Buscar

Artigo O Problema do Nosso País é a Visão de Curto Prazo

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

11/06/13 "O problema do nosso país é a visão de curto prazo" - Economia - Notícia - VEJA.com
veja.abril.com.br/noticia/economia/o-problema-do-nosso-pais-e-a-visao-de-curto-prazo/imprimir 1/2
Argentina
'Desde outubro do ano passado há
uma intervenção muito maior do
Estado na economia, na gestão de
Cristina. Isso é um mau remédio.'
Robeto Lavagna, ex-ministro da
Economia da Argentina no governo
Néstor Kirchner
28 de Setembro de 2012
Argentina
"O problema do nosso país é a visão de curto prazo"
Ministro da Economia entre 2002 e 2005, durante o governo de Néstor Kirchner, o economista
Roberto Lavagna diz que os programas do governo atual são como uma 'colcha de retalhos' , sem
visão de médio prazo para o país
Por Tatiana Gianini
Roberto Lavagna, ex-ministro da Economia da Argentina: defesa das políticas econômicas
de fomento produtivo (Alexandre Schneider)
Reportagem em VEJA desta semana mostra como a presidência de Cristina
Kirchner transformou a Argentina numa ilha, ao submeter os cidadãos ao
isolamento econômico com medidas heterodoxas como o controle de câmbio,
as barreiras às importações e o controle artificial dos preços. Os
supermercados são obrigados a racionar até a venda de erva-mate. Durante a
viagem, VEJA conversou com um personagem que apontava um caminho
diferente para a Argentina. Ministro da Economia entre 2002 e 2005, durante o
governo de Néstor Kirchner, o economista Roberto Lavagna é considerado o
responsável por recolocar o país nos trilhos da estabilidade após a severa
crise de 2001. Durante a sua gestão, o país registrou uma taxa de crescimento alta, de 9% ao ano, com uma inflação
controlada e um superávit nas contas públicas. No atual cenário argentino, sua experiência bem-sucedida é fonte
recorrente de consulta por parte de investidores internacionais. Em seu escritório em Buenos Aires, Lavagna
concedeu a seguinte entrevista à repórter Tatiana Gianini:
Leia também
As vítimas da política econômica de Cristina Kirchner
Cristina Kirchner defende protecionismo argentino
 
O senhor é considerado o último ministro da Economia que de fato conseguiu exercer o cargo. Hoje,
muitos argentinos nem sabem o nome do atual responsável pela pasta. O que mudou? O Ministério da
Economia já não é mais o que era antes. Agricultura, que antes estava dentro do meu ministério, agora é um
11/06/13 "O problema do nosso país é a visão de curto prazo" - Economia - Notícia - VEJA.com
veja.abril.com.br/noticia/economia/o-problema-do-nosso-pais-e-a-visao-de-curto-prazo/imprimir 2/2
ministério a parte. O mesmo ocorreu com a Indústria. O que ainda segue sendo chamado de Ministério da Economia
é uma área que se ocupa de questões puramente financeiras. No lugar que antes havia um ministro, hoje há pelo
menos cinco pessoas.
A economia argentina vive hoje um período de decadência? O potencial argentino segue sendo enorme,
embora este seja um momento no qual é preciso refletir. O crescimento médio anual do país passou de 9% até 2006
a 4% nos últimos anos. Trata-se de uma desaceleração importante. Mais do que isso, o governo atual já não tem à
sua disposição os recordes históricos de superávit fiscal em suas contas públicas nem da balança de pagamentos.
Há uma taxa de investimento bastante menor do que a de anos anteriores, e como consequência a criação de
empregos é reduzida. Em 2007, também apareceu a inflação. Portanto, as margens de manobra da economia foram
se consumindo e chegamos a um momento como o da primeira metade de 2012, no qual o país registrou um
crescimento de não mais do que 1%.
Por que o governo passou de um cenário de superávit tanto nas contas públicas quanto no setor externo
para um de déficits? Boa parte do superávit das contas públicas conseguido nos anos da gestão de Néstor
Kirchner foi consumida pela concessão de subsídios não sociais oferecidos pelo governo, como os de transporte e
de energia. No ano de 2005, esses subsídios eram de 3,5 bilhões de pesos. No ano passado, eles foram de 76
bilhões de pesos. Multiplicaram-se 22 vezes. Já o superávit em dólares das contas externas foi gasto com a
importação de gás natural, principalmente da Bolívia. As importações de energia alcançam 11 bilhões de dólares.
O governo passou a controlar o acesso aos dólares para evitar a fuga de capitais. O senhor disse
recentemente que isso era o mesmo que quebrar o termômetro para acabar com a febre. Por quê? Porque
o problema é que um país que tinha superávit no comércio de energia hoje tem um déficit importante. Isso não vai
ser resolvido apenas com a restrição aos dólares, mas sim com um plano de energia para o qual a Argentina tem
reservas comprovadas mais do que suficientes. Para isso, falta segurança jurídica, falta que o preço que o governo
paga pelos combustíveis seja razoável. Enquanto isso não ocorre, o país seguirá tendo que controlar o dólar com
proibições de compra, que não levam a nada. O país passou a depender excessivamente de fatores externos, como
o preço das commodities.
Grifes de luxo como a francesa Louis Vuitton e a americana Ralph Lauren decidiram fechar as suas portas
porque não conseguem importar. A saída de investidores estrangeiros não preocupa o governo? Esse
governo não. O objetivo do governo é usar menos dólares, porque ao usar menos dólares o governo pode pagar a
conta de energia. Eles não se importam com o fato de que isso faça as empresas abandonarem o país.
A Argentina também perdeu para a Colômbia o posto de segundo país na América do Sul que mais recebe
investimentos estrangeiros. O problema não se trata nem dos investimentos que deixam de entrar, mas dos
próprios capitais que estão saindo do país. Como vamos esperar que entrem investidores de fora se os que estão
dentro do país estão saindo? Desde 2006, há um déficit negativo entre o que entra e o que sai. Estima-se o país
perdeu desde 2006 um total de 90 bilhões de dólares.
Qual o futuro desse governo? Depende de como reagirá o governo nos próximos meses. Até agora, ele reagiu
com medidas de curto prazo que têm efeitos negativos importantes, como a de restringir as importações de insumos
para a produção. O que vai ser feito mais adiante eu não sei. Em minha opinião, o mais sensato a se fazer é mudar o
rumo para as políticas econômicas de fomento produtivo de 2002 a 2006. Aumentar os investimentos em energia é
um fator fundamental, mas o governo também terá que ordenar as contas em pesos, para controlar a inflação, que
nos últimos cinco anos tem girado em torno de 21% em média por ano. Esse ano, a inflação anual será de 25%. Ou
seja, o que terá que ser feito é reordenar as contas públicas e lançar um programa de investimentos energéticos.
Se o senhor fosse o ministro da Economia nesse momento, o que faria? Essa é a clássica pergunta que me
fazem. Eu diria que implantaria um plano econômico e social, porque as dois coisas vêm juntas. Tudo isso funciona
como a relojoaria, na qual cada peça tem que combinar exatamente com a outra para que funcione. Não basta uma
medida ou outra paliativa, mas um plano integral que tem que combinar em termos de direção. Isso é um programa
econômico. O governo agora age sem uma visão de médio prazo. É como uma colcha feita de retalhos.
Muitos argentinos comparam a situação difícil para conseguir dólares ao que ocorre na Venezuela. O que
o senhor pensa? Infelizmente ao que tudo indica essas travas devem seguir, mas de forma muito conjuntural, até
que se resolva o tema da questão energética.
Existem semelhanças da Argentina de Cristina com a Venezuela de Hugo Chávez? Desde outubro do ano
passado há uma intervenção muito maior do Estado na economia, na gestão de Cristina. Isso é um mau remédio. Na
Venezuela, a intervenção estatal é um fracasso. A petrolífera PDVSA passou de produzir 3 milhões de barris por dia
para produzir 2,5 milhões. O Muro de Berlim caiu há alguns anos por um bom motivo. O Estado pode orientar, mas
colocar-se a produzir não dáresultado.
Por que a população precisa pagar esse preço tão alto de não viajar, não comprar importados etc? Bom,
as pessoas votaram por essa presidente. É por isso que afirmo que os eleitores argentinos precisam refletir. Isso
ocorreu em outubro do ano passado. Os eleitores votam pelo curto prazo e depois sofrem. Um dos defeitos de nosso
país é uma visão de muito curto prazo.

Outros materiais