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Poder ideológico e alienação

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Poder Ideológico e Alienação
O poder consiste na capacidade de exercer domínio e controle. É a possibilidade de agir e produzir os efeitos desejados sobre indivíduos ou grupos humanos. É a relação que se estabelece entre aquele que possui a força de dominação e aquele sobre o qual o poder é exercido. A relação de poder ocorre através da força física, econômica, política e ideológica.
A ideologia abrange o conjunto de idéias, normas e valores que determinam o modo coletivo de pensar e agir. Tem como finalidade produzir conceitos e verdades, geralmente definidas pela classe dominante, repassando-as para a maioria da população. Tem ainda a função de manter o modelo de relações sociais vigentes, adaptando os indivíduos às suas tarefas prefixadas, para que aceitem passivamente a sua condição de existência. 
O poder ideológico atua de forma sutil e complexa na sociedade. Para compreender com maior profundidade a estrutura e atuação desse poder, vamos analisar os diversos mecanismos que sustentam esta dominação. São os núcleos sociais, também chamados de instituições, que formam esta engrenagem. São os organismos como a família e a escola, já estabelecidos para adaptar e enquadrar o indivíduo na condição desejada. Junto a estas instituições, outras forças também exercem papel fundamental neste jogo ideológico. Podemos citar o sistema jurídico, a mídia através das notícias, entretenimento e propagandas, assim como próprio Estado.
Vamos abordar alguns desses mecanismos sociais, para demonstrar e exemplificar a influência ideológica que exercem.
Família
A família é a primeira instituição que atua sobre o indivíduo e o acompanha ao longo de sua vida. Qual o verdadeiro papel da família na formação do indivíduo? A própria família já não recebe a influência do modelo de sociedade estabelecida?
Podemos identificar dois modelos de estrutura e formação familiar. A família que forma de maneira autoritária e outra que adota maior liberdade nas suas relações, chamada dialogal.
Em nosso país, estamos superando a relação familiar machista, autoritária e hierárquica. No entanto, ainda persistem os critérios que estabelecem a dominação. 
No modo de produção capitalista, a família, mesmo consciente, não possui forças suficientes para resistir às influências que sofre pelo meio em que vive.
O exemplo que segue pode ajudar a compreender o papel da família diante do sistema no qual está inserida. 
Três casais, todos eram professores de uma universidade, resolveram socializar os seus esforços e decidiram integrar a estrutura de vida. Dois casais tinham dois filhos e o outro casal tinha um filho. Optaram por uma casa onde todos pudessem morar. Venderam tudo que tivessem repetido. Em vez de cinco carros, eles ficaram com três. Em vez de sete geladeiras, ficaram com duas. Em vez de três aspiradores, três batedeiras, três máquinas de lavar, de cortar grama... eles reduziram tudo a uma unidade. Os filhos brincavam e estudavam juntos. Se o casal quisesse sair à noite, não precisava pagar alguém que cuidasse dos filhos. Os professores, em vez de comprar três livros, compravam um. A biblioteca ficou repleta com os melhores livros! Eles podiam discutir os problemas em conjunto e a maioria dos alunos de especialização queriam ser orientados por um deles. Quando um não podia atender o aluno, outro o substituía. A biblioteca era disponibilizada para os alunos orientandos. O mais interessante é que começou a sobrar dinheiro. Os gastos se reduziram para menos da metade. Com isso puderam investir mais em pesquisa, livros, equipamentos, cursos, viagens. Os próprios filhos mostravam mais satisfação, tornaram-se mais seguros, integrados com os filhos dos outros casais, com a vantagem de um desenvolvimento mais sadio. Enfim, houve uma mudança muito grande para melhor na vida desses casais.
Esse fato nos leva a refletir sobre a influência que o sistema capitalista global exerce na vivência e formação das famílias. A característica que o sistema impõem é a individualização das pessoas e das famílias. Através da competição, as qualidades individuais são privilegiadas e as relações associativas são colocadas em segundo plano. As pessoas não são preparadas para viver coletivamente. É também importante para o sistema econômico, que se consuma a maior quantidade de produtos. Para isso cada família, mesmo que sejam só duas ou três pessoas, torna-se um agente consumidor. Cada família passa a ter toda parafernália de objetos que dia-a-dia são inventados e comercializados através de uma maciça propaganda que cria necessidades, na maioria das vezes supérfluas. A cada instante são criados novos desejos e que se transformam em necessidade. Toda essa relação com os bens materiais, destina-se para o lucro e os privilégios de uma classe. Quantos produtos temos em nossa casa e que seriam desnecessários!
Na família encontramos os momentos mais importantes para a estruturação da personalidade dos indivíduos. A vivência familiar é a base da formação que possibilitaria uma ruptura com as práticas do sistema. Ocorre que o próprio sistema não permite esta tomada de consciência. Para estabelecer uma resistência neste modelo social, é necessário o desenvolvimento da consciência também nas demais instituições que fazem parte da trajetória de vida das pessoas. 
Escola
A discussão sobre o poder ideológico da escola diz respeito à grande maioria das pessoas. Há uma vasta bibliografia sobre a função da escola e muitos escritos já assumem uma postura critica.
A escola faz parte da estrutura social. Como instituição, exerce o papel de produzir, reproduzir e legitimar as relações sociais já existentes. A educação de certo modo cria o modelo da sociedade em que se desenvolve e é criada por ela. 
É importante distinguir escola de educação. 
A escola consiste na estrutura criada por um grupo para manter seus interesses e sua ideologia. Representa a estrutura de controle dos que detêm o poder. Quando essa escola não executar a política e os interesses do grupo no poder, ela pode ser censurada, mudada, reformada e até mesmo fechada. Constitui-se num aparelho ideológico. 
Educação designa o processo de desenvolvimento das potencialidades do indivíduo. Do latim, ex significa de dentro de, para fora e ducere significa tirar, levar. Isto é, tirar de dentro duma pessoa, ou levar para fora alguma coisa que já está dentro dela. No processo educativo a pessoa não é uma “tábula rasa”, uma tela em branco. Nela já existem experiências, potencialidades que serão desenvolvidas e aperfeiçoadas ao longo do processo educativo. 
Essa distinção vai identificar as principais correntes que se verificaram através da história.
Podemos começar pela Grécia. Havia dois modelos de educação: o manipulador, usado pelos donos do poder e o libertador, representado pela escola de Sócrates, que partia do desenvolvimento da pessoa a partir dela mesma. O modelo socrático comparava o verdadeiro professor e o parteiro, que tira o humano do humano. Assim o educador deve tirar de dentro das pessoas o que já existe. Chamou este processo de Maiêutica, que consiste em formular perguntas, instigar ao invés de dar respostas prontas, obrigando as pessoas a desenvolver o seu próprio pensamento.
Mas este processo não agradou aos donos do poder e Sócrates foi acusado de corromper a juventude e perturbar a cabeça das pessoas. Consequentemente foi condenado à morte.
Para confirmar este controle da escola pela classe dominante, vejamos algumas afirmações históricas.
“Nunca houve tantos estudantes como hoje. Inclusive gente do povo quer estudar... Ensinam a ler e escrever a gente que só deveria aprender a manejar instrumentos... O bem da sociedade exige que o conhecimento das gentes não vá mais longe do que é necessário para a sua própria ocupação diária... Todo homem que saiba além de sua rotina diária, não será nunca capaz de continuar paciente no seu trabalho”. (La Chalotais, França, 1766)
Bernard de Mandevilleescrevia na mesma época:
“A fim de conseguir, mesmo em circunstâncias difíceis, uma sociedade harmônica e um povo dócil, nada melhor do que a existência de um grande número de analfabetos e de pobres; os conhecimentos alargam e multiplicam os desejos e quanto menos coisas uma pessoa desejar, mais fácil lhe será obtê-las”.
Na Inglaterra, em 1897, um projeto que visava oferecer escolas a todos, foi derrubado na Câmara dos Lordes, e entre outras razões estava esta:
“Em vez de ensinar-lhes subordinação, a escola os tornaria rebeldes... Poderiam então ler panfletos e livros perigosos... Tornaria-os insolentes ante seus superiores; em poucos anos, o resultado disso forçaria o governo a utilizar a força contra eles.”
No Brasil, a história recente do período militar estruturou a escola à imagem e semelhança do modelo autoritário. Vejamos algumas frases que ocupavam as páginas do material didático distribuído de norte a sul do país e que constam no livro: as belas mentiras.
“Mãe... é acolhedora, tranqüila, segura presa firmemente ao solo. Mãe é repouso e sossego. Quando a gente está cansada, ou triste, ou desiludida, ou desanimada ela nos conforta”.
“Lúcia trabalha comigo há vinte anos. Faz parte da família... Lúcia sabe que vovó Lilica e Beto gostam dela. Por isso, Lúcia é uma preta feliz”.
“Era uma vez um marceneiro que trabalhava desde manhã até a noite. Aplainava a madeira e cantava”.
“O operário mostra suas mãos cheias de calo, durante toda vida tocaram a terra, os fogos, os metais, estão vazias de riquezas, estão negras, cansadas, pesadas. Diz o senhor: que beleza! Assim são as mão dos santos!”
“a poupança é aquela coisa, caro amigo, que, colocando o dinheiro no cofrinho, quando ele está cheio, você está uma, duas, três vezes rico, rico, como um rei”
“O camponês sempre espera e a esperança é a parte melhor e mais verdadeira da alegria humana”
A escola no sistema capitalista adota o modelo de formação adequado para expandir sempre mais o poder de dominação. O efeito mais promissor para o capital é a preparação do indivíduo para a mão-de-obra e a reprodução das relações de exploração. Desde a instituição de ensino, suas normas e valores, passando pela formação e didática dos professores, o material utilizado, as dinâmicas de aula, o número de alunos, a forma de organização das carteiras em sala e o modelo de provas, compõem de maneira direta ou subjetiva os interesses para a formação desejada para cada indivíduo.
Paulo Freire, o mestre da educação em nosso país, alerta que os currículos e a metodologia de ensino aparentemente neutros, formam estudantes passivos que executam ordens sem questioná-las, como se a sociedade existente fosse fixa, pronta. Os cursos em geral, enfatizam a técnica e não o contato crítico com a realidade.
Já percebemos que a escola exerce um papel fundamental para que se mantenha o modelo de organização da sociedade. No entanto, num contexto democrático, o espaço escolar oferece também as condições para desenvolver uma postura inovadora, baseada no questionamento, na crítica e na mudança do modelo de sociedade vigente.
Igreja
Parece estranho que as igrejas possam compor uma estrutura a serviço das relações de dominação do sistema capitalista.
A abordagem se restringe ao campo da crítica sociológica do fenômeno religioso exercido pelas igrejas. A análise que segue, pretende contribuir para que a própria igreja estabeleça conduta coerente no seu papel social, superando a carga negativa de sua história. Ao sociólogo cabe examinar as relações e interesses subjacentes à estrutura da igreja, identificando os aspectos ideológicos que movem a prática religiosa.
A religião constitui um conjunto de mediações simbólicas baseadas nos princípios, normas, rituais e gestos, formando uma doutrina a serviço da sociedade. Ao longo da história, observamos que todas as formas de exercício do poder estão vinculadas à dominação religiosa. 
Os ditadores e impérios buscavam tornar absoluto seu poder em nome de Deus. Os governantes justificavam a dominação dos súditos alegando inspiração divina. Utilizavam a religião para legitimar o poder absoluto que exerciam. O sacrifício de pessoas, torturas, escravidão e oferendas mostra o reconhecimento e a aceitação da prática religiosa submissa. 
O Faraó sacrificava os judeus, os césares sacrificavam os cristãos. Os imperadores de Espanha e Portugal diziam-se no direito divino para o sacrifício de índios e escravos. No contexto atual, o imperialismo capitalista, em função do culto ao mercado, escraviza e exclui milhões de pessoas do terceiro mundo.
Neste sentido, Marx considera a religião o ópio do povo. É a ideologia religiosa domesticadora e alienante que usa o nome de Deus para melhor explorar e dominar. Quando a religião não exerce uma postura crítica diante da realidade social e não denuncia a corrupção do poder dominante, naturalmente ela se consagra como aliada a serviço dos opressores. A proliferação de novos templos, principalmente nos espaços urbanos mais pobres, é a evidencia de que a fé pode ser transformada em mercadoria.
Ao mesmo tempo em que a igreja ainda está vinculada ao poder dominante, várias iniciativas demonstram o espaço que ela oferece para a organização das pessoas na busca de solução dos problemas sociais. São as comunidades que se reúnem para organizar atividades que estimulam o compromisso social e político, revelando a igreja progressista e transformadora da sociedade e, consequentemente a transformação da própria igreja.
Meios de Comunicação
Os meios de comunicação são considerados a força ideológica mais eficiente e de maior abrangência de nossa sociedade. Talvez esteja no setor da mídia o segredo de existir uma sociedade com tantas contradições e injustiças, sem que haja manifestações de resistência e transformação. A comunicação consiste no instrumento mais importante de manipulação par impedir qualquer mudança no processo de exploração e dominação.
Os meios de comunicação determinam os fatos e a realidade. Algo passa a existir ou desaparecer no momento que é noticiado ou deixa de ser veiculado. A mídia não se empenha somente em distorcer os fatos. Muitas vezes silencia sobre determinado assunto.
Quem detêm ou tem acesso aos meios de comunicação, naturalmente possui influência, têm poder. No Brasil, os meios de comunicação estão nas mãos de poucas pessoas. Foram concedidos para aliados do governo durante o regime militar. A influência estrangeira é grande em todas as mensagens transmitidas. Grande parte dos patrocinadores são multinacionais, com interesses e controle sobre o conteúdo apresentado pela mídia. Os meios de comunicação tornaram-se reféns daqueles que detém o poder econômico e político tanto externo como internamente.
A cultura de uma sociedade sofre influência direta dos meios de comunicação. De forma subjetiva, um filme, a novela, a propaganda ou as notícias revelam um estilo de vida, um tipo de moradia, uma decoração, a maneira de vestir, de relacionar-se. A mídia aposta em mensagens subliminares. A padronização cultural visa o enfraquecimento e a desintegração da identidade cultural de cada região. O mercado da comunicação ignora as diferenças culturais e torna tudo homogêneo. O MacDonal´s é igual no Rio, em New York, em Tóquio, em Pequim e em Moscou. A globalização transforma tudo num imenso Big Mac.
O caso Nestlê ilustra a força ideológica da comunicação. A indústria criou o leite “que substitui o leite materno”. Para vender seu produto, fez intensa propaganda em todo mundo. Fornecia o leite de graça no começo. Quando as crianças estavam acostumadas ao leite artificial, as mães foram obrigadas a comprá-lo. Em alguns países onde 90% das mães amamentavam até os seis meses, depois da Nestlê, esta proporção baixou para 15 a 20%. Milhões de crianças morreram, pois as mães não tinham condições de comprar o leite. No entanto, o interesse maior estava no lucro gerado com a venda do novo produto.No jogo ideológico, as notícias constituem parte importante na formação da opinião pública. Elas podem construir ou omitir acontecimentos. A maioria das pessoas não possui capacidade crítica diante das notícias, aceitando como verdade tudo que lhe é transmitido. As notícias sempre são compostas de alguns elementos do fato acontecido.
 Por exemplo, uma manifestação contra a violência organizada por diversas comunidades reúne milhares de pessoas. Muitas manchetes, imagens e comentários poder ser produzidos a partir desse evento. No dia seguinte, na primeira página o jornal mais popular, com visão mais crítica, divulga o seguinte: “20 mil pessoas protestam contra a violência”. Outro jornal, vinculado à política da elite apresenta a notícia numa página secundária com o seguinte título: “Manifestantes provocam tumulto durante a passeata”. 
Podemos observar que as notícias são selecionadas em detalhes para representar determinados interesses. Aliás, isto pode ser demonstrado na própria sala de aula. Diante de um fato, a versão contada pelo professor geralmente difere da interpretação feita pelos alunos. 
O Sistema Jurídico
Na abordagem dos diversos mecanismos de manutenção do poder ideológico, nos deparamos com a estrutura jurídica. São as leis de todo tipo: as tradições, as leis familiares, os regulamentos, estatutos, leis penais, governamentais, constitucionais e morais. No campo do direito, interessa analisar e compreender o sentido dessas leis, o aspecto histórico e as razões que deram sua origem.
No enfoque positivista, também chamado funcionalista, as leis incidem sobre os acontecimentos de maneira fria e imediata. A simples aplicação da lei é sinônimo de justiça. Nesta condição, muitas sentenças são padronizadas, mesmo que os fatos envolvam circunstâncias diferentes, como por exemplo, a desigualdade econômica das partes que buscam os seus direitos. 
Não há questionamento sobre a motivação e os interesses da lei. A formação positivista desenvolve uma visão limitada sobre o direito. Orienta os operadores da lei para que julguem com segurança, aplicando pura e simplesmente o que a norma determina. O sistema legal é considerado a fonte neutra e absoluta da justiça. 
Na vertente crítica ou alternativa, há um pressuposto de que as leis são criação humana, elaboradas em determinado momento histórico e respondem aos interesses culturais, econômicos, políticos e sociais. Grupos com maior força de dominação, poder e prestígio possuem as prerrogativas para criar novas leis, fazendo valer a vontade particular sobre todos os outros. O direito alternativo propõem interpretações jurídicas de interesse social. Consolida uma resposta crítica ao sistema de leis. Sugere análise mais flexível, levando em consideração cada caso, resguardando as diferenças sociais e econômicas das partes.
Para demonstrar as possibilidades ideológicas inerentes ao sistema jurídico e os seus efeitos práticos na sociedade, vejamos o exemplo, que marca uma experiência pessoal.
No Rio Grande do Sul, cidade de Porto Alegre, o dono de uma área, somando vários terrenos, decidiu construir prédios, com a finalidade comercial dos apartamentos. Tendo avançado na construção, somando 300 unidades, viu-se obrigado paralisar a obra por falta de dinheiro. 
Passados três anos com a obra paralisada, o proprietário foi surpreendido pela invasão dos apartamentos, organizada pelo movimento dos sem-teto. 
Naturalmente, através de seu procurador, ajuizou um pedido de reintegração de posse. A lógica do direito positivo é a emissão de liminar determinando o despejo dos invasores. Se necessário, com reforço policial. No entanto, o pedido foi distribuído para o Juiz Hamilton Bueno, ilustre e respeitado defensor do direito alternativo.
O magistrado não concedeu a liminar. De forma responsável, trabalhou para a solução do caso. Visitou o local da invasão e certificou-se que eram trabalhadores de baixa renda. Conversou com os sem-teto e solicitou que constituíssem uma comissão. Uma semana depois, convocou a primeira audiência. Junto com o magistrado, estavam presentes o proprietário dos imóveis com seu procurador, o gerente da Caixa Econômica Federal e a comissão formada pelos invasores. 
Considerou viável e propôs o financiamento dos apartamentos em favor das 300 famílias, que somavam em torno de 1500 pessoas. Mesmo com a resistência inicial do proprietário, o juiz concluiu o caso com sucesso, após seis meses de negociações, criando um financiamento de 25 anos através da Caixa Econômica Federal. 
Ainda hoje, a maioria dos invasores são proprietários, pagando suas prestações. Os efeitos de uma decisão ou outra, são inimagináveis. Numa decisão positivista, que representa a maioria das sentenças em nosso país, teríamos mais 1500 pessoas marginalizadas, engrossando os problemas sociais na periferia da cidade. Numa visão alternativa e humanitária, a solução beneficiou ambas as partes. Além disso, demonstra o tamanho dos efeitos que a força ideológica pode provocar. Enfim, para o próprio Estado, custa menos prevenir e se antecipar aos problemas, do que pagar pelo socorro e tratamento dos excluídos.

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