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Aula 1: Currículo: uma Palavra e Inúmeras Concepções
Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Refletir sobre os diversos significados da palavra “currículo” e analisar o sentido dessa polissemia conceitual; 
2. estabelecer relações entre currículo, sociedade e cultura; 
3. compreender a relevância das contingências políticas, históricas e sociais na constituição dos discursos sobre o currículo, e suas implicações para a prática educativa e para o trabalho docente.
O que é currículo?
Questões referentes ao currículo têm-se constituído em frequente alvo da atenção de autoridades, professores, gestores, pais, estudantes, membros da comunidade. Quais as razões dessa preocupação tão nítida e tão persistente?
Será mesmo importante que nós, profissionais da educação, acompanhemos toda essa discussão e nela nos envolvamos? Não será suficiente deixarmos que as autoridades competentes tomem as devidas decisões sobre o que deve ser ensinado nas salas de aula?
A quem cabe discutir questões sobre o currículo? Qual a sua relevância para a formação de educadores e para a prática educativa?
O currículo tem sido de fato objeto de discussão nas escolas? Em caso afirmativo, como ele se dá?
O que se entende por currículo e como ele entra no cenário escolar: como protagonista ou figurante? As indagações feitas por Moreira e Candau (2007) são um bom ponto de partida para iniciarmos nossas reflexões sobre o currículo.
Se analisarmos as práticas escolares ao longo dos tempos, podemos constatar que as respostas a essas questões podem variar, pois, de acordo com os diferentes contextos, tempos, atores e espaços, o currículo assume papéis e significações também diferentes.
Você pode verificar isso, na prática, se fizer uma entrevista informal com algumas pessoas, do campo educacional ou não, fazendo a seguinte pergunta: 
“O QUE É CURRÍCULO?”
É muito provável que as respostas variem bastante e tragam noções muito distintas. É importante observarmos que o que se entende por currículo, hoje, provavelmente traz uma “herança conceitual” dos múltiplos sentidos atribuídos ao currículo em outros contextos. E essa polissemia não acontece por acaso.
Diferentes fatores socioeconômicos, políticos e culturais contribuem para que o currículo seja entendido como: 
- os conteúdos a serem ensinados e aprendidos;
- as experiências de aprendizagem escolares a serem vividas pelos alunos;
- os planos pedagógicos elaborados por professores, escolas esistemas educacionais;
- os objetivos a serem alcançados por meio do processo de ensino;
- os processos de avaliação que terminam por influir nos conteúdos e nos procedimentos selecionados nos diferentes graus da escolarização. 
(MOREIRA e CANDAU, 2007, p.18)
Essa multiplicidade se revela não só nos discursos informais sobre currículo, seja na escola ou fora dela. Também expressa diferentes concepções teóricas sobre currículo e o que cada uma delas privilegia. Assim, chegamos a uma primeira conclusão: os estudos sobre currículo não se pautam em uma única teoria do currículo, mas em “teorias do currículo”. Mas cabe outra pergunta antes de analisarmos os porquês dessa polissemia, dessas múltiplas concepções de currículo: O que entendemos por “teorias do currículo” e, consequentemente, por “teoria”?
Ao fazer uma análise crítica dos paradigmas científicos que delineiam os estudos sobre currículo, Silva (2004) problematiza a noção de teoria como descoberta do real. Segundo o autor, essa concepção parte de um pressuposto de que há, a priori, uma realidade a ser encontrada ou desvendada. A teoria apenas a refletiria, a representaria. Assim, uma teoria do currículo teria a função apenas de descrever e explicar o currículo como algo já existente.
Partindo dessas premissas, em nossas aulas, ao tratarmos de “teorias do currículo”, as conceberemos como produções de discursos sobre o currículo.
Assim, nos diferentes discursos ou teorias sobre currículo, estão implicadas diferentes concepções de sujeito, de homem, de sociedade e de cultura, e não aleatoriamente. Sendo construções, e não apenas descrições de uma realidade, são configuradas social e historicamente. Tomando metaforicamente a etimologia da palavra currículo (curriculum = pista de corrida), entendemos que os “rumos” e “trajetos” desse campo do saber são múltiplos e complexos, resultantes dos diferentes contextos, dos diferentes paradigmas, das diferentes funções que ele vem assumindo na prática pedagógica, ao longo dos “percursos percorridos” em diferentes tempos, cenários e espaços.
POR QUE DISCUTIR SOBRE CURRÍCULO?
É inegável que o currículo nunca foi figurante no cenário escolar. Mesmo que ainda não fosse nomeado dessa forma, desde os primórdios da instituição escolar o currículo teve um papel relevante na docência, pois nele se corporificavam as diversas ações do processo de ensino-aprendizagem. Partindo-se da ideia de currículo como “[...] as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades de nossos(as) estudantes.”, (MOREIRA ; CANDAU, 2007, p.18), torna-se evidente que em qualquer tempo e espaço, é em torno dele que a prática educativa acontece. Discutir currículo é, portanto, discutir a ação educativa em suas diferentes instâncias. Refletir sobre o currículo implica analisar criticamente cada ação que constitui o “educar”, considerando essa palavra em seu sentido amplo. 
Nesse sentido, é fundamental refletir sobre as relações entre currículo, formação e atuação docente, já que os professores têm um papel importante no processo curricular por estarem, muitas vezes, em suas mãos as diferentes decisões e ações, que se constituem os atos de currículo.
Os docentes participam da construção do currículo e do delineamento de seu “contorno”, quando: Selecionam os conteúdos que serão trabalhados com seus alunos. Definem as abordagens que serão dadas a esses conteúdos, isto é , que conhecimentos, visões de mundo, de sujeito,de sociedade, de cultura serão privilegiadas. Planejam o modo como serão trabalhados os conteúdos: que enfoque metodológico será utilizado; que experiências e formas de interação serão proporcionadas e privilegiadas, etc; posicionam-se frente aos conhecimentos e experiências prévias de seus alunos, valorizando-os ou não. Avaliam a aprendizagem: Como encaram os erros e acertos dos alunos, o que e como privilegiam em suas avaliações, que instrumentos utilizam; como comunicam para os alunos, suas famílias o que aprenderam e o quem precisam aprimorar.
Em cada uma dessas ações cotidianas, o currículo se configura a partir da forma como se concebe a sociedade, os alunos, os conhecimentos, a cultura, o processo de ensino-aprendizagem, os métodos, a avaliação.  Ele não se restringe ao domínio técnico-
-metodológico, visto que é um artefato social e cultural, no qual cada um desses atos de currículo pode assumir diferentes nuances, dependendo do contexto em que é produzido, das intenções e concepções que permeiam essa produção. 
Como ressaltam Moreira e Silva (1994),
Assim, as escolhas e ênfases dadas na construção do currículo implicam uma ação política, pois elas são responsáveis pela formação de sujeitos, isto é, pela formação das identidades desses sujeitos. Formamos para a submissão ou para a transformação. Os alunos aprendem muito mais do que disciplinas através dos atos de currículo. Aprendem visões de mundo, de cultura, de si próprios. O que se ensina e como se ensina, a forma como o processo de ensino-aprendizagem é entendido e mediado, o que, como e por que se avalia são fatores que determinarão o que serão os alunos. Se o conhecimento, que constitui o currículo, não é neutro, então este assume uma importância vital na constituição dos sujeitos e de suas subjetividades.
SOBRE ALGUNS SENTIDOS DA POLISSEMIA DO TERMO “CURRÍCULO”.
A diversidade de sentidos que a palavra currículo apresenta no cotidiano escolar ou na sociedade é reflexo, também, dos processos de construçãodo currículo como campo de saber. As ênfases dadas por esses estudos revelam tensões, conflitos e concepções que transcendem a abordagem epistemológica, o entendimento sobre o que é conhecimento. O que é privilegiado em cada um desses estudos, a forma como concebem a “realidade” se relaciona com questões de poder. Assim, a seleção dos conhecimentos que configurarão os estudos e a preponderância de uma identidade ou subjetividade sobre outras são operações de poder e situam as teorias do currículo num campo epistemológico social, em um território contestado, no qual há uma luta que vai além das ideias, das “teorias”, uma luta de poder, onde têm um papel central na atividade de garantir o consenso, de obter hegemonia. (SILVA, 2004). É nessa “luta” epistemológica, ideológica e política que o campo do currículo vem se constituindo e emerge como uma resposta não só às demandas do cotidiano escolar, mas da sociedade. Assim, vamos ver o currículo transitar por diferentes enfoques, cada qual imprimindo a ele sentidos diferentes. O que nos interessa, nesta aula, é compreender que, seja no período anterior à emergência do currículo como campo de saber, seja depois, as tendências e concepções são múltiplas e estreitamente vinculadas às relações entre currículo, cultura e sociedade e às relações de poder. O que nos interessa é aprofundar o entendimento do currículo, entendendo que o movimento pendular do currículo tem sentidos que são complexos e envolvem posicionamentos ideológicos e políticos. É fundamental, portanto, entendê-lo como artefato social e cultural, determinado social e historicamente, cujos “artesãos” protagonistas são os professores, que têm em suas mãos o pensar e o fazer educação, a práxis pedagógica. A polissemia do currículo deve ser objeto de análise e reflexão de educadores, pois o entendimento de que o fazer pedagógico transcende o pensar sobre “como se faz currículo”, sobre os seus aspectos técnico-metodológicos, nos aponta para novas dimensões e reflexões - ideológicas, intercríticas e multirreferenciais – e nos instiga a pensar sobre “o que o currículo faz com as pessoas e com as instituições” e sobre o compromisso sócio-pedagógico e político da formação e da prática docente. (MACEDO, 2007)  . Assim, “[...] entender a criação de um currículo é algo que deveria proporcionar mapas ilustrativos das metas e estruturas prévias que situam a prática contemporânea.” (GOODSON, 1998, p.21, apud MACEDO, 2007, p.29). 
Entender e refletir sobre a polissemia do currículo é tomar posse dos “mapas conceituais” que constituem as referências da trajetória dos discursos do currículo e da construção desse campo de saber. É ter em mãos os caminhos percorridos e a possibilidade de escolher novos caminhos, ter consciência da importância desse artefato cultural e de seu papel na ação educativa.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR CONSULTADA E/OU DE REFERÊNCIA
GOODSON, I.F. Currículo: Teoria e história. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
MACEDO, R. S. Currículo: Campo, conceito e pesquisa. Petrópolis: Vozes, 2007.
MOREIRA, A. F. B. e SILVA, T. T. (Orgs.). Currículo, cultura e sociedade.
São Paulo: Cortez, 1994.
__________ e CANDAU, V.M. Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
Nessa aula você:
Compreendeu que a polissemia da palavra “currículo” revela diferentes maneiras de conceber os sujeitos, a sociedade, o conhecimento, a cultura; 
refletiu sobre a importância do papel da escola e dos educadores nos processos curriculares e na formação dos sujeitos e, consequentemente, na reprodução ou transformação da sociedade; 
aprendeu que, mesmo antes do currículo se constituir como campo, essa diversidade de sentidos já permeava os discursos sobre currículo e que as teorias do currículo revelam distinções que transcendem a abordagem epistemológica, pois expressam uma luta pela hegemonia e estão relacionadas com questões de poder; 
analisou a importância das reflexões sobre o currículo e sobre os sentidos dessa polissemia na formação docente, na medida em que os educadores têm um papel relevante na construção do currículo e na concretização desse artefato cultural através da prática educativa; 
analisou, também, a dimensão sócio-histórica e política da prática docente e sua relevância na construção das identidades e subjetividades dos estudantes. 
Aula 2: Currículo: Campo, Conceito e Relações. Aspectos Históricos, Contextuais e Educacionais
Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Conhecer os diferentes modos de conceber o conhecimento científico e distingui-lo do senso comum; 
2. refletir sobre o conceito de campo e suas implicações socioeconômicas, históricas e políticas; 
3. analisar o caminho de construção do campo e do objeto de estudo do currículo, suas contradições, tensões e desafios; 
4. compreender a importância das reflexões sobre as conceituações de currículo para os profissionais da educação. 
	Primeiramente, olhe para a figura de uma forma geral, sem se deter nos detalhes. O que você vê?
Agora, tente mudar o seu ângulo de visão: procure olhar a partir da direita, da esquerda, de cima e de baixo. Viu algo diferente? Se você viu uma jovem, repentinamente verá uma idosa e vice-versa...
Se ainda não conseguiu enxergar clique na figura.
ALGUNS PASSOS PARA VER A JOVEM:
O risquinho preto é um colar. Ele define o pescoço. Logo acima você encontra o maxilar da jovem, cujo rosto está voltado para o fundo da figura, como se algo estivesse lá. Tanto que sua boca é invisível e a gente vê apenas a pontinha do nariz e das pestanas.
ALGUNS PASSOS PARA VER A IDOSA:
Transforme o risquinho preto em boca e o maxilar da jovem em nariz. Sua figura aparece de perfil, nariz muito evidente, olhando para frente e para baixo.
Conseguiu, agora, perceber a transformação da imagem? Então, vamos refletir sobre essa experiência e entender qual a razão de iniciar nossa discussão sobre ciência com ela... Que relações você estabelece entre o tema de nossa aula e essa experiência? Anote suas hipóteses antes de prosseguir. Alguns aspectos envolvidos nessa experiência podem nos ajudar a estabelecer relações entre ela e o saber científico e a refletir sobre a ciência. 
No processo de observação e leitura desta imagem, o que podemos considerar como equivalente aos dados (fatos?), ao cientista, ao conhecimento científico (teorias)? 
Para dar continuidade à nossa reflexão, pense sobre essas perguntas: 
Durante a experiência, os dados (informações) mudaram ou permaneceram os mesmos?  
Se o que você viu foram os dados, e se considera que eles permaneceram estáveis, fixos, então como viu duas figuras distintas? 
O que fez com que a figura se modificasse? 
 Pois é, você já deve ter concluído que o que apreendemos da realidade não depende apenas dos dados disponíveis, mas da ação interpretativa do pesquisador, do observador. Vimos, na aula anterior, que há pensamentos divergentes sobre a neutralidade da ciência. Na perspectiva positivista, a teoria é entendida como uma descrição imparcial e objetiva dos fatos, da realidade. Na perspectiva pós-estruturalista, hoje predominante na análise social e cultural, a teoria é entendida como uma produção, uma criação da realidade, a partir do que é observado, pressuposto com o qual trabalharemos ao longo desse curso. Nesta perspectiva, fazer ciência não é uma atividade neutra, imparcial. Nietzsche já problematizava essa questão quando afirmou que não há fatos e sim interpretações...
Mas você deve estar se perguntando se a Ciência não é exatamente o conhecimento produzido para explicar os fatos, fenômenos e situações do cotidiano, para responder às infinitas perguntas que instigam e afligem a Humanidade... Você tem razão. Segundo Alves (1981) a ciência não é uma forma de conhecimentodiferente do senso comum; é apenas uma abordagem mais especializada, controlada e disciplinada desse conhecimento. O autor coloca em questão o mito que se construiu sobre a ciência e a ideia de que o cientista é uma pessoa que pensa melhor que as outras, que tem em suas mãos uma receita universalmente válida, válida para todos os casos, de que a sua palavra, por ser especialista, vale mais. Ao contrário, relativiza as diferenças e semelhanças entre esses dois tipos de saber.
O senso comum e a ciência são expressões da mesma necessidade básica, a necessidade de compreender o mundo, a fim de viver melhor e sobreviver. E para aqueles que teriam a tendência de achar que o senso comum é inferior à ciência, eu só gostaria de lembrar que, por dezenas de milhares de anos, os homens sobreviveram sem coisa alguma que se assemelhasse à nossa ciência. (ALVES, 1981, p.16) Para muitos autores, o que caracteriza o conhecimento científico e o distingue do saber não científico é sua abordagem sistemática da realidade e do objeto a ser pesquisado, o que envolve, em geral: a seleção de um problema; a formulação de perguntas ou questões que norteiam o olhar do pesquisador; a escolha da metodologia de pesquisa; a seleção de referenciais teóricos; a coleta e análise de dados; o levantamento de hipóteses; a elaboração de conclusões e de paradigmas; o levantamento de novas questões. Ressaltamos que todos esses “passos” ou “etapas do fazer científico” são permeados por escolhas que não são neutras, que são configuradas a partir do contexto no qual o conhecimento científico é produzido.
O olhar do pesquisador, portanto, reflete esse contexto, se direciona para um ou outro fragmento, um ou outro dado, de acordo com o que é privilegiado, com o que é valorizado por ele, pela sociedade e pela própria ciência. 
Assim, para os mesmos dados ou fatos, podem ser “vistas” ou “produzidas” diferentes configurações da realidade. A “figura-imagem” da realidade pode assumir diferentes “formas”, dependendo do modo como a olhamos e a analisamos, do que privilegiamos...
Essa discussão é muito importante para identificarmos como, na trajetória dos discursos sobre o currículo, este vai se configurando como campo e que lutas de poder nele são travadas. Para alguns autores (Moreira e Silva, 1994; Macedo, 2007), o interesse pelo currículo é muito anterior à origem do currículo como campo. “Mesmo antes de se constituir em objeto de estudo de uma especialização do conhecimento pedagógico, o currículo sempre foi alvo da atenção de todos os que buscavam entender e organizar o processo educativo escolar.” (MOREIRA E SILVA, 1994, p. 8-9) Ao analisar os primórdios dos discursos sobre o currículo, Macedo (2007) evidencia que desde a antiguidade grega e romana verifica-
-se uma preocupação com um aspecto que, durante muito tempo, foi o foco das discussões e teorizações sobre o currículo e que está presente até hoje: a organização dos conhecimentos, seja através dos planos, seja através da distribuição dos conteúdos por disciplinas.
No texto A República e as Leis, de Platão, por exemplo, o currículo é definido como um plano de estudos, sendo considerado por Macedo (2007) como uma inspiração do enfoque disciplinar que viria a seguir, e tomaria rumos religiosos durante a Idade Média, para se solidificar como uma forte tendência, desde o Iluminismo até a Modernidade. Silva (2004, p. 21) destaca a Didactica magna, de Comenius (século VXII) como um exemplo de que “há antecedentes na história da educação ocidental moderna, institucionalizada, de preocupações com a organização da atividade educacional [...] e a questão do que ensinar.”   
Assim, muito antes de o currículo se constituir um campo de estudos específico e especializado, os discursos sobre o currículo estiveram presentes, explícita ou implicitamente, nos discursos educacionais e pedagógicos formulados pelos atores que participam diretamente da ação educativa ou por teóricos das diferentes áreas ou campos, como a Filosofia, Pedagogia, Psicologia e Sociologia. Essas diferentes ideias sobre o currículo permearam as práticas educativas e contribuíram para a construção do campo do currículo.  
Como se constituiu o campo do currículo? Segundo Silva (2004) e Macedo (2007), a ideia de currículo mais difundida na modernidade, associada à organização e método, embora já fosse “anunciada” anteriormente, se consolidou efetivamente no final século XIX e início do século XX, nos Estados Unidos.  Foi na literatura educacional americana desta época que o termo “currículo” começou a ser designado como um campo especializado de estudos. 
Para Silva (2004), a emergência do currículo como campo de estudo está diretamente relacionada a diversos fatores, dentre os quais: a formação de corpo de especialistas sobre o currículo e a elaboração de um número expressivo de estudos que se configuraram como teorias do currículo; a formação de disciplinas e departamentos universitários; a institucionalização de setores especializados sobre currículo na burocracia educacional do estado e o surgimento de revistas especializadas. A origem do campo do currículo não ocorre por acaso nos Estados Unidos. Seu surgimento está relacionado às demandas socioeconômicas e políticas da sociedade capitalista e à institucionalização da educação de massas, marcante da sociedade estadunidense do início do século XX, e às condições a ela associadas. Estão entre essas condições: a formação de uma burocracia estatal encarregada dos negócios ligados à educação; o estabelecimento da educação como um objeto próprio de estudo científico; a extensão da educação escolarizada em níveis cada vez mais altos a segmentos cada vez maiores da população; as preocupações com a manutenção de uma identidade nacional, como resultado das sucessivas ondas de imigração; o processo de crescente industrialização e urbanização (SILVA, 2004, p. 22). John Dewey é um dos precursores de uma utilização do termo currículo na literatura americana. Em seu livro The child and the curriculum, escrito em 1902, com uma abordagem nitidamente inspirada nos ideários da democracia liberal, Dewey defende a ideia de que os interesses e experiências das crianças e jovens deveriam ser considerados no planejamento curricular, como elementos centrais do processo de ensino-aprendizagem. Sua preocupação é a de que a escola, entendida como espaço de vivência e prática de princípios democráticos, formasse sujeitos capazes de exercer um papel ativo na sociedade.  Essas ideias progressistas de Dewey estavam em dissonância com o discurso predominante da época, no qual a escola era vista, prioritariamente, como o local no qual as novas gerações seriam preparadas para o mercado de trabalho. Talvez por essa razão o pensamento de Dewey não tenha exercido tanta influência nos discursos pedagógicos americanos da época e na formação do campo do currículo.
	
	
AULA 3-Teorias Críticas do Currículo e seus Contrastes com as Teorias Não Criticas. Articulações Pós-Críticas
Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Refletir sobre a distinção entre as teorias do currículo críticas e não críticas e suas implicações para a prática educativa; 
2. analisar as contribuições das teorias críticas para a superação de concepções reducionistas e hierárquicas de currículo; 
3. identificar os contrastes, as convergências e possíveis interseções entre as teorias críticas e pós-críticas.
	
	
Aula 4: Cenários Formativos do Mundo Atual e Etnoeducação. A Práxis Educativa e seus Significados.
		Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Ressignificar o papel da escola e do conhecimento escolar no mundo contemporâneo; 
2. analisar as contribuições das teorias críticas e pós-críticas na busca de um novo olhar sobre as diferentes configurações sociais e culturais presentes na sociedadepós-modernas; 
3. conhecer os pressupostos da abordagem multiculturalista e suas implicações para a prática educativa; 
4. refletir sobre os processos de aprendizagem em diferentes cenários formativos e suas relações com o currículo. 
	
Vimos, nas aulas anteriores, os diversos pensamentos que influenciaram e constituíram as abordagens tradicionais e críticas sobre o currículo. Analisamos como as ideias desse campo foram se confrontando, complementando, dialogando e em que terreno surgem as ideias que darão sustentação às novas abordagens.
Agora, estudaremos os eixos centrais do pensamento pós-crítico, procurando compreender os principais conceitos teóricos que sustentam essa nova maneira de entender o currículo.
Pilares do pensamento pós-crítico: inaugurando novos olhares
Mundo no qual há a prevalência de determinadas significações, de determinadas visões de mundo, de culturas, que são veiculadas e assumidas como únicas pelo diferentes meios de comunicação e informação. Tempos nos quais a Internet, a TV, o Cinema, o Rádio, as Mídias impressas modelam modos de se vestir, de cantar, de apreciar, de ler o mundo, de ser no mundo. Paradoxalmente, através destes e de outros meios, os grupos dominados também abrem novos canais de expressão, começam a reivindicar vez e voz, manifestam-se. 
Clique no PDF para saber mais sobre este novo tempo.
Do Modernismo ao Pós-modernismo: Segundo Silva (2004), a educação como conhecemos hoje em dia é moderna, por excelência. Mas o que há de modernidade na educação e na escola? Não nos referimos aqui ao conceito de “moderno” mais usual, relacionado à ideia de atual, inovador. Quando nos referimos à escola “moderna” estamos nos referindo ao que há do pensamento moderno na instituição escolar e, é claro, no currículo. Mas será que a modernidade é tão evidente ou ela se “esconde” nos discursos e nas práticas curriculares, nos atos de currículo? Algumas questões podem nos ajudar a refletir e entender como a modernidade se expressa no cotidiano da escola: Por que há mais aulas de 
matemática do que de artes? Por que, em geral, os livros didáticos são mais valorizados do que produções de autoria dos professores? Onde se sustentam as ideias de “certo” e “errado” tão presentes no contexto escolar? Todos os alunos devem aprender as mesmas coisas, do mesmo modo, no mesmo tempo? Que cultura está mais presente e 
vale mais nos conteúdos curriculares da História, da Música, das Artes, da Geografia, das Ciências Naturais, da Língua Portuguesa/Literatura: a da classe dominante ou da dominada?
A escola é moderna porque “seu objetivo consiste em transmitir o conhecimento científico, em formar um ser humano supostamente racional e autônomo e em moldar o cidadão e a cidadã da moderna democracia representativa. É através desse sujeito racional, autônomo e democrático que se pode chegar ao ideal moderno de uma sociedade racional, progressista, moderna.” (SILVA, 2004, p. 111-112). Assim, a escola revela o pensamento moderno tanto no currículo mais visível, como no currículo oculto, quando privilegia um modelo de sujeito, uma cultura, quando coloca em polos opostos o saber popular e o saber científico, quando atribui unicamente aos alunos, e às suas famílias e grupo social, o sucesso e fracasso escolar, tendo como fundamento um padrão de comportamento, de cultura, de visão de mundo. 
A escola é “moderna” e esta modernidade é colocada sob suspeita pelo pensamento pós-moderno. Para Silva (2004, p. 111), “o pós-modernismo não representa, entretanto, uma teoria coerente, unificada, mas um conjunto variado de perspectivas, abrangendo uma diversidade de campos intelectuais, políticos, estéticos, epistemológicos.” Definição do pós-modernismo: O pós-modernismo define-se relativamente a uma mudança de época, a um tempo histórico que sucede o modernismo, que se inicia em meados do século XX. Pensamento do pós-modernismo: Por isso mesmo, o pensamento pós-moderno é multifacetado, amplo e complexo, não se restringe a uma área de conhecimento ou a determinados teóricos. Abarca distintos objetos de estudo e preocupações. O que as formulações que configuram o pensamento pós-moderno têm em comum é a crítica aos princípios da Modernidade, época histórica que o antecedeu. Vamos analisar quais as principais críticas que o Pós-modernismo faz à Modernidade e conhecer alguns de seus pressupostos. Segundo Silva (2004), o pensamento pós-moderno coloca em dúvida, dentre outros aspectos: as ideias iluministas de razão e racionalidade.As noções de progresso e as verdades absolutas e inquestionáveis sustentadas pelo positivismo cientifico; 
Para os pós-modernistas, estes princípios modernistas dão sustentação às sociedades totalitárias, às relações de exploração e dominação, seja pelas estruturas estatais ou pelas estruturas organizacionais das empresas capitalistas. A escola, uma das principais instituições através da qual os princípios modernistas são veiculados e corporificados através do currículo, também é posta sob suspeita. O pensamento pós-moderno coloca em questão a herança modernista presente na escola e expressa pelo currículo linear, sequencial, estático, segmentado em disciplinas, que privilegia uma cultura como a única cultura, que supervaloriza o conhecimento científico em detrimento do conhecimento cotidiano, pois esta herança não mais responde aos desafios da contemporaneidade, dos tempos pós. Em síntese, as ideias pós-modernistas estão presentes no pensamento pós-crítico do currículo através da crítica contundente aos princípios modernistas presentes na prática educativa, que tornam o currículo um importante instrumento de dominação e exclusão dos indivíduos e grupos, em diferentes aspectos, “cientificamente” validados e, por isso mesmo, nem sempre visíveis e questionados. 
Do Estruturalismo ao Pós-estruturalismo: Embora Foucault rejeite ser categorizado como “pós-estruturalista”, podemos situar seu trabalho e seu pensamento como um pilar desta vertente teórica. Foucault viveu e produziu grande parte de sua obra numa época em que o pensamento marxista tinha grande importância e influência nas produções acadêmicas dos diversos campos do conhecimento. O conceito de poder na perspectiva marxista foi um dos focos de sua crítica. Dentre as principais contribuições deste pensador para a reflexão pós-estruturalista, podemos ressaltar o “deslocamento” que Foucault faz do conceito de poder. Ele desestabiliza os axiomas e paradigmas marxistas de poder, segundo os quais o poder estava atrelado às relações econômicas e de classe, ao defender a ideia de que ele não é tão fixo nem estável como pensavam os marxistas.
Clique no PDF e saiba mais sobre esta contribuição de Foucault.
Do Estruturalismo ao Pós-estruturalismo: Nestes tempos pós, pensar a vida social é, inerentemente, pensar os processos culturais, a cultura, pois é em torno dela e através dela que gira a vida social. A cultura é o centro do cenário social contemporâneo e tem sido enfatizada por autores de diferentes enfoques e campos do saber, passando a ser objeto de estudo de diferentes áreas e abrindo a possibilidade de estudos inter e transdisciplinares. Não por acaso, a abordagem multicultural do currículo surge nos Estados Unidos, com Peter McLaren, num momento em que lá se concentrava hegemonicamente o poder econômico. Um país que, como outros países ricos, atraiu para si um enorme fluxo migratório, em função da demanda por mão de obra e, consequentemente, no qual passou a coexistir uma diversidade de grupos raciais e étnicos.
No cenário multicultural e diverso da sociedade americana do final do século, o multiculturalismo emergiu como expressão da resistência de grupos culturalmente subalternizados – mulheres, negros/as, os/as homossexuais – à tendência homogeneizante do currículo universitário tradicional, no qual eram privilegiados os valores e representações da cultura dominante –  branca, masculina, europeia, heterossexual – expressos através dos seus cânones literários, estéticos e científicose transmitidos como universais, difundindo como “a cultura” o que era apenas uma cultura particular, de um grupo particular. Para esses grupos, o currículo universitário deveria ser múltiplo, multifacetado, incluindo a contribuição das diversas culturas, em particular as culturas dominadas (SILVA, 2004).
A abordagem pós-crítica do currículo, na qual se inserem as contribuições do pensamento pós-modernista, os estudos pós-estruturalistas e multiculturalistas, nos instiga a refletir sobre outros aspectos implicados na relação entre conhecimento, cultura e poder, que nos levam a pensar sobre alguns pontos que antes eram negligenciados. • De que forma a seleção e a organização dos conteúdos curriculares têm lidado com as diferenças? 
• Como os diferentes grupos sociais, raciais e étnicos são contemplados e representados no currículo? 
• Como a cultura de massa se expressa na cultura escolar? 
• Que lugar os conhecimentos cotidianos, sejam dos alunos ou professores ou de outros atores sociais, vem ocupando no contexto escolar? 
Estas e outras questões serão aprofundadas na próxima aula, quando estudaremos mais detalhadamente os atos de currículo numa perspectiva pós-crítica.
Aula 5: Atos do Currículo
		Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Conceituar “atos de currículo” a partir das contribuições teóricas críticas e pós-críticas do currículo; 
2. analisar os diversos aspectos que constituem os atos do currículo, compreendidos como eixo central do processo curricular: os conteúdos selecionados, a forma como são abordados, organizados, traduzidos em atividades e avaliados; 
3. refletir sobre as conexões entre os atos de currículo e o multiculturalismo, assim como sobre a importância desses atos na prática docente e na formação das identidades dos alunos, seja pelo seu papel transformador ou reprodutor da sociedade. 
	
“(...) os/as educadores não poderão ignorar, no próximo século, as difíceis questões do multiculturalismo, da raça, da identidade, do poder, do conhecimento, da ética e do trabalho que, na verdade, as escolas já estão tendo que enfrentar. Essas questões exercem um papel importante na definição do significado e do propósito da escolarização, do que significa ensinar e da forma como os/as estudantes devem ser ensinados/as para viver em um mundo que será amplamente globalizado, ‘high tech’ e racialmente diverso que em qualquer outra época da história.”
 
Henry Giroux (1995)
Nesta aula, aprofundaremos o olhar sobre os novos desafios que se impõem na sociedade contemporânea, pós-moderna, e sobre a importância da cultura nos processos de controle e mudança social que se configuram na instituição escolar, tentando esboçar respostas, mesmo que provisórias, para estas questões. Para isso, começaremos nossa reflexão retomando alguns pontos analisados na aula anterior e ampliando a discussão sobre a abordagem multiculturalista, de forma a subsidiar o debate sobre os atos de currículo.
Tempos pós-modernos: novos desafios para a prática educativa
A clássica compreensão de que a escola é um espaço social onde se ensina e se aprende, parece estar, nos tempos atuais, a exigir com urgência ressignificações. Se orientarmos a discussão para refletir e ou definir sobre o que a escola deve ensinar (para citarmos apenas um dos aspectos que esta compreensão pode envolver), encontraremos posicionamentos e formulações teóricas bastante distintas, algumas delas complementares e outras excludentes ou contraditórias, que se revelam, também, na formulação das propostas curriculares. Contudo, a reflexão sobre o papel dos conhecimentos escolares e a relevância e centralidade da cultura nos processos de construção das identidades dos alunos/as tem caracterizado o debate acerca do tema e nos impulsionam a analisar de que forma as modificações que vêm ocorrendo na sociedade, seja no âmbito da economia, da política, da cultura, das interações sociais, é significada e trabalhada nas salas de aula. Portanto, a reflexão sobre o que a escola deve ensinar está profundamente vinculada ao debate sobre como as transformações sociais vêm interferindo na construção das identidades dos sujeitos e de que forma a cultura assume um papel central nesse processo.  Tais evidências, inseridas na complexidade que caracteriza as transformações sociais do mundo contemporâneo, nos remetem a Forquin (1993) que, ao abordar as relações entre escola, cultura e modernidade, referenciado por dois outros autores - Paul Lengrand e Joffre Dumazedier - observa: “(...) que o mundo muda sem cessar: eis aí certamente uma velha banalidade. Mas para aqueles que analisam o mundo atual, alguma coisa de radicalmente nova surgiu, alguma coisa mudou na própria mudança: é a rapidez e a aceleração perpétua de seu ritmo, e é também o fato de que ela se tenha tornado um valor enquanto tal, e talvez o valor supremo, o próprio princípio da avaliação de todas as coisas (...). Em quê o mundo muda, por quê, em quais direções? (1993, p. 18,19)   
	Secretarias de Educação, sejam estaduais ou municipais, têm produzido inúmeras versões de propostas curriculares nos últimos anos. Assim como, a exemplo de outros países, foi feito a nível federal, pela Secretaria de Educação Fundamental do MEC, a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Da mesma forma, estudos produzidos no campo do currículo vêm apresentando contribuições que alimentam o debate e revelam a complexidade do tema. Ganha terreno, nesta área, uma diversidade de estudos que busca estabelecer relações entre o currículo e diferentes aspectos que caracterizam as discussões sobre cultura, educação e reformas do sistema educativo.
Alternativas para o currículo:multiculturalismo e diversidade cultural
Ao se referir às relações existentes entre cultura e escola, Silva (1995)   denuncia o enorme distanciamento “entre as experiências atualmente proporcionadas pela escola e pelo currículo e as características culturais (...),” próprias da realidade social. Para ele: “no novo mapa cultural traçado pela emergência de uma multiplicidade de atores sociais e por um ambiente tecnicamente modificado, a educação institucionalizada e o currículo continuam a refletir, anacronicamente, os critérios e os parâmetros de um mundo social que não mais existe.”
(p. 185) A desconstrução dos discursos e das narrativas hegemônicas e dominantes pela afirmação de narrativas e discursos alternativos dos grupos subjugados socialmente, devem ser, segundo o autor, um compromisso incorporado pela escola. Para isso, indica quatro componentes centrais representativos das novas configurações culturais e sociais que devem constituir-se como objeto de reflexão para a pedagogia e o currículo.
al entre povos e naçoes- Outro componente trata da relação cultural entre povos e nações dominantes e povos e nações dominadas e se insere na perspectiva crítica denominada pós-colonialismo. Para o autor, os processos de reprodução e perpetuação de relações de poder determinados pela hegemonia de uma determinada cultura sobre a outra devem ser desestabilizados e dasalojados pela escola e pelo currículo. Neste sentido, Silva (1995) argumenta que: “Num mundo como este, no qual conhecimento e poder estão intimamente entrelaçados e no qual os saberes subjugam, é extremamente importante uma perspectiva educacional e curricular que permita o desenvolvimento de visões alternativas das relações de dominação e subordinação entre culturas e nações.” (p. 194).
Novo cenário cultural- Um terceiro aspecto destacado pelo autor aponta a necessidade de a escola rever posições para lidar com o novo cenário cultural representado pela difusão e generalização das novas mídias. Para ele, tais transformações: 
“não podem ser interpretadas no registro conservador do pânico moral e da visão patologizante que vê a ampliação da influência da cultura popular e o predomínio dos novos meios e conteúdos culturais como uma ameaça a tradicionais valores e capacidades supostamente mais universais,humanos e superiores.” (p. 198)
Estudos culturais- Como último componente, o autor evidencia as contribuições de trabalhos desenvolvidos no campo dos Estudos Culturais, colocando em destaque a ideia do multiculturalismo. Nessa direção, sublinha que os diferentes aspectos do debate sobre o multiculturalismo, movimentos e identidades sociais devem ser incorporados ao processo de reflexão sobre a prática educativa, pois tal perspectiva
 “pode ser imediatamente transportada ao âmbito da escola e do currículo, pois as relações aí envolvidas não são abstratas e removidas do âmbito da prática. Elas estão presentes, manifesta e diretamente, no cotidiano de todos nós e no cotidiano da escola e do currículo.” (p.197). Da mesma forma, Candau ao discutir os conceitos de Multiculturalismo e Interculturalismo e suas implicações no campo educacional da América Latina, analisa as origens e os avanços destas correntes, assinalando que tais perspectivas, embora venham ocupando um espaço “crescente no nível internacional”, no contexto da América Latina, permanecem sendo “um desafio”. Como destaca a autora, muito embora possamos reconhecer que, desde o início do século, em alguns países latino americanos tenham se desenvolvido experiências educativas “orientadas a atender de modo mais adequado a diferentes grupos sociais e culturais marginalizados”, como no caso das populações indígenas. 
O que pode nos indicar a “hipótese de que a preocupação por uma educação que respeite a diversidade cultural emerge de modo original na América Latina e é muito anterior ao atual movimento de valorização desta perspectiva que se desenvolve no plano internacional.”- nossas escolas ainda permanecem cultivando uma cultura de “caráter monocultural”. Basta observar, como nos assinala a autora, que 
“o sistema público de ensino em nosso país (...), além de estar longe de garantir a democratização efetiva do direito à educação e ao conhecimento sistematizado, terminou por criar uma cultura escolar padronizada, ritualística, formal, pouco dinâmica (...) e está referida à cultura de determinados atores sociais, brancos, de classe média, de extrato burguês e configurados pela cultura ocidental, considerada como universal.” Outra questão discutida pela autora diz respeito à diferença que é preciso estabelecer entre o significado dos termos multiculturalismo e interculturalismo, “muitas vezes utilizados como sinônimos”.
Tal concepção deve refletir inúmeros aspectos envolvidos nos processos de interação que ocorrem em sala de aula.
Nesses processos professores e alunos entrecruzam “crenças, aptidões, valores, atitudes e comportamentos.” (p.88) - conferindo ao que se aprende ou ao que se  deixa de aprender uma dimensão real que não se limita aos conteúdos propostos e expressos no currículo escrito.
Assim considerado, “um currículo multicultural no ensino implica mudar não apenas as intenções do que queremos transmitir, mas os processos internos que são desenvolvidos na educação institucionalizada.”
(p.88). É preciso, dessa forma, reorientar a formação docente para evitar que se perpetuem visões e atitudes de não valorização de grupos sociais diversos e socialmente excluídos, considerar criticamente a utilização de materiais pedagógicos e, particularmente, dos livros didáticos que se apresentam carentes de uma visão multicultural, assim como levar em conta o conhecimento prévio dos alunos, obtido pelas experiências cotidianas e extraescolares, como alternativas necessárias e inerentes à viabilização de uma educação multicultural.  Neste sentido, é fundamental aprofundar a reflexão sobre o papel dos atos de currículo neste processo de busca por uma educação mais democrática, na qual as diferentes representações sociais possam ser contempladas. Atos de currículo: o currículo corporificado na práxis O que são atos de currículo? Qual o seu significado e importância numa perspectiva multirreferencial e intercrítica de currículo? Quais os seus pontos de contato com a abordagem intercultural? Estas questões nos ajudam a pensar no currículo em uma das principais instâncias onde ele se corporifica: a sala de aula. O termo Atos de currículo é um conceito que vem sendo desenvolvido pelo professor e pesquisador brasileiro Roberto Sidnei Macedo, no Grupo de Pesquisa em Currículo, Complexidade e Formação / UFBA - Bahia, a partir de uma perspectiva não formal, multirreferencial e intercrítica de currículo. Para compreendermos os aportes fundantes deste conceito, procuraremos sintetizar o que se entende por uma abordagem multirreferencial e intercrítica, segundo Macedo. Os conceitos de multirreferencialidade e intercrítica encontram-se, nas formulações de Macedo (2007), dialogicamente interligados, representando uma perspectiva que rompe com a ideia de disciplinaridade, tão presente nas abordagens modernas e estruturalistas de currículo.
Os atos de currículo, entendidos como toda ação socioeducacional através da qual o currículo é corporificado, têm um papel central nos processos  elencados, vistos no texto que você acabou de ler, pois é através deles que os processos de produção e negociação cultural ocorrerão na escola: na escolha dos conhecimentos que comporão o currículo e estarão presentes nas aulas (os conteúdos, as imagens, os textos, as músicas, as artes, o corpo, as linguagens); nas formas como os conhecimentos serão organizados e abordados (o que e como estará presente nos cadernos, nos livros didáticos, nos murais e em outros espaços); no modo como serão tratadas as diferenças (que valores e visões de mundo serão contemplados); na organização dos espaços e tempos escolares; nas expectativas positivas ou negativas que projetamos sobre a escola, os alunos, os grupos sociais, sobre nós mesmos. Um desafio que tem como protagonistas as culturas e suas interfaces.

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