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1 A Cooperação Internacional na efetivação da Saúde Global: a ações da Fiocruz na África durante o governo Lula International Cooperation and Global Health: Fiocruz's actions in Africa during Lula’s governments. Maíra da Silva Fedatto Mestra em Relações Internacionais/IREL_UnB Introdução A ascensão de Luís Inácio Lula da Silva à presidência, em 2003, estabelece uma readequação da inserção internacional brasileira, sobretudo a busca por maior atuação e influência nas discussões e nos foros internacionais. Esses objetivos podem ser exemplificados tanto pela diversificação de seu comércio exterior quanto pela aposta política no multilateralismo, bem como suas tentativas de reformar as principais instituições internacionais e sua consolidação como líder regional sul-americano. Com efeito, a política externa brasileira tornou-se mais politizada e mais aberta a novos atores. Entretanto, as ações do país seguem orientadas pelos princípios históricos do Itamaraty, a saber: pacifismo, globalismo, pragmatismo, juridicismo, universalismo. Compreender o pragmatismo nas relações exteriores do Brasil faz-se importante para o presente artigo. O realismo - que embasou a política externa brasileira desde o Império, passando pela consolidação do Estado nacional, entre 1822 e 1912 - transformou-se em pragmatismo ao longo dos anos. Cervo (2006, apud Ayllón 2014) afirma que o pragmatismo busca o resultado sobre o conceito e, sobretudo, os ganhos concretos e materiais sobre valores políticos e ideológicos. Neste sentido, o pragmatismo conduz a política externa ao estabelecimento de relações realistas com as principais potências e à busca do desenvolvimento interno por meio da ação externa. Pode-se afirmar, portanto, que a articulação brasileira com os países em desenvolvimento e a Cooperação Sul-Sul são desdobramentos do Pragmatismo da Política Externa e, mais além, inserem-se em um contexto de fortalecimento destes países para tornar a inserção no mercado e nas discussões globais mais simétricas. 2 De modo geral, a cooperação internacional foi incorporada à política exterior do Brasil como uma de suas variáveis permanentes, passando a mobilizar grande número de entidades internas e externas, entretanto, ao longo dos dois mandatos de Lula (2003-2010), observou-se um maior entusiasmo especialmente no que diz respeito a Cooperação com Países em Desenvolvimento. Com efeito, a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) afirma que “essa cooperação representa uma ferramenta de política externa porque projeta internacionalmente o país que contribui para a construção de um mundo mais justo e equilibrado, melhora as relações bilaterais, facilitando o diálogo e a busca de consensos em muitas áreas e fóruns internacionais.” (REVISTA IPEA, apud Fedatto 2013). Mais além, de acordo com o discurso oficial do Itamaraty, a cooperação técnica promovida pelo Brasil deve ser conduzida pelos princípios de diplomacia solidária, pela atuação em resposta a demandas dos países em desenvolvimento, pelo reconhecimento da experiência local, pela não imposição de condicionalidades, não vinculação a interesses comerciais ou fins lucrativos e não ingerência em assuntos internos dos países parceiros (Leite, 2013). O discurso de solidariedade do Ministério das Relações Exteriores, no entanto, ocasiona fortes críticas à cooperação brasileira, especialmente àquela realizada com países em desenvolvimento, e mais especificamente com os países africanos, elemento chave da política externa de Luís Inácio Lula da Silva. Como afirma Visentini (2014), parte da sociedade e dos empresários brasileiros acusava o governo de perder tempo e recursos com “um continente sem valor econômico e sem futuro”. Não podemos esquecer, entretanto, que cooperação horizontal destituída da imposição de condicionalidades, como vem sendo praticada pelo Brasil, não constitui um discurso desprovido de interesses políticos e ou econômicos. A cooperação realizada pelo Brasil tem seus próprios objetivos, dentre eles a diversificação de parcerias no comércio, novas fronteiras de investimentos e a constante busca em se afirmar como um global player no cenário internacional e consolidar seu protagonismo no plano multilateral. Neste sentido, as ações de cooperação podem ser consideradas investimentos que, futuramente, resultariam em ganhos de segurança, ao promover estabilidade de regiões vizinhas e de interesse nacional; em ganhos econômicos e comerciais, com a aproximação internacional como fator propulsor para negócios; e em ganhos políticos, ao possibilitar a concerto de decisões em arenas internacionais, com a inclusão de temas caros aos países do eixo sul, como o do desenvolvimento. Além disso, as trocas de experiências e a transmissão de conhecimento adquirido por meio de 3 políticas públicas bem-sucedidas ajudam a consolidar posições comuns em diversos setores. (SCHMITZ, 2011, p.57) Com efeito, os setores predominantes da Cooperação Internacional do Brasil com os Países em Desenvolvimento são saúde, agricultura e educação. Visando o tema em tela, observa- se que, de acordo com o Ministério da Saúde, a política externa brasileira – no que tange a cooperação na área da saúde – possui suas prioridades geográficas e estão estabelecidas da seguinte forma: (1) América do Sul, (2) Haiti, (3) África - especialmente os PALOPS. A América Latina e a África são as regiões que têm maior número de projetos brasileiros. Em 2010, o Brasil possuía 84 projetos na América Latina, que representam 70,5%, e 44 na África, dos quais 26 desenvolviam-se nos PALOPS (MS 2010, apud FEDATTO, 2013). Diante do exposto, o presente trabalho inicialmente fora uma retoma histórica da Cooperação Internacional em Saúde destacando o protagonismo brasileiro nesta seara. Posteriormente apresentará a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com a principal executora dos projetos brasileiros em saúde e, finalmente, analisará o papel da cooperação do Brasil na área da saúde, especificamente através das ações da Fiocruz no continente africano. Para isso foram elencados três projetos de Cooperação Internacional em Saúde com Angola, Cabo Verde e Moçambique, todos integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Cooperação Internacional em Saúde: o protagonismo brasileiro Uma retrospectiva histórica a partir dos anos 1960 informa-nos que a cooperação no âmbito da saúde, assim como as ações de Cooperação Internacional de modo geral, foi influenciada pelo movimento dos países não alinhados e priorizou suas ações visando à construção de sistemas de saúde baseados na atenção primária à saúde 1 . Não obstante o avanço tecnológico observado na área da medicina com a descoberta de novos medicamentos e tratamentos, os mais países pobres permaneceriam vítimas de enfermidades e, mais além, com difícil acesso às novas formas de tratamento e de medicação. Almeida et all (2010) afirmam, neste sentido, que os avanços da área da saúde além de não contribuírem para amenizar as 1 Atenção Primária é um conjunto de intervenções de saúde no âmbito individual e coletivo que envolve: promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cadernos_humanizasus_atencao_basica.pdf (Acesso em 05/04/2015) 4 disparidades existentes entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos, ainda agravou a precária capacidade de resolução de problemas dos sistemas de saúde, intensificando as desigualdades. Com efeito, aponta-se comoponto crucial no desenvolvimento das reflexões sobre o tema da saúde global o advento da epidemia de HIV/AIDS a partir da década de 1980. Esta ocorrência viabilizou um novo tipo de ativismo transnacional em prol do acesso ao tratamento, e ainda influenciou a pesquisa, as práticas clínicas, as políticas públicas e o comportamento social (BRANDT, 2013 apud VENTURA, 2013). Mais além, as discussões interdisciplinares entre Relações Internacionais e Saúde Global cresceram notavelmente nas últimas décadas tendo em vista: o disseminado pavor popular frente a questões como a propagação do vírus da AIDS/HIV e de “novas” epidemias como H1N1 e o Ebola. E, acima de tudo, devido à ampliação da agenda de segurança internacional e sua nova abordagem de temas que não sejam diretamente relacionados ao setor militar. Neste sentido, políticas públicas conjuntas foram demandadas visando cooperar contra o estado crítico da saúde das populações, especialmente nos países mais pobres. A esse respeito ainda é importante destacar que, no continente africano, observa-se o convívio de doenças transmissíveis epidêmicas com altas taxas de pobreza e fome. Este cenário é responsável pelas elevadas taxas de mortalidades geral, materna e de menores de 5 anos, bem como pela baixa expectativa de vida ao nascer. Com efeito, existe uma progressiva concordância de que não existe desenvolvimento sustentável sem populações saudáveis, pois enfermos sobrecarregam os sistemas de saúde e previdenciário ao mesmo tempo em que contribuem com menos impostos e com menos força de trabalho (WHO/CDS/CPE/CEE, 2004), ou seja, problemas de saúde contribuem para a perpetuação da pobreza e, consequentemente, da dependência da ajuda internacional. Diante deste cenário, aliado a emergência de novas epidemias, observou-se um debate sobre a eficácia das ações de cooperação em saúde, sobretudo as verticais, ou seja, dos países do Norte para os países do Sul, pois essas ações vinculam-se a doenças específicas e possuem pequeno impacto nos sistemas de saúde. O Brasil, portanto, através do Centro de Relações Internacionais (CRIS) da Fiocruz, desenvolveu o conceito de cooperação estruturante de saúde, buscando romper com o modelo Norte-Sul. O conceito brasileiro é crítico à Cooperação Vertical, tmartins Realce 5 pois a considera uma transferência passiva de conhecimento e tecnologias que não auxilia na capacitação autônoma dos agentes dos países receptores. A cooperação estruturante, por outro lado, têm como foco o treinamento de recursos humanos e a construção de capacidades em pesquisa, ensino ou serviços e para o fortalecimento ou criação de “instituições estruturantes” do sistema de saúde, tais como ministérios da saúde, escolas de saúde pública, institutos nacionais de saúde, universidades ou cursos técnicos, escolas politécnicas em saúde, institutos de desenvolvimento tecnológico e de produção de insumos, incluindo fábricas de medicamentos. A proposta é que estas instituições ajam conjuntamente em redes nacionais e regionais e apoiem os esforços de estruturação e fortalecimento dos sistemas de saúde de seus respectivos países (Almeida et all, 2010). Assim, o Brasil vem assumindo um papel ativo no cenário global da saúde exemplificado pela designação da FIOCRUZ como Centro Colaborador da Organização Pan Americana de Saúde (OPAS/OMS) bem como sua constante participação nos organismos multilaterais da saúde e articulação do tema no âmbito das coalizões Sul-Sul, a saber, BRICS e IBAS. A Cooperação Estruturante em Saúde atende, dessa maneira, aos preceitos da Diplomacia da Saúde, definida por Buss e Leal (2009) como o conjunto de negociações desenvolvidas em múltiplos níveis, que delineia e gerencia o ambiente das políticas globais em saúde; e que, idealmente, produz melhores resultados para a saúde da população de cada país envolvido - atendendo, assim, aos interesses nacionais -, bem como implementa as relações entre Estados e reforça o compromisso de um amplo arco de atores em prol da iniciativa comum de assegurar a saúde como direito humano e bem público. A Fiocruz e o Continente Africano Historicamente, desde a década de 1990 a Fiocruz desenvolve projetos de cooperação com o continente africano, relacionamento que se intensificou durante os governos de Lula, especialmente durante o segundo mandato do presidente, seguindo as diretrizes da política externa visando solidificar a cooperação Sul-Sul. Neste sentido, a Fundação tornou-se a principal executora dos projetos de cooperação internacional em saúde com a África e a consolidação de seu papel estratégico na região deu-se em 2008 através do Escritório Regional de Representação tmartins Realce tmartins Realce tmartins Realce 6 da Fiocruz na África, com sede em Moçambique. Em 2009, estabeleceu-se o Centro de Relações Internacionais em Saúde (CRIS), órgão de assessoria da Presidência da Fiocruz com os objetivos de incorporar, ampliar e aprimorar as funções até então exercidas pela Assessoria de Cooperação Internacional (ACI). O CRIS ampliou suas atividades sob a convicção de que o conceito de saúde global, que abrange as políticas e o acesso aos sistemas universais de saúde, deve ser impulsionado através de uma aproximação setorial ampla objetivando reduzir as iniquidades por meio de ações que norteiem o desenvolvimento dos sistemas de saúde transmitindo conhecimentos e tecnologia em favor da melhoria da qualidade de vida (Fedatto, 2013). Neste sentido, o CRIS executa as estratégias institucionais de âmbito internacional e coordena as atividades de cooperação, objetivando uma constante ampliação e consolidação do intercâmbio e da atuação internacional da Fiocruz. Com efeito, [...] nos últimos anos, a cooperação internacional da Fiocruz cresceu de forma importante, como parte da priorização das áreas sociais, entre elas a saúde, na política externa brasileira. Nessa perspectiva, a Fiocruz é considerada a instituição-chave (“ponto focal”) para a cooperação internacional em saúde do governo brasileiro. Sendo assim, pelo menos dois âmbitos de cooperação merecem atenção: o da pesquisa propriamente dita e o da cooperação técnica para o desenvolvimento, que envolve diferentes dimensões (capacitação/formação de recursos humanos e fortalecimento institucional, entre outros), implementada segundo o conceito de “cooperação estruturante em saúde”, desenvolvido na Fiocruz. (BRANDÃO, 2010, p.23) Para fins deste projeto e mantendo a baliza temporal dos dois mandatos de Lula, destacam-se os seguintes projetos de cooperação nos PALOPs: Capacitação em Serviços de Saúde (Moçambique, Guiné Bissau e Cabo Verde); Criação e Fortalecimento de Escolas Nacionais de Saúde Pública (Angola); Institutos Nacionais de Saúde (Moçambique, Guiné Bissau); Escolas Politécnicas de Saúde (Moçambique, Cabo Verde) e Implantação da Fábrica de Medicamentos Antirretrovirais (Moçambique). Importante destacar que todas as ações seguem o conceito, já exposto, de “cooperação estruturante em saúde”. Capacitação e Fortalecimento dos Sistemas de Saúde em Angola Apesar dos vastos recursos naturais e do crescimento econômica das últimas décadas, tmartins Realce 7 desde 1994 Angola compõe o ranking dos países menos desenvolvidos do mundo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), caracterizados por: Their low level of socio-economic development is characterized by weak human and institutional capacities, low and unequally distributed income and scarcity of domestic financial resources. They often suffer from governance crisis, political instability and, in some cases, internal and external conflicts. Their largelyagrarian economies are affected by a vicious cycle of low productivity and low investment (Economic and Social Council, 2015). O país ainda conta com um dos índices de corrupção mais altos do mundo (168º dentre os 178 países listados), e ocupa a 148º posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Como exposto anteriormente, o Brasil vem ampliando sua atuação no cenário internacional, principalmente no que tange a Cooperação Sul-Sul. Nesse cenário, Angola – que tem laços históricos e culturais com o Brasil e está localizada em um eixo estratégico por sua posição geográfica e geopolítica - tem um papel privilegiado (Kraychete et all, 2013). No que diz respeito à saúde, Angola possui uma expectativa de vida de 51.5 anos frente a uma expectativa brasileira de 74 anos, a mortalidade infantil é de 11.3%, uma das mais altas do mundo. É importante destacar que, no período após a independência, houve uma descomunal escassez dos recursos humanos, tendo pouco mais de 20 médicos em todo o país, assim o Estado teve que recorrer à contratação de profissionais sob a égide dos acordos de cooperação. Hodiernamente, o país segue com capacidades limitadas de recursos humanos e, mais além, possui poucas faculdades de medicina e insuficientes agentes comunitários. Em 2010, Angola tinha aproximadamente 3000 médicos, sendo que a cobertura médica média no país é de 2 médicos para 10000 habitantes. Mais além, os recursos humanos da saúde estão distribuídos principalmente pelas capitais de província, estando concentrados 85% em Luanda. (AEP, 2013). De acordo com o Projeto Healthy n’Portugal promovido, em 2013, pela Associação Empresarial de Portugal (AEP), cerca de 8% do financiamento da saúde em Angola é promovido por ações de Cooperação Internacional. Os doadores contribuem anualmente com aproximadamente 60,56 milhões de euros. Diante deste cenário, analisamos o ajuste complementar ao Acordo de Cooperação Econômica, Científica e Técnica de 1980, assinado em 2007, visando à capacitação dos sistemas de saúde do país africano bem como o fortalecimento dos sistemas nacionais de saúde. O artigo 8 primeiro do Ajuste estabelece que: a cooperação desenvolver-se-á nos seguintes domínios, considerados de interesse comum: a) apoio à organização e implementação do curso de Mestrado em Saúde Pública em Angola para formar profissionais que atuarão no ensino, investigação e cooperação técnica na Escola de Saúde Pública de Angola; apoio à estruturação de uma rede de bibliotecas em saúde em Angola; apoio à reestruturação das Escolas Técnicas de Saúde de Angola; apoio ao fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde Pública de Angola. (BRASIL, Ministério das Relações Exteriores, 2007 2 ) A coordenação do projeto, do lado brasileiro, ficou a cargo da Agência Brasileira de Cooperação (ABC) em conjunto com a Assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério da Saúde e, do lado angolano, do Ministério da Saúde. Já a execução das atividades ficou sob a responsabilidade da Fiocruz e da Direção Nacional de Recursos Humanos de Angola. No que tange as responsabilidades de cada país, o artigo terceiro estabelece que, ao Brasil, caberia designar e enviar especialistas brasileiros a Angola para desenvolver as atividades de cooperação técnica previstas no Projeto; receber especialistas angolanos para serem capacitados pelas instituições executoras do Projeto e acompanhar e avaliar o desenvolvimento do mesmo. Por outro lado, o país africano ficou responsável por designar os especialistas que participariam de atividades de cooperação no âmbito do Projeto tanto no Brasil como em Angola; disponibilizar instalações e infraestrutura adequadas à execução das atividades em Angola; prestar apoio necessário à execução do Projeto aos especialistas brasileiros e, em conjunto com o Brasil, acompanhar e avaliar o desenvolvimento do Projeto. (Fedatto 2013, apud BRASIL, 2007). O projeto de cooperação BRA/04/044-S083 se assenta em três pilares: 1. apoio à conformação de um projeto de Escola Nacional de Saúde Pública (ENSPA) que se assenta assessoria técnica para a definição do projeto político pedagógico institucional, da constituição de redes colaborativas, de eixos programáticos, de linhas de investigação e da qualificação docente; 2. apoio ao fortalecimento das Escolas Técnicas de Saúde, por meio de assessoria técnica no plano pedagógico, curricular e de gestão; e 3. apoio ao Fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde Pública por intermédio do treinamento específico. Os resultados esperados foram elencados em quatro perspectivas: 1. Quadro técnico qualificado para desempenhar atividades docentes na futura Escola de Saúde Pública de 2 Disponível em: http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/bilaterais/2007/b_128/ (Acesso: 09/10/2013) 9 Angola. 2. Escolas Técnicas de Saúde de Angola com grade curricular reestruturada. 3. Instituto Nacional de Saúde Pública de Angola com diagnóstico e treinamentos específicos realizados. 4. Rede de bibliotecas de Saúde em Angola fortalecida. (Fedatto, 2013 apud Projeto BRA/04/044-S083, 2007, p.4) Ao analisar o projeto, percebemos que no que tange a busca por um quadro técnico qualificado, o projeto estipulou nove etapas para a capacitação de 25 profissionais angolanos em cursos de curta duração (15 dias), abrangendo os seguintes conteúdos: identificação de processos de saúde-doença; formulação de políticas de saúde; planejamento de sistema e serviços de saúde; bioestatística; técnicas de análise demográfica; epidemiologia básica; financiamento do sistema de saúde; gerência e análise de banco de dados e inquéritos epidemiológicos. (Projeto BRA/04/044-S083, 2007) Visando reestruturar a grade curricular das escolas técnicas, o projeto estabeleceu cursos de curta duração (21 dias), com 25 profissionais a serem treinados. Os cursos foram: educação profissional em saúde; elaboração e revisão curricular e adaptação de material didático; capacitação de supervisores de estágio angolanos em formação docente-assistencial na área de enfermagem; e gestão da formação técnica em saúde. (Projeto BRA/04/044-S083, 2007) Em busca do terceiro resultado, Instituto Nacional de Saúde Pública de Angola, o projeto previa três atividades: primeiramente, a realização de um diagnóstico da situação da capacidade do Instituto Nacional de Saúde Pública a partir da visita de três técnicos brasileiros por sete dias. A segunda consistia no treinamento de cinco profissionais angolanos, no Rio de Janeiro, em um “estágio de curta duração” (quinze dias). Por último, o projeto indicava uma missão de avaliação para implantação das atividades nas áreas demandadas. A missão durou sete dias, em Angola, e foi executada por técnicos brasileiros (Fedatto 2013 apud Projeto BRA/04/044-S083, 2007). O fortalecimento da rede de bibliotecas em Saúde é o último resultado pretendido no projeto e foi composto por três fases: a capacitação de profissionais angolanos em informação científica e tecnológica; em comunicação em saúde; e em infraestrutura de rede, desenvolvimento de aplicativos bibliográficos e interface web. As duas primeiras capacitações 10 técnicas aconteceram no Rio de Janeiro, durante quinze dias, através do envio de três profissionais angolanos. (ABC, 2007) O último curso de capacitação foi realizado por técnicos brasileiros em Angola durante sete dias. Dez profissionais angolanos foram treinados a um custo de US$15.190 (Fedatto, 2013). Destaca-se que o projeto de capacitação e fortalecimento do sistema de saúde, assinado com Angola, foi negociado, também, com Moçambique. Houvetentativa de acordo com Guiné-Bissau e Cabo Verde sem, entretanto, obter sucesso. Tendo em vista a escassez e baixa qualificação de recursos humanos de saúde de Angola, já expostas anteriormente, a Fiocruz estabeleceu o fomento à qualificação de profissionais de saúde pública para reforço das capacidades locais como um dos pilares das ações de cooperação internacional. Assim, ainda em 2007, Brasil e Angola assinaram juntamente com o projeto “Capacitação do Sistema de Saúde de Angola”, um segundo Ajuste Complementar na área de “Formação de docentes em Saúde Pública em Angola”, objetivando a abertura da primeira turma de mestrado e apoio à estruturação da Escola Nacional de Saúde Pública de Angola. A Fiocruz, através de sua Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) foi designada, juntamente com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), como responsável pela execução e avaliação das atividades. A principal responsabilidade brasileira, de acordo com o artigo terceiro do Ajuste Complementar, é designar e enviar especialistas para formar docentes, pesquisadores e profissionais em saúde em Angola com capacidade de participar no desenvolvimento de modelos analíticos de agravos endêmicos e no planejamento, implantação e avaliação de propostas de intervenção em nível das práticas e programas de saúde do sistema de saúde de Angola. (BRASIL, 2007). Neste sentido, o estabelecimento do Mestrado em Saúde Pública foi acordado em 2007 e, após interrupção, novas negociações aconteceram durante a missão da Fiocruz em Luanda em fevereiro de 2009 e, posteriormente, a revisão e atualização, em julho de 2010, da cooperação técnica entre os dois países através do Projeto de Capacitação do Sistema de Saúde da República de Angola. Assim, a primeira turma de quinze alunos, profissionais estratégicos 11 do Ministério da Saúde de Angola, formou-se em maio de 2012. O curso de mestrado pode ser inserido no conceito de cooperação estruturante que – como explanado anteriormente - busca fomentar a autonomia e independência dos países parceiros. Dessa forma, a capacitação de recursos humanos pode contribuir para formação de grupos de pesquisa, divulgação de conhecimentos, gestão e/ou de assistência dos Institutos de Saúde, planejamento, políticas públicas, dentre outros. E a partir daí criar um corpo mais robusto de pesquisadores locais que possam pensar autonomamente seus sistemas de saúde. Fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde de Moçambique Inegavelmente, a Sociedade Moçambicana de Medicamentos é a “menina dos olhos” da Cooperação Técnica em Saúde promovida pelo Brasil. Contudo, outros projetos em consonância com o conceito de cooperação estruturante foram acordados com o país africano. Em 2010 40% dos projetos brasileiros direcionados aos PALOPs envolviam Moçambique. Com efeito, a formação e aperfeiçoamento de recursos humanos locais é uma das prioridades das linhas de ação do Brasil no país africano, visando estruturar e fortalecer os sistemas de saúde para que sejam capazes de enfrentar autonomamente seus problemas. Por isso, a Fiocruz atua em conjunto com os Ministérios da Saúde e das Relações Exteriores de vários países para a criação de cursos de mestrado e doutorado. Assim, no presente trabalho a analisou-se o projeto “Fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde de Moçambique”, que – assim como com Angola – trata-se de um ajuste complementar – assinado em 2007 - ao Acordo Geral de Cooperação entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Moçambique, de 1981. A duração prevista do projeto era de 12 meses com um custo estimado de US$345.701, sua justificativa baseava-se na crença que uma das principais estratégias para enfrentar o quadro de complexidade dos problemas do sistema de saúde encontra-se no aprimoramento do Instituto Nacional de Saúde que resultará em uma melhoria do suporte e da qualidade do sistema de diagnósticos de Moçambique, do desenvolvimento de protocolos nacionais, do apoio a coleta de dados que possam apoiar políticas nacionais baseado em evidencias e como suporte da pesquisa em saúde. (BRASIL, 2007, p.3) 12 O artigo primeiro do Ajuste Complementar expõe a sua finalidade: “a) apoiar a organização e implementação do curso de Mestrado em Ciências da Saúde em Moçambique para formar futuros profissionais que atuarão no ensino e na pesquisa no país; b) apoiar a reestruturação da rede de bibliotecas em saúde; c) apoiar a elaboração do Planejamento Estratégico do Instituto Nacional de Saúde de Moçambique”. No que tange as responsabilidades de cada país, estabelece o artigo terceiro que: Ao Governo da República Federativa do Brasil cabe: a) designar e enviar especialistas brasileiros a Moçambique para desenvolver as atividades de cooperação técnica previstas no Projeto; b) receber 97 especialistas moçambicanos no Brasil para serem capacitados pelas instituições executoras do Projeto; e c) acompanhar e avaliar o desenvolvimento do projeto. Ao Governo da República de Moçambique cabe: a) designar especialistas moçambicanos que participarão de atividades de cooperação técnica no âmbito do Projeto no Brasil e em Moçambique; b) disponibilizar instalações e infraestrutura adequadas à execução das atividades de cooperação técnica do Projeto em Moçambique; c) prestar aos especialistas brasileiros apoio necessário à execução do Projeto; e d) acompanhar e avaliar o desenvolvimento do Projeto. (BRASIL, 2007) O principal foco do projeto era o apoio à criação do curso de Mestrado em Ciências da Saúde, por meio da capacitação de seus docentes, que teve início em março de 2008. Na parceria entre o Instituto Nacional de Saúde (INS) moçambicano e a Fiocruz, por meio do Programa de Pós-Graduação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) foram oferecidos módulos de curta duração (15 dias) para profissionais moçambicanos nas seguintes áreas: métodos laboratoriais para diagnóstico; informatização e gestão de dados laboratoriais; banco de dados em epidemiologia; metodologia científica; conceitos básicos em medicina investigativa; fisiopatologia de doenças infecto parasitárias; modelos experimentais de doenças; uso de protocolos terapêuticos; profilaxia e terapia de doenças infecto-parasitárias (Fedatto 2013, apud BRASIL, 2007). Os estudantes são, na maioria, servidores do INS e desenvolvem, durante a pós-graduação, estudos sobre temas importantes para o país, como HIV e malária. Atualmente encontra-se em curso a quarta turma do Mestrado em Ciências da Saúde, iniciada em 2014, e com perspectiva da abertura da primeira turma de Doutorado em saúde pública e ciências da saúde, sob a responsabilidade da Universidade Eduardo Mondlane e do 13 Instituto Nacional de Saúde (INS) de Moçambique, tendo a Fiocruz, o Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa e a Universidade Federal do Rio de Janeiro como comitê consultivo. As disciplinas teóricas do mestrado são ministradas em Moçambique por pesquisadores do IOC em parceria com professores locais. O programa inclui ainda um período de três meses no Brasil, para desenvolvimento de pesquisas nos laboratórios do campus de Manguinhos, no Rio de Janeiro. Os estudantes são, na maioria, servidores do INS e desenvolvem, durante a pós- graduação, estudos sobre temas importantes para o país, como HIV e malária. Além de oferecer qualificação acadêmica, a cooperação internacional tem o objetivo de fomentar a pesquisa em saúde em Moçambique. Implantação do Banco de Leite Humano em Cabo Verde Apesar de não receber tanto destaque como dado a países como Angola eMoçambique, a República de Cabo Verde é o país africano que mais recebe cooperação brasileira, entretanto, no que tange a saúde, o país configura-se como penúltimo beneficiário dos projetos do Brasil. Essa menor participação cabo-verdiana justifica-se pelo fato do país ter um dos melhores indicadores de saúde da região. De acordo com a OMS (2009), as doenças não transmissíveis constituem as principais causas de morte, representando mais de 40% dos óbitos da população. Assim, as diretrizes de cooperação definidas pela OMS através “Estratégia de Cooperação com Cabo Verde” para o período 2008-2013 tiveram como foco: i) melhoria da situação sanitária; ii) reforço das capacidades e desempenho do Serviço Nacional de Saúde; iii) promoção da saúde. Com efeito, em 2008, Brasil e Cabo Verde assinaram um Programa Executivo 3 relativo ao Acordo Básico de Cooperação Técnica e Científica, firmado em 1977, visando fortalecer as relações de cooperação técnica. Assim, como estabelece o artigo primeiro, o Programa tem como objetivo principal fornecer apoio técnico para a implementação de um Banco de Leite Humano no Hospital Agostinho Neto na Cidade de Praia, em Cabo Verde, visando combater a desnutrição do setor neonatal local. 3 Disponível em: http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/bilaterais/2008/b_129/ (Acesso: 10/10/2013) 14 É importante destacar que a Rede Brasileira de Banco de Leite Humano (REDEBHLH-BR) é considerada a maior e mais complexa do mundo pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O Banco de Leite Humano é responsável pela promoção do aleitamento materno e execução das atividades de coleta, processamento e controle de qualidade do leite produzido nos primeiros dias após o parto (o colostro), leite de transição e leite humano maduro, para posterior distribuição sob prescrição do médico ou nutricionista. No Brasil, a Rede conta com mais de 180 Bancos de Leite e atende anualmente a uma média de 100.000 recém-nascidos (BRASIL, 2008, p.3). A coordenação do projeto, do lado brasileiro, ficou a cargo da Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores (ABC-MRE), e do lado de Cabo Verde, da Direção Geral da Cooperação Internacional do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Cooperação e Comunidades (DGCI-MNECC). Já a execução das atividades ficou sob a responsabilidade do Ministério da Saúde do Brasil através das ações da Fiocruz e do Ministério da Saúde de Cabo Verde através da Direção Geral da Saúde. A duração prevista era da assinatura até 30 de agosto de 2009, sendo, entretanto, prorrogado automaticamente até o cumprimento de seu objetivo (Fedatto, 2013). No que tange as responsabilidades de cada país, o artigo terceiro estabelece que o Brasil deveria designar e enviar técnicos para desenvolver, em Cabo Verde, as atividades de cooperação técnica previstas; receber técnicos cabo-verdianos no Brasil para serem capacitados; prestar apoio operacional aos técnicos de Cabo Verde na execução do projeto; disponibilizar a infraestrutura necessária para a realização dos treinamentos no Brasil e acompanhar e avaliar o desenvolvimento do Projeto. Enquanto isso, Cabo Verde designaria os técnicos para o treinamento no Brasil; disponibilizaria instalações e infraestrutura adequadas à execução das atividades; prestaria apoio operacional necessário aos técnicos brasileiros na execução do projeto, além de acompanhar e avaliar o desenvolvimento do mesmo (BRASIL, 2008). A primeira etapa para implementação do Programa deu-se em maio de 2008, quando uma delegação brasileira realizou uma missão técnica em Cabo Verde para avaliar as possibilidades de transferência de tecnologia dos Bancos de Leite Humano em bases adequadas à realidade local. Posteriormente, em abril de 2009, quatro técnicos cabo-verdianos 15 foram ao Rio de Janeiro para um estágio prático, que incluiu visitas técnicas aos Bancos de Leite e oficinas no Instituto Fernandes Figueira/Fiocruz. Em 2010, representantes da ABC e da Fiocruz realizaram uma missão para estabelecer uma base técnica no país. Decidiu-se pela implantação do BLH no Hospital Agostinho Neto. Em junho de 2011, a Fiocruz enviou uma missão de monitoramente e acompanhamento da instalação e preparação dos equipamentos. Em julho do mesmo ano, outros três profissionais cabo-verdianos estiveram em Brasília para visitas técnicas. Em agosto de 2011, o Banco de Leite foi inaugurado em Cabo Verde. Entre 2011 e 2013 diversos cursos e visitas foram realizados em ambos os países visando a capacitação de profissionais e monitoramento do projeto. 4 Os resultados pretendidos estipulados no projeto eram: 1) Projeto de implantação da atividade de Banco de Leite Humano; 2) Banco de Leite Humano implantado em Cabo Verde; 3) Equipe de técnicos do país quanto ao funcionamento do Banco de Leite Humano e processamento e controle da qualidade do leite materno; 4) Sistema de informações em Bancos de Leite Humano no país desenvolvido e implantado; 5) Projeto monitorado e avaliado. Em Dezembro de 2013, o Coordenador no Núcleo de Gestão e Informação da RBLH- BR (IFF/Fiocruz) juntamente com o Gerente de Cooperação Bilateral com Países de Língua Portuguesa da Agência Brasileira de Cooperação foram à Cabo Verde realizar a avaliação final do projeto. Um comitê ad hoc foi organizado para os trabalhos de avaliação. O Banco de Leite Humano de Cabo Verde foi o primeiro na África e atendeu, ao longo de dois anos, aproximadamente 765 recém-nascidos internados na unidade neonatal do Hospital Doutor Agostinho Neto. Mais além, proporcionou orientação individual a 3802 mães em aleitamento, bem como 226 visitas domiciliares para recolha e aconselhamento. O projeto ainda reforçou as atividades do hospital nas ações de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno através de atendimentos em grupos oferecidos a grávidas e mães, dentre outras ações. Por último, concluiu-se que o BLH contribuiu para a redução na taxa de mortalidade no setor de neonatologia de 10,1%, em 2010, para 6.4% em 2012 (rBLH-BR, 2013). Assim como os demais projetos analisados neste artigo, o Programa de Apoio para 4 Disponível em: http://www.iberblh.org/index.php?option=com_content&view=article&id=280&Itemid=60 (Acesso: 20/11/2014) 16 Implementação de um Banco de Leite Humano em Cabo Verde esteve em harmonia com a Cooperação Estruturante em Saúde defendida pelo Brasil. Houve transferência completa da tecnologia utilizada e capacitação dos recursos humanos, permitindo total independência de Cabo Verde para o prosseguimento da ação. Considerações Finais Definida por Sombra Saraiva (2005) como realista, universalista e pragmática, a política externa dos governos de Lula foi utilizada como instrumento para o desenvolvimento nacional e com autonomia para buscar alianças e parcerias que melhor servissem aos seus objetivos tanto domésticos quanto internacionais. No que tange a África, ao longo dos oito anos de governo petista, a Cooperação Sul-Sul foi um dos eixos de aproximação com o continente. Em dez anos, o Brasil realizou mais de 600 projetos de transferência de tecnologia e conhecimento em 43 países africanos. A prioridade geográfica do governo direcionou-se para os países da CPLP. Já no que tange a prioridade temática, um terço das ações de cooperação foram no âmbito da saúde, agricultura e educação. Com efeito, em seu discurso oficial, o Itamaraty afirma que a Cooperação Técnica brasileira busca uma transferência de conhecimentos técnicos, além de caracterizar-se por uma ênfase na capacitaçãode recursos humanos e pelo emprego de mão-de-obra local, deve ser destituída de condicionalidades e não deve visar lucros. Não significando, entretanto, que o país não possua interesses políticos e/ou econômicos. A cooperação com os países africanos analisada neste artigo faz parte do projeto de política externa do Brasil, que tem seus próprios objetivos, especificamente o de projetar o Brasil no cenário internacional, desenvolvendo seu smart power, ou seja, obter eventuais ganhos políticos a partir dessas ações, inclusive junto a outros Estados africanos e nos espaços multilaterais (como ONU, OMC, dentre outros). Mais além, o continente africano, nos últimos anos, vem se afirmando como uma região atraente para negócios e projetos econômicos e de desenvolvimento de infraestruturas, principalmente em consequência das recentes descobertas de recursos naturais. 17 Com efeito, a Política Externa para o continente africano no âmbito da cooperação técnica na área da saúde inovou ao fundamentar-se na “construção de capacidades para o desenvolvimento”. Ou seja, a proposta brasileira, liderada pela Fiocruz, visa explorar as capacidades e recursos existentes nos países parceiros e, ao definir-se como estruturante, foca principalmente na capacitação de recursos humanos locais e no fortalecimento institucional dos sistemas de saúde. Um problema encontrado nas ações de Cooperação Sul-Sul, de modo geral e especificamente na área da saúde, é a ausência de uma sistematização das informações dos projetos de cooperação bem como dados sobre seus sistemas de saúde, dificultando, assim, o registro e análise das ações, volumes, impactos e progressos das ações cooperativas. Hirst (2012) aponta ainda outro obstáculo: o fato de os países que cooperam nessa modalidade terem recursos financeiros limitados e bem como grande fragilidade institucional, econômica e social, dificultando que os programas iniciados pela Cooperação deixem de fato um legado para o futuro. Ou seja, de cumprir com o objetivo primordial da CSS que é romper com a dependência da ajuda internacional e capacitar os países subdesenvolvidos para resolverem autonomamente seus problemas domésticos. Referências Bibliográficas ABC, Agência Brasileira de Cooperação. A cooperação técnica do Brasil para a África. Brasília: ABC, 2010. ALMEIDA, Célia ; CAMPOS, Rodrigo; BUSS, Paulo; FERREIRA, José Roberto. A concepção brasileira de “cooperação Sul-Sul estruturante em saúde”. Disponível em: www.reciis.cict.fiocruz.br. Revista Eletrônica de Comunicado, Informação e Inovação em Saúde,vol.4, n.1,pp. 25-35. Rio de Janeiro, 2010. AMORIM, C. Perspectivas da Cooperação Internacional. In: MARCOVITCH, J. Cooperação Internacional: estratégia e gestão. 1994. São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo. BRANDÃO, Norma Cristina Cardoso. 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