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Globalização, democracia e cidadania Niedjha Abdalla-Santos Introdução Nesta aula, discutiremos a relação entre as estratégias do mundo globalizado e o exercício da cidadania. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • entender os conceitos de globalização, democracia e cidadania; • compreender os impactos causados pela globalização na sociedade democrática; • reconhecer aspectos da cidadania representativa e participativa, tendo os indivíduos como agentes transformadores da sociedade. Bons estudos! 1 Os conceitos de globalização, democracia e cidadania Saiba que globalização é uma noção surgida no final da década de 1980, envolvendo os dis- cursos econômico, geográfico, sociopolítico e ecológico-ambiental, entre outros. O conceito está relacionado à tendência de se conferir alcance mundial aos fenômenos e à consciência dos atores sociais (THERBORN, 2001). Globalização corresponde a uma visão de mundo idealmente conectado a novos padrões de comércio, investimento e produção, e, para existir como tal, apoia-se num modelo de Estado cada vez menor, associado a estruturas de organizações sociais. FIQUE ATENTO! Sinais da globalização estão presentes em muitos aspectos de nosso cotidiano. É o caso da enorme interconectividade das mídias sociais e de outras soluções tecno- lógicas que nos permitem discutir, estudar, negociar, assistir ou ministrar aulas em qualquer parte do mundo e a qualquer momento. Figura 1 – A interconectividade planetária é uma das características da globalização. Fonte: Toria/Shutterstock.com Tenha em mente que, apesar de difundir um discurso ecológico com preocupações ambien- tais planetárias, a globalização é muitas vezes entendida como inimiga da justiça social e da preservação cultural, por favorecer os fluxos de capitais e aumentar as desigualdades sociais. Com a ampliação das fronteiras entre organizações, países, continentes, ou mesmo com a eliminação desses limites, fica evidente que, em termos antropológicos, a globalização amplia flu- xos, encontros e hibridismo culturais. Por outro lado, pode também favorecer a hegemonia cultural das grandes potências sobre as demais localidades. EXEMPLO Hegemonia cultural representa a imposição de uma cultura dominante sobre ou- tras. Um exemplo típico é a conhecida festa de 31 de outubro. O “dia das bruxas” era festejado em quase todo o mundo com rituais que variavam conforme a cultura local. Nas últimas décadas, o fenômeno da globalização tem imposto a festa de halloween nos moldes norte-americanos por meio de filmes, livros, jornais, progra- mas televisivos e produtos de consumo de massa. O conceito de democracia que pode ser entendido como o “conjunto de regras de procedi- mentos para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados” (BOBBIO, 1997, p. 12). Para Dahl (2001), é o conjunto de regras constitucionais que estabelecem como uma sociedade tomará decisões. Duas principais classificações da democracia são a participativa e a representativa, sendo esta última o modelo adotado no Brasil. Figura 2 – Democracia autônoma e participativa com maturidade política. Fonte: Seita/Shutterstock.com SAIBA MAIS! Jacobi (1999) já visualizava as consequências das transformações globais para o planeta, com destaque para a degradação ambiental e a crescente desigualdade entre regiões. Sintomas de uma crise que agrava os problemas sociais e aprofunda a distância entre os países em desenvolvimento e os industrializados: <http://www. scielo.br/pdf/sausoc/v8n1/04>. Na democracia representativa, a população escolhe seus representantes pelo voto e eles tomam as decisões, elaboram as leis (vereadores, deputados e senadores) e governam (prefeitos, governadores e presidente da república). Trata-se de participação política limitada, pois normal- mente existe grande distância entre os cidadãos e seus representantes (ANDRADE et al, 2012). Por outro lado, a democracia participativa permite maior proximidade do poder público com a sociedade, que tem oportunidade de participar ativamente da dinâmica de elaboração das políticas públicas por meio de assembleias nas quais, em tese, todos têm direito a se expressar. Indepen- dente dos aspectos que a caracterizam, a democracia é essencial para que uma sociedade alcance direitos e satisfaça necessidades individuais e coletivas, promovendo a cidadania. Segundo Carvalho (2007), cidadania é o processo de integração das pessoas ao governo por meio da participação política, da garantia de direitos e da justiça social. A cidadania é indispensá- vel à existência da democracia, pois é o cidadão que tende a buscar a garantia de seus direitos, a liberdade, o desenvolvimento humano e a igualdade política. FIQUE ATENTO! Entende-se que a democracia representativa compromete a qualidade da própria democracia, especialmente quando se combina, de forma pouco ética, ao capita- lismo e à globalização, acentuando desigualdades, crise fiscal, perdas culturais e recessão econômica (NOGUEIRA, 2003). Entenda que a cidadania é habitualmente desdobrada em direitos civis, políticos e sociais, sendo considerado cidadão pleno quem alcança a titularidade dos três direitos, incompleto aquele que possui apenas alguns direitos e não-cidadão aquele que não possui direitos (CARVALHO, 2007). Ainda segundo Carvalho (2007), direitos civis são os fundamentais à vida, à liberdade, à pro- priedade, à igualdade perante a lei. Direitos políticos dizem respeito à participação do cidadão no governo: direito a manifestações, reuniões e organizações políticas; a organizar partidos; a votar e ser votado. Já os direitos sociais são os que garantem a participação na riqueza coletiva da socie- dade: acesso à educação; trabalho; salário justo; saúde; aposentadoria etc. Figura 3 – Direitos políticos de mobilização e de manifestação. Fonte: Arthimedes/Shutterstock.com SAIBA MAIS! Na Constituição Federal brasileira de 1988, os direitos civis estão no Capítulo I, que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos. O destaque fica por conta do art. 5o, que garante que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Tratamos, assim, de alguns dos principais aspectos relativos aos conceitos de globalização, democracia e cidadania. 2 Impactos da globalização sobre a sociedade democrática A globalização impacta as conexões mundiais e gera múltiplos fenômenos sociais. Ela favo- rece o comércio e o fluxo de capital, facilitando articulações e pressões das grandes corporações multi e transnacionais. As consequências são fortemente materiais e as causas dão margem a inúmeros questionamentos de ordem ética. Corporações costumam utilizar seu poder de pressão sobre o mercado de trabalho (remunerando precariamente, discriminando e burlando direitos trabalhistas), sobre empresas (boicotando fornecedores e clientes) e até mesmo sobre os governos. A concentração global acentua desigualdades sociais, pois se apoia na exploração, na segmentação e na exclusão (BERLINGUER, 1999). Figura 4 – O poder do dinheiro das corporações globais. Fonte: hanss/Shutterstock.com EXEMPLO No mundo capitalista, são frequentes os escândalos em que se levantam suspeitas sobre contratos milionários e leis aparentemente feitas para favorecer corporações. Empresas de telecomunicações, planos de saúde, indústria armamentista e mon- tadora de automóveis são exemplos de organizações que investem no apoio de legisladores e de agentes públicos em favor de seusinteresses. Podemos concluir, portanto, que são evidentes os impactos da globalização sobre as socie- dades democráticas. 3 Cidadania participativa e agentes transformadores da sociedade Vimos que a democracia representativa pode ser prejudicial para uma sociedade quando os representantes políticos são cooptados pelo capital globalizado e passam a agir contra o bem comum e em favor das corporações. Neste cenário, uma possível alternativa seria o modelo de democracia participativa, no qual as decisões podem ser tomadas mais diretamente pela sociedade. FIQUE ATENTO! O exercício da democracia é, muitas vezes, uma tarefa árdua, cansativa e desgas- tante. Entretanto, para uma nação evoluir na defesa efetiva dos cidadãos, eles pre- cisam participar das ações democráticos que definem o presente e o futuro do país. Com o exercício da cidadania autônoma e participativa, a sociedade pode se organizar livre- mente em busca de direitos, na tentativa de conter o avanço dos interesses das grandes corpora- ções globais. Abre-se, assim, o caminho à formação de agentes transformadores da sociedade. Fechamento Chegamos ao final desta aula. Aqui, você teve a oportunidade de: • conhecer e discutir os conceitos de globalização, democracia e cidadania; • reconhecer as vertentes representativa e participativa da cidadania; • entender os impactos causados pela globalização na sociedade. Referências ANDRADE, Daniela Meirelles; CASTRO, Carolina Lescura de Carvalho; PEREIRA, José Roberto. Cidadania ou “estadania” na gestão pública brasileira?. Rev. Adm. Pública, Rio de Janeiro, v. 46, n. 1, p. 177-190, fev. 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi- d=S0034-76122012000100009&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 26 jul. 2016. BERLINGUER, Giovanni. Globalização e saúde global. Estud. av., São Paulo , v. 13, n. 35, p. 21-38, abril. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi- d=S0103-40141999000100003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 jul. 2016. BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. CARVALHO, J.M. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 9. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. DAHL, R. Sobre a democracia. Brasília: UnB, 2001. JACOBI, Pedro. Poder local, políticas sociais e sustentabilidade. Saúde e Sociedade, v. 8, n. 1, p. 31-48, 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v8n1/04>. Acesso em: 26 jul. 2016. NOGUEIRA, Marco Aurélio. Sociedade civil, entre o político-estatal e o universo gerencial. Rev. bras. Ci. Soc., São Paulo, v. 18, n. 52, p. 185-202, jun. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?s- cript=sci_arttext&pid=S0102-69092003000200010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 jul. 2016. THERBORN, Göran. Globalização e desigualdade: questões de conceituação e esclarecimento. Sociologias, Porto Alegre , n. 6, p. 122-169, dez. 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S1517-45222001000200007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 26 jul. 2016.
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