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28 MEC 243 – Máquinas Térmicas (Aula 3) 3.1 Ciclo de Rankine Uma área importante de aplicação da termodinâmica é a de geração de potência. Os dispositivos ou sistemas utilizados para produzir potência são chamados de motores ou máquinas, e os ciclos termodinâmicos nos quais eles operam são chamados de ciclos de potência. Existem vários tipos de sistemas de geração de potência, cada qual produzindo uma potência líquida na vizinhança, a partir do consumo de um combustível fóssil, nuclear ou solar. Estes sistemas associados às plantas de potência hidrelétricas produzem praticamente, toda a potência elétrica e mecânica utilizada no mundo. A imagem a seguir apresenta uma usina geradora de potência. Nas instalações de potência a vapor, geralmente o fluido de trabalho é a água que é alternadamente vaporizada e condensada, ao percorrer o ciclo termodinâmico. Os fundamentos necessários à análise termodinâmica dos sistemas de geração de potência incluem os princípios de conservação de massa e de energia, o segundo princípio da termodinâmica e os dados termodinâmicos. Estes princípios podem ser aplicados individualmente aos componentes da planta de potência, tais como turbinas, bombas, trocadores de calor, condensadores, torres de resfriamento, compressores, válvulas e caldeiras. A imagem a seguir é uma representação esquemática de uma unidade geradora de potência elétrica, e sua divisão em subsistemas. 29 Figura do livro MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N.“Fundamentals of Engineering Thermodynamics”, 7ª Edição, John Wiley & Sons, 2011. Legenda: Subsistema A – Sistema gerador de potência; Subsistema B – Sistema gerador de vapor; Subsistema C – Sistema gerador de água de resfriamento e Subsistema D – Sistema gerador de eletricidade. O vapor d’água é o fluido de trabalho mais utilizado nos ciclos de potência a vapor, em função do seu baixo custo, de sua disponibilidade e de sua alta entalpia de vaporização. De modo prático, as plantas de geração de energia elétrica podem ser aproximadas a uma instalação de potência a vapor nas quais a água é o fluido de trabalho. O componente principal do subsistema A, sistema gerador de potência a vapor, é a turbina a vapor. As imagens a seguir ilustram as pás e o rotor de turbinas a vapor. 30 Turbina a vapor conjugada. Legenda: (1) Turbina de alta pressão (HP) (2) Turbina de pressão intermediária (IP) (4) Turbina de baixa pressão (LP) Rotor e pás da turbina a vapor de baixa pressão. 31 Rotor e pás móveis da Turbina a vapor de alta pressão. 32 A título de ilustração, um vídeo de funcionamento de uma turbina a vapor de uma central termoelétrica é apresentado no seguinte endereço eletrônico: http://www.youtube.com/watch?v=BwV1J4nI66U De forma resumida, uma unidade geradora de potência segue a representação da ilustração abaixo. Já sabemos que o Ciclo de Carnot é o ciclo mais eficiente que opera entre dois limites de temperatura especificados. Assim, a princípio, é natural considerar o ciclo de Carnot como um provável ciclo ideal para as usinas de potência a vapor. Em um ciclo de Carnot que opera em regime permanente, a alternância vaporização/condensação de uma substância pura deverá estar localizada dentro da região de saturação, podendo então, este ciclo ser representado em um diagrama Temperatura–Entropia como: Condensação no condensador Evaporação na caldeira 33 As regiões do diagrama Temperatura–Entropia e os perfis isobáricos neste diagrama, são os mesmos observados no diagrama Temperatura–Volume Especifico para uma substância pura. No ciclo de potência de Carnot idealizado conforme a representação ao lado, o fluido de trabalho (água) é aquecido de forma reversível e isotérmica em uma caldeira (processo 1 – 2), é expandido de forma isoentrópica em uma turbina (processo 2 – 3), é condensado de forma reversível e isotérmica em um condensador (processo 3 – 4) e finalmente é comprimido de forma isoentrópica por um compressor até o estado inicial (processo 4 – 1). Quais são as dificuldades de ordem prática do ciclo de potência de Carnot? 1 – Ao se considerar processos de transferência de calor em sistemas bifásicos, estabelece-se um limite máximo de temperatura, que corresponde à temperatura crítica do fluido de trabalho. No caso da água, essa temperatura é de 374 oC. Esse limite para a temperatura, limita a eficiência térmica. Assim, toda tentativa de elevar a temperatura máxima do ciclo envolve a transferência de calor para o fluido de trabalho em uma única fase, o que não é fácil de ser conseguido de forma isotérmica. 2 – O processo de expansão isoentrópica (processo 2 – 3) pode ser aproximado de maneira satisfatória por uma turbina bem projetada. Entretanto, o título do vapor diminui durante esse processo. Dessa forma, a turbina precisa processar vapor com baixo título, ou seja, vapor com alto conteúdo de umidade. A colisão de gotas de líquido com as pás do rotor da turbina causa a erosão da mesma. Em termos operacionais, vapor com título abaixo de 90% não é admitido na operação das turbinas a vapor d’água. 34 3 – O processo de compressão isoentrópica (processo 4 – 1) envolve a compressão de uma mistura de líquido e vapor para o estado de líquido saturado. Duas dificuldades podem ser apontadas nesse processo: primeira, não é fácil controlar o processo de condensação de modo a terminar com o título desejado no estado 4; segunda, não é prático projetar um compressor que processe duas fases. Conclui-se então que o Ciclo de Carnot não pode ser associado de forma prática/operacional aos dispositivos reais, não sendo, portanto, um modelo realista para os ciclos de potência a vapor. Muitos problemas práticos do Ciclo de Carnot podem ser eliminados superaquecendo o vapor d’água na caldeira e condensando-o completamente no condensador. Este novo ciclo das usinas de potência a vapor, que elimina os problemas práticos do ciclo de Carnot é denominado Ciclo de Rankine, um ciclo ideal que não considera irreversibilidades internas, e que é composto de quatro processos: (I) Compressão isoentrópica em bomba; (II) Fornecimento de calor a pressão constante em caldeira; (III) Expansão isoentrópica em turbina e (IV) Rejeição de calor a pressão constante em condensador. Uma descrição sumária de operação do Ciclo de Rankine simples ideal pode ser elaborada considerando o esquema abaixo. Segue a descrição da operação: (1) A água entra na bomba no estado 1 como líquido saturado e é comprimida de maneira isoentrópica até a pressão de operação da caldeira. A temperatura da água aumenta um pouco durante esse processo de compressão isoentrópica devido a uma ligeira diminuição no volume específico da água. 35 (2) A água entra na caldeira como líquido comprimido no estado 2 e sai como vapor superaquecido no estado 3. (3) O vapor d’água superaquecido no estado 3 entra na turbina, na qual ele se expande de forma isoentrópica e produz trabalho, girando o eixo conectado a um gerador elétrico. A pressão e a temperatura do vapor caem durante esse processo até os valores do estado 4, estado no qual o vapor entra no condensador. Nesse estado geralmente o vapor é uma mistura de líquido e vapor com título elevado. (4) O vapor é então condensado a pressão constante no condensador, rejeitando calor para um fluido de resfriamento. A água deixa o condensador como líquido saturado e entra na bomba completando o ciclo. De forma esquemática temos essas operaçõesassociadas aos subsistemas de um ciclo de potência conforme a representação a seguir. O ciclo termodinâmico associado, o ciclo de Rankine, será representado como: 36 Para uma instalação de potência a vapor simples que opera segundo um ciclo Rankine, sem superaquecimento, ou seja, o vapor sai da caldeira com vapor saturado, pode-se estabelecer a seguinte definição para a eficiência térmica, conforme a notação do diagrama T – s abaixo: Observação: Enunciado do Primeiro Princípio da Termodinâmica “Para um sistema que opera segundo um ciclo, o calor efetivo transmitido ao ciclo, para a realização do mesmo, é igual ao trabalho efetivo observado em suas vizinhanças.” 37 Exemplo 1 – O Ciclo Rankine Simples Ideal Considere uma usina de potência a vapor d’água que opera segundo um ciclo de Rankine simples ideal. O vapor entra na turbina a 3 MPa e 350 oC e é condensado no condensador a pressão de 75 kPa. Determine a eficiência térmica desse ciclo. Para a bomba (processo 1 – 2) Situação de operação: Regime permanente, variações de energias cinética e potencial desprezíveis, fluido incompressível e isoentrópica (adiabática) Vejamos agora: du = q - w (primeiro princípio da termodinâmica) ds = q/T (segundo princípio da temodinâmica) du = Tds – pdv (equação fundamental da termodinâmica) h = u + pv dh = du + pdv + vdp dh = Tds – pdv + pdv + vdp dh = Tds + vdp (equação fundamental da termodinâmcica) Conclusão para a bomba que opera de forma isoentrópica: v = 0,001037 m3/kg e h1 = 384,36 kJ/kg (Tabela B.1.2 – página 578) Assim: h2 = h1 – wbomba = 384,36 – (– 3,03) = 387,39 kJ/kg 38 Para a caldeira (processo 2 – 3): Situação de operação: Regime permanente, variações de energias cinética e potencial desprezíveis. h3 = 3115,25 kJ/kg (Tabela B.1.3 – página 581) Portanto: qH = 3115,25 – 387,39 = 2727,86 kJ/kg Para a turbina (processo 3 – 4): Situação de operação: Regime permanente, variações de energias cinética e potencial desprezíveis e isoentrópica (adiabática). Processo isoentrópico: s3 = s4 s3 = 6,7427 kJ/(kg.K) (Tabela B.1.3 – página 581) Para o equilíbrio líquido-vapor na saída da turbina: (Tabela B.1.2 – página 578) Pela regra da alvanca: h4 = (1 – x)hl + xhv = (1 – 0,8857) 384,36 + 0,8857 2662,96 = 2402,52 kJ/kg Logo: wturbina = 3115,25 – 2402,52 = 712,73 kJ/kg Para o condensador (processo 4 – 1): Situação de operação: Regime permanente, variações de energias cinética e potencial desprezíveis. 39 Cálculo da eficiência térmica: Ou ainda: 3.2 Desvios entre os ciclos reais de potência a vapor e os idealizados O ciclo de potência a vapor real difere do ciclo Rankine ideal em virtude das irreversibilidades presentes no vários componentes do ciclo. O atrito do fluido e a perda de calor para a vizinhança são as fontes comuns de irreversibilidades. O atrito acarreta uma queda de pressão na caldeira, no condensador e nas tubulações que conectam os diversos componentes. Dessa forma o vapor sai da caldeira a uma pressão mais baixa que a de entrada nesse dispositivo, e um pouco mais baixa ainda é a pressão na entrada da turbina. A queda de pressão no condensador é em geral muito pequena. Logo, para compensar essas quedas de pressão, a água deve ser bombeada a uma pressão mais alta em relação àquela do ciclo ideal, o que exige da bomba um consumo maior de trabalho. Outra fonte de irreversibilidade são as perdas de calor. Para manter o mesmo nível de potência líquida produzida, é preciso transferir mais calor para o vapor na caldeira, diminuindo assim a eficiência do ciclo. Os efeitos das irreversibilidades na bomba e na turbina podem ser observados na ilustração a seguir. Legenda: r = real, s = isoentrópico. 40 3.2.1 Como aumentar a eficiência do ciclo de Rankine? O aumento na eficiência térmica do ciclo de Rankine tem como base as seguintes modificações: (1) O superaquecimento do vapor a temperaturas mais altas no ciclo Rankine ideal (aumento em TH, médio). (2) Aumento da pressão na caldeira em relação ao ciclo Rankine ideal (aumento em TH, médio). 41 (3) Diminuição da pressão no condensador em relação ao ciclo Rankine ideal (redução em TC, médio). 3.3 O Ciclo de Rankine com Reaquecimento Ideal O aumento da pressão na caldeira aumenta a eficiência térmica do ciclo Rankine, mas também aumenta o conteúdo de umidade de vapor até níveis inaceitáveis. Como aumentar a eficiência com o aumento da pressão sem enfrentar o problema da umidade excessiva nos últimos estágios da turbina? Resposta: Expandir o vapor da turbina em dois estágios, e reaquecê-lo entre eles. O reaquecimento é uma solução prática para o problema de umidade excessiva nas turbinas. Assim temos o ciclo de Rankine com reaquecimento ideal, conforme observado na representação a seguir. Nesse ciclo: qcaldeira = qprimário + qreaquecimento = (h3 – h2) + (h5 – h4) wturbina = wturbina 1 + wturbina 2 = (h3 – h4) + (h5 – h6) 42 Exemplo 2 – O Ciclo de Rankine com reaquecimento Em uma pequena usina o vapor sai da caldeira na temperatura de 600 ºC a 3MPa. O condensador opera na temperatura de 45ºC e dissipa 10 MW. A primeira seção da turbina expande a 500 kPa e, em seguida, o fluxo é reaquecido sofrendo expansão na turbina de baixa pressão. Determine: a) A temperatura de reaquecimento considerando que na saída da turbina o vapor é saturado. b) A potência total da turbina c) A transferência de calor total da caldeira. Solução (1) Ponto 1: 45 ° C, líquido saturado (x=0) Da Tabela B.1.1 (página 576) temos: Ponto 1: h1 = 188,41 kJ / kg, v1 = 0,001010 m 3/kg e Psat = 9,593 kPa (2) Ponto 3: 3,0 MPa, 600ºC Da Tabela B.1.3 (página 581) sabemos que a temperatura de saturação para uma pressão de 3 MPa é T3 = 233,9 ºC. (3) Como a temperatura do fluido quando deixa a caldeira é T = 600ºC, logo o fluido está superaquecido. Então a tabela a ser consultada é Tabela B.1.3. Ponto 3: h3 = 3682,34 kJ / kg e s3 = 7,5084 kJ / kg K (4) Ponto 6: T = 45 ° C, vapor saturado (x=1) Ponto 6: h6 = 2583,19 kJ / kg e s6 = 8,1647 kJ / kg K 43 BOMBA Reversível e adiabático. Energia: wp = h2 - h1 Entropia: s2 = s1 Considerando o fluido incompressível: wP = v1 (P2 - P1) wP = 0,00101 (3000 - 9,593) wP = 3,02 kJ / kg wP = h2 - h1 h2 = h1 + wp h2 = 188,41 + 3,02 h2 = 191,43 kJ / kg TURBINA Seção de alta pressão wT = h3 - h4 s4 = s3 = 7,5084 K / kJ kg Interpolando os valores da tabela B.1.3 (página580) temos: h4 = 3093,26 kJ/kg e T4 = 314ºC TURBINA Seção de baixa pressão wT = h5 – h6 s5 = s6 = 8,1647 kJ/kg K e P5 = 500 kPa Interpolando os valores da tabela B.1.3 (página 580): h5 = 3547,55 kJ / kg e T5 = 529ºC CONDENSADOR qL = h6 – h1 Ponto 6: Vapor saturado a 45ºC Da Tabela B.1.1 (página 576) 44 POTÊNCIA DA TURBINA ( ) POTÊNCIA DA CALDEIRA ( ) 45 3.3 O Ciclo de Rankine Regenerativo Ideal Do exame do diagrama Temperatura–Entropia do ciclo Rankine ideal tem-se que calor é transferido ao fluido de trabalho (processo 2 – 2’) a uma temperatura relativamente baixa. Isso diminui a eficiência do ciclo. Para se minimizar esse problema, procura-se aumentar a temperatura da água que sai da bomba antes de entrar na caldeira. Um processo que viabiliza esse objetivo é a utilização de um trocador de calor (ou regenerador ou aquecedor de água de alimentação, AAA) para transferir calor de uma corrente de vapor que se expande na turbina para a corrente de alimentação de água da caldeira. Surge então o ciclo de Rankine regenerativo ideal, que segue a representação da ilustração a seguir. Legenda: AAA = aquecedor de água de alimentação. 46 Ex.35 - Em um ciclo de Rankine ideal uma caldeira gera 1000 kg/h de vapor d’água saturado a 170 oC (h = 2768,70 kJ/kg). Este vapor é injetado em uma turbina de baixa pressão para a geração de energia elétrica por intermédio de um dínamo. Após a passagem pela turbina, o vapor apresenta uma entalpia de 2373,87 kJ/kg. Este vapor passa por um condensador e sai com entalpia igual a 198,86 kJ/kg e em seguida o fluido condensado é bombeado para a entrada da caldeira apresentado entalpia igual a 210,0 kJ/kg. Calcule: a) A taxa de calor adicionada pela caldeira; b) A taxa de calor rejeitada no condensador; c) A potência disponibilizada pela turbina; d) A potência que bomba fornece para a água e e) A eficiência térmica do processo. Ex.36 - Considere um ciclo de potência a vapor ideal, que descreve um processo industrial, em que uma caldeira gera 1500 kg/h de vapor de água superaquecido para o funcionamento de uma turbina geradora de potência para o acionamento de um gerador elétrico. Calcular: a) O trabalho diponibilizado pela turbina em kJ/kg; b) A potência da turbina em kW e c) A eficiência térmica do processo. Dados termodinâmicos: h1 = 160,1 kJ/kg h2 = 168,3 kJ/kg h3 = 1819,1 kJ/kg h4 = 1255,6 kJ/kg 47 Ex.37 – Considere um ciclo com reaquecimento que utiliza água como fluido de trabalho. O vapor deixa a caldeira e entra na turbina a 4 MPa e 400 ºC. O vapor expande até 400 kPa na turbina de alta pressão, é requecido até 400 ºC e então expande novamente na turbina de baixa pressão até 10 kPa. Determine o rendimento do ciclo. Ex.38 – Considere um ciclo regenerativo que utiliza água como fluido de trabalho. O vapor deixa a caldeira, e entra na turbina a 4 MPa e 400 ºC. Após expansão até 400 kPa, parte do vapor é extraído da turbina com o propósito de aquecer a água de alimentação num aquecedor de mistura. A pressão no aquecedor da água de alimentação é igual a 400 kPa e a água na seção de saída deste equipamento está no estado líquido saturado a 400 kPa. O vapor não extraído é expandido, na turbina, até a pressão de 10 kPa. Determine o rendimento do ciclo. Bibliografia ÇENGEL, YUNUS A., BOLES, MICHAEL A. Termodinâmica: 5ª Edição, McGraw Hill, 2006.
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