte localiza-se em Gurgaon, cidade (satélite) que faz parte da Grande New Delhi.
O restaurante pertence ao hotel Crowne Plaza e é gerenciado pelo senhor Shailendra Shukla.
Mais que um restaurante, e para sua surpresa meu caro leitor, o Wild Fire, é na verdade uma CHURRASCARIA !!!
Uma churrascaria na Índia! Mas como pode???
Para responder a esta pergunta eu entrevistei o brasileiro Mateus que trabalha na Wild Fire.
Mateus é gaúcho e trabalhava em São Paulo em uma das melhores churrascarias. Ele me explicou que devido a grande variedade de alimentos tanto vegetarianos quanto não vegetarianos, todos saem satisfeitos. As pessoas que só comem frango, encontram um delicioso frango no espeto, os que comem carne de porco também tem vez na Wild Fire, assim como os que comem lingüiça. Mas e quanto a carne de vaca???
Segundo Mateus, a maioria dos clientes são de estrangeiros e hóspedes do próprio hotel. Há também indianos (como os cristãos) que comem carne sem problemas e tem também os curiosos que ousam experimentar visto que a carne servida é importada do Brasil e não de gado indiano.
Outra curiosidade que o gaúcho Mateus me contou, é que é bastante comum mesas com pessoas só vegetarianas, como também mesas mistas onde por exemplo duas pessoas são vegetarianas e as outras duas ou três não são. O que importa é que devido a grande variedade de alimentos, todos saem satisfeitos do primeiro e único restaurante/churrascaria da Índia.[2: http://indiagestao.blogspot.com.br/2007/08/restaurante-brasileiro-na-india.html]
De fato, quanto mais se misturam as populações, mais facilmente são realizadas as introduções de novos alimentos na rotina local. Hodiernamente proliferam restaurantes com diferentes bandeiras, trazendo ao ocidente, por exemplo, a culinária japonesa, tailandesa, venezuelana, italiana, portuguesa, chinesa, indiana, cada uma com sua característica própria, abusando dos temperos e modos de cocção regionais e, principalmente, com o uso de fontes de proteína próprios, e eis que aí onde a maioria das pessoas torcem o nariz. 
Para melhor ilustrar as diferenças das preferências de sabores mundo afora, cabe trazer alguns pratos que, para nós, ocidentais, estão longe de dar água na boca, mas que para a população de seus países de origem, todavia, serão muito bem vindos se postos à mesa.
Primeiramente, vale apresentar o prato Sannakji, originário da Coréia do Sul. Trata-se de nada mais, nada menos, que tentáculos de filhotes de polvo cortados vivos, servidos ao cliente enquanto ainda se contorcem no prato, ou inteiros mesmo. Pode ser servido com gergelim ou óleo de gergelim. Sugere-se que o cliente mastigue bem os pedaços, pois como se contorcem podem gerar risco de sufocamento ou mesmo as ventosas do bicho podem grudar na parede do esôfago gerando dor.
Outro prato por assim dizer “exótico”, é uma bolacha de barro, com que a população mata a fome.
A alta inflação, o aumento constante do preço dos alimentos, desastres naturais e surtos de doenças como a cólera foram responsáveis pela situação caótica do país, lugar onde se propaga a fome. A solução que a população encontrou para aplacar os efeitos, pelo menos imediatos, da fome, foi a produção de biscoitos de argila amarela da cidade central de Hinche. As bolachas de terra levam em sua composição três ingredientes básicos: argila, manteiga, água e sal. Faz-se então o disco da bolacha que é cozida pelo próprio sol escaldante do país. Em menos de 1 hora é possível, então, se consumir uma bolacha de argila fresquinha. 
A culinária local refletiu mais uma vez a necessidade da alimentação da população, mostrando em um caso extremado o quanto que o paladar se adapta às necessidades e disponibilidade do alimento no meio social. Não é muito diferente, por exemplo, do sertão nordestino onde as pessoas passaram a consumir o mandacaru,cacto originalmente utilizado apenas como alimentação do gado e que, com a escassez de água e, consequentemente, de água para a plantação, se tornou alimento para famílias inteiras no país. [3: A foto que se segue mostra um menino haitiano mostrando a língua após o consumo do biscoito de barro.]
O que tem acontecido com o biscoito haitiano é que ele tem se popularizado no gosto da população, mesmo daquela que não necessariamente passa fome. Isso inclusive, porque além de as acharem palatáveis, às bolachas de argila há quem atribua no Haiti propriedades medicinais.
Por fim, e não menos excepcional, cabe que se fale acerca de um dos cafés mais caros do mundo e o qual poucos brasileiros teriam estômago para provar se soubessem da sua procedência: o Kopi Luwak. Trata-se de um café extraído do cocô da civeta, principalmente produzido nas ilhas de Sumatra, Java, Bali, e Sulawesi, nos arquipélagos da Indonésia. Pode ser encontrado também em Madagascar e nas Filipinas, locais onde o produto é chamado de Kape Alamid. 
E porque é tão especial a ponto de ser tão cara essa iguaria? Porque a civeta primeiramente seleciona os grãos frescos de café e, uma vez no seu intestino, apenas a polpa é digerida, sendo os grãos preservados e alterados por enzimas e bactérias unicamente presentes no intestino do animal, que dão o aroma e sabor tão valorizados pelos baristas. O sabor é descrito como uma mistura de chocolate com suco de uva e é menos ácido e amargo que os cafés comuns.
Dada a sua limitada produção, cerca de 230 quilos por ano, apenas, chega a custar mil dólares o quilo do café. É vendido especiamente para o Japão, Europa e Estados Unidos e uma xícara do café pode custar cerca de 50 libras esterlinas no Reino Unido. 
Abaixo segue a foto da civeta se alimentando.
De fato, a interpretação cultural do sabor por cada povo varia infinitamente conforme a disponibilidade de alimentos, a geografia, o clima, o momento social, a condição financeira e outros infinitos aspectos. A introdução desses pratos em culturas diferentes pode causar estranheza em um primeiro momento, mas fato é que a facilidade de comunicações e transportes tem facilitado o intercâmbio de experiências entre as pessoas, dentre as quais se insere a gastronomia. Para os elementos que muito destoem da cultura local, podem os chefes abusar das combinações que mais agradem a população, como foi feito com a comida japonesa e como de fato, irá acontecer com a culinária de tantos outros países do mundo. 
CONCLUSÃO
Certamente o gosto de cada povo por determinado tipo de alimento foi se desenvolvendo graças à respectiva disponibilidade, bem como de acordo com as crenças e necessidade de cada agrupamento cultural. Desse modo, o que agrada ao paladar de determinado ajuntamento social, não produz o mesmo efeito em outro, mesmo em um mundo tão conectado quanto este no qual se vive atualmente. 
Certamente os padrões têm se tornado mais flexíveis, mais abertos à inserção de elementos de outras culturas, mas não sem um choque inicial. É esse choque que faz com que um prato tido como típico em uma região do planeta seja taxado como “exótico” em outra. Para que esta aceitação e intercâmbio culinário sejam crescentes podem os mestres de cozinha se valer de adaptações ao gosto local, o que tem sido muito feita pela culinária japonesa nestas últimas décadas. 
De todo modo, o que se observa é que a interpretação do sabor varia de cultura para cultura, chegando a extremos de reação conforme o país que se transite, havendo um movimento crescente de internacionalização da culinária, por meio de um processo de adaptação e familiarização dos produtos e métodos de cocção quando importados ou exportados mundialmente. 
REFERÊNCIAS
Disponível em: <http://www.fatosdesconhecidos.com.br/as-10-comidas-mais-nojentas-do-mundo/>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <http://www.tribunapr.com.br/arquivo/vida-saude/conheca-algumas-das-comidas-mais-exoticas-do-mundo/>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <http://www.sitedecuriosidades.com/curiosidade/20-comidas-estranhas-para-comer-antes-de-morrer.html>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Sannakji>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <http://noticias.r7.com/internacional/noticias/biscoito-de-terra-alimenta-famintos-no-haiti-20111130.html>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Kopi_Luwak>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <http://indiagestao.blogspot.com.br/2007/08/restaurante-brasileiro-na-india.html>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2010/12/19/biscoitos-de-terra-iguaria-faz-sucesso-ate-entre-quem-nao-passa-fome-no-haiti.htm>. Acesso em 10.09.2017.
Disponível em: <https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/06/28/franquias-de-comida-oriental-faturam-r-400-milhoes-em-um-ano-veja-opcoes.htm>. Acesso em 10.09.2017.

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