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DIÁLOGO DAS FONTES

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DIÁLOGO DAS FONTES 
 
*A essência da teoria é que as normas jurídicas não se excluem, supostamente porque pertencentes 
a ramos jurídicos distintos, mas se complementam. A teoria foi desenvolvida por Erik Jayme, na 
Alemanha, e Cláudia Lima Marques, no Brasil. A última doutrinadora propõe um sentido de 
complementaridade entre o Código Civil de 2002 e o Código de Defesa do Consumidor, sobretudo 
nas matérias de direito contratual e responsabilidade civil. 
 
A ideia de que as leis devem ser aplicadas de forma isolada umas das outras é afastada pela teoria 
do diálogo das fontes, segundo a qual o ordenamento jurídico deve ser interpretado de forma 
unitária. A teoria do diálogo das fontes foi idealizada na Alemanha pelo jurista Erik Jayme, 
professor da Universidade de Helderberg e trazida ao Brasil por Claudia Lima Marques, da 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 
A teoria surge para fomentar a ideia de que o Direito deve ser interpretado como um todo de forma 
sistemática e coordenada. Segundo a teoria, uma norma jurídica não excluiria a aplicação da outra, 
como acontece com a adoção dos critérios clássicos para solução dos conflitos de normas 
(antinomias jurídicas) idealizados por Norberto Bobbio. Pela teoria, as normas não se excluiriam, 
mas se complementariam. Nas palavras do professor Flávio Tartuce, “a teoria do diálogo das fontes 
surge para substituir e superar os critérios clássicos de solução das antinomias jurídicas 
(hierárquico, especialidade e cronológico). Realmente, esse será o seu papel no futuro”.1 
A jurista Claudia Lima Marques, após discorrer sobre a exclusão da norma pela aplicação dos 
critérios clássicos de solução de antinomias, ensina que a “doutrina atualizada, porém, está a 
procura, hoje, mais da harmonia e da coordenação entre as normas do ordenamento jurídico 
(concebido como sistema) do que da exclusão.” 2 
A tese tem o fito de trazer ao intérprete uma nova ferramenta hermenêutica hábil a solucionar 
problemas de conflito entre normas jurídicas (antinomias) no sentido de interpretá-las de forma 
coordenada e sistemática, em consonância com os preceitos constitucionais. Claudia Lima 
Marques ensina os fundamentos da teoria: 
“É o chamado ‘diálogo das fontes’ (di + a = dois ou mais; logos = lógica ou modo de pensar), 
expressão criada por Erik Jayme, em seu curso de Haia (Jayme, Recueil des Cours, 251, p. 259), 
significando a atual aplicação simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas, 
leis especiais (como o CDC, a lei de seguro-saúde) e gerais (como o CC/2002), com campos de 
aplicação convergentes, mas não mais iguais. 
Erik Jayme, em seu Curso Geral de Haia de 1995, ensinava que, em face do atual ‘pluralismo pós-
moderno’ de um direito com fontes legislativas plúrimas, ressurge a necessidade de coordenação 
entre leis no mesmo ordenamento, como exigência para um sistema jurídico eficiente e justo 
(Identité culturelle et intégration: le droit international privé postmoderne. Recueil des Cours, II, 
p. 60 e 251 e ss.). 
O uso da expressão do mestre, ‘diálogo das fontes’, é uma tentativa de expressar a necessidade de 
uma aplicação coerente das leis de direito privado, coexistentes no sistema. É a denominada 
‘coerência derivada ou restaurada’ (cohérence dérivée ou restaurée), que, em um momento 
posterior à descodificação, à tópica e à microrrecodificação, procura uma eficiência não 
hierárquica, mas funcional do sistema plural e complexo de nosso direito contemporâneo, a evitar 
a ‘antinomia’, a ‘incompatibilidade’ ou a ‘não coerência’. 
‘Diálogo’ porque há influências recíprocas, ‘diálogo’ porque há aplicação conjunta das duas normas 
ao mesmo tempo e ao mesmo caso, seja complementarmente, seja subsidiariamente, seja 
permitindo a opção pela fonte prevalente ou mesmo permitindo uma opção por uma das leis em 
conflito abstrato – solução flexível e aberta, de interpenetração, ou mesmo a solução mais 
favorável ao mais fraco da relação (tratamento diferente dos diferentes)”.3 
Eis que o diálogo entre as fontes ora se dará através da aplicação conjunta de duas normas ao 
mesmo tempo, ora mediante a complementação de uma norma a outra, ora por meio da aplicação 
subsidiária de uma norma a outra. 
Conforme ensina o professor Flávio Tartuce, a primeira justificativa da aplicação da teoria do 
diálogo das fontes estaria na sua funcionalidade, pois atualmente o operador do Direito se depara 
com uma enorme quantidade de leis que leva o intérprete a um verdadeiro desnorteio4. O 
professor Tartuce expõe em sua obra interessante passagem tirada da obra de Claudia Lima 
Marques5, nas quais são expostas as razões para aplicação da teoria: 
“Para [Erik] Jayme, o direito como parte da cultura dos povos muda com a crise da pós-
modernidade. O pluralismo manifesta-se na multiplicidade de fontes legislativas a regular o 
mesmo fato, com a descodificação ou a implosão dos sistemas genéricos normativos 
(‘Zersplieterung’), manifesta-se no pluralismo de sujeito a proteger, por vezes difusos, como o 
grupo de consumidores ou os que se beneficiam da proteção do meio ambiente, na pluralidade de 
agentes ativos de uma mesma relação, como os fornecedores que se organizam cadeia e em 
relações extremamente despersonalizadas. Pluralismo também na filosofia aceita atualmente, 
onde o diálogo é que legitima o consenso, onde os valores e princípios têm sempre uma dupla 
função, o ‘double coding’, e onde os valores são muitas vezes antinômicos. Pluralismo nos direitos 
assegurados, nos direitos à diferença e ao tratamento diferenciado aos privilégios dos ‘espaços de 
excelência’ 
Outro fundamento para a aplicação da teoria do diálogo das fontes é o de que as leis surgem para 
ser aplicadas e não excluídas umas pelas outras, mormente quando possuem campos de aplicação 
convergentes. Verbi gratia, não é possível que as relações jurídicas de consumo sejam regidas 
unicamente pelo Código de Defesa do Consumidor com a exclusão da aplicação do Código Civil. 
Segundo a lição de Flávio Tartuce, pela tese do diálogo das fontes, “supera-se a ideia de que o 
Código Consumerista seria um microssistema jurídico, totalmente isolado do Código Civil de 
2002”. 7 
Verifica-se, portanto, que a teoria do diálogo das fontes também tem o fito de evitar exclusões 
impertinentes de normas jurídicas, uma vez que não apenas o excesso de normas pode ser 
prejudicial para o aplicador da lei. Também se busca que o ordenamento jurídico seja interpretado 
de forma coerente, evitando distinções injustas.

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