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1 UNIP - Curso de Direito - Disciplina: Direitos Humanos Professor: Edílson Mendes – 2017 DIREITOS HUMANOS ASPECTOS HISTÓRICOS I Guerra Mundial – 1914 a 1918 - II Guerra Mundial – 1939 a 1945 Liga das Nações - Foi à criação de um organismo internacional de manutenção da paz, tinha como finalidade promover a cooperação, paz e segurança internacional, condenando agressões externas contra a integridade territorial e a independência política de seus membros. Criada em 1919 (Genebra/Suíça) pelo tratado de Versalhes, o qual determinou que todas as colônias alemãs passariam para a Inglaterra e para França, que a Alsâsia e a Lorena voltariam ao domínio francês. Um dos problemas da Liga das Nações foi ser composta por apenas 63 países, entre as quais não se incluíam todas as nações poderosas, como por exemplo, os Estados Unidos. Já nasceu com seus dias contados: EUA não aderiram. Em 1929 Crash da Bolsa de NY. Estava havendo diversas invasões de países. Organização das Nações Unidas - A Organização das Nações Unidas (ONU) é uma união de países criada para promover a paz mundial, a segurança e a colaboração internacional. A ONU foi fundada em 1945, pela carta das nações unidas, assinada em São Francisco, sua sede é em Nova York após a Segunda Guerra Mundial, o motivo da criação foi que A Liga das Nações foi incapaz de evitar a Segunda Guerra Mundial e se dissolveu, dando origem a um novo órgão, criado levando em consideração os defeitos e erros dela. Possui os seguintes órgãos: Conselho de Segurança (É formado por 05 paises EUA/ China/ Inglaterra/ França/Russia) Unanimidade. Assembléia Geral. Secretarias. Conselhos Sociais e econômicos. Corte Internacional de Justiça (composta por 15 juizes e com sede em Haia) A Corte Internacional de Justiça - A Corte Internacional de Justiça não é, nem um corpo legislativo, nem uma academia. Define-se como um órgão do Direito Internacional, destinado a prestar justiça nos limites que lhe foram prescritos. O Funcionamento da Corte Internacional de Justiça A Corte Internacional de Justiça, com sede em Haia (Holanda), é o principal órgão judiciário das Nações Unidas, obedecendo a seu funcionamento ao que estipula seu Estatuto, que é parte integrante da Carta da ONU. Todos os membros das Nações Unidas são, ipso facto, parte do Estatuto. Estados não membros das Nações Unidas podem tornar-se partes do Estatuto, obedecendo às condições estipuladas para cada caso pela Assembléia Geral, à recomendação do Conselho de Segurança. Todos os países que fazem parte do Estatuto da Corte podem recorrer a ela sobre qualquer caso. Outros Estados poderão fazê-lo sob condições estipuladas pelo Conselho de Segurança, que pode encaminhar à Corte qualquer controvérsia jurídica. Além disso, a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança podem solicitar à Corte pareceres sobre quaisquer questões jurídicas; também aos outros órgãos das Nações Unidas, assim como as Agências Especializadas, é facultado recorrer à Corte para pareceres sobre questões jurídicas dentro do escopo das suas respectivas atividades, desde que tenham para isso autorização da Assembléia Geral. Somente países - nunca indivíduos podem recorrer à Corte Internacional de Justiça. A competência da Corte se estende a todas as questões a ela submetidas pelos Estados e a todos os assuntos previstos na Carta das Nações Unidas e nos tratados e convenções em vigor. Os Estados podem comprometer-se antecipadamente a aceitar a jurisdição da Corte em determinados casos, seja por meio de tratados ou convenções que estipulem o recurso à Corte ou por meio de uma declaração especial nesse sentido. Tais declarações aceitando a jurisdição compulsória da Corte podem, contudo, excluir determinados tipos de questões. Para emitir suas sentenças, a Corte, de acordo com o Artigo 38 do Estatuto, recorre às seguintes fontes de direito: Convenções Internacionais que estabelecem regras conhecidas pelos Estados litigantes; Costumes Internacionais com evidências de uma praxe geralmente aceita como de direito; Princípios Gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas; Jurisprudência e pareceres de competentes juristas das várias nações, como elementos subsidiários para determinar as regras de direito. A Corte pode decidir ex aequo et bono (segundo o que for justo e bom), isto é, lavrar sentença por eqüidade, se as partes litigantes estiverem de acordo. O Conselho de Segurança poderá ser chamado, se necessário, por uma das partes para determinar quais as medidas a tomar, a fim de dar cumprimento a uma sentença, caso a parte contrária se recuse a acatá-la. A Corte Internacional de Justiça se compõe de quinze juízes chamados "membros" da Corte. São eleitos pela Assembléia Geral e pelo Conselho de Segurança em escrutínios separados. Os juízes são escolhidos em função de sua competência, e não pela sua nacionalidade, observando-se, contudo, o critério de fazer com que estejam representados na Corte os principais sistemas jurídicos do mundo. Não poderá haver dois juízes da mesma nacionalidade na Corte. O mandato dos juízes é de nove anos, podendo haver reeleição. Não podem os juízes dedicar-se a outras atividades durante o exercício de seu mandato. Tribunal de Nuremberg - Após a II Guerra Mundial, os países aliados resolveram formar um tribunal internacional com a finalidade de julgar os "crimes" cometidos pelos inimigos de guerra, o qual ficou conhecido como o Tribunal de Nuremberg que resultou em uma série de 13 julgamentos, realizados em Nuremberg, na Alemanha, de 1945 a 1946. Esse tribunal foi criado por um acordo assinado pelos representantes dos E.U.A., Grã-Bretanha, França e ex-U.R.S.S., em Londres, em agosto de 1945. Juízes e promotores públicos de todos os quatro países tomaram parte no primeiro julgamento, que teve como réus 22 funcionários da Alemanha nazista. 2 Para muitos um progresso do direito internacional, para outros um tribunal improvisado e arbitrário, onde se observou a espantosa negação de elementares postulados do direito penal tradicional, como o princípio da legalidade, pois deu efeito retroativo a um Plano de Julgamento para a incriminação de fatos pretéritos, não considerados crimes ao tempo de sua prática, e impôs aos acusados o enforcamento e penas arbitrárias, sem direito a qualquer recurso, além de ter sido um tribunal que foi criado e funcionou segundo a vontade arbitrária dos vencedores, com o exclusivo propósito de uma vingança pura e simples. Principal argumentação para criação do tribunal foi de a invocação do direito natural, direito esse que esta acima do direito formal. O tribunal teve 216 sessões. Funcionou de 1945 a 1946. Principais penas: Prisão; Prisão perpetua; Penade Morte – As mortes eram através de enforcamento. O Tribunal de Nuremberg foi o grande incentivador da criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) - A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforcem, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição. Tratado é todo acordo formal e escrito, celebrado entre Estados e organizações internacionais, que busca produzir efeitos numa ordem jurídica de direito internacional, maior regulador, conhecido como o Tratado dos Tratados, é a Convenção de Viena de 1969. TPI - TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL - ESTATUTO DE ROMA O TPI, sediado em Haia (Holanda), foi criado em 2002 para investigar indivíduos acusados de crimes de guerra e contra a humanidade. O Estatuto de Roma, documento no qual se funda, já foi ratificado pelo Brasil. O Estatuto de Roma considera como graves os seguintes crimes que “afetam a comunidade internacional no seu conjunto” (artigo 5°): a) O crime de genocídio: com intenção de destruir grupo nacional, ético, racial ou religioso. b) Crimes contra a humanidade Artigo 7o. 1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por “crime contra a humanidade”, qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque: Extermínio (compreende a sujeição intencional a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição de uma parte da população); Tortura (entende-se o ato por meio do qual uma dor ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são intencionalmente causados a uma pessoa que esteja sob a custódia ou o controle do acusado; este termo não compreende a dor ou os sofrimentos resultantes unicamente de sanções legais, inerentes a essas sanções ou por elas ocasionadas); Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável; c) Crimes de guerra: ex. uso de arma proibida, violação as convenções humanitárias. d) O crime de agressão: É o planejamento, a preparação, o início ou a execução, por pessoa em posição efetiva para exercer controle ou dirigir a ação política ou militar de um Estado, de um ato de agressão o qual, pelo seu caráter, gravidade e escala, constitui violação manifesta da Carta das Nações Unidas. Tais crimes são imprescritíveis (discussão), conforme artigo 29 do Estatuto de Roma. Foi criado em 1998 pelo Estatuto de Roma, com sede em Haia, na Holanda, em funcionamento a contar de 1º de julho de 2002. Os tribunais de: Nuremberg, Ruanda, Iugoslávia eram considerados tribunais de exceção, pois foram criados após o fato (princípio do Juízo Natural). O TPI é um Tribunal permanente, autônomo e julga crimes de abrangência internacional. Penas: Prisão de até 30 anos. Prisão perpétua. Multa. Perda de bens (produto do crime) Não tem: Pena de morte; Pena cruel e Pena de banimento (tirar nacionalidade) O Brasil é parte no Estatuto de Roma Decreto Legislativo 112/2002. EC 45/04 incluiu ao art. 5º, § 4º, CF afirmando que o Brasil se submete ao Tribunal Penal Internacional. Entrega é diferente de Extradição. Entrega ocorre entre o TPI e um Estado. Extradição ocorre entre Estados. O TPI surge como forma de evitar a criação de tribunais ad hoc internacionais por motivos meramente políticos, como ocorreu nos casos dos Tribunais de Nuremberg (1945), Tóquio (1946), para antiga Iugoslávia (1993 – 100mil mortos e 20 mil estupros) e Ruanda (1994 – 800 mil mortos em 100dias). Direitos Fundamentais são os direitos do homem previstos na Constituição de um país, enquanto os Direitos Humanos são os direitos do Homem ou Fundamentais previstos em Tratados ou Direitos Humanos. Exemplo de Direito à Vida, art. 5º da CF/88 e art. 4º, da Convenção Americana. Os Direitos Humanos são: 3 Históricos - Mudam com os tempos, são dinâmicos, passando pelas diversas revoluções e chegando aos dias atuais. Ex: Abolição da escravidão, direito das mulheres. Naturais - Essenciais à pessoa humana, mesmo na ausência de Legislação específica Universais - Independem de fronteiras e leis nacionais, são válidos a todos, indistintamente. Destinam-se, de modo indiscriminado, a todos os seres humanos. Indivisíveis e interdependentes – Não se podem defender apenas alguns direitos em detrimento de outros. Os direitos humanos formam um todo, um dependendo do outro. Não se pode cuidar das mulheres, deixando de lado as crianças, cuidar das crianças e se esquecer dos problemas raciais, assim sucessivamente. Irrenunciáveis - Não se renunciam direitos fundamentais. Alguns deles podem até não ser exercidos, mas não se admite sejam renunciados. Inalienáveis - São direitos intransferíveis, inegociáveis, porque não são de conteúdo econômico patrimonial. Se forem conferidos a todos, deles não se pode desfazer porque são indisponíveis. Imprescritíveis - A prescrição é um instituto jurídico que somente atinge os direitos de caráter patrimonial, não a direitos personalíssimos. As Gerações de Direitos Humanos Primeira Geração - DIREITOS INDIVIDUAIS; DIREITOS DA LIBERDADE; Declaração da Virgínia (Estados Unidos -1776) Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França - 1789) Segunda Geração - DIREITOS SOCIAIS; DIREITOS DA IGUALDADE; Século XIX início do Século XX Direitos Sociais, Econômicos e Culturais; Constituição Mexicana (1917); Constituição Russa (1919) Terceira Geração - DIREITOS DOS POVOS; DIREITOS DA SOLIDARIEDADE; Dimensão Internacional; Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU- 1948); Declaração Universal dos Direitos dos Povos (1976) Quarta Geração - DIREITOS À VIDA; DIMENSÃO PLANETÁRIA; Direitos a uma vida saudável, em harmonia com a natureza; Princípios ambientais e de desenvolvimento sustentável; Carta da Terra ou Declaração do Rio (1992). Para alguns. Conforme Norberto Bobbio, a referida geração de direitos decorreria dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocaremem risco a própria existência humana, através da manipulação do patrimônio genético e pesquisas biológicas. Primeira Geração - OS DIREITOS DE LIBERDADE (INDIVIDUAIS) A grande mudança de rumos na aventura dos direitos humanos foi ditada pelas Declarações do século XVIII. Tais documentos, que simbolizaram o coroamento das lutas burguesas e consolidaram as transformações que até então se operavam no mundo ocidental, tiveram o iluminismo (ou ilustração) como referencial teórico imediato. A filosofia iluminista teve suas raízes no século XVII, através do racionalismo e do empirismo, tendências paralelas representadas pelo pensamento de Descartes, Spinoza, Leibniz, Newton, Bacon, Berkeley, Hobbes, Locke e outros. E sinalizou uma verdadeira revolução intelectual, pois seja na atitude de repúdio às certezas consagradas pela autoridade e pela tradição, ou na busca de novas bases para a compreensão dos fenômenos naturais e sociais, o ser humano passou a ser concebido no estado de pura natureza, mediante uma dedução exclusivamente racional. Ora, nesse universo retomou-se a crença num Direito Natural, que nasce com o homem e é inseparável na natureza humana. Porém, ao contrário da proposta medieval da dupla verdade – uma revelada por Deus e outra conquistada pela razão, a nova escola Jusnaturalista, que tomou forma a partir do século XVII, sustentava que o homem era titular de certos direitos fundamentais, cuja existência independia de qualquer justificação metafísica. Grosso modo, podem ser resumidas em quatro, as proposições esposadas pelos jusnaturalistas da época: a) considerados eternos e absolutos, existem direitos naturais demonstráveis pala razão, extensivos a todas as pessoas em todos os tempos e lugares; b) o Direito Natural consiste num conjunto de regras, verificáveis à luz da razão, que asseguram perfeitamente todos esses direitos naturais; c) a existência do Estado se prende, tão só, a garantir aos homens esses direitos naturais; d) o direito positivo, aplicado e executado pelos tribunais, é o meio pelo qual o Estado realiza essa função, obrigando moralmente apenas enquanto em concordância com o Direito Natural. O racionalismo jusnaturalista foi levado ao extremo pelo inglês Thomas Hobbes (na obra “Leviathan”- 1651), que formulou a tese da origem contratual do Estado, em cujo favor, após o primitivismo caótico da convivência sem ordem, os homens pactuaram renunciar aos seus direitos naturais, objetivando a segurança de todos – o que daria ao governante um poder absoluto. Essa postura, modernamente, recebeu forte crítica do jurista italiano Norberto BOBBIO, ao observar que o Direito Natural da Idade Moderna (contada em Hobbes), com sua “concepção estreita, particularmente privatista e atomista do homem”, deu origem ao liberalismo. Para BOBBIO, Hobbes tomou como ponto de partida o homem isolado, em estado natural egoísta, enquanto o jusnaturalismo medieval viu o homem em sociedade e dentro de uma perspectiva comunitária. Com John Locke, também pensador inglês, em seu livro “Two Treatises of Government” (1689), desenvolveu-se a teoria da liberdade natural do ser humano. Segundo Locke, divergindo de Hobbes, os homens optaram por constituir-se em sociedade no afã de alcançarem melhor proteção de seus direitos naturais (a liberdade e a propriedade); eles não renunciaram a seus direitos, mas o confiaram a uma autoridade comum, mediante um contrato. O poder, pois, era consentido, não sendo lícito ao soberano exercê-lo de maneira despótica, sob pena, dos súditos retomá-lo pela via da rebelião – “direito de resistência” – para recobrar a liberdade originária. É curioso notar a relativa identidade entre o trabalho de Locke e o de Francisco Suárez, embora a diferença de mais de cinqüenta anos 4 que os medeiam, até para mostrar que a futura noção do liberalismo sobre o Estado de Direito limitou-se, insofismavelmente, a apenas uma das correntes do jusnaturalismo (a “racionalista”). Para o teólogo espanhol Suárez, em sua obra “De Legibus ac Deo Legislatore”(1612), os homens eram, por natureza, igualmente livres e não súditos uns dos outros. Da natureza a comunidade recebia automaticamente a autoridade política, e então a transferia ao príncipe. Destarte, a determinação da forma de governo não deriva da natureza, mas da livre escolha da comunidade. E sublinhava que o poder político era de direito divino, quando considerado em si mesmo, abstratamente; mas de direito humano, quando considerado concretamente, enquanto exercido por pessoas determinadas. Essa polêmica adentrou pelo século XVIII, marcado por um confronto direto e definitivo com o carcomido regime absolutista. Nessa fase, foram da maior alta valia e influência as seguintes contribuições: a) de Montesquieu, em cuja obra-mestra, “O Espírito das Leis” (1748), prescreveu a suprema necessidade da separação das funções do Estado em três poderes distintos e independentes (executivo/legislativo/judiciário) denunciando uma atentatória à liberdade a concentração do poder nas mãos de uma só pessoa ou órgão; b) de Voltaire, crítico mordaz das idéias e costumes de seu tempo, dono de vasta publicação (“Cartas Filosóficas”, por ex., em 1734), e que foi um acérrimo defensor da liberdade individual e implacável combatente de todo tipo de despotismo; c) de Jean-Jacques Rousseau, em cujo trabalho mais festejado, “Do Contrato Social” (1762), expôs a tese de que os homens se agregaram societariamente por motivos eminentemente pragmáticos, na soma de forças para sobrepujar a resistência. Essa união era engendrada pelo contrato social, a se constituir num instrumento que garantia simultaneamente a igualdade e a liberdade – e nisso diferia de Locke, que associava liberdade e propriedade. Mais que isso, Rousseau condenou a propriedade privada (“causa primeira da miséria social”), porque a igualdade das massas (o povo como “único soberano”), e, enalteceu a vida do “bom selvagem” (contrapondo-o à civilização européia); d) dos “enciclopedistas”, grupo de filósofos e economistas, dirigidos por Diderot e D’Alembert, que resumiram sistematicamente os esforços do intelecto humano, com a famosa “Enciclopédia” (35 volumes – 1751/1772), e em cujas páginas desenvolveu um fervoroso programa de reivindicações sociais e políticas; e) de Cesare Beccaria, autor do livro “Dei Delitti e delle Pene” (1764), onde desfiou – fundado numa perspectiva racional, no direito natural, no contrato social e no controle do poder – veementemente, seu libelo contra o processo secreto, a desigualdade dos castigos segundo a qualificação das pessoas, a atrocidade dos suplícios, a tortura e a pena de morte. Com todas as características já mencionadas e ante o peso de tamanha efervescência cultural, o Jusnaturalismo espalhou-se por toda a Europa e tambémpela América, servindo de base doutrinária para a o surgimento da Declaração de Direitos. Tais documentos, que se mostraram verdadeiros manifestos políticos das novas forças sociais que despontavam, passaram a enunciar formal e solenemente os direitos fundamentais dos indivíduos. É sobremodo interessante atentar que a expressão “declaração de direitos” deixa transparecer por completo o espírito que animava a edição desses diplomas: acreditava-se que os direitos individuais não constituíam uma criação do Estado, posto que existiam antes do advento deste, bastando, pois, para fazê-los respeitados, declarar expressamente a existência dos mesmos, depois de racionalmente reduzidos da natureza humana. Muito embora a Inglaterra tenha dado o impulso inicial, e não obstante situar-se na França o pólo mais ativo da irradiação de idéias, foi na América do Norte, na ainda colônia de Virgínia, que surgiu a primeira Declaração de Direitos. Tamanho feito, por parte de uma colônia, não deve causar espanto. Ao darem contornos definitivos à sua luta libertária, as colônias inglesas da América reuniram-se num Congresso Continental, em 1774, que recomendou a formação de governos independentes. E nisso quem se antecipou às demais foi justamente à Virgínia, que em 12 de junho de 1776 publicou sua manifestação formal de direitos (“... do Bom Povo de Virgínia”), e cuja cláusula primeira anunciava “que todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes” – e com certos direitos, inerentes dos quais não poderiam ser privados. Nesse expediente de 16 cláusulas, inequívoco alicerce do constitucionalismo americano, percebe-se com nitidez a influência das doutrinas jusnaturalistas e iluministas então em voga, precipuamente das obras de Locke, Montesquieu e Rousseau. Outras sete colônias, mirando-se nesse exemplo, adotaram constituições radicalistas com semelhantes dispositivos de proteção individual. Ainda em 1776, como passo decisivo desse processo emancipatório, o 3º Congresso da Filadélfia aprovou a “Declaração de Independência dos Estados Unidos”, em 4 de julho daquele ano. O texto, que também traz a herança do mesmo legado entre os homens, considerados titulares de certos direitos inalienáveis como a vida, a liberdade e a procura da própria felicidade. Seguem-se-lhe a Constituição Federal de 1787, e, uma “Bill of Rights” (Declaração de Direitos), aprovada em 1789 e ratificada em 1791, contendo dez emendas à Carta Básica norte-americana. Todos esses acontecimentos e prescrições legais foram de notável significação humana e social, de grande qualidade sistemática e de inflamada capacidade de estímulo, influindo nas revoluções libertárias da América hispano-portuguesa e, inclusive, na França iluminista. Todavia, foi a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”, aprovada pela Assembléia Nacional francesa, em 26 de agosto de 1789 que, incontestavelmente, teve desde logo muito maior repercussão do que as precedentes. Para tanto contribuiu, em parte, a notória condição francesa de centro irradiador de idéias e iniciativas; mas o seu sucesso defluiu, sobretudo, do caráter universal daquela Declaração, cujos autores souberam enunciar direitos individuais como aplicáveis a todas as sociedades políticas. A “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” instituiu um Estado de Direito e, partindo do pressuposto que se fazia mister fixar solenemente os “direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem”, tratou de regulá-los em seus 17 artigos, dentre os quais destacamos: a) a igualdade de todos, quanto aos direitos (art. 1); b) a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão, como direitos naturais e imprescritível da pessoa humana (art. 2); c) a soberania reside na Nação: o povo é quem delega autoridade 9art. 3); d) a medida da extensão da liberdade de cada um é não prejudicar o direito de outrem (art. 4); e) o princípio da legalidade, permitindo-se tudo quanto à lei não proíba e estatuindo que ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não manda (art. 5); f) a proibição de acusação, prisão ou detenção, salvo nos casos determinados opor lei e na forma por ela prescrita (art. 7); g) a presunção de inocência (art. 9); h) a liberdade de manifestação dos pensamentos e opiniões (art. 11); i) a garantia dos direitos e a separação dos 5 Poderes através da Constituição (art. 16); j) a propriedade como um direito sagrado e inviolável, salvo caso de necessidade pública e mediante justa e prévia indenização (art. 17). A Declaração de 1789, como se sabe, tornou-se uma fonte – obrigatória e permanente – para as novas proclamações do gênero, tanto na própria França (em 1793, 1795, 1814 e 1848), quanto no restante da Europa e no continente da burguesia, representou o cortamento de uma longa luta pela afirmação das liberdades públicas e princípios basilares da pessoa humana, dando um novo perfil à sociedade e acarretando sensível progresso institucional. SÍNTESE DA 1ª DIMENSÃO - Os direitos da primeira geração ou primeira dimensão inspirados nas doutrinas iluministas e jusnaturalistas dos séculos XVII e XVIII são direitos de titularidade individual, embora alguns sejam exercidos em conjuntos de indivíduos. Essa geração inclui os direitos à vida, liberdade, segurança, não discriminação racial, propriedade privada, privacidade e sigilo de comunicações, ao devido processo legal, ao asilo diante das perseguições políticas, bem como as liberdades de culto, crença, consciência, opinião, expressão, associação e reunião pacíficas, locomoção, residência, participação política, diretamente ou por meio de eleições. São os primeiros direitos a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, cujo princípio era a proteção do indivíduo. Os direitos fundamentais de primeira dimensão, contemporâneos do liberalismo político, surgem como resposta ao absolutismo monárquico e objetivavam proteger o homem na sua esfera individual contra a interferência abusiva do Estado. São direitos de cunho meramente negativo, que visam garantir as liberdades públicas. Negavam o Estado no seu poder de interferir nas liberdades individuais, por que este era visto como inimigo para o homem. São direitos civis e políticos como a liberdade de locomoção, de pensamento, inviolabilidade do domicílio, liberdade de religião, por exemplo. A Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (26/08/1789), aprovado pelo parlamento francês, cujo lema: Um País deve ter uma Constituição escrita, com separação dos Poderes e Previsão dos Direitos Individuais. Segunda Geração - OS DIREITOS DE IGUALDADE (COLETIVOS) A primeira metade do século XIX foi marcada pela consolidação do Estado liberal – edificado sobre o ponto de vista dos direitos individuais – e pelo fenomenal desenvolvimento da economia industrial. Para o liberalismo,apegado à lição iluminista de supervalorização da lei, o Estado tinha na Constituição a sua mais forte plataforma jurídica. Note-se que a própria Declaração francesa de 1789, no seu artigo 16, patenteou a obrigatoriedade de um texto constitucional composto precipuamente da decisão dos poderes e da declaração de direitos, com sua garantias. Aliás, a mentalidade juspositivista do século XIX, o sentido de Constituição era justamente este: era explícita a legalidade e organiza as garantias. E o Estado Constitucional, oriundo das teses liberais, não era apenas um Estado não-interveniente, criado pelos interesses burgueses em contraposição ao absolutismo intervencionista; esse Estado era uma sistemática de explicitações, montada a partir da idéia de que o poder existe com base no consentimento das pessoas, e que deve garantir a elas uma série de liberdades. Destarte, o Estado constitucional não era apenas um Estado com limitações, mas sim intrinsecamente limitado. Ora, esse arcabouço ideológico levou, na prática, a existência de um Estado impregnado de um formalismo que, ao não cogitar da distinção entre legalidade e legitimidade, afigurou-se excludente. Assim é que a igualdade, solenemente estampada na Declaração de 1789, não passou de expressão retórica. Ou melhor, se chegou a suprimir os privilégios formais do “antigo regime”, não concretizou quanto à desigualdade econômica patrimonial. Na ordem política que se instaurou, as pessoas passaram a iguais perante a lei, erigida como padrão de igualdade entre todos os seres humanos, mas que não operou uma modificação das condições materiais das classes populares, e a liberdade, desvirtuada na prática, passou a ser utilizada pelo homem burguês como capacidade ilimitada de exercer a sua iniciativa, a sua criatividade e os seus direitos individuais. Com a ascensão da burguesia à posição de classe dominante, acelerou-se a industrialização e suas implicações sócio-econômicas e culturais, abrindo caminho para um novo estágio de consciência sobre as necessidades básicas do ser humano. Com efeito, o desenvolvimento do capitalismo industrial, propiciando a urbanização e concentrando mão-de-obra assalariada, mormente nas fábricas, fez com que se formasse uma nova classe social – o proletariado, ou a moderna classe operária urbano-industrial. Justamente com a Revolução Industrial estruturou-se o Estado capitalista Liberal. O Estado do “Laissez-faire”, de não-intervenção, da liberdade de iniciativa e de contrato; o Estado “gendarme”, que consistiu em garantir a livre atuação das forças do mercado, fundado na premissa de que, se todos defendessem os seus próprios interesses, o interesse coletivo seria automaticamente defendido. Por fim, o Estado que privilegiou o capital em detrimento do trabalho, em nome do direito de cada indivíduo contratar livremente com seu semelhante, sem a proteção e a fiscalização estatal – o que unicamente significou a liberdade dos assalariados se colocarem nas mãos dos empregadores. Evidente, pois, a enorme contradição entre os princípios divulgados nas declarações de direitos e a realidade cotidiana de amplos setores da sociedade, especialmente numa certa fase do capitalismo industrial. O proletariado estava submetido a todo o tipo de exploração: jornada de trabalho excessiva (de 14 a 16 h/dia), remuneração indigna, condições insalubres e insegurança no trabalho, abusiva situação trabalhista de mulheres e crianças, desemprego e miséria crescentes, péssimas condições de vida (moradia, saúde, alimentação, educação), dentre outros aspectos. Ante tais situações cruéis e desumanas, o proletariado reagiu com greves, agitações e rebeliões por toda parte, como as revoluções de 1848, ocorridas na França e na Alemanha, ou a célebre “Comuna” de Paris (1871), movimentos primordialmente operários na sua origem. Esse novo perfil que caracteriza a Europa do século XIX, com todas as suas nuances, possibilitou o desenvolvimento da crítica social, do ideário socialista de doutrinas alternativas, do sindicalismo e da organização política da classe operária e demais setores populares. No contexto das lutas operárias, levadas a efeito desde o século anterior, surgiu o sindicalismo. Amadurecido no seio das associações de auxílio mútuo (séc. XV), o movimento operário fortaleceu-se graças à conquista de liberdade de organização classista, primeiramente na Inglaterra (através de lei aprovada pelo Parlamento, em 1824), e mais tarde, de modo gradual, no restante da Europa 6 e nos Estados Unidos. Os sindicatos guardaram pontos em comum com o socialismo e o anarquismo. Na Inglaterra, registre-se, o sindicalismo assumiu, via de regra, em feição reformista, da qual a “Trade Union” (fundada em 1833) foi típico exemplo – as reivindicações eram majoritariamente de índole econômica, sem cogitar as alterações das estrutura político-institucional. Na França e na Itália, porém, a ação sindical adotou tendência predominantemente revolucionária – buscou a emancipação proletária por meio de mudanças radicais na sociedade. Por outro lado, do mesmo caldo cultural europeu nasceram o anarquismo e o socialismo. Ambos propugnavam o fim da propriedade privada – um dos principais valores protegidos pelas declarações dos direitos – e o fim das diferenças de classe. Buscavam, igualmente, a destruição do Estado, considerado um instrumento de opressão dos trabalhadores a serviço da burguesia. Todavia, para os socialistas, de um modo geral, o Estado burguês deveria ser substituído pelo Estado proletário, que aplainaria as desigualdades sociais. Já os anarquistas por seu turno, preconizavam a substituição do Estado pela cooperação de grupos associados (mecanismos de controle espontâneo da sociedade). Dentre os mais notáveis anarquistas sobressaem os nomes de Pierre Joseph Proudhon (numa 1ª fase), Michael Bakunin, Piotr Kropotkin e Leão Tolstoi. E, dos socialistas mais importantes, destacam-se: Henry de Saint-Simon, Louis Blanc, Augusto Blanqui e Charles Fourier – denominados de “utópicos” e, Karl Marx e Friedrich Engels – fundadores do socialismo “científico”. Mais tarde, os marxistas se dividiram em ortodoxos e revisionistas. Em fevereiro de 1848, auxiliado por Engels, Marx fez publicar o “Manifesto Comunista”, ardente conclamação à união e à luta proletárias e inequívocas fonte irradiadora do futuro comunismo. Mas foi a partir do texto “A Questão Judaica”, quatro anos antes, (1844), que Marx passou a denunciar a concepção liberal-burguesa dos direitos humanos, expressa nas declarações americana (1776) e Francesa (1789), negando sua universalidade e identificando-se com os interesses da classe social dominante. O pensamento marxista se funda na sociedade ocidental de meados do século XIX, extremamente individualista, injusta e desigual, e que converteu o trabalho num instrumento de dominação. As contundentes investidas de Marx contra adeclaração francesa, de 1789, apontavam, aliás, para uma contrafação do ideal de direitos humanos comuns a todos. O detalhe, aí, é que o problema não era de fundo, e sim de forma. Os direitos humanos do homem, distintos dos direitos do cidadão, foram apresentados como direitos do homem egoísta, separado dos outros indivíduos e da comunidade, porque a burguesia do período da alta acumulação capitalista passara a subordinar a liberdade e a igualdade à propriedade. Também a Igreja Católica se mostrou sensível aos problemas sociais do século XIX, em que pese à reticência inicial e a leitura imitada daquela realidade. Assim, diante da gravidade da “questão social” (conflito entre capital x trabalho), ao mesmo tempo em que buscava se contrapor à doutrina marxista e amenizar os efeitos do capitalismo, o Papa Leão XIII denunciava com veemência os abusos e as injustiças praticados por “um pequeno grupo de ricos e opulentos” e, contrariando a posição liberal-capitalista de então, defendia a tese do dever do Estado de intervir no campo econômico-social, através de medidas em prol dos interesses da classe operária – incluindo o direito de organização sindical – e da proteção dos direitos de todos os cidadãos, especialmente “dos fracos e dos indigentes”. É claro que o contexto de crise, desigualdade social e concentração da riqueza, tornara insuficientes as interpretações do liberalismo acerca dos direitos fundamentais, entendidos como inerentes à natureza humana, independentemente de sua condição social ou da sua classe de origem. Assim, os movimentos de base passaram a questionar o fosso que se alargara entre os postulados de igualdade e liberdade para todos e a trágica situação vivida pelos trabalhadores, reivindicando a real efetivação de tais direitos declarados; os sindicatos e os partidos operários foram levados a clamar por mudanças profundas e pela atuação do Estado no plano coletivo, mormente quanto às relações de trabalho. E algumas melhorias apareceram, pós-1870: direito de greve, regulamentação da jornada diária, seguros contra acidentes e contra invalidez, inquéritos para responsabilização patronal. Nessa altura, o próprio capitalismo encontra-se em transformação. O espocar de revoluções nacionalistas (Itália, Alemanha, América Latina) foi contemporâneo com o surgimento das grandes empresas, dos “trustes” e dos “cartéis”; e o capitalismo em expansão superou as fronteiras regionais, fazendo renascer a corrida colonialista. Em conseqüência, o mundo desistiu, na antevéspera do novo século, a partilha da África e da Ásia, bem como a política de alianças entre as potências dessa quadra – era o “Imperialismo” europeu, à procura de novas fontes de matéria prima, outros mercados consumidores e mais bases geopolíticas. Por força das pressões da sociedade, cada vez maiores no final do século XIX, acabou se dando a transição do modelo liberal clássico para o Estado Social, perceptivo pelo paulatino abandono da atitude abstencionista por uma posição intervencionista propiciadora de meios de acesso aos bens sociais. A questão do conteúdo dos direitos humanos, portanto, foi transferida ao século XX. Nas primeiras décadas do século XX, a Revolução Mexicana – de 1910 (com sua Constituição socialista), a Constituição de Weimar – na Alemanha de 1919 (ressaltando os direitos sociais), e a criação da Organização Internacional do Trabalho/OIT – também de 1919 (parte XIII do Tratado de Versalhes), ampliavam na realidade sócio-política a dimensão dos direitos humanos, que deixaram de ser entendidos apenas como direitos individuais e passaram a abarcar – ainda que restritamente, em muitos lugares – os direitos coletivos de natureza social. Surgiu, então, a crença de que os indivíduos que não têm direitos a conservar são os que, mas precisam do Estado. Finalmente, com o findar da II Guerra Mundial o problema dos direitos básicos da pessoa humana foi posto mais uma vez na ordem do dia. Com a Carta das Nações Unidas, assinada em 26 de junho de 1945, criou-se uma organização internacional (a ONU), voltada a permanente ação conjunta dos Estados na defesa da paz mundial, incluída aí a promoção dos direitos humanos e das liberdades públicas (art. 1). Com tais propósitos, ao menos em tese a noção dos Direitos Humanos deixou de ser um compromisso de cada país, individualmente, para passar ao “status” de princípio internacional a inspirar as ações dos membros – fundadores ou futuros – da organização. Mas como a experiência já havia deixado claro que não pode haver paz sem justiça social, decidiu-se por uma Resolução específica sobre tais direitos, vagamente referidos na Carta. Assim é que, na terceira sessão ordinária da Assembléia Geral da ONU, verificada em Paris, a 10 de dezembro de 1948, foi aprovada a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, seguramente o documento de maior ressonância no presente século nesse particular. A declaração, contendo 30 artigos, proclamou os direitos e liberdades fundamentais “como o ideal comum a ser atingido por todos”, e tratou de exaustivamente enumerá-los com a finalidade de permitir-lhes melhor proteção jurídica, partindo do postulado geral de que 7 “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos (...) e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (art. 1). É deveras significativo que a Assembléia Geral preliminarmente, tenha dado ênfase ao verbo proclamar, pois patenteia assim que não houve concessão ou mero reconhecimento de direitos, e com isso os remete à própria natureza humana, razão pela qual a ninguém (nem mesmo a ONU) cabe legitimidade para retirá-los de qualquer indivíduo. Nesse ponto, a Declaração Universal avançou a concepção de direitos humanos, quer depreendendo-os também do relacionamento do homem com o meio social, quer enxergando-os muito além das relações entre os indivíduos e o Estado ou da mera preocupação com a conservação de direitos. Uma prova disso é o artigo 22 do texto, que faz ecoar categoricamente o direito de todo ser humano à segurança social e à realização “dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade”. Resumidamente, o exame dos artigos da Declaração revela três primaciais características: a certeza dos direitos (com a prévia e cristalina fixação de direitos e deveres), a segurança dos direitos (impondo normas para sua respeitabilidade) e a possibilidade dos direitos (exigindo os meios para todos terem acesso ao gozo dos direitos). A Declaração de 1948, ainda, se fez meritório não só por atualizar o rol dos direitos, em face das características da sociedade industrial, mas, sobretudo por preceituar como compromissos de todos – Estados e indivíduos, governantes e governados – a tarefa permanenteda construção de um mundo onde todos os homens possam usufruir uma vida digna, com pleno atendimento de suas necessidades primárias, materiais e espirituais. Entretanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos não possui, tecnicamente, qualquer valor de obrigatoriedade para os Estados. Ela não é um tratado, mas sim um conjunto de recomendações, conquanto na forma qualificada de “proclamação”. Conseqüentemente, o seu valor é meramente moral, indicando diretrizes a serem seguidas nesse assunto pelos Estados. Mesmo assim, deve-se frisar que os direitos e liberdades nela exaltados já são princípios gerais de direito ou direito costumeiro. Tais ponderações remetem a uma dupla conclusão: a da ampliação do conceito de direitos humanos e da tibieza daquela Declaração no que concerne a sua eficácia, notadamente quanto aos direitos coletivos. Verifica-se, pois, que os problemas relativos à institucionalização dos direitos humanos não se encontram no plano de sua realização concreta e no plano de sua exigibilidade. Essa preocupação, certamente, esteve presente no cerne dos debates travados na ONU após 1948, levando a uma paciente elaboração do “Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais” aprovado pela assembléia Geral, em 16 de dezembro de 1966, e que consagraram a Segunda geração dos direitos humanos, pertinentes ao princípio da igualdade. Ou seja, da fase de reclamar direitos ou de protegê-los frente ao Estado, que toda pessoa possui por sua qualidade como tal, passou-se a outra, de reivindicar os meios para que os direitos se tornem efetivos. E, via de conseqüência, entendeu-se um dever do Estado possibilitar amplamente os recursos devidos à satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais. Com o Pacto, aliás, esses direitos se projetaram acima do patamar de pretensões individuais e coletivas perante o Estado, cabendo a este o papel de agente promotor das garantias e direitos chamados sociais (art. 2). O referido Pacto Internacional, que os especialistas consideram se de “aplicação progressiva”, entrou em vigor em 1976. Dentre os direitos por ele consagrados, importa destacar: a) direito ao trabalho; b) direito a uma remuneração eqüitativa e que proporcione ao trabalhador e sua família “condições dignas de existência”; c) direito à previdência social; d) direito às condições de segurança e higiene no trabalho; e) direito à organização sindical (“fundar e se filiar a sindicatos”); f) direito de greve; g) direito à cultura e ao lazer; h) proteção e assistência à família; i) cuidados especiais à gestante e à infância; j) direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si e sua família, inclusive alimentação, vestuário e moradia adequados e uma melhora contínua das condições de existência; l) direito de toda pessoa estar protegida contra a fome; m) direito de toda pessoa ao “mais alto nível possível de saúde física e mental”; n) direito à educação, devendo o ensino primário (1º Grau, no nosso caso) ser obrigatório e gratuito, e o ensino secundário (II Grau) “generalizado e fazendo-se acessível a todos”. Já a dicotomia entre os direitos proclamados (na Declaração Universal e no Pacto de 1966) e a corriqueira realidade internacional, dá origem, nestas últimas décadas do século XX, a uma nova etapa no alargamento da noção de direitos humanos, como resultado direto da preocupante divisão do mundo entre países ricos e países pobres. SÍNTES DA 2ª DIMENSÃO - Após a 1ª Guerra Mundial, o regime político liberal, caracterizado pela mínima intervenção estatal, entrou em crise. A sociedade passou a exigir um Estado mais atuante, clamando a substituição da Constituição, antes apenas garantista, por uma constituição dirigente, que estabelecessem normas instituidoras de programas governamentais. Surge o Estado do Bem Estar Social. Nesse contexto, surgiram os direitos fundamentais de segunda dimensão, denominados de direitos sociais, econômicos e culturais. Esses direitos impõe ao Estado uma atuação prestacional voltada para a satisfação das carências da coletividade. Através deles, buscava-se tornar os homens, já livres, iguais no plano fenomênico. Neste contexto, depreende-se que os direitos de segunda geração ou segunda dimensão, seriam os Direitos da Igualdade, no qual estão à proteção do trabalho contra o desemprego, direito à educação contra o analfabetismo, direito à saúde, cultura, etc. Essa geração dominou o século XX, são os direitos sociais, culturais, econômicos e os direitos coletivos. São direitos objetivos, pois conduzem os indivíduos sem condições de ascender aos conteúdos dos direitos através de mecanismos e da intervenção do Estado. Pedem a igualdade material, através da intervenção positiva do Estado, para sua concretização. Vinculam-se às chamadas “liberdades positivas”, exigindo uma conduta positiva do Estado, pela busca do bem-estar social. São exemplos destes direitos: direito à saúde, ao trabalho, a assistência social, a educação, liberdade de sindicalização, direito de greve, direito a férias e ao repouso semanal remunerado, vale dizer que nesta dimensão visa à proteção de grupos de pessoas, tais como trabalhadores e aposentados. Terceira Geração - OS DIREITOS DOS POVOS OU DA SOLIDARIEDADE 8 O mundo convive, no século XXI, com o paradoxo da crescente internacionalização dos direitos humanos, cada vez mais entronizados no direito interno estatal, e a flagrante escalada de novas formas de imperialismo, de dominação e de violação contumaz desses próprios direitos. Do domínio das armas ao controle econômico, dos boicotes ostensivos aos subornos de todo tipo, da especulação das empresas transnacionais à cumplicidade de oligarquias locais, das regras unilaterais de mercado ao peso das dívidas externas, do mega-protecionismo aos impedimentos de uma tecnologia autóctone – tudo conduz a uma realidade profundamente desigual entre as coletividades organizadas do planeta. E o lado fraco no jogo de interesses desta era pós-industrial, inegavelmente, são os países subdesenvolvidos, de industrialização periférica e economia centrada na exportação de matérias-primas (uns mais, outros menos). A bissegmentação mundial entre países ricos (hemisfério Norte) e países pobres (hemisfério Sul) e o desnível entre eles existente, como se sabe, é um fato histórico relativamente recente. Em todas as sociedades civilizadas do mundo, o nível básico de vida foi praticamente o mesmo, até o Renascimento (séculos XIV-XV). A revolução comercial (mercantilista) acabou cavando diferenças em favor dos países que se dedicaram ao comércio externo e ao colonialismo. Com a Revolução Industrial (séculos XVIII-XIX), as sociedades industriais passaram a Ter, em relação às sociedades que permaneceram agrárias, vantagens cada vez mais aceleradas. E a nova Revolução Industrial, especialmentea sociedade terciária e informacional contemporânea, faz multiplicar essa vantagem, por um fator altíssimo, em benefício dos membros do restrito clube pós-industrializado. Ao mesmo tempo, ao longo desse processo, sobressai toda uma tradição de lutas políticas e econômicas de cada povo e cada país pelo seu livre desenvolvimento, e que progressivamente passaram a ter amparo jurídico internacional. Das batalhas anticolonialistas à guerra contra o poderio tecnológico-industrial, da resistência frente ao expansionismo personalista à oposição antiimperialista – em nenhum desses momentos têm faltado contribuições e sacrifícios, a título pessoal ou coletivo, em prol da liberdade, da paz e da justiça social no plano internacional. A saga societária para liquidar a opressão – qualquer que fosse sua forma ou pretexto – e pela afirmação soberana dos povos tomou vulto no século XIX, com o direito de “autodeterminação dos povos” ou “princípio das nacionalidades”. Mais precisamente a partir de 1820, quando uma ordem de movimentos liberais irradiou-se pela Europa. Associados aos ideais de democracia, república ou monarquia constitucional, intensificaram-se os anseios e iniciativas de cunho nacionalista. E, ao contraditar-se o princípio do “legitimismo” – reacionária posição do Congresso de Viena (1815) para conservar o absolutismo -, formulou-se o “princípio das nacionalidades”: todo povo que se considerasse uma mesma nação (identidade ética-cultural) deveria constituir-se em Estado independente, livre do jugo estrangeiro; e, da mesma forma, as diversas parcelas de uma nação deveriam fundir-se num só Estado. O direito de “autodeterminação dos povos”, pois, se forjou na crença da soberania popular, nascida nos embates ideológicos das revoluções burguesas, que vieram substituir o absolutismo feudal pelo Estado capitalista liberal. Segundo ela, todo poder emana do povo e, portanto, só ao povo cabe decidir sobre seu próprio destino, estribada em rico filão documental: Declaração de Virgínia – 1776 (art. 2º), Declaração francesa de 1789 (art. III), Declaração francesa de 1793 (arts. XXIII a XXVI). Já na época das revoluções socialistas e dos movimentos de libertação nacional, que são marcas registradas do século XX, a idéia de soberania popular ganha uma dimensão incomparavelmente maior e mais concreta, sendo exemplos: as transformações e reformas sócio-econômicas que se efetuam, a socialização de boa parte da economia, o surgimento de uma economia nacional independente – atualmente, a preocupação central da maioria dos países do Sul; indubitáveis tentativas de construir, por caminhos diversificados, uma base material ampla, um patrimônio dinâmico e produtivo de toda a nação, capaz de elevar sensivelmente os padrões de existência, cultura, produtividade e participação de todos os setores da população ou, pelo menos, de sua maior parte. Ao término da II Guerra Mundial, após a derrota dos Estados totalitários nazi-fascistas, 51 países reuniram-se em São Francisco (EUA) e firmaram a Carta fundadora das Nações Unidas, em 26 de junho de 1945. Por via dessa Carta, o princípio da “autodeterminação” se estabeleceu em definitivo no Direito Internacional, pois faz parte dos propósitos da ONU “desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direito e de autodeterminação dos povos” (Artigo 1, alínea 2). Reconhecendo o princípio da “autodeterminação”, reafirmado em inúmeros documentos, o Direito Internacional rejeitou toda e qualquer idéia de estagnação de povos ou Estados e a defesa intransigente do “status quo” (situação vigente). Ademais, aceitou a tese de mobilidade histórica e progresso social, franqueando a possibilidade aos povos e países de, legitimamente, aspirar e galgar sempre mais elevados níveis de organização interna e desenvolvimento. Em outras palavras, cotejando tão somente o artigo 55, da Carta da ONU, e o art. XXVIII, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, é válido concluir que: a) os direitos econômicos, sociais e culturais são direitos do cidadão e dever do Estado; b) o Estado, absorvendo em si os direitos individuais e coletivos, passa à agente prestador dos direitos humanos, ao tempo em que também ele se torna beneficiário da nova ordem internacional que se preconiza para a realização de tais direitos. Todavia, conquanto seja responsável pela consecução de medidas que materializem os direitos econômicos, sociais e culturais, o Estado tem o direito de auto determinar-se nos seus assuntos internos, sem qualquer ingerência externa. Ficam no ar as perguntas: todos os Estados dispõem dos recursos necessários para tornar efetivos os direitos de Segunda geração? Quantos Estados têm condições de se autodeterminarem nas relações externas? Onde a nova ordem recomendada? Talvez seja oportuno descortinar a realidade mundial advinda depois da Última Grande Guerra: a) consolidação da hegemonia norte-americana no campo capitalista; b) constituição do sistema socialista internacional sob a liderança da URSS (cujo sistema-satélite recém-desintegrou-se); c) supressão do colonialismo; d) industrialização das periferias; e) formação e consolidação das corporações transnacionais (ou multinacionais); f) desenvolvimento da revolução científico-tecnológica baseada na contínua automação do processo produtivo. Junto com a valorização do ideal democrático, ocorreu a divisão do mundo em dois blocos de poder – Estados Unidos (Ocidental capitalista) x União Soviética (Comunismo). Com estes, teve início à “guerra fria”, com a instalação de bases militares norte-americanas na Europa Ocidental, a teoria do “perigo comunista” e a venda de armamentos. Os soviéticos, por sua vez, também construíram sua bomba atômica e cuidaram de assistir a seus aliados. E a humanidade passou a viver não mais sob a ameaça de conflitos convencionais, de genocídios e matanças localizadas, mas sob o signo da destruição total. 9 Por outro lado, as novas relações internacionais desse pós-guerra apresentou novos autores, com o processo de descolonização da Ásia e da África e as lutas contra o racismo e o “apartheid”, ensejando inclusive a oficialização do movimento dos países não-aliados (não participação em blocos militares), através da célebre Conferência de Bandung (Indonésia), em 1955. Aliás, essa Conferência ratificou o princípio da “autodeterminação, que desde a Carta da ONU (1945), vinha servindo de base legal para a histórica campanha que fez soçobrar quase por completo o colonialismo. Nesse ponto, impõe-se um parêntese: é impossível negar que a breve história política desses povos, vindos de conquistar a independência, demonstra suficientemente que a autodeterminação de cada qual foi, em grande parte, fictícia. Faltavam-lhes, por certo, os meios para satisfazer as mínimas demandas da população, num sério questionamento aos solenes enunciados de direitos.A par disso, o panorama mundial apresentou, nas duas últimas décadas, uma nova e complexa gama de situações, a influir na realidade e nos anseios do Terceiro Mundo. O risco da solução final, de um descomunal conflito nuclear “sem vencedores”, levou ao câmbio das regras da guerra fria pelas da coexistência pacífica. No bojo desse arranjo de conveniências – dos anos 70 para os 80 -, o conflito, a competição e a cooperação vieram operando no quadro de uma ampla confrontação industrial e tecnológica que, nos seus desdobramentos, mantiveram e ampliaram a repartição do mundo em dois segmentos de países: um desenvolvido (Norte) e outro subdesenvolvido (Sul). E mais,: a rápida modernização do planeta, o domínio da comunicação e da informação, o aumento da produtividade de uns poucos pela informatização (Japão, Estados Unidos e alguns países europeus), a relativa “Pax Americana” diante do colapso da URSS), a impraticabilidade de um desarmamento real e a formação de megamercados regionais, são alguns outros fatores a comprovar o agravamento do desnível Norte-Sul na presente década. Essa rápida análise, por modesta que seja, revela uma nova etapa na evolução e no conceito de direitos Humanos. Assim, a terceira geração de direitos surge na paulatina conscientização, por parte das nações menos desenvolvidas, da necessidade de uma mudança de situação, com condição primordial ao alcance dos meios que permitam a plena vigência dos direitos humanos. A indissociabilidade dos direitos individuais e coletivos, bem como a consciência de que sua fruição por inteiro é proporcional ao esforço conjugado do Estado, do indivíduo, dos grupos sociais e das diferentes nações, levaram os países pobres a encetar movimentos e reivindicações comuns, inclusive valendo-se de eventuais relações multilaterais, como ocorreu com a proposta de “patrimônio comum da humanidade” quanto aos recursos dos fundos oceânicos, defendida pelo “Grupo dos 77” – número originário do bloco dos países terceiro-mundistas, articulado dentro da ONU, nos anos 70. Foi com esse espírito que, na Conferência de Argel, em 1976, um grupo de países do Sul proclamou a “Declaração dos Direitos dos Povos”. Nela propuseram a busca de “uma nova ordem política e econômica e internacional, em cujo contexto possa dar-se “o respeito efetivo dos direitos humanos”. E, no mesmo ano, a V Conferência de Cúpula dos Países Não-Aliados, em Sri Lanka (ex-Ceilão), definiu – com validade hodierna: “Só uma reestruturação total das relações econômicas internacionais, mediante o estabelecimento de uma nova ordem econômica internacional, permitirá aos países subdesenvolvidos alcançar um nível aceitável de desenvolvimento”. Corroborando com tais assertivas, o “Simpósio de especialistas sobre o tema dos direitos de solidariedade e direitos dos povos”, convocado pela UNESCO, em San Marino (1984), concluiu que os direitos proclamados (através da ONU) são os direitos dos povos à sua existência, à livre disposição dos recursos naturais próprios, o direito ao patrimônio natural comum da humanidade, à autodeterminação, à paz e à segurança, à educação, à informação e à comunicação, a um meio ambiente são ecologicamente equilibrados. O corolário desses direitos todos vem a ser o direito ao desenvolvimento, “de cuja realização se deriva, com efeito, o respeito da maioria dos demais direitos e liberdades dos povos” (art. 38). O tema do “direito ao desenvolvimento” tem originado debates e levantado muitas expectativas na conjuntura contemporânea. Definido como um conjunto de princípios e regras no fundamento dos quais o homem, enquanto indivíduo ou membro do corpo social (Estado, nação, povo...) poderá obter, na medida do possível, a satisfação das necessidades econômicas, sociais e culturais indispensáveis a sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade. Quanto a esse direito, que os seus credores são os indivíduos, os povos e os Estados, enquanto os devedores se resumiriam na totalidade da comunidade internacional. A ONU, em algumas de suas resoluções, já incluiu o direito ao desenvolvimento nos direitos humanos. Por último, renomados estudiosos consideram-no, ao mesmo tempo, como um direito do Estado e um direito da pessoa humana. Para muitos, na sociedade internacional em que vivemos, caracterizada por uma verdadeira “revolução mundial” – composta de uma série de “revoluções contínuas” – criam corpo às exigências de novas medidas e mentalidades quanto à aplicação dos direitos humanos na perspectiva dos interesses coletivos. Dessa forma, a redefinição da ordem internacional, no interesse dos povos do Terceiro Mundo, aponta para os seguintes requisitos: Reconhecimento do direito a um desenvolvimento livre de ingerências externas, que não implique em qualquer forma de dominação, hegemonia ou atrelamento, com rigoroso respeito à integridade territorial desses países e inviolabilidade de suas fronteiras; Reconhecimento de plena soberania dos países do Sul sobre os seus próprios recursos naturais e atividades econômicas essenciais, também assegurando-se-lhes, de fato, a completa igualdade nas relações econômicas internacionais; Criação de mecanismos internacionais para firmar uma redistribuição justa das receitas procedentes do intercâmbio econômico em favor dos países subdesenvolvidos. Isso inclui o direito de controlar as atividades e lucros das multinacionais, uma política democrática de preços das matérias-primas, e, a ampliação da ajuda financeira e técnica aos países atrasados/dependentes; O predomínio da cooperação e da multipolaridade entre nações, sujeitando-se o exercício da soberania ao princípio da “função social”; O direito a um meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, o que questiona os modelos desenvolvimentistas adotados; O direito à utilização do “patrimônio comum da humanidade”, ou seja, o acesso compartido dos povos aos recursos do alto-mar, dos fundos oceânicos, do espaço exterior e das regiões polares. Assim, tais direitos dos povos ou de solidariedade podem e devem servir às transformações imprescindíveis na conjuntura mundial, conforme vão se consolidando como instrumento de moralidade política internacional, favorecendo o desenvolvimento de relações justas, equânimes, pacíficas e solidárias. 10 SÍNTESE DA 3ª DIMENSÃO - Os direitos fundamentais até então assegurados, tinham como destinatário o homem enquanto indivíduo. Já os direitos fundamentais de Terceira Dimensão tem como traço característico o fato de não mais estarem centrados no homem individualmente considerado, mas sim na coletividade. Surgem os direitos coletivos e difusos. Neste contexto, depreende-se que a terceira geração ou terceira dimensão, que foram desenvolvidos no século XX, tendo como marco inicial, o fim da 2ªGuerra Mundial (criação da ONU – 1945) seriam os Direitos da Fraternidade entre os povos, no qual está o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, progresso, paz universal, etc. Essa geração é dotada de um alto teor de humanismo e universalidade, pois não se destinavam somente à proteção dos interesses dos indivíduos, de um grupo ou de um momento. Refletiam sobre os temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade. Como exemplo pode-se citar o direito a paz, ao meio ambiente e a conservação do patrimônio cultural. A PROTEÇÃO INTERNACIONAL - DOS DIREITOS HUMANOS Os direitos humanos são cada vez menos matéria de jurisdição doméstica dos Estados Unidos, para cada vez mais interessar e obrigar a totalidade da vida internacional. A solidificação e a prática desses direitos, porém, se estribam em três premissas inconfundíveis: a sua entronização e respeito na ordem interna de cada país; a sua incorporação no direito internacional; e, a criação de instrumentos de controle que impunham a sua aplicação. Na verdade, o problema de fundo dos direitos humanos, hoje em dia, não é tanto o de declará-los ou de encontrar argumentos para justificá-los – que existem, e muitos -, mas sim o de protegê-los. Vale dizer, a sua realização se situa no terreno político, e não filosófico. O primeiro passo, taxativamente, foi à transposição desses valores basilares para as Cartas Políticas que se tornaram praxe com os movimentos revolucionários do século XVIII, fórmula com que se buscou conferir-lhes o máximo de eficácia. Assim, os direitos individuais (civis e políticos) e os direitos coletivos (econômico, social e cultural) foram, aos poucos, integrando os textos constitucionais ou a legislação positiva da maioria dos Estados. Contudo, a experiência tem demonstrado tanto no passado como no presente, que muito embora afirmadas e garantidas constitucionalmente, as liberdades públicas – assim nominadas a positivação, pelo poder estatal, das duas classes de direitos – não raramente se apresentam divorciadas da realidade do povo. Essa circunstância dicotômica, encontrada em muitos países – ontem ou hoje -, deve ser atribuída a um claro desvirtuamento da própria idéia de Constituição, ardilosamente perpetrada pela classe dirigente, mas que não invalida a contínua necessidade desse instrumento na efetivação dos postulados democráticos. Sobre esse tema (Constituição), sua importância e alguns desdobramentos, vejam-se o capítulo Constituição e Cidadania. Por outro lado, os desequilíbrios sociais impulsionados pela Revolução Industrial e os efeitos múltiplos das duas grandes guerras da primeira metade do século XX, sacudiram a consciência mundial e levaram – Estados, grupos sociais e indivíduos – a valorizar o tema dos direitos e garantias da pessoa humana, na evidência de que ninguém poderia Ter par ou desfrutar das liberdades enquanto perdurassem as estruturas sociais injustas. Portanto, a começar com a Carta das Nações Unidas (1945), a explicitação e a defesa dos direitos humanos ganharam relevo inusitado, cada vez mais merecendo a atenção e mesmo sendo objeto direto de inúmeras declarações e atos jurídicos internacionais (bilaterais ou multilaterais, celebrados por Estados ou Organizações). Ora, o prévio reconhecimento do ser humano como sujeito de direito das normas internacionais é a condição “sine Qua non” para se discorrer sobre a proteção dos direitos básicos na ordem internacional (da Segunda metade do século) – sem desacreditar o acervo contributivo existente, de maneira especial o gestado no período entre-guerra (1919-1938). Nesse particular, a maior parte dos doutrinadores contemporâneos defende a posição de que são sujeitos de Direito Internacional: os Estados, as organizações externas, o próprio homem; isto é, cada ente que possuir direitos e deveres perante o regramento jurídico internacional. Existem duas fortes razões para o homem ser considerado pessoal internacional: a) a própria dignidade humana, que leva a ordem jurídica internacional a lhe reconhecer direitos fundamentais e procurar protegê-los; b) a própria noção de direito, “obra do homem e para o homem”. De fato, com a democratização do Dir Int, não se pode mais negar a personalidade internacional do indivíduo; O homem é tão pessoa internacional quanto o Estado, apenas a sua capacidade jurídica e de agir é bem mais limitada. Inclusive, é expressivo o fato de já se notar inúmeros autores que pregam um Direito Internacional dos Direitos Humanos como uma especificidade, porque ele é posto em movimento pelo indivíduo, enquanto o Dir Int Geral o é pelo Estado. Assinale-se, igualmente, que a década de 80 foi caracterizada por um rico desenvolvimento dessa área jurídica, tanto na interpretação dos direitos fundamentais como na criação e florescimento de mecanismos mais eficazes para sua proteção. A par disso, tornou-se necessária à instalação de instâncias ou mecanismos controladores da ação dos Estados, quer para fazê-los respeitar os direitos da população de seu território, quer para impedi-los a honrar os princípios do direito internacional. Esses organismos se classificam em universais e regionais, diferenciando-se de acordo com sua composição, seus objetivos e métodos de trabalhos e, por derradeiro, sua competência. Nessa altura, a questão que se coloca para o Direito Internacional é que lhe faltam o poder coercitivo, por não se vislumbrar mundialmente um órgão de controle direto e fiscalizador, com aptidão de exigibilidade sobre as ações violadoras de um Estado. Os atos dos sistemas (universais/regionais) de proteção existentes têm apenas um caráter moral, de repreensão ao Estado infrator e de alerta à comunidade internacional, intentando fazer cessar a violação. Em outras palavras, o Direito Internacional, contrariamente ao Direito interno, não tem governo nem polícia, e seus tribunais de justiça não têm jurisdição obrigatória, ou seja, eles só julgam e decidem se entre as partes envolvidas houver um acordo nesse sentido, aceitando o julgamento e a executoriedade da sentença que for lavrada. 11 Ademais, acabam se chocando os mecanismos de controle com o velho conceito limitado de soberania nacional, que tem como corolário o princípio da “não-intervenção” em assuntos de responsabilidade interna de cada Estado. Essa concepção irrestrita de soberania impede as ações efetiva dos organismos estabelecidos na sociedade internacional para a defesa dos direitos gerais da humanidade. A dificuldade de punir os Estados transgressores, enquanto compreendidos os sistemas de proteção internacional como expressão exclusiva das conveniências estatais, tem levado não poucos experts” a denunciar uma diferença de tratamento nessa matéria motivada por uma compreensão bipartida dos direitos
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