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Texto 1 O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

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O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM 
Afrânio da Silva Garcia 
Disponível em: http://www.filologia.org.br/pereira/textos/odesenvolvimento.htm 
 
PREFÁCIO 
 
O trabalho do professor José Pereira da Silva, intitulado "O desenvolvimento da linguagem", constitui 
uma excelente obra de introdução aos estudos desse importante tópico da Psicolingüística, coligindo 
uma série de informações essenciais sobre o assunto expostas pelos autores mais conceituados, tais 
como Noam Chomsky, Jean Piaget, Charles Osggod, A. R. Luria, Judith Greene e André Ombredane. 
O professor José Pereira da Silva faz um apanhado dos principais trabalhos sobre as relações entre o 
pensamento e a linguagem, sobre os usos e as funções da linguagem e sobre as noções de 
competência e desempenho, para depois desenvolver, ampla e profundamente, os tópicos de aquisição 
da linguagem e aprendizagem de línguas estrangeiras. 
O que são nativismo e empirismo? Quando ocorre a diferenciação dos conceitos nas crianças? O que 
é a fala egocêntrica e quais as suas funções? Como se dá a fase do balbucio? A linguagem é aprendida 
através da relação estímulo-resposta? O que é a ecolalia? Quando ocorre a função denominativa? 
Existe linguagem sem pensamento ou pensamento sem linguagem? O que são mandos e tatos? Qual 
a idade certa para começarmos a ensinar uma língua estrangeira a uma criança? Todas essas questões 
são respondidas de forma didática e clara pelo presente trabalho, imprescindível numa área, a 
Psicolingüística, tão abandonada pelos editores brasileiros, forçando os estudantes e professores de 
Letras e Psicologia a valer-se, quase sempre, de fotocópias e de livros esgotados para seus estudos. 
 
Afrânio da Silva Garcia 
 
ÍNDICE 
1 – INTRODUÇÃO 
2 - PSICOLINGÜÍSTICA 
3 - O PENSAMENTO E A LINGUAGEM 
3.1 - A PERCEPÇÃO, OS CONCEITOS E OS SÍMBOLOS 
3.2 - O PENSAMENTO E A LINGUAGEM 
4 - USOS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM 
5 - A COMPETÊNCIA E O DESEMPENHO 
6 - A AQUISIÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM 
6.1 - A APRENDIZAGEM DA LINGUAGEM 
7 - CONCLUSÃO 
8 - BIBLIOGRAFIA 
 
INTRODUÇÃO 
Preocupado sempre com o aperfeiçoamento pedagógico, mais especificamente, com o ensino da 
língua vernácula, e tendo tido a oportunidade de fazer o Curso de Metodologia do Ensino Superior nas 
Faculdades Integradas Estácio de Sá, onde os trabalhos individuais de final de cada módulo devem ser 
práticos, de acordo com a área específica de cada aluno, resolvi dedicar-me, sempre que possível, à 
pesquisa de metodologia do ensino da linguagem. 
Percebendo a dedicação da Profa. Léa Lattari da Costa em relação a este aspecto prático que devemos 
dar ao curso e à sua boa vontade e zelo em ler, corrigir e comentar pessoalmente cada trabalho que 
lhe é apresentado, resolvi dedicar alguns dias especialmente à pesquisa do desenvolvimento da 
linguagem, visto que este é um dos aspectos mais interessantes da Psicologia do Desenvolvimento, a 
que a citada mestra se dedicou no último trimestre de 1981, no referido curso. 
Minha intenção, inicialmente, foi a de preparar-me um pouco melhor para o desempenho do magistério 
na área a que me dedico. Após algumas leituras básicas para o trabalho, no entanto, percebi o quanto 
interessante e empolgante é o assunto, o que me levou à deliberação de aprofundá-lo um pouco, seja 
documentando as conclusões parciais com uma bibliografia especializada insistentemente citada, seja 
procurando abordá-lo sob aspectos e pontos de vista vários. 
Os objetivos deste trabalho são, como se vê, eminentemente práticos, visto que se reduzem a uma 
tomada de posição frente às dificuldades pedagógicas do ensino-aprendizagem das línguas, tanto no 
que diz respeito à língua materna, quanto a uma segunda língua. 
 
PSICOLINGÜÍSTICA 
Com o nome de Psicologia da Linguagem, a Psicologia trata do fenômeno da produção da linguagem 
humana, do seu comportamento e do seu desenvolvimento. 
Quando o termo psicolingüística começou a ser usado pela primeira vez, no início da década de 1950, 
indicava um interesse pelos métodos lingüísticos para descrever a produção dos usuários da 
linguagem; em especial, a análise estrutural em unidades lingüísticas tais como fonemas, morfemas e 
frases, as quais pareciam oferecer uma formulação mais precisa das unidades tão obviamente 
psicológicas quanto as letras, frases e sentenças. 
"Psicolingüística" é, portanto, um neologismo que surgiu da necessidade de se denominar essa fase 
de revolução na Lingüística e na Psicologia, principalmente depois que Chomsky publicou nos Estados 
Unidos um trabalho sobre gramática gerativa denominado Syntactic Structures. 
Jean-Yvon Lanchec, em seu livro Psicolingüística e Pedagogia das Línguas, diz que "a Psicolingüística 
tem por objetivo estudar as relações entre a mensagem pronunciada por um sujeito A e o modo pelo 
qual é percebida por um sujeito B, que só retém uma parte dos elementos dessa mensagem". 
Na realidade, afirma Langacker, 
sendo a linguagem um fenômeno em grande parte mental, seu estudo pode ser considerado um ramo 
da Psicologia. Qualquer teoria adequada da Psicologia Humana deve dar alguma explicação de nossos 
processos de pensamento; a linguagem é de importância central aí porque a maioria de nossos 
pensamentos assume forma lingüística. Muitos, se não a maior parte de nossos conceitos, recebem 
algum tipo de rótulo verbal. Assim, a relação entre linguagem e formação de conceitos é de grande 
interesse para os psicólogos. A linguagem também testa significativamente teorias de organização 
psicológica. As línguas são altamente estruturadas, e aprendemos a identificar e descrever suas 
estruturas de forma consideravelmente detalhada. Qualquer teoria da organização psicológica, 
portanto, deve consiliar adequadamente os tipos de estruturas que sabemos serem características das 
línguas humanas. 
Demonstrando que a competência lingüística de um locutor possibilita-lhe a criação de todas as frases 
da língua que fala, a teoria chomskyana da gramática gerativa mostrou que a linguagem é um tipo de 
comportamento humano muito mais complexo do que até então era considerado, levando os estudiosos 
a um "saudável respeito pelas complexidades do comportamento lingüístico", visto terem todos eles 
fracassado ao tentar uma supersimplificação das regras gerativas da linguagem. 
Uma análise gerativa da linguagem humana, com certeza, levaria qualquer psicólogo a repensar as 
suas teorias sobre o comportamento humano em geral, a menos que já o tivesse feito antes. 
Relativo a isto escreve Judith Greene: "A implicação para a Psicologia é que qualquer modelo 
psicológico de comportamento do usuário da língua teria de se harmonizar com essa descrição do uso 
lingüístico. Em outras palavras, ao descrever o que o comportamento lingüístico envolve, a análise 
lingüística atuaria como um teste empírico para avaliar a produção de modelos psicológicos." 
Num outro lugar, a mesma psicóloga ainda diz mais: "É importante entender que a Psicolingüística 
continua sendo uma subdisciplina da Psicologia, cuja característica marcante reside no fato de os seus 
praticantes acreditarem no valor do exame lingüístico para se efetuar uma análise da linguagem." 
Noutras palavras, o que se pode entender disso é que a Psicolingüística não é tão somente a mesma 
Psicologia da Linguagem, como era considerada outrora. Comparativamente, poderíamos dizer que a 
Psicologia da Linguagem está para a Psicolingüística assim como a Língua Latina está para a Língua 
Portuguesa. A Psicolingüística, sem abandonar a sua origem, que é a Psicologia (e da qual é um 
segmento), utiliza-se dos métodos revolucionários e seguros da Lingüística moderna. 
Deste modo, "... a excitante idéia de que as próprias regras lingüísticas seriam um protótipo do 
comportamento do usuário da linguagem estimulou um novo modo de encarar a linguagem –continua 
Greene – e o desenvolvimento de novas técnicas para testá-lo." 
Toda esta revolução dentro da Psicologia se deu a partir das idéias gerativistas e transformacionalistas 
de Chomsky e seus sequazes. 
Segundo Judith Greene, "A pesquisa psicolingüística baseia-se no pressuposto de que as gramáticas 
(gerativas) descrevem a competência lingüística de quem usa uma determinada língua", assunto de 
que trataremos separadamente. 
Embora ainda haja discordâncias a respeito, uma maioria respeitável de especialistas no assunto 
considera o comportamento lingüístico muito mais complexo do que os demais tipos de comportamento 
humano. Por isso, "... um ponto final que é de grande interesse para os psicólogos é a questão sobre 
se as leis que governam o comportamento lingüístico são especiais para a linguagem humana ou são 
características de todo comportamento, como seria mantido pelos teóricos do estímulo-resposta." 
Como se vê, o assunto não está totalmente pesquisado e conhecido, mas, pelo contrário, muitas das 
idéias que discutiremos a seguir ficarão aguardando uma resposta definitiva dos atuais pesquisadores 
e estudiosos. 
De qualquer maneira, o assunto, ou a disciplina, é de grande importância para quem está preocupado 
com o problema da linguagem, sua evolução (aprendizagem ou aquisição), seu comportamento e os 
seus problemas patológicos. 
 
O PENSAMENTO E A LINGUAGEM 
A PERCEPÇÃO, OS CONCEITOS E OS SÍMBOLOS 
Como o pensamento e a linguagem estão estreitamente unidos em seus usuários, é preciso que se 
analisem as possíveis interferências que um deles pode ter sobre o outro, assim como o modo pelo 
qual eles se relacionam. 
Em seu livro, Metodologia da Linguagem, J. Budin ensina: "Há inúmeras experiências cujo objetivo é 
conhecer a extensão das representações mentais infantis. Podem ser apresentados à criança objetos 
e figuras a fim de verificar se ela sabe dar-lhes nomes." Essas experiências são feitas assim porque se 
supõe que os conceitos, o pensamento, a percepção e a linguagem são elementos que se acham 
estreitamente ligados entre si. O que, aliás, não deixa de ser verdade. No entanto, é fato já sabido que 
"os conhecimentos de um escolar são, em regra, maiores do que sua capacidade de exprimi-los 
verbalmente." 
Ainda na mesma página, continua Budin o relato de suas experiências: "A criança de seis ou sete anos 
tem escassez de representações mentais bem definidas, dependendo o número das mesmas do lugar, 
do meio, etc. 
Predominam sempre as representações objetivas, sendo que as de quantidade são mais desenvolvidas 
nos meninos. As meninas, geralmente, são mais bem dotadas no concernente à expressão verbal." 
Antônio Gomes Penna nos dá um pequeno, mas importante roteiro do desenvolvimento perceptivo da 
criança, que nos interessou bastante. Diz ele: 
"No que diz respeito ao desenvolvimento perceptivo correlacionado com o desenvolvimento motor, tem 
sido destacado o fato de que, já por volta dos dois meses de idade, uma criança revela interesse pela 
voz humana, demonstrando-o através de interrupção ou mudança de ocupação. Pela altura do sexto 
mês, parece claro que ela pode distinguir entre uma voz amistosa e uma reprovadora. Aos nove meses 
de idade tem sido observada uma certa capacidade discriminatória quanto às palavras faladas pelo 
adulto, no sentido de que algumas chamam-lhe mais atenção." 
A partir da percepção é que a criança formula os seus primeiros e mais elementares conceitos, 
representando os objetos pelo pensamento (que, provavelmente é anterior à linguagem), por meio de 
suas características gerais. 
Novamente é Budin que nos apoiará com as suas palavras: "Os conceitos infantis limitam-se aos que 
a criança faz aos objetos e ao que os objetos produzem nela. Só depois de aprender a falar inclui nos 
seus conceitos experiências alheias, fato que só se processa lentamente." 
O que é compreensível, dada a complexidade da linguagem. E mais: 
Todas as coisas vindas através dos sentidos ou da manipulação revelam-se úteis à formação de 
conceitos. No começo, qualquer homem é "papai"; qualquer mulher, "mamãe". Há o que se chama 
generalização, isto é, reação idêntica a coisas semelhantes. Bola é qualquer objeto redondo: laranja, 
maçã, etc. 
Uma certa hora, porém, surge a diferenciação, como resultado de uma análise, pela qual a criança 
verifica que pode comer laranjas e maçãs, mas não bolas. "Papai" deixa de ser um homem qualquer 
para se tornar um determinado homem, com características bem definidas. 
Disso se conclui, ao menos provisoriamente, que os conceitos se "baseiam em imagens verbais e 
representam generalizações que só contêm elementos essenciais e constantes." Aliás, "todo indivíduo 
tem tendência a reorganizar suas percepções em um conjunto bem estruturado", escreve Lanchec. E, 
ao que parece, essa estruturação das percepções não seria possível em muitos casos, pelo menos nos 
casos mais complexos, sem a utilização de algum tipo de linguagem. 
Por meio da linguagem, os pensamentos e os conceitos tomam uma forma mais simples, de tal modo 
que as percepções de um indivíduo possam ser transmitidas às outras pessoas numa "boa forma", 
conforme pregam os gestaltistas. E "a ‘boa forma’ é, antes de tudo, uma forma simples e regular." 
Já que lembramos os gestaltistas, os seus defensores afirmam que 
as linhas melódicas e as figuras, no sentido mais geral, são formas; quando as percebemos, elas 
constituem um todo e não um agregado de percepções. Esse todo tem uma unidade própria. A respeito 
disso o austríaco Ehrenfels observa que, se um elemento estranho for acrescentado — uma nota numa 
melodia, pontos ou linhas num desenho —, a percepção tornar-se-á totalmente diferente, enquanto que 
a transposição de uma melodia num outro tom permite-nos, contudo, reconhecê-la. Essa importância 
da organização do conjunto foi também evidenciada na aquisição da língua materna ou na 
aprendizagem de uma segunda língua. Por essa razão, os esquemas entoativos parecem mais 
importantes para a compreensão do que a articulação correta dos fonemas que compõem a mensagem. 
Tanto os gestaltistas, quanto os funcionalistas, os estruturalistas, gerativistas, transformacionalistas e 
todos os que se preocupam com a organização do pensamento e sua comunicação dão grande 
importância ao problema da linguagem humana e o modo por que ela é formulada na mente de quem 
fala e de quem ouve. 
Quanto à gestalt, um dos seus princípios fundamentais é que "uma forma é algo mais do que a soma 
de suas partes e, a cadeia falada /la bi al/, por exemplo, é percebida como um conjunto diferente de 
/l+a+b+i+a+l/. O encadeamento dos fonemas modifica foneticamente cada um dos elementos. A 
percepção se faz ao nível da sílaba. 
Não se esqueça, de resto, — adverte Penna — que a linguagem apenas prolonga e pereniza o processo 
perceptual, sendo justo, pois, que nela se observem fenômenos paralelos aos que podem ser 
registrados no domínio da percepção." 
Diríamos mesmo, embora não tenhamos autoridade para dizer nada desta natureza, que não só a 
percepção, mas todos ou quase todos os fenômenos da mente humana estão diretamente relacionados 
com a linguagem. E é novamente o Prof. Budin que nos traz mais esse acréscimo: "A memória está 
igualmente ligada à linguagem, pois o adulto só se lembra dos fatos que ocorreram depois que 
aprendeu a falar." 
Ora, se a linguagem é uma forma simbólica de exprimirmos os nossos pensamentos, ajudando-nos a 
organizar nossas percepções e a formular conceitos a partir dessas percepções, além de servir de 
recurso mnemônico indispensável, que fenômenos mentais poderão ocorrer que não estejam 
relacionados com a linguagem e até mesmo dependentes dela? 
 
O PENSAMENTO E A LINGUAGEM 
Entre a linguagem autêntica (aquela que, quando se diz, diz-se pela primeira vez e com originalidade) 
e o pensamento não cabem distinções,pois ela é o próprio pensamento. 
Embora não tenhamos condições de discutir tal afirmativa, o que apresentaremos aqui não será uma 
confirmação exata, mas uma análise das opiniões correntes entre os especialistas no assunto. 
A idéia que uma palavra exprime não está fora desta palavra. Quando emitimos as palavras, 
encadeamo-lhes, no mesmo instante, as idéias que elas exprimem (idéias essas que se organizam 
graças às palavras com que as exprimimos); e essas palavras tornam o pensamento uma coisa viva e 
animada, uma coisa perceptível como todas as outras. As palavras, como sinais, encarnam em si uma 
significação e um sentido que as transformam na imagem do pensamento ou do conceito que elas 
exprimem. 
Ronald W. Langacker, em seu livro A linguagem e sua estrutura, escreve que 
Se definirmos pensamento como atividade consciente, podemos primeiramente observar que 
pensamento, ou pelo menos certos tipos de pensamento, podem existir completamente independentes 
da linguagem. O exemplo mais simples é a música. Do mesmo modo, ao se descobrir de repente que 
duas partes de um quebra-cabeças completadas separadamente se ajustam uma à outra, uma pessoa 
que está absorta na sua solução não realiza nenhum ato lingüístico, embora possa em seguida 
exclamar: "Ah! Isso deve se encaixar aqui!" É pois difícil compreender por que certas pessoas 
sustentam ser impossível o pensamento sem a linguagem. 
A menos que a linguagem seja considerada em sentido amplo, como qualquer forma de se exprimir um 
pensamento, ou no sentido que Merleau-Ponty deu à chamada "linguagem autêntica", o que Langacker 
escreveu não pode, até o momento, ser contestado cientificamente. 
Eis o que diz Sapir, por intermédio de J. Budin, a respeito das palavras: "São adequados envoltórios 
do pensamento que abrangem milhares de experiências diversas e são capazes, ainda, de englobar 
milhares de outras." E acrescenta o mestre: "Pensamos, pois, por meio de símbolos, símbolos que 
constituem conceitos, utilizando aqueles que são familiares e adequados a cada situação. Os mais 
empregados são as palavras, instrumentos preciosos na intercomunicação. Pensamos, em geral, por 
meio de palavras, o que não impede o uso de símbolos matemáticos, notações musicais, cores, linhas, 
etc." 
Como a percepção da criança é inferior nos seus primeiros anos, dificilmente ela conseguiria distinguir 
o que pensa do que percebe e do que faz, visto que os seus conceitos estão ligados ao que ela "faz 
aos objetos e ao que os objetos produzem nela". Assim, a criança, durante muito tempo, fala sempre 
em voz alta, acompanhando as palavras de ações apropriadas. 
"Na evolução normal do pensamento há uma gradual transição da linguagem clara para a murmurada 
e, finalmente, desta para a implícita. A sanção social age no sentido de internar o pensamento e os que 
não o fazem ou de fato são loucos ou são considerados como tais. 
Os movimentos musculares que a pessoa executa, quando pensa, demonstram de forma clara as 
relações entre o pensamento e a fala." 
E não é só. Os rótulos verbais — segundo Langacker — "são especialmente importantes no campo 
das idéias abstratas. Justiça, democracia, liberdade, comunismo e educação são termos familiares e, 
no entanto, seria bastante difícil fixar seus significados com precisão. Justiça não evoca uma imagem 
concreta como no caso de mesa. Podemos, geralmente, concordar sobre se uma coisa é ou não uma 
mesa, mas que certeza podemos ter no que toca à justiça?" 
E conclui, a seguir: 
Tais conceitos provavelmente não existiriam se não houvesse palavras para eles, as quais reúnem e 
mantêm juntas várias noções vagas e não muito coesas. Por serem abstratas, as palavras desse tipo 
são muito pouco ligadas à realidade. 
Inquestionavelmente — depõe Piaget —, parece que o surgimento da linguagem amplia as 
possibilidades da criança, proporcionando-lhe uma série de operações que realmente ultrapassam os 
limites da inteligência sensório-motora. Graças à linguagem, a criança é capaz de evocar situações 
passadas, libertando-se das fronteiras do espaço próximo e presente nas quais permanece prisioneira, 
enquanto mergulhada na pura etapa sensório-motora. Por outro lado, também graças à linguagem, os 
objetos não são mais atingidos em sua condição de puro imediatismo perceptivo, mas inseridos num 
quadro conceptual e racional que enriquece a possibilidade de seu conhecimento. 
O fundamento básico do pensamento é a analogia. Por isso "colheremos, para saboreá-lo, um fruto da 
mesma forma e da mesma cor que aquele de que conhecemos o agradável sabor." 
As leis que regem o pensamento individual e que produzem a atitude analógica são responsáveis pelo 
desenvolvimento do simbolismo pelo qual se exterioriza a linguagem. 
Assim como "o ruído da colher na tigela fica sendo para a criança o símbolo de sua refeição, o latido 
do cão é o símbolo do animal que late e, por extensão analógica, o símbolo de vários animais, de sorte 
que, pronunciando o au-au significativo, a criança exprimirá, sob a forma de reação simbólica, todo um 
conjunto de experiências possíveis." 
Na maior parte das civilizações, inclusive a nossa, tem-se dado um valor extraordinário à verbalização 
como forma de simbolização dos fenômenos que se processam na mente. Isso vem acontecendo a tal 
ponto que "acarretou, praticamente, uma verdadeira identificação do pensamento com a linguagem." 
E, como é um fato desta nossa civilização, "a educação coletiva tende a forçar o pensamento a se 
sujeitar constantemente aos quadros das construções gramaticais." 
Considerando a estrutura do pensamento e a estrutura da linguagem, especialmente após o surgimento 
do conceito de estrutura profunda da linguagem, o reflexo de uma sobre a outra parece tornar-se mais 
evidente. 
Woodworth, em Psychologie expérimentale, analisando os diagramas de Euler, afirma que "a 
ambigüidade da linguagem corrente, comparada com a clareza que os diagramas projetam, fornece 
um argumento sério contra a teoria segundo a qual o pensamento é, essencialmente, um discurso 
silencioso. Na realidade, devemos evitar o discurso para podermos alcançar o pensamento claro." 
Na verdade, 
um forte pressuposto subjacente da abordagem psicolingüística foi que a percepção da fala é uma 
imagem reflexa dos processos envolvidos na produção da fala; por conseguinte, as dificuldades em 
percepção são consideradas um reflexo direto das operações que têm lugar na produção da fala. 
Assim, demonstrações de efeitos de percepção ou de memória devidos a variáveis tais como a 
complexidade transformativa, a profundidade de Yngve ou o número de operações de decodificação, 
foram tratadas como prova direta de que essas mesmas operações são executadas pelo locutor quando 
produz sentenças. 
À página 85 de seu livro citado, Judith Greene escreve que 
aqueles que falam a língua-mãe nem sempre estão conscientes de suas intuições. Assim, 
particularmente num contexto apropriado, a ambigüidade de sentenças como A caçada ao caçador foi 
terrível ou Eu tenho um livro roubado pode não ser notada. Não obstante, Chomsky afirma que, uma 
vez assinaladas as duas interpretações possíveis (usualmente por meio de exemplos lingüísticos 
análogos), o conhecimento intuitivo da língua-mãe pelo locutor o levará a concordar que tais sentenças 
estão transformativamente relacionadas com duas ou mais estruturas profundas diferentes. 
Embora as relações entre linguagem e pensamento sejam profundas, há muito já se sabe que elas não 
são de causa e efeito, como já se supôs. Na verdade, diz Wallon, tratando da evolução psicológica da 
criança, "... na verdade ela (a linguagem) não é a causa do pensamento, mas o instrumento e o suporte 
indispensáveis ao seu progresso. Se há, por vezes, atraso de um sobre o outro, a sua ação recíproca 
restabelece rápido o equilíbrio." 
Um exemplo dessa ação da linguagem sobre o pensamento estáno fato de que as categorias 
gramaticais e demais diferenças entre as diversas línguas humanas facilitam o desenvolvimento de 
certas formas de pensamento para as quais a língua do usuário tenha uma forma lexical ou gramatical 
para exprimir. 
Leiamos, a respeito, a lição de Langacker: 
Não há quase dúvida de que as diferenças lexicais têm algum efeito no pensamento, pelo menos no 
sentido de ser mais fácil pensar sobre coisas para as quais temos palavras. 
Não teremos problema, por exemplo, para nos lembrarmos da cor de um objeto vermelho ou azul. 
Suponhamos, contudo, que nos apresentem um objeto de tom marrom extremamente escuro, tão 
escuro que é quase preto. Não há palavra comum em português especialmente para essa cor. 
Provavelmente hesitaremos em chamá-lo de marrom ou de preto. 
Numa outra parte ele nos apresenta argumentos que realmente esclarecem que a existência do 
pensamento sem a linguagem é óbvia. Um deles 
é a experiência muito comum de querermos exprimir uma idéia e não podermos encontrar a maneira 
satisfatória de transformá-la em palavras. Esse problema não existiria se o pensamento fosse 
impossível sem a linguagem. 
Não obstante, a maior parte de nossos pensamentos envolve evidentemente a linguagem, muitas vezes 
de modo essencial. O problema, contudo, de determinar qual a influência da linguagem sobre o 
pensamento merece ser tratado com cautela. 
Como já mostramos anteriormente, ao apresentar o problema, por exemplo, de conceitos como 
"democracia", "justiça", etc., "os estudiosos estão geralmente de acordo que as palavras facilitam em 
muito certos tipos de pensamento, servindo como referências ou símbolos, que se manipulam sem 
dificuldade." 
Aliás, já por volta dos quatro anos de idade a criança tem elementos a partir dos quais já se pode 
afirmar, segundo Piaget, que "o pensamento antecede a linguagem, embora esta possa desempenhar 
um papel importante no sentido de concorrer para a aquisição de formas de equilíbrio mais avançadas 
e para a produção de esquemas representativos mais flexíveis ou móveis." 
Portanto, "nosso pensamento é condicionado pela categorização lingüística da experiência, de modo 
que é mais fácil operar com conceitos codificados por uma só palavra do que com conceitos para os 
quais não há uma palavra especial disponível. A maneira, portanto, pela qual nossa língua divide a 
realidade conceptual tem pelo menos um efeito mínimo sobre o pensamento. Mas não há 
absolutamente evidência que sugira ser essa influência de algum modo tirânica ou poderosa." 
Por exemplo, 
quando pensamos em aritmética podemos empregar a palavra "aritmética" como um símbolo em nosso 
processo de pensamento. É muito mais fácil usar a palavra aritmética em nossos pensamentos do que 
operar com todo um complexo de conceitos simbolizado por essa palavra. O uso dos símbolos verbais 
torna, portanto, em muitos casos, mais fácil o pensamento. Pode-se mesmo argumentar que certos 
tipos de pensamento seriam impossíveis sem a existência desses símbolos com os quais podemos 
operar convenientemente. 
Como a capacidade para aprender a falar uma língua é básica na inteligência humana, as regras 
subjacentes na aprendizagem da língua devem ser características do modo como funciona a mente 
humana. 
Diga-se a propósito que Piaget já pensava de modo semelhante, bastante tempo antes de Chomsky se 
lançar como luminar da teoria gerativista-transformacional, quando escreveu que "a linguagem estende 
indefinidamente o poder do pensamento e lhe confere uma mobilidade que ele não poderia atingir por 
si mesmo, mas ela não é a sua fonte." E acrescenta: "Entre a linguagem e o pensamento existe, assim, 
um círculo genético tal que um dos dois termos se apóia, necessariamente, sobre o outro numa 
formação solidária e uma perpétua ação recíproca. Mas ambos dependem, no final de contas, da 
própria inteligência, que é anterior à linguagem e independente dela." 
Enfim, "o pensamento deve ser verbal para poder comunicar-se." 
A linguagem, portanto, poderá ser estudada sob vários aspectos, devendo-se "distinguir nitidamente o 
âmbito da Lingüística, que estuda a atividade pela qual se comunica um conteúdo de consciência de 
um indivíduo a outro, e a Psicologia, que, como a Lógica, se ocupa em examinar o próprio conteúdo da 
consciência humana." 
Deste modo, pensamento e linguagem, embora não sendo uma mesma coisa, têm muito em comum. 
A Psicolingüística tenta definir tais relações nos ouvintes e falantes, analisando-as meticulosamente. 
 
USOS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM 
A linguagem tem uma grande importância na organização da conduta da criança e no seu 
desenvolvimento. Primeiro a sua influência é feita de fora para dentro; depois, passa a se projetar de 
dentro para fora. No início, o controle da conduta é feito pelos pais, através da linguagem; mais tarde, 
pela própria criança. "A conduta da criança, inicialmente controlada pelos adultos sob a forma de 
incitações e recomendações verbais, progressivamente passa a ser controlada por ela própria, através 
da linguagem interiorizada". 
A montagem das conexões perceptomotoras far-se-á com certa lentidão, todavia. Não obstante, aos 
14/16 meses de idade parece certo que as crianças têm sua conduta regulada pela palavra do adulto. 
Solicitada a dar um objeto colocado diante dela, ela o fará sem maiores dificuldades. Tal já não 
acontecerá a partir do momento em que se aumente o grau de complexidade da situação. 
Citando Luria, Penna acrescenta que "A função reguladora da palavra não se mantém senão na medida 
em que ela não entre em conflito com as particularidades da situação exterior." Isto significa que a 
resposta não exija uma escolha entre um número muito grande de possibilidades e/ou obstáculos. 
André Ombredane, através da Sra. Ofélia Boisson Cardoso, dá-nos o seguinte depoimento: 
Pensamos que, na função da linguagem, se podem distinguir os seguintes usos: a) uso afetivo; b) uso 
lúdico; c) uso prático; d) uso representativo; e) uso dialético. Esses usos, que serão analisados adiante, 
não estão no mesmo nível, o que quer dizer que eles correspondem, ao mesmo tempo, a momentos 
sucessivos da organização da função. No desenvolvimento da linguagem da criança, vê-se que o uso 
afetivo é o mais primitivo, precedendo o uso lúdico, e este último precede o uso prático; o uso 
representativo se elabora a partir do uso prático, enquanto o dialético é o último a se manifestar. Na 
linguagem constituída do adulto, todos esses usos se organizam estreitamente, em dosagens muito 
variáveis, segundo as circunstâncias e mesmo de um a outro momento da oração, se bem que não 
seja freqüente aprender cada um deles em estado de pureza. O adulto utiliza a linguagem tanto para 
exprimir estados afetivos, quanto para brincar, sustentar a ação, substituir as narrações à ação e fazer 
operações simbólicas abstratas; essas várias atitudes se entrelaçam completamente em todas as 
orações. 
O fato de esses usos pertencerem a níveis diferentes de evolução não significa que, no adulto, não 
possam coexistir, pois, na realidade, coexistem segundo condições variáveis, dominantes em quem 
fala. Os diferentes usos acima considerados evoluem do mais automático para o menos automático ou 
voluntário, do mais simples para o mais complexo, e do mais organizado para o menos organizado. 
No caso de uma insanidade mental, as formas que primeiramente são atingidas são exatamente as 
menos organizadas, mais complexas e menos automáticas. Só em casos extremos seriam afetadas as 
funções e usos mais simples. Assim, "na medida em que se instalam condições psicopatológicas 
decorrentes de lesões cerebrais no falante, registram-se dissoluções que logo atingem as duas formas 
superiores de utilização dos signos verbais, isto é, as formas representativa e dialética, persistindo as 
formas beneficiadas por maior organização e maior automatismo,isto é, as formas afetivas, lúdicas e 
práticas." 
Como veremos no lugar próprio, "nas condições normais de linguagem, cada um de seus usos 
corresponde a uma estrutura particular da frase, e que nos usos inferiores essa estrutura comporta, 
normalmente, modificações profundas que se comparam estreitamente aos agramatismos dos 
afásicos." 
a) "Uso afetivo — conforme Ombredane — é o mais primitivo e o mais consolidado dos usos da 
linguagem. Tem origem na expressão espontânea das emoções e também nos gestos pelos quais se 
preparam e esboçam as ações." 
Sobre a origem deste uso, escreve Antônio Gomes Penna que, 
no que concerne ao uso afetivo, primeiro na ordem de aquisição, origina-se da pura expressão 
espontânea das emoções e dos impulsos para a realização de atos. Fundamentalmente, caracteriza-
se por três ordens principais de fenômenos: 1) por modulações de voz e variações de ritmos; 2) pelo 
emprego espontâneo de exclamações, interjeições e blasfêmias; 3) por degradações da língua, como 
se configura através do emprego exclamativo ou interjeitivo de termos predicativos e, sobretudo, de 
alterações de estrutura às quais cabe a denominação de agramatismos. 
Como assinalou Jackson, as exclamações, as interjeições, as blasfêmias constituem os elementos 
fundamentais da linguagem afetiva. É, de resto, digno de nota que o grande número dessas emissões 
verbais espontâneas e impulsivas seja constituído por fórmulas que, primitivamente, tiveram valor 
predicativo. 
Ombredane conclui que 
a linguagem afetiva ultrapassa a atividade verbal. Dela participa a gesticulação de todo o corpo, 
particularmente dos membros superiores e do rosto. O punho cerra-se na cólera, a cabeça se inclina 
no desgosto. Nota-se que, no campo da linguagem oral, a gesticulação não está codificada em uma 
língua, como está em certos meios da linguagem por gestos. Os gestos não adquiriram uma 
significação arbitrária, em relação ao sentido, como nos sinais fonéticos. O indivíduo pode usá-los mais 
livremente, mas sua capacidade de expressão se acha singularmente limitada, e é no uso afetivo da 
linguagem que eles encontram seu melhor rendimento. 
A reprodução artificial das gesticulações, que participam naturalmente dos estados afetivos e dos 
impulsos à ação, constitui a mímica. Mas, como observou Georges Dumas, há na expressão 
espontânea elementos que o indivíduo não pode voluntariamente pôr em ação: variação de tonus, 
contrações dos músculos lisos, reações secretoras. 
O uso afetivo da linguagem oral se manifesta principalmente de duas maneiras: primeiro, pela 
modulação da voz e pelo ritmo da emissão; segundo, pelos usos graduados da língua e pelas 
modalidades de seu emprego, a que se pode denominar agramatismos. 
Como fez notar Georges Dumas, as emoções depressivas diminuem a intensidade da voz, pela 
diminuição da força dos músculos expiradores e da energia da corrente do ar expirado. 
Elas neutralizam o timbre pela inércia dos músculos que controlam os ressonadores e as lâminas 
vibrantes do canal vocal; diminuem a altura, relaxando a contração dos músculos que governam a 
abertura da glote e a extensão do segmento vibrátil das cordas vocais; acarretam um alongamento da 
duração das emissões fônicas, um retardamento da emissão. 
As emoções excitantes têm efeito contrário: aumentam a intensidade da voz, enriquecem o timbre, 
elevam o tom, abreviam a duração das emissões vocais, tornam a emissão mais rápida. 
Também Osgood é da mesma opinião que Ombredane, embora se reserve um pouco, sendo menos 
categórico no que afirma. No seu Método e teoria da Psicologia Experimental, escreve que "parece 
provável que os mesmos padrões neurais eferentes que produzem o relaxamento da musculatura do 
corpo, também sirvam para provocar o relaxamento dos músculos que participam da vocalização; de 
outro lado, a maior tensão na musculatura do corpo é acompanhada por uma crescente tensão nos 
músculos vocais." 
Aliás, "no adulto, a emoção acarreta uma degradação da linguagem, que a aproxima da linguagem 
infantil." Detalhando um pouco, no seu livro, A Afasia e a Elaboração do Pensamento Explicito, 
acrescenta Ombredane que "a linguagem infantil apresenta em seu uso afetivo, entre outras, duas 
características notáveis: em primeiro lugar, a indeterminação do signo verbal, que deixa aos efeitos 
vocais a função expressiva; em segundo, a aplicação do mesmo signo verbal a situações diferentes 
em virtude da analogia do tom afetivo fundamental. Também observa-se, na linguagem afetiva do 
adulto, o enfraquecimento das estruturas verbais, com o aparecimento de lapsos, condensações de 
palavras e jargão." 
b) Uso lúdico — Começando com Penna, veremos que ele é, "fundamentalmente, o uso que decorre 
de emissões sonoras vinculadas aos estados de satisfação ou de calma, caracterizando-se por 
repetições ritmadas. É a esse uso que se vinculam as lalações. Em suas manifestações superiores, 
revelam-se as funções lúdicas através dos trocadilhos, dos chistes, etc." 
De certo modo, o uso lúdico da linguagem corresponde à função poética de Jakobson, que é a função 
dominante da linguagem literária e que está centrada sobre a própria mensagem. 
Do mesmo modo, poderíamos dizer que a função emotiva ou expressiva da linguagem corresponde ao 
uso afetivo, visto anteriormente, pois ela exprime a atitude do sujeito em relação àquilo de que fala e 
está centrada sobre o sujeito emissor. 
O uso lúdico 
aparece cedo, desde o período da lalação. A criança emite sons e se ouve a si mesma. Sente prazer 
nesse circuito que vai do ato fonético à impressão acústica que o segue. Quando as lalações começam 
a apresentar cristalizações, e uma estrutura se esboça nesses jogos, aparece a repetição ritmada. 
Observa-se a repetição palilálica de um mesmo fonema, ou então do agrupamento de vários fonemas, 
formando um motivo melódico que se renova por tempo mais ou menos longo. 
Esse jogo de repetição ritmada que é, a princípio, autônomo, evolui para jogo de repetição de fonemas 
emitido pelos que cercam a criança. Ela brinca de responder a um som ouvido pelo que ela sabe emitir, 
sejam quais forem um e outro sons; mas, assim que o som emitido se assemelha ao percebido, o jogo 
das mudanças fonéticas muda para o jogo das descobertas fonéticas. Aqui se situa a origem da 
imitação. Um jogo de nível mais elevado, que serve de base ao uso representativo, é o das perguntas 
e respostas. Bem antes de a criança poder fixar e utilizar palavras, ela pergunta o nome dos objetos. 
Não é, porém, uma preocupação semântica que a impele primitivamente a essa conduta. Ela designa 
objetos um após outro, com expressão oral interrogativa, e o adulto deve responder-lhe. Mas pouco lhe 
importa, a princípio, a resposta; e isso se verifica no fato de, muitas vezes, ela não esperar a resposta 
para continuar seu interrogatório. 
Quando a criança atinge o uso representativo da linguagem, continua a verbalizar livremente, sem se 
prender às regras da língua. Encadeia fonemas em grupos desprovidos de significação, associa 
palavras, pertencentes ao vocabulário da língua, em frases absurdas e incoerentes. Mas, no fundo 
dessa verbalização, desenham-se motivos regularmente renovados, que vão assumindo o aspecto de 
uma litania poética. 
A que motivos obedecem tais jogos verbais? Percebe-se que esta atividade, inicialmente, busca a 
satisfação decorrente do estabelecimento de um ritmo e a reprodução constante e monótona de certos 
motivos, de onde nasce uma espécie de acalanto, que adormece a inquietação muscular e leva o corpo 
a um estado de euforia. Mais tarde, quando a criança se submete às leis da língua, quando as emissões 
verbais são cada vez mais determinadas pela significação, os jogos da linguagem proporcionam o 
prazer de uma atividade sem constrições. 
c) Uso prático — Segundo Ombredane, "o uso prático define a linguagem que tem por fim facilitara 
ação em processo de desenvolvimento, sobretudo a que se cumpre em condições coletivas de 
colaboração ou de rivalidade, quer se trate de crianças brincando, de soldados numa ação militar ou 
de homens impulsionando em grupo algo demasiado pesado." 
Noutro lugar, André Ombredane afirma que o uso prático, tem por efeito de facilitar a ação. 
Isso é evidente quando se trata de ações feitas em condições coletivas de colaboração ou de rivalidade. 
Os chamados, as ordens, as indicações, as aprovações, as censuras, as interdições constituem a 
atividade de chefe, à qual Pierre Janet atribuiu grande importância na gênese da linguagem. Da mesma 
forma, é esta atitude do chefe que se observa em todas as formas da linguagem de ação, quer se trate 
de soldados em guerra, de crianças brincando, de operários no trabalho. 
A cada passo da ação a linguagem prática indica a direção a tomar, a técnica a empregar. Por esse 
lado, prende-se à linguagem representativa, mas o que a distingue é a importância do suposto 
conhecido. 
É importante notar que se encontra a linguagem prática na atividade do indivíduo isolado: ordens ou 
desculpas, indicações de objetos e de gestos, aprovações e queixas de si para si, pequenas palavras 
obscuras que pontuam a ação, que marcam as articulações, que sublinham as surpresas, os esforços, 
os sucessos, os fracassos. 
Enfim, conclui Ombredane, que 
o que caracteriza, essencialmente, o uso prático, o que o distingue fundamentalmente da linguagem 
representativa, é a importância do que é fornecido pela situação, do que se supõe conhecido de todos. 
Não se trata aqui, de contar, expor, explicar; trata-se de adaptar prontamente a ação de cada um às 
circunstâncias que são percebidas por todos. Segue-se que a linguagem prática é caracterizada pela 
redução extrema dos elementos representativos e pelo desenvolvimento máximo dos elementos 
sugestivos, excitantes ou inibidores. 
Em relação às funções da linguagem jakobsonianas, podemos dizer que o uso prático corresponde, 
aproximadamente e em parte, às funções referencial e conativa, visto que a função referencial está 
orientada para o referente, para o contexto (a coisa, a realidade extralingüística para que aponta o 
significante) e a função conativa, orientada para o destinatário ou sujeito receptor, e que tem como 
finalidade atuar sobre este mesmo sujeito, influenciando o seu modo de pensar, o seu comportamento, 
etc. 
d) Uso representativo — Continuamos na linha de Ombredane em seu livro, A Afasia e a Elaboração 
do Pensamento Explícito, cujas citações foram todas por nós traduzidas sem transcrição do texto 
francês a que sempre nos referimos: 
Com o uso representativo da linguagem, nós ultrapassamos um limiar importante, pois que 
abandonamos o domínio da linguagem determinada pelo estado afetivo do momento, para 
ingressarmos pela situação concreta. Entramos, então, em uma área particularmente artificial, onde se 
impõe ter-se presente, na imaginação, aquilo que está ausente e onde é necessário supor situações 
que existem. 
A ação representada é uma ação destacada da situação atual; ela implica, da parte do sujeito, uma 
atitude totalmente diversa da que domina aquele que está verdadeiramente envolvido na ação: a atitude 
didática é aquela que caracteriza o indivíduo que realmente não age. 
Corresponde, de um certo modo, à função referencial, denotativa ou cognitiva, e, em parte, à função 
metalingüística, se é que se pode fazer um relacionamento entre o uso representativo e as funções da 
linguagem. 
e) Uso dialético — "O uso dialético da linguagem pode ser entendido como um uso formal que não se 
destina tanto à descrição ou ao relato, quanto a fazer e a desfazer combinações simbólicas. A álgebra 
é a forma mais elaborada deste uso. Os conteúdos aos quais o sistema de signos pode ser aplicado 
são indiferentes." 
Como se vê, o uso dialético e mesmo o uso representativo, são adquiridos pela criança só bem mais 
tarde ou, pelo menos, somente depois de uma certa vivência a criança pode desenvolver tais usos da 
linguagem. 
 
COMPETÊNCIA E DESEMPENHO 
Uma criança, ao atingir a idade de cinco a seis anos, normalmente já adquiriu os elementos básicos de 
sua língua materna, podendo criar e compreender naturalmente um número quase infinito de frases 
que ainda não se tinham apresentado formalmente diante de si. Para compreendermos bem a natureza, 
aquisição e desenvolvimento da linguagem será necessário que, antes, tenhamos uma noção da 
natureza da competência lingüística de quem aprende a falar uma língua. 
"Um dos pontos principais que os teóricos da gramática gerativa estabeleceram como princípios é 
justamente a prioridade da elaboração de um modelo de competência do sujeito que fala, sendo que o 
modelo de 'performance' só pode ser estudado depois." 
Como a competência lingüística se reflete no desempenho, conforme declara Judith Greene, 
as tentativas para solucionar a disputa de fronteiras entre Lingüística e Psicolingüística gravitam em 
torno de uma distinção entre competência, considerada área de interesse da Lingüística, e 
desempenho, considerado área de interesse da Psicologia. A competência refere-se à linguagem no 
sentido do que constitui a capacidade para falar uma língua. O desempenho, por outro lado, refere-se 
às expressões produzidas pelos usuários da língua; a questão é que nem sempre existe uma 
correspondência exata entre as expressões de um locutor e as regras lingüísticas da língua. 
A tal respeito escreve Langacker que 
uma língua é um conjunto de princípios que estabelecem correlações entre significados e seqüências 
de sons. Esses princípios estão subjacentes e tornam possível a comunicação através de um 
comportamento verbal exterior, mas não podem ser equiparados a esse comportamento. Uma língua 
é um conjunto de regras dominado pelo falante; não é nada que um falante faz. O mesmo tipo de 
distinção pode ser feito entre uma sinfonia e sua execução. Não importa de que maneira seja a sinfonia 
executada, ela permanece inalterada. É um sistema musical abstrato que está subjacente à atividade 
dos músicos, mas que não pode ser equiparado à sua atividade. Da mesma forma, um sistema 
lingüístico está subjacente à atividade verbal de seus falantes. Uma língua é um conjunto abstrato de 
regras psicológicas que constituem a competência de uma pessoa como falante. Essas regras colocam 
uma classe ilimitada de frases à disposição do falante, das quais ele fará uso em situações concretas. 
O comportamento verbal real não passa de uma manifestação indireta das regras psicológicas que 
fazem única a linguagem humana. A estrutura de uma língua não é afetada quando seus falantes fazem 
erros ao falar, assim como uma sinfonia não é afetada quando não é bem executada. 
Na página seguinte ele continua: 
A preocupação do lingüista pela competência lingüística é, simplesmente, porque logicamente uma 
descrição da competência lingüística precede uma descrição do desempenho lingüístico. As regras que 
determinam as frases bem construídas de uma língua constituem um elemento essencial do 
mecanismo psicológico envolvido na fala e na compreensão; servimo-nos dessas regras quando 
produzimos e compreendemos frases. 
Uma pessoa que aprendeu uma língua — diz Chomsky — adquiriu um sistema de regras que 
relacionam som e significado de um certo modo específico. Por outras palavras, ela adquiriu uma certa 
competência que coloca em uso na produção e compreensão da fala. 
Fazendo também uma comparação, a Profa. Judith Greene tentou esclarecer o que seria o 
desempenho e a competência e o faz comparando as regras de condução de um automóvel com a 
competência e o seu uso com o desempenho lingüístico. 
Segundo ela, "a aptidão para usar as regras de condução de um automóvel a fim de desenvolver uma 
nova combinação de movimentos de pé e mão quando deparamos com um outro tipode automóvel 
que nos é estranho, é comparável ao uso das regras gerativas para produzir sentenças novas." 
Essas regras gerativas a que se refere Greene são as regras da gramática gerativa da língua do falante, 
a partir das quais ele se torna um falante competente. Ter uma competência lingüística, portanto, é 
dominar as regras gramaticais dessa língua, subjacentes em todos os falantes nativos de qualquer 
língua humana. 
Aliás, "é fundamental distinguir entre a estrutura de uma língua e a maneira como essa estrutura é 
usada. No que diz respeito ao falante, podemos nos referir a uma distinção entre sua competência 
lingüística e seu desempenho lingüístico." 
E Judith Greene escreve que 
uma teoria gramatical deve poder explicar como uma criança é capaz de desenvolver um sistema de 
regras gramaticais que gerarão todas as sentenças possíveis; e mais, como é que ela faz isso com 
base na amostra de dados lingüísticos a que se encontra exposta, amostra essa que será não só 
limitada mas também susceptível de degenerar, no sentido de que conterá muitas expressões 
divergentes que, de um modo ou de outro, terão que ser expungidas dos dados. O argumento é que, 
para que isso seja exeqüível, a criança deve ter uma representação inerente dos princípios da 
gramática universal (que descreve as formas e relações gramaticais que são comuns a todas as 
línguas, que Chomsky denominou universais lingüísticos) que restringe a sua escolha de possíveis 
conjuntos de regras gramaticais. Isto não é somente uma hipótese acerca do modo como uma criança 
aprende uma língua. Implica também que, durante o processo de aprendizagem, as regras gramaticais 
de sua língua estão sendo internalizadas pela criança; e é justamente essa competência lingüística que 
está subentendida no desempenho lingüístico do adulto. 
"Uma gramática deve fornecer a melhor descrição possível de uso lingüístico", ou seja, "da competência 
de quem usa uma determinada língua." Mas essa descrição 
nada teria a dizer sobre as regras ou operações efetivas por meio das quais um usuário da língua 
realiza essa produção. 
As regras da gramática estão internalizadas na cabeça do locutor e fornecem a base para a sua 
compreensão das relações lingüísticas. 
Como as gramáticas se baseiam nas expressões dos que falam a língua-mãe ou, melhor dito, em suas 
intuições sobre expressões possíveis, as investigações psicológicas do desempenho lingüístico podem 
ser importantes no esclarecimento de dados lingüísticos. 
Por isso, "não é possível avaliar a competência de uma criança pequena, pois ela não pode formular 
julgamentos gramaticais. Somente a 'performance', ou seja, a produção oral, pode servir de base de 
estudo. As frases pronunciadas por crianças são, às vezes, comparadas às que os adultos empregam 
no 'estilo telegráfico'. Essa observação não leva em conta supressões feitas pelas crianças, quando o 
adulto conservaria marcas de gênero ou concordâncias em frases do tipo: Mamãe e papai comprou 
dois carro." 
O trabalho dos psicólogos da linguagem, psicolingüistas e lingüistas, ao dirigirem "a atenção para o 
comportamento dos indivíduos quando usam sentenças, à busca de uma relação um-a-um entre regras 
gramaticais e desempenho dos sujeitos, trouxe a lume, pelo seu próprio fracasso, a influência de muitos 
fatores inesperados." 
Dentro da área da Lingüística, os que se preocupam com o desempenho da linguagem desenvolvem 
um estudo que se denomina Estilística. Tal estudo, no entanto, tem-se desenvolvido mais 
especificamente em relação à língua literária e, um pouco menos, em pesquisas dialetológicas. 
 
A AQUISIÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM 
Trataremos, neste capítulo, da aquisição espontânea e natural da linguagem nativa sob o título geral 
acima e da aquisição artificial, feita, geralmente, na escola, sob o título de APRENDIZAGEM DA 
LINGUAGEM. Como é natural, só nessa segunda parte é que trataremos de uma pedagogia da 
linguagem. 
Seria muito bom se todos os que militam no magistério primário, e mais ainda, os especialistas em 
ensino maternal, jardim de infância e pré-escolares em geral, tivessem uma noção bastante lúcida deste 
aspecto do desenvolvimento da criança. Aliás, se os poucos privilegiados que participam dessas pré-
escolas não tiverem a possibilidade de aproveitar das vantagens que lhes cabem, de nada adiantaria 
a existência de tais estabelecimentos. 
J. Budin, em sua Metodologia da Linguagem, escreve que "o melhor meio de acompanhar a formação 
espiritual e humana da criança consiste em seguir-lhe o desenvolvimento da linguagem", começando 
pela observação de todas as suas reações verbais mais elementares, já que, "em essência, o grito da 
criança contém, apenas, sons próximos das vogais, acrescidos de outros, semelhantes a sopros que 
se produzem na respiração." 
Até hoje, infelizmente, ainda não se tem uma explicação suficientemente clara e incontestável sobre a 
aquisição da linguagem, mas 
duas teorias explicam (cada uma negando a outra) a germinação da linguagem infantil: 
a) O Nativismo — dá grande importância ao poder inventivo da criança (imaginação). Assim, muito do 
que ela diz será produto de uma atividade criadora, absolutamente espontânea; 
b) O Empirismo — declara que a linguagem infantil se forma pela imitação. 
Uma terceira teoria, conciliatória (acrescenta Budin), admite uma atividade congênita, instintiva, 
involuntária e ancestral (impulso ou instinto de linguagem), sem a qual não pode haver imitação. 
De fato, o conteúdo das expressões verbais está condicionado à imitação, o que não diminui o valor da 
espontaneidade, sem a qual se torna impossível a seleção das palavras. 
Em seu livro, Psicopatologia da Linguagem (Alguns Temas), Ofélia Boisson Cardoso trata do mesmo 
tema, escrevendo que 
argumentar-se-á com o fato de ser a linguagem adquirida, em início, quando mais rudimentares são os 
processos de aquisição, através de estímulos exclusivamente sonoros. Não é bem esse o processo, 
porém. A criança realmente percebe sons e os imita; mas não intencionalmente; há uma atividade 
lúdica, de jogo, que atende à inquietação muscular, satisfazendo-se no próprio exercício; não há um 
determinado alvo a atingir. Emitindo os sons que imita, ela não pretende comunicar-se, quando chega 
a fazê-lo intencionalmente, o som como que já se tornou concreto: e, semelhante à etiqueta, tornou-se 
consistente. Só depois de vencida esta etapa, abstraindo e generalizando, poderá a criança comunicar-
se usando a palavra. 
Não temos a intenção de discutir aqui todas as teorias e respectivas refutações, mas apenas abordar 
o assunto de uma maneira que nos pareça satisfatória, dada a extensão do trabalho. 
Veremos que "as crianças mostram uma habilidade surpreendente para falar com fluência qualquer 
língua constantemente usada ao seu redor. Toda criança normal que não seja isolada do uso da 
linguagem começa logo a falar naturalmente uma ou mais línguas." 
Aliás, o que é mais importante é que 
a aquisição da língua vernácula pela criança independe de qualquer orientação especial. Os pais 
podem gastar horas "reforçando" toda parcela de atividade verbal reconhecível de seus filhos com um 
sorriso ou outra recompensa, ou tentando por meio da linguagem infantil transpor a distância entre sua 
competência lingüística amadurecida e a competência incipiente da criança. Mas não há razão especial 
para crer-se que tal atividade tenha qualquer conexão com o êxito final da criança ao tornar-se falante 
nativo da língua de seus pais. As crianças podem aprender uma língua brincando com outras crianças 
que a falam o melhor que podem, apesar de todos os esforços concentrados de pais extremosos. A 
única coisa aparentemente necessária é ficar suficientemente exposto à língua em questão. 
Isto não significa que a figura dos pais não tenha a mínima importância para a aquisição da linguagempela criança. Pelo contrário, ela será importantíssima. Principalmente a figura da mãe, que atuará 
emocionalmente com uma grande intensidade na psique da criança que inicia a aquisição da 
linguagem. 
A importância das interferências emocionais no desenvolvimento da conduta verbal permite situar o 
problema da assimilação das formas verbais como um problema vinculado ao aprendizado de novas 
posições e de novos desempenhos funcionais no interior do grupo. A idéia central é a de que o domínio 
da linguagem segue rigoroso paralelismo com as modificações da constelação familiar, tal como essas 
modificações são perceptualmente assimiladas pelo falante, na época própria em que ele se revela, 
praticamente, sensível ao aprendizado da fala. Significativa, sobretudo, será a forma como se irá viver 
a relação com a figura materna, pois que a linguagem do falante, em sua fase inicial, se revela 
essencialmente maternal. 
Antes de A. G. Penna, Merleau-Ponty já afirmara que "toda linguagem é, sob certo sentido, maternal. 
Tal como as relações da criança com sua mãe, também a aquisição da linguagem é um fenômeno de 
identificação. Aprender a falar é aprender o desempenho de um certo número de papéis, é dominar um 
certo número de condutas das quais fomos inicialmente apenas espectadores." 
É claro que o que aqui se fala em relação à mãe ou aos pais é válido para qualquer pessoa que tenha 
grande influência, seja como substituta ou como auxiliar dos pais, nesta primeira fase da vida da 
criança. Assim, a babá poderá ter uma influência "maternal" sobre a criança muito maior do que a mãe, 
quando esta passa maior parte do dia separada do filho, como é o caso da mãe operária, por exemplo. 
Também é cabida aqui uma observação sobre a importância das modificações da "constelação 
familiar". Para a criança, são de importância fundamental, constituindo as estrelas principais do lar, as 
pessoas de quem ela mais depende afetivamente. Normalmente, é claro, tais pessoas são os pais. No 
entanto, elas podem ser os avós, a babá, os irmãos, etc. Por exemplo, quando surge um neném, depois 
que o "caçula" já está de uma certa idade, isto acarretará uma modificação muito grande em relação a 
ele. Por isso, sem dúvida, haverá um grande impacto psicológico-emotivo sobre tal criança, inclusive 
com perigo de algum tipo de retrocesso no seu processo de desenvolvimento. 
Esta capacidade de aquisição da linguagem é notável por várias razões, acrescenta Langacker. Em 
primeiro lugar, por sua universalidade em toda a raça humana. Simplesmente não há casos de crianças 
normais que, tendo tido a oportunidade, não tenham adquirido uma língua nativa. 
A aquisição da linguagem é uniforme na espécie humana. É também específica da espécie humana. 
Toda pessoa normal aprende uma língua humana, mas nenhum outro animal, nem mesmo o macaco 
mais inteligente, mostrou-se capaz de um mínimo de progresso nesta direção, embora alguns animais 
possam aprender a resolver problemas, a usar instrumentos, etc. 
O processo é ainda mais notável pela relativa rapidez e por sua perfeição. Quando tentamos analisar 
uma língua para ver como funciona, descobrimos ser ela extraordinariamente complexa, abrangendo 
princípios de organização altamente abstratos. Mesmo assim, nos primeiros anos de sua vida, qualquer 
criança consegue dominar pelo menos um desses sistemas. Além disso, o sistema lingüístico dominado 
pela criança é idêntico para todos os fins práticos ao sistema empregado pelas pessoas que a cercam. 
As diferenças são realmente mínimas quando se comparam com o vulto dessa realização. Se a criança 
for regularmente submetida a duas línguas, provavelmente aprenderá as duas; ainda mais, conseguirá 
manter os dois sistemas lingüísticos separados, o que em si é também um feito considerável. 
Demonstrando o caráter essencialmente socializado da conduta verbal, inúmeras e importantes 
discordâncias existem contra a afirmação de Piaget de que a resposta verbal da criança é egocêntrica. 
David Krech e Richard S. Crutchfield escreveram, em seu livro, Elementos de Psicologia, que, 
segundo Vigotski, a criança usa a sua linguagem egocêntrica como forma de comunicação com os 
outros. Por exemplo, quando uma criança mostra todos os sinais de linguagem egocêntrica e é 
colocada num grupo de crianças surdo-mudas ou entre estranhos, ou isolada num canto, fala menos 
do que sob outras condições. Vigotski admite, continuam, que a natureza egocêntrica da linguagem da 
criança resulta da diferenciação insuficiente entre o seu mundo interior e o mundo social externo. Vale 
dizer, a criança sente que todos os outros percebem o que ela percebe e compreendem o que ela 
compreende. 
A abundância das pesquisas realizadas sobre o processo do desenvolvimento da linguagem permite 
que se considere 
que os primeiros sons emitidos por um recém-nascido são os elementos manifestos, a partir dos quais 
se desenvolve o discurso; que as vocalizações são utilizadas como meios de comunicação antes da 
aquisição da própria palavra; que se compreende a palavra antes que se possa observar a sua 
utilização; que a criança normal possui um repertório de apenas algumas palavras, por volta de um 
ano; que o desenvolvimento no curso do primeiro semestre do segundo ano é lento, mas que, ao fim 
desse mesmo ano, uma grande aceleração se registra quanto à aquisição de respostas verbais; que 
as palavras são utilizadas, primeiro, num sentido geral, dependendo o seu emprego específico do 
processo do desenvolvimento; que os substantivos aparecem primeiro, seguindo-se os verbos e os 
adjetivos e, mais tarde, as palavras exprimindo relações, e só ao fim do segundo ano os pronomes; 
que as primeiras palavras têm função de sentença e que as combinações de palavras aparecem 
relativamente tarde. 
Vejamos, a seguir, a abordagem da evolução ou desenvolvimento da linguagem nos primeiros anos da 
vida da criança: 
Nos primeiros dois meses de vida, os nenês emitem todos os sons da linguagem humana. Isso, conclui 
Osgood, contradiz inteiramente a noção de que a criança gradualmente se torna capaz de produzir 
vários sons. Uma afirmação mais precisa seria dizer que se modificam as freqüências comparativas 
dos vários sons da linguagem, à medida que se dá o desenvolvimento. 
Do terceiro mês em diante, expressões traduzem estados de satisfação. A criança brinca com os sons 
do mesmo modo por que, mais tarde, movimenta os braços e as pernas. É a fase do balbucio, em que 
são empregadas todas as vogais e grande parte das consoantes, aparecendo, ainda, sons guturais e 
nasais para os quais não existem símbolos. Vêm, primeiro, os labiais: p, b, m...; por último as guturais: 
k, g, r... Depois, para reproduzir as nossas palavras, a criança deve, apenas, combinar os elementos 
lingüísticos de que dispõe, o que faz pela imitação. Começa por imitar a si mesma, em longos e 
intermináveis monólogos; a imitação dos outros já é mais difícil, embora, aos dois ou três anos, a 
linguagem da criança seja o eco de tudo quando ela ouve. 
Segundo Jean-Yvon Lanchec, 
antes dos 10 meses, aproximadamente, a criança passa pelo estágio pré-verbal: 
— 1ª fase: A criança manifesta oralmente suas sensações agradáveis e desagradáveis. A expressão 
vocal é espontânea, sem imitações. 
— 2ª fase: A criança tenta imitar o que escuta, sem lhe atribuir significação particular. 
— 3ª fase: A criança compreende algumas palavras sem poder repeti-las. 
O sentido das palavras representa todas as vivências que a criança obtém pelo ouvido e que, por sua 
vez, determinam uma linguagem própria. As primeiras reações resultam unicamente da impressão 
sonora; entretanto, aos seis meses, as diferenças de sons se tornam acentuadas e correspondem a 
estados de alegria, de cólera ou de indiferença. 
Os olhos buscam a pessoa que fala. Atua sobre a criança um som vocal; às vezes, uma palavra 
característica ou um conjuntoindeterminado onde sobressai uma espécie de melodia da linguagem. 
Paulatinamente o idioma passa a ser compreendido de maneira mais precisa: há manifestação da 
própria vida, da vida alheia, de algo que podemos chamar de realidade. 
Aos oito meses, existem movimentos independentes; aos nove, compreendem-se gestos simples. Ora, 
os gestos são acompanhados de vocábulos; formam-se, pois, associações entre uns e outros, o mesmo 
acontecendo com relação aos objetos (indicados pelo olhar) e seus respectivos nomes. 
Entre os 10 e os 14 meses, é pronunciada a primeira palavra com significação. As primeiras 
manifestações intencionais de comunicação vão desenvolver-se progressivamente: os substantivos 
aparecem primeiro, depois os verbos, os adjetivos e os advérbios. 
A título de exemplo, eis a progressão constatada numa criança: 
— 3 palavras aos 12 meses, 
— 20 palavras aos 15 meses, 
— 23 palavras aos 18 meses. 
A aquisição se faz muito lentamente no início e a palavra pode ter então várias significações. É o estágio 
da palavra-frase. O nome de um objeto serve para designar todas as ações com ele relacionadas. 
Frases de uma só palavra — Os adultos exprimem por meio de uma oração o que as crianças fazem 
com um só vocábulo; no entanto, mesmo na linguagem dos adultos há exemplo disso: — Socorro! Por 
isso, os adultos, em geral, compreendem pouco as crianças que não conhecem bem, dando-se o 
oposto com as que figuram na sua órbita familiar. 
A oração de duas palavras surge quando a criança completa um ano e meio, ou mesmo mais tarde. 
Verifica-se um como encaixe de duas frases de uma única palavra. Cada um dos vocábulos poderia, 
por si, abranger o conteúdo total. Às vezes acontece também que o outro indica um aspecto particular: 
"Mamã vem" (= Mamãe, venha!). 
Tratando das pesquisas que sobre o assunto se fizeram a partir de 1960, Lanchec escreve: 
Essas pesquisas consideram que a criança passa por uma sucessão de estágios que correspondem, 
cada um, a um conjunto coerente, a uma "gramática" particular. As frases de duas palavras são 
formadas a partir de classes gramaticais, numa ordem bem precisa: a classe pivô (P), formada por 
poucos elementos utilizados freqüentemente, e a classe aberta (O), cujos elementos são mais 
numerosos e menos empregados. Temos assim frases (S) do tipo: S Õ (P) + O 
meu pé 
Exemplo: (P) = alegre + O = homem 
aquele café 
Essas classes vão diferenciar-se progressivamente, sem corresponderem às classes gramaticais dos 
adultos. Brown e Bellugi observaram que, em cinco meses, cinco classes gramaticais aparecem, a 
partir de uma classe-pivô: artigos, adjetivos, pronomes demonstrativos, adjetivos e pronomes 
possessivos. 
H. Delacroix cita o exemplo de uma menina observada por O. Bloch, que empregava a palavra ‘robe’ 
para designar tudo o que se relacionava com o passeio (robe, chapeau, voiture). Depois, a reunião de 
duas palavras constitui a primeira frase elementar. Em alguns casos, cada um dos termos pode ter um 
valor de palavra-frase, o que às vezes torna a diferenciação delicada. Esse domínio das primeiras 
reuniões de palavras desenvolve-se entre dois e três anos. Constatamos que os substantivos são 
empregados sobretudo no início: uma criança de dois anos utiliza 16 verbos entre 100 substantivos. 
Os verbos manifestam-se no vocabulário com um atraso de um a cinco meses em relação ao 
substantivo. Eles servem para manifestar a vontade: "coloque", "quero", "levanta", etc., ou ainda o 
resultado de ações: "veja", "olha" (= veja o resultado! olha o resultado ou o que aconteceu!). A segunda 
pessoa só aparece mais tarde. 
Até aos dois anos, as palavras da criança não têm flexão: substantivos, verbos no infinitivo (ou forma 
invariável na terceira pessoa), adjetivo na forma positiva. 
Aos três anos, entram em uso as desinências, porque a criança começa a perceber o valor das palavras 
dentro da sentença. O emprego de formas variadas traduz, então, necessidade de expressar coisas 
diferentes. Segundo Ster, "existe uma base relativamente pequena de formas adquiridas, a qual permite 
à criança constituir, por si mesma, o caudal das formas gramaticais". Assim, em torno daquilo que já é 
conhecido, se formam termos novos. 
O processo de aquisição dura vários anos e depende muito do ambiente. As formas difíceis tardam 
mais: conjunções, preposições e numerais, inclusive. 
Aliás, quando aparece o uso das desinências, os períodos mais longos também já estão aparecendo, 
já que, após o aparecimento de frases com duas palavras, 
os períodos mais longos começam logo a aparecer rapidamente. Nomeiam-se pessoas ou coisas que 
participam de um acontecimento; vários acontecimentos se confundem na mesma frase. (Chamam-se 
orações irradiadas, visto que possuem um centro comum). A criança pode, outrossim, dar realce a certo 
fato, negando, simultaneamente, o oposto: o pequeno não (= o pequeno, não o grande). 
As partículas negativas (principalmente no francês), geralmente mal empregadas, são dotadas de 
sentido emotivo-volitivo. Sobressaem duas tendências: expressar a emotividade e colocar, sempre, 
acima de tudo, as coisas concretas, intuitivas. 
O período da relação manifesta-se entre três e quatro anos. Constatamos a utilização de artigos, de 
adjetivos e de pronomes demonstrativos, depois, um pouco mais tarde, de pronomes possessivos. 
No início do terceiro ano, aparecem as frases perifrásticas do tipo "É bom que", "É necessário que", 
etc. As subordinadas causais introduzidas por porque são empregadas mais tarde. Nessa idade, as 
crianças não se preocupam nem com a causa, nem com a finalidade. 
De começo, faz-se tão somente a justaposição das frases. A subordinação representa, já, uma grande 
conquista da linguagem e do pensamento. As orações temporais e as relativas são as primeiras; mais 
tarde vêm as causais, as condicionais e as finais. 
Em todas as partes do mundo, as primeiras palavras abrangem formas semelhantes: labiais e dentais, 
unidas a vogais, com reduplicação: mamá, naná, tatá, etc. e, por influência dos adultos, designam os 
pais, o alimento, etc. De início, traduzem desejos e estados emotivos. Aos poucos, todavia, progride o 
ponto de vista objetivo e regride o subjetivo. Desenvolve-se a função denominativa. A criança pergunta 
como se chama (ou o que é) uma coisa e mais tarde o porquê (aos quatro anos, aproximadamente). 
Aparecem vocábulos onomatopaicos; outros, analógicos e alguns de significado diferente do habitual 
(mamá = alimento). A duração dessas divergências no concernente à linguagem dos adultos varia 
bastante, podendo ser até muito curta. 
Aos quatro ou cinco anos, o desenvolvimento da linguagem é tal que a criança está em condições de 
manifestar verbalmente seus afetos e idéias a ponto de poder ser compreendida pelo adulto. 
P. Manyuk constatou que todas as estruturas de base que o adulto emprega são utilizadas por certas 
crianças entre os três e meio e os quatro anos e meio, mas o desenvolvimento de estruturas mais 
complexas vai progredir até a idade de dez anos. C. Chomsky insiste no fato de que as estruturas não 
são todas dominadas antes dos seis anos. Todas essas pesquisas põem em evidência a complexidade 
do desenvolvimento da linguagem, que prossegue durante muitos anos, enquanto progressivamente 
as diversas regiões do cérebro se diferenciam e se organizam. 
Cabe ainda creditar a O. Hobart Mowrer "a observação de que é pela capacidade de sentenciação e 
não pela simples emissão de palavras isoladas que a verdadeira dimensão verbal se instala na criança". 
De tudo o que até aqui se viu já se pode concluir que as formas sintáticas não são absorvidas em pouco 
tempo, nem todas ao mesmo tempo, mas paulatina e gradativamente. Também se pôde observar que 
a criança não repete simplesmente o que ouve falar ao seu redor. Ela só começa a utilizar-se de uma 
estrutura a partir do momento que começaa entender tal estrutura. Nenhuma criança reproduz 
indiferentemente uma palavra ou frase ouvida. O que pode acontecer, e é muito freqüente, é que a 
palavra ou a frase seja entendida de uma maneira própria da criança. 
Segundo Neumann, "a linguagem progride, pouco a pouco, do afetivo-volitivo para o objetivo-
compreensivo", de tal maneira que o concreto precede o abstrato, o individual precede o geral e o 
subjetivo precede o objetivo. 
Voltando ao que se disse no início deste capítulo, pode-se dar uma ampla interpretação à normalidade, 
no que diz respeito à aquisição da linguagem. 
Na realidade, a aquisição da linguagem é possível apesar das deficiências físicas e psicológicas. Nem 
a incapacidade de ouvir, nem a de emitir sons vocais impedirão uma criança de dominar um sistema 
lingüístico. No caso das crianças surdas, é evidentemente necessário um treinamento especial, pois é 
claro que um surdo não pode aprender uma língua ouvindo-a. 
As crianças incapazes de usar seus órgãos vocais para produzir sons vocais podem, no entanto, 
aprender uma língua sem dificuldades especiais. São capazes de compreender perfeitamente uma 
língua e podem aprender a comunicar-se por escrito como qualquer outra pessoa. A aquisição da 
linguagem, portanto, não depende de maneira decisiva da expressão verbal. 
A aquisição da língua nativa é menos provavelmente afetada pelo retardamento mental do que a de 
outras habilidades intelectuais. Uma criança deficiente mental a ponto de não poder aprender aritmética 
pode ainda assim adquirir a linguagem. 
No entanto, uma criança não pode inventar uma língua a partir do nada. 
Estar exposto ao uso da língua é, pois, o requisito mínimo necessário para a aquisição da linguagem. 
Quando trazidas para a sociedade normal, onde a linguagem é regularmente usada, as crianças que 
cresceram em regiões desertas ou em isolamento lingüístico, geralmente conseguem fazer alguns 
progressos no aprendizado do uso da língua. 
Neste caso, é claro, a dificuldade será proporcional ao tempo que a criança ficou isolada da linguagem. 
No entanto, não há uma documentação suficiente sobre tais experiências porque tais casos são raros, 
como é natural. 
A língua que uma criança aprende, aprende-a a partir dos modelos que tiver em seu convívio, qualquer 
que seja a situação. 
A estrutura da linguagem humana é algo extremamente complexo. Por isso, de modo algum poderá 
ser explicada suficientemente com base no mecanismo de condicionamento e reforço ou no estímulo 
e reação, conforme ensina Langacker. 
O modo como se reforçam nos bebês certos sons e se extinguem outros, geralmente é explicado pela 
teoria do condicionamento e reforço. No entanto, embora não esteja de todo provada esta hipótese, se 
isto for comprovadamente verídico, ainda não explicará a mínima parte da aquisição e do 
desenvolvimento da linguagem. 
A tal respeito, "a hipótese que propõe Mowrer é a de que o processo de reforçamento beneficia todos 
os sons emitidos pela própria mãe da criança e que são por esta, eventualmente, reproduzidos. Ocorria 
o que ele chama de recompensa secundária. Em outras palavras, a emissão dos sons semelhantes 
aos produzidos pela mãe é recompensada na medida em que esses sons se associam aos prêmios e 
à redução das tensões produzidas por eles." 
Seria muito interessante saber-se como se organiza e como se fixa a linguagem no cérebro de uma 
criança. No entanto, a sua descrição não é muito simples, dependendo, concretamente, de um 
conhecimento básico de cibernética, de comunicação e neurofisiologia. No entanto, "nos últimos dez 
anos, pôde ser formulada uma interpretação neurofisiológica satisfatória dos fenômenos do 
desenvolvimento da linguagem oral, graças aos trabalhos de Hyden, em 1962, e de Barbizet, em 1964. 
O cérebro foi algumas vezes comparado a um computador que conservaria em sua memória as 
informações recebidas por todas as vias nervosas." 
Isto acontece de tal modo que "quando uma mãe mostra a uma criança um objeto, pronunciando o 
nome desse objeto (lápis, por exemplo), a criança escuta o nome enquanto toma conhecimento do 
objeto, olhando-o, apalpando-o, etc. Ela adquire, assim, a significação ligada ao nome do objeto pelo 
uso de seus órgãos sensoriais e sensitivos: receptores, vias, centros de recepção e vias de 
associação." 
Grande estudioso do assunto e lingüista de renome internacional, Langacker afirma que "a tarefa da 
Lingüística é chegar a uma compreensão da linguagem;" e que "é fundamental para esse fim um 
conhecimento da capacidade de aquisição da linguagem, a qual vimos ser admirável por várias razões. 
Uma explicação satisfatória da aquisição da linguagem (afirma ele), ainda está longe de nosso alcance, 
mas com esse objetivo em vista estamos grandemente motivados para investigar a estrutura das 
línguas. Uma das razões que justificam os estudos lingüísticos, em outras palavras, é o fato de que 
eles poderão trazer algum esclarecimento sobre a natureza de tão notável aspecto do desenvolvimento 
psicológico da criança." 
Enfim, parece claro que o conhecimento do processo de aquisição e desenvolvimento da linguagem 
será de grande proveito para os psicólogos e pedagogos em geral e, mais especificamente, para os 
que se preocupam com o ensino da linguagem. 
Vejamos, portanto, alguma coisa a respeito do ensino e da aprendizagem de línguas. 
 
APRENDIZAGEM DA LINGUAGEM 
Como foi visto no início deste capítulo, a diferença entre aquisição e aprendizagem da linguagem é 
muito sutil e, no que nos interessa, não vale a pena teorizar sobre o assunto. Para sermos práticos, 
consideremos sob o título de aprendizagem o resultado de trabalho pedagógico, enquanto que a 
aquisição é aquela que se realiza espontaneamente, sem uma preocupação metódica. 
Não nos caberá também a defesa de um ou outro método ou de uma ou outra teoria da aprendizagem 
específica. Nossa abordagem pretende ser a mais descomprometida possível, dando apenas uma 
visão panorâmica do que sobre o assunto se discute entre os especialistas e doutos. 
Em seu livro, Psicologia do Comportamento, tratando da linguagem, Henri Piéron ensina: 
Os gestos vocais, que comportam meios de ação sobre os outros seres (gritos para amedrontar, para 
chamar, para enternecer) tomam facilmente significação simbólica. Seu desenvolvimento sistematizado 
é a linguagem que, num grupo social, é transmitida pela educação aos novos indivíduos do grupo. Os 
gestos vocais, em toda sua flexível variedade, são praticados pelas crianças e, por associação com 
experiências perceptivas, sua significação, seu papel são aprendidos progressivamente, com o duplo 
movimento da associação analógica (que estende o uso dos termos) e da inibição condicionada (que 
o restringe e adapta), através dos ensaios-e-erros da vida mental. 
É lógico que, numa sociedade do tipo da nossa, a linguagem precisa de ser ensinada e aprendida, se 
a quisermos em níveis mais abstratos e técnicos, principalmente porque a ascensão social está quase 
sempre ligada ao domínio de determinados registros da língua padrão, considerados mais importantes 
ou mais cultos. Por isso a escola tem uma grande importância na aprendizagem da língua, visto que 
ela é a instituição social destinada a conter a desenfreada e desorganizada evolução de uma língua, 
como acontece com todas as línguas faladas por muitas pessoas, como o português, o inglês, o 
espanhol, etc. 
É a partir da escola que se estabelece a unificação de uma língua e o seu desenvolvimento técnico e 
artístico. 
Por tudo isso e muito mais é que "uma introdução à natureza da linguagem é importante para qualquer 
pessoa que interesse por possíveis aplicações práticas dos resultados da investigação lingüística. Uma 
compreensão fundamental da linguagem seria certamente valiosa para quem estuda ou ensina uma 
língua (mesmo a língua nativa do aluno ou professor)." 
Como já vimos,

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