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Processos de Conformação Mecânica – Aula 05 Trefilação Prof. Leandro E. Falqueto E-mail: leandro.falqueto@hotmail.com 1. Introdução • O processo de trefilação pode ser utilizado para fabricação de fio, cabos e arames. • Também pode ser utilizado para acabamento superficial ou correções dimensionais de tubos, barras ou arames. • Os faraós egípcios usavam adornos de ouro em forma de arame trabalhado a quase 3000 A.C. • Mas a fabricação de arames tal como conhecemos hoje só teve início no século XIV, pouco antes do período renascentista. • A difusão do telégrafo e a consequente demanda por fios condutores levou a trefilação a sofrer um grande avanço. 2. Conceito • O processo consiste em tracionar-se o material a ser deformado, passando-o através do furo de uma ferramenta. • Uma parte da deformação é produzida pela reação da matriz no material e outra parte pela estricção. – Quanto mais dúctil for o material, maior será a contribuição da estricção. Vídeo 3. A ferramenta • A ferramenta utilizada é denominada fieira. • Ela possui um furo cônico que possibilita a redução do diâmetro do fio ou arame com manutenção do volume. – Com isso, ocorrerá redução de seção sem a perda de volume de material. • A fieira é constituída de um núcleo feito de um material extremamente duro, alojado numa carcaça de aço carbono. • O núcleo da fieira deve ser duro e resistente, podendo ser fabricado em aços resistentes ao desgaste, produtos cerâmicos (óxidos) sinterizados, dentre outros. • Tradicionalmente utiliza-se WC (carbeto de tungstênio), que é um material extremamente duro e de fácil fabricação. • Quando um furo desgasta, excedendo as dimensões de norma, pode-se reabrir para bitolas maiores. • No caso da trefilação de materiais mais duros, pode-se utilizar núcleos fabricados em diamante sintético. • Abaixo está apresentado a geometria do núcleo da fieira. • O paralelo define a dimensão final do produto trefilado. • α é o ângulo de redução ou aproximação e deve ser determinado de modo a maximizar a vida útil da ferramenta com menor consumo de energia. • β é o ângulo de entrada que serve para auxiliar a lubrificação, feita, preferencialmente, com lubrificantes sólidos. 4. Lubrificação • Apesar de óleos e graxas poderem ser utilizado, recomenda- se o uso de lubrificantes sólidos (sabão) a base de cálcio, sódio ou lítio. – O sabão é um lubrificante seco na forma de pó que, ao ser colocado no porta-ferramenta, cobre completamente o fio e a fieira. – A eficácia da lubrificação é garantida quando o fio e a ferramenta estão completamente submersos. 5. Condições de trefilação • Todo o processo é realizado a frio, embora calor considerável seja produzido devido à própria deformação (atrito interno) e, principalmente, devido ao movimento relativo entre o material e a ferramenta. – Por isso, para refrigerar a fieira, utiliza-se canais para circulação de água no seu corpo. • A velocidade de trefilação varia com o material que está sendo trabalhado. – De modo geral, busca-se utilizar uma velocidade que maximize a vida útil da ferramenta. – Dependendo dos parâmetros, pode-se trefilar fios com velocidades entre 10 a 100 m/s. • Grandes reduções podem ser feitas através de sucessivos passes. – Dependendo do estado da matéria prima, é possível produzir-se reduções totais de até 85 a 90%, sem utilizar tratamentos térmicos intermediários. • Quando a matéria-prima apresenta ovalizações ou defeitos superficiais, um passe com uma pequena redução (de 2 a 5 %) deve ser utilizado para as devidas correções. • Deve-se, no entanto, evitar passes sucessivos com pequenas ou grandes reduções, pois podem surgir defeitos causados pela não homogeneidade da deformação. – A homogeneidade da deformação é, portanto, critério para definir o % de redução. 6. Preparação da matéria-prima • Como matéria-prima são utilizados arames, barras e tubos extrudados. – Na indústria de fabricação de fios e arames, a matéria-prima recebe o nome de fio máquina. • Eles são produzido pelo processo siderúrgico de laminação a quente ou extrusão (caso dos tubos), podendo apresentar uma fina camada de óxido (carepa). • Essa carepa é dura e, caso não seja removida, causa elevado desgaste na fieira. • Tradicionalmente, a eliminação dessa camada de óxido é realizada por decapagem química ou descascamento mecânico. – Opcionalmente, pode-se fazer uma deposição eletrolítica de um filme de cobre ou estanho para aumentar a velocidade de trefilação dos arames ou fios de aços. 6.1. Decapagem química • Na decapagem química, o material é imerso numa solução aquosa de 20 % de H2SO4 ou de HCl. • O tempo de permanência no banho depende da espessura da carepa, mas, para melhor eficácia, o processo deve ser realizado a 40 °C. • Após a remoção da carepa, o material deve ser removido e imediatamente levado à neutralização. – Para isso, ele é imerso num tanque com óxido de cálcio (CaO). • Depois de neutralizado, o material pode ser seco numa estufa e, posteriormente, encaminhado para a trefilaria. • Esse processo gera resíduo que deve ser tratado antes de sua eliminação, o que torna o processo mais caro. Antes Depois 6.2. Descascamento mecânico • Como já dito, a decapagem química é dispendiosa e gera resíduos que pode causar problemas ambientais. • Por isso, pode-se recorrer a técnica de descascamento mecânico, no qual a carepa é removida por quebra e escovamento. • O material passa ziguezagueando entre roletes dispostos na horizontal e na vertical, causando a quebra da carepa. • Posteriormente ele é escovado para finalização da remoção da carepa. 7. Equipamento para trefilação • O equipamento utilizado na indústria da trefilação é a trefiladora. • Na sua forma mais simples, é constituída de um desbobinador, um cabeçote motorizado com porta ferramentas, um carretel cônico (serrilho) e um rebobinador. • O fio, ao sair do desbobinador, passa pela fieira para redução e é rebobinado na própria trefiladeira, com o auxílio de um carretel cônico. • A trefiladeira pode ser composta de cabeçote simples ou cabeçotes múltiplos. • Cabeçote simples: – É utilizada em pequenas indústrias ou como equipamento periférico. – Permite apenas uma única redução de espessura. • Cabeçote múltiplo – Utilizada em grandes trefilarias de siderúrgicas para produção em larga escala de fios e arames. – Permite várias reduções em sequência. Vídeo 8. Definição do trabalho redundante • Para entender e quantificar o trabalho redundante, vamos considerar um estiramento realizado numa fieira de baixo atrito e compará-lo com outro produzido por tração uniaxial. • Para deformar uniaxialmente um fio, seria necessária uma tensão σU. E, para obter a mesma deformação pelo processo de trefilação, utiliza-se uma tensão σT. • Porém, ao aplicar a tensão σT em uma deformação uniaxial, seria obtida uma deformação virtual ε*. • Assim, o trabalho redundante é encontrado pela diferença entre a deformação verdadeira (ε) e a deformação virtual (ε*). • Como a área sob a curva tensão x deformação é proporcional à energia da deformação, temos que: – A energia gasta para obter a deformação uniaxial é o trabalho útil (UP); – E a diferença entre as áreas de ε e ε* equivale à energia dissipada pelo trabalho redundante (UR). Deformação por trefilação Deformação por tração 9. Influência do ângulo de redução • O trabalho plástico ou útil na fieira depende apenas da redução que é dada pela diferença de diâmetros de entrada e saída do material.• Mas a energia total gasta no processo deve levar em conta, ainda, a energia relativa dissipada no processo. • A medida que o ângulo da fieira aumenta, essa energia devido ao atrito (UA) diminui. – Isso ocorre porque a deformação passa a ser feita pela redução, reduzindo a componente horizontal da reação com a fieira. – Além disso, quando há o incremento da estricção, a área de contato entre a fieira e o material diminui, reduzindo ainda mais os efeitos do atrito. • Por outro lado, o trabalho redundante aumenta com o aumento do ângulo da fieira. – Isso ocorre porque, a medida que o ângulo aumenta, as zonas de fluxo restringidos (zona morta ou zona de estagnação) também aumentam. – Logo, a energia necessária para a deformação cresce. • Considerando que o trabalho total é dado pela soma das contribuições individuais do trabalho plástico (UP), trabalho redundante (UR) e trabalho devido ao atrito (UA), vemos, no diagrama abaixo, que existem um ângulo α* (ângulo ótimo de fieira), no qual o trabalho total (UT) é mínimo. UT = UP + UR + UA Ângulo ótimo de fieira (α*) implica na menor UT. • O ângulo da fieira também influencia nos esforços de trefilação. – Para valores de α próximos ao ângulo ótimo, o comportamento é parabólico, como na energia. – Aumentando-se o ângulo, atingi-se αC, que é o ângulo crítico. – A partir desse ponto, surgem as zonas mortas, devido ao incremento da estricção, e a tensão tem um crescimento atenuado devido a redução de contato entre o material e a matriz (diminuição do atrito). – O aumento atenuado da tensão continua até que nenhum escorregamento metal/fieira seja produzido. – Nessa condição, o ângulo é chamado de supercrítico (αSC). – A partir de αSC, a tensão de trefilação volta a diminuir até se estabilizar. – Isso ocorre porque, a partir desse ângulo, o material passa a ser descascado ao invés de reduzido. 10. Estimativa de esforços na trefilação • Considerando φ = ε*/ε como um termo representativo do incremento do trabalho redundante, temos: é a tensão de escoamento; é a área de entrada; é a área de saída; é o incremento do atrito. 11. Efeito dos parâmetros da trefilação sobre a microestrutura • Quando a redução ocorre de forma correta (17 a 22% por passe), a deformação é homogênea e todo agregado policristalino alonga-se uniformemente na direção do estiramento. • Se a redução por passe é pequena (δ<< 10%), a deformação não tem profundidade e o alongamento é localizado apenas na superfície. • Como efeito da situação apresentada, a região alongada tende a se contrair e a região que não se alongou, tende a se alongar. • Desse modo, o trefilado apresentará tensões trativas no centro e compressivas na superfície. • A medida que esse gradiente se intensifica, com o incremento de cada passe, a probabilidade de trincamento interno aumenta, podendo levar o material à fratura. • No caso de redução excessiva (δ>> 22 %), o estiramento tende a se localizar na região central do arame. • Com isso, o gradiente se inverte, tornando trativo na superfície e compressivo na região central. • Após sucessivos passes, surgirão trincas externas na forma de ponta de flecha, também conhecidas como Chevron. 12. Tratamentos térmicos intermediários • Os materiais trefilados podem ser produzidos com diferentes níveis de dureza, dependendo da quantidade de passes que este sofrer. • Algumas vezes, para dar continuidade ao processo, são necessários tratamentos térmicos intermediários para reverter o encruamento, reduzindo a tensão de escoamento do material. • Dependendo da composição química e das características microestruturais do material, dois tipos de ciclos térmicos podem ser produzidos. 12.1. Recozimento • Aplicado à ligas não ferrosas e aos aços de baixo teor de carbono. • O tratamento consiste no aquecimento do material deformado em um forno com ou sem atmosfera controlada (o que depende do material). • O material permanece no forno até que as propriedades deste sejam reestabelecidas, tomando referência o estado antes da deformação. Ciclo térmico para o recozimento. 12.2. Patenteamento • Uma das características mecânicas que melhor caracteriza a trefilabilidade de um aço alto carbono é a estricção. – Quando a estricção atinge valores próximo a 70 %, pode-se obter uma redução de até 55-60 % no arame, sem necessidade de tratamentos térmicos intermediários. • Caso o tratamento térmico anterior (recozimento) fosse aplicado a um aço desse tipo, a recristalização seria acompanhada de modificações microestruturais, devido a difusão do carbono. – Por exemplo, a estrutura de perlita passaria por um processo de transformação, alterando as propriedades do material. • Para evitar esse problema, utiliza-se o tratamento térmico conhecido como patenteamento. – Nele, o aço é recozido no domínio austenítico e, após o processo de recristalização, deve ser resfriado bruscamente até a temperatura de formação da perlita fina (temperatura de patenteamento). – O material é mantido num meio isotérmico (banho de chumbo) até que a austenita metaestável se decomponha em perlita fina. • Desse modo, as propriedades de ductilidade e estricção do aço de alto teor de carbono são mantidas. Ciclo térmico para o patenteamento. 13. Processo de trefilação de tubos • Tubos cilíndricos ocos podem ser fabricados por processos de conformação a quente e recebem acabamento pelo processo de trefilação. – Esse processo é utilizado com a finalidade de se obter tolerâncias dimensionais mais acuradas e melhor acabamento superficial. – Também é utilizado para produzir tubos com paredes mais finas ou diâmetros menores do que aqueles que podem ser obtidos pelos outros processos. Vídeo 13.1. Trefilação sem plug ou madril • Como o interior do tubo não é suportado, a parede se torna ligeiramente mais espessa e a superfície interna irregular. • Como, nesse caso, na entrada e na saída da fieira, o cisalhamento é grande, a deformação redundante é maior e a deformação limite menor do que os outros processos. 13.2. Trefilação com plug estacionário • Nesse caso, tanto o diâmetro interno e o externo são controlados. • O plug pode ser cilíndrico ou cônico e controla o tamanho e a forma do diametro interno, resultando num processo com precisão dimensional superior ao anterior. • O atrito no plug é crescente, por isso a redução de área raramente supera os 30 %. Plug estacionário 13.3. Trefilação com plug flutuante • Um plug é cuidadosamente posicionado flutua na “boca” da fieira. • Podem proporcionar redução de área de até 45 %. • Apresenta menores cargas de trefilação para uma mesma redução que no caso do plug estacionário. • Permite a trefilação e o bobinamento de tubos longos. • A lubrificação e o desenho das ferramentas são um dos limitantes dessa técnica. Plug flutuante 13.4. Trefilação com mandril passante • O mandril consiste numa barra longa e dura que se estende por todo o comprimento do tubo, o qual é puxado pela tenaz junto com o tubo, através da matriz. • A força de trefilação é transmitida ao material, parcialmente pela puxada na seção da saída e parcialmente pelas forças de atrito que atuam ao longo da interface tubo-mandril. • Após a trefilação, o madril é removido do interior do tubo por meio de uma retificadora que aumenta ligeiramente o diâmetro do tubo, alterando as tolerâncias dimensionais. Mandril passante Vídeo
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