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A história da gastronomia no Brasil

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A história da gastronomia no Brasil
A cozinha brasileira é diversificada desde a sua origem
O índio, que o colonizador português encontrou ao chegar ao Brasil se alimentava de mandioca, palmito, aipim, batata, abóbora, milho, feijão, fava, amendoim, cará os quais plantava e colhia também se alimentavam de carnes e peixes. Com a mandioca, produzia farinha e beiju, onde a primeira constituía a base de sua alimentação. Não plantava frutas, apenas comia o que a natureza lhe oferecia: abacaxi, goiaba, cajá, maracujá, mamão, mangaba e caju. O peixe era cozido ou assado inteiro, sem escamar. A caça era assada com couro e comida semi crua. 
Todo o alimento era preparado em separado, mesmo que fosse consumido junto; o condimento principal era a pimenta, usada verde ou madura, que podia ser consumida inteira, com farinha. O molho resultante da mistura de pimenta e sal era adicionado à comida no momento de ser servida. 
As bebidas eram feitas a partir da fermentação da mandioca, do aipim, da batata-doce e do milho. O vinho era feito de caju, ananás e jenipapo, e também de beiju e tapioca. Igualmente havia a garapa de pamonha – pamonha diluída em água – e xibé, farinha de mandioca com água. As bebidas eram servidas quentes. 
Quando colonizaram o Brasil, e na medida em que iam se instalando, portugueses e suas famílias traziam da África os escravos. Foram da mistura desses três povos, o índio, o português e o negro, que nasceu o brasileiro e sua cozinha.
 
Ao negro a alimentação era imposta pelo colonizador português, que trazia de sua terra natal, vacas, touros, ovelhas, cabras, carneiros, porcos, galinhas, patos, gansos, bem como grande variedade de frutas, legumes, verduras, cereais e temperos. 
Os escravos aprenderam a fazer pirão cozido, misturando a farinha de mandioca ao caldo fervente; apreciavam o milho, preparavam angu, um mingau mais consistente que o pirão, feito com água e fubá. As mulheres portuguesas faziam bolos, canjicas e pudins com o milho brasileiro. 
O arroz era cozinhado com água e sal, com a consistência do pirão, para acompanhar carnes e peixes. Arroz branco, solto e seco era servido somente em hotéis e casas ricas. A mistura de raças também originou variedades de arroz: de hassuá, de forno, de cuxá, de pequi, de carreteiro, que também estavam presentes em doçarias sob a forma de mingaus, bolos, pudins e arroz doce. O feijão, apesar de pouco apreciado pela população da época, também fazia parte da alimentação, e era consumido junto com farinha, peixes frescos e carnes. 
Os escravos da cidade também comiam toucinho, carne-seca, peixe salgado, laranja e banana. Os escravos de propriedades mais pobres eram sustentados apenas com farinha de mandioca e caldo de laranja, e mesmo assim eram mais fortes e sadios que a média dos europeus. 
Diversos alimentos, como inhame, quiabo, erva-doce, gengibre, açafrão, gergelim, amendoim africano, melancia, banana e coco foram trazidos do continente africano quando do tráfico de escravos e com esses se alimentavam. A banana foi o alimento vindo de lá que mais ganhou popularidade. 
O coco, a princípio, era consumido apenas em parte por índios e africanos, que aproveitavam somente a polpa crua e a água. Mais tarde, por influência portuguesa, passaram a extrair o leite para usar no preparo do cuscuz – prato típico africano, que no Brasil teve variações. 
Carne de caça, peixes, crustáceos e moluscos eram muito apreciados pelos negros, que raramente matavam cabras, porcos, ovelhas ou carneiros para consumo próprio e dos quais comiam apenas as vísceras fritas ou assadas junto com feijão. Eles não consumiam leite, por considerar bebida de crianças. 
Sabores do Brasil
Que prato poderia ser considerado o verdadeiro representante do povo brasileiro? Feijoada ou o feijão com farinha e carne-seca? Virado à paulista ou tutu mineiro?  
Pratos como feijoada, feijão com farinha e carne-seca, virado à paulista, tutu mineiro, vatapá baiano, moqueca capixaba, quindim pernambucano, qualquer um deles, e mais uma centena de outras iguarias, pode ser considerada como a mais perfeita tradução do paladar brasileiro. E a receita original deve ter sido testada pela primeira vez nos dos tempos do Brasil colônia.
A cada dia, historiadores, nutricionistas e antropólogos, depois de analisarem os cadernos de receitas das tetravós, misturam seus achados com dados históricos conhecidos e o resultado é a confirmação de que comida não existe apenas para o nosso sustento. O cardápio de 400 anos serve de indicador para que hoje os historiadores entendam melhor a relação entre conquistadores e conquistados; a organização social ao longo da história e as trocas entre os que aqui se encontravam com os que chegaram em naus capitânias ou em navios negreiros.
A formação da identidade nacional é fruto da miscigenação de três raças, a comida brasileira é a mistura de uma generosa porção da cozinha portuguesa, acrescida de alguns sabores africanos e mais um pouquinho da culinária indígena.
Os “ingredientes” da formação da identidade da cozinha brasileira são realmente esses, mas o que os pesquisadores querem saber é: em quais proporções índios, portugueses e africanos contribuíram para a cultura gastronômica nacional? Porém, menosprezaram o papel dos indígenas no processo de formação da culinária brasileira como um todo”.
A literatura sobre o tema nos leva a acreditar que, enquanto as mulheres negras e portuguesas contribuíam com a arte de criar receitas, a cunhã se limitava a entrar com o milho, a mandioca e o amendoim. “Foram os sistemas culinários indígenas que tornaram possível o processo de colonização do Brasil. Por muito tempo, nossa culinária foi a indígena”.
Nos primeiros séculos da colonização, a cozinha era um reduto exclusivamente feminino e praticamente não existiam mulheres brancas no Brasil. Então, a tática dos portugueses foi a de casar com mulheres indígenas. Dessa maneira, os colonizadores entraram para uma extensa rede de parentesco e aliados, o que possibilitou o êxito da colonização, mesmo com um número bastante reduzido de elementos. “Por meio dos casamentos, os portugueses conseguiram produzir e obter alimentos do modo indígena, até porque suas mulheres índias eram as únicas cozinheiras possíveis”.
Pelo menos no primeiro século, grande parte da sobrevivência dos colonizadores aconteceu graças à adoção do modo de vida indígena. Já no século 17, com o início da produção açucareira no Nordeste e o vaivém dos navios pelo Atlântico, o português começou a trazer parte da culinária de sua terra natal para o Novo Continente.
Após dominarem o comércio de especiarias, os portugueses, no século 17, viram seu monopólio ameaçado por holandeses e ingleses. A crise, então, fez com o que os colonizadores trocassem produtos e sabores entre suas colônias. Dessa maneira, trouxeram para o Brasil sementes de especiarias do Oriente e levaram plantas daqui para outras terras do Império, a ponto de confundir os pesquisadores sobre a origem da flora em mais de um continente. Um dos exemplos da confusão é o coqueiro que, apesar de ser um dos nossos símbolos, veio de Cabo Verde, trazidos pelos portugueses em 1553.
O mesmo aconteceu com a manga, a jaca, a canela, o açúcar, o algodão. As trocas agrícolas se deram, em grande parte, devido à resistência do colonizador em se entregar de corpo e alma à dieta alimentar do Novo Mundo. A saída para continuar nos antigos hábitos alimentares era trazer para cá tudo o que pudesse ser transportável da Europa ou das colônias portuguesas de além-mar.
A aceitação dos alimentos nativos pela elite açucareira da colônia só ocorreu de fato quando o abastecimento dos importados se tornou irregular por causa da guerra contra os holandeses, ocorridas entre 1595 e 1663. Aí, sim, na falta da branca farinha de trigo usada pelos europeus no pão de cada dia, os senhores de engenho começaram aceitar as consideradas menos nobres, como as de milho e de mandioca, cuja técnica de extração, aliás, os índios dominavam comoninguém.
A introdução do azeite de dendê, supostamente trazido pelos escravos, é uma das questões que geram dúvidas. Fica difícil imaginar uma africana que, tirada às pressas do seu local de origem, tivesse a preocupação de recolher e trazer para cá sementes de plantas conhecidas e apreciadas por ela. O mais correto, é que o alimento tenha chegado até nós por meio de transações comerciais.
Seja como for, o azeite de dendê se tornou parte integrante da culinária brasileira, em especial, da comida baiana. A africana, que provavelmente já deveria conhecer o óleo de palma, como também é chamado, introduziu o alimento na cozinha da casa grande, hábito que se perpetuou entre seus descendentes até hoje.
A mistura de raças, culturas, sabores, mais a imperiosa necessidade de sobrevivência do colonizador ou do escravo (índio ou negro), resultaram na criação de pratos que se tornaram emblemas da brasilidade, ainda que, de início, tenham sido rejeitados pela elite escravagista.
O mais popular entre todos é a combinação “arroz com feijão” que, só se consolidou efetivamente no século 18. O feijão já era consumido basicamente com farinha de milho ou mandioca. O arroz, porém, chega às nossas mesas quando começa a ser produzido em grande escala, na segunda metade do período colonial.
O outro prato é a feijoada que nasceu nas senzalas, quando o escravos começaram a aproveitar as partes menos nobres dos porcos, abatidos para consumo na casa-grande, e misturá-los ao feijão preto, que era a base de sua alimentação. Entretanto, essa é uma visão romanceada das relações sociais e culturais estabelecidas durante a escravidão no Brasil.
A versão mais aceita conta que a “nossa” feijoada nasceu mesmo em Portugal, em regiões como Estremadura, Beiras ou Trás-os-Montes, onde se misturam vários tipos de feijão (menos o preto que é de origem sul-americana) com linguiças, orelhas e pés de porcos.
Outro exemplo clássico do sincretismo existente na culinária brasileira foi a mistura de farinha, feijão e carne-seca que se tornou indispensável no processo de conquista do interior do território brasileiro que começou em 1563. Mas foi a partir do século 17 que as terras do interior do Brasil passaram a ser rotineiramente exploradas.
De acordo com a História da Alimentação no Brasil, os bandeirantes paulistas saídos do Sudeste e os vaqueiros do Nordeste levavam em seus embornais a farinha, o feijão e a carne-seca para serem consumidos durante suas longas estadias fora de casa. A razão dessa preferência se baseava na durabilidade desses alimentos que poderiam ser transportados meses a fio, sem correr o risco de se deteriorarem.
 
O feijão ainda apresentava mais uma vantagem para a subsistência desses dois grupos. Na ida para os sertões, tanto bandeirantes quanto vaqueiros costumavam plantar feijões em territórios nem sempre propícios à produção de outros produtos agrícolas. Ao voltarem, principalmente os paulistas, recolhiam o que haviam semeado meses antes e abasteciam-se para não padecer com a fome no retorno à Vila de Piratininga.
Foi no contraste entre a fome e a criatividade no aproveitamento de alimento e nas adaptações dos distintos modos de preparo, mais os apimentados sabores africanos que se estabeleceu e se diversificou o nosso cardápio. “É por meio dessas combinações culinárias que a gente brasileira se reconhece como dessa ou daquela região. É na mesa do botequim, ao saborear uma feijoada ou até na mais singela das refeições de ovo frito sobre arroz com feijão escaldante que alimentamos o corpo e a memória de nossa identidade enquanto brasileiros”.

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