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PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 129 Classificações das sentenças Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau1 Rafaela Cabral Ferreira2 Resumo: Este artigo foi desenvolvido com a intenção de realizar estudo e análise das formas pelas quais a doutrina Processual Civil classifica as sentenças judiciais. Ini- cialmente, em razão da forte influência do Direito Processual italiano, os doutrinadores pátrios consideravam três tipos de classificações para as sentenças. Mais adiante, juristas brasileiros, acompanhando a ideia de Pontes de Miranda, defenderam a existência de mais dois tipos, considerando cinco os tipos de sentenças no Processo Civil. Dessa forma, atu- almente os estudiosos do Direito Processual se dividem entre os adeptos da Teoria Triná- ria e os defensores da Teoria Quinária. Diante disso, objetiva o presente artigo a concluir, por meio da análise dos argumentos apresentados pelas teorias doutrinárias, quantos tipos de sentenças devem ser admitidos no Direito Processual Civil. Ressalta-se que a definição das espécies de sentenças no Direito Processual brasileiro é importante para que haja o correto relacionamento entre a decisão judicial e os outros institutos processuais, como, por exemplo, os recursos cabíveis em face das sentenças proferidas. Palavras-chave: Sentenças. Classificações. Efeitos. Teoria trinária. Teoria quinária. Abstract: This article was developed with the intention of studying and analyzing the ways in which the Civil Procedure doctrine classifies court sentences. Initially, due to the strong influence of Italian Procedural Law, the patriotic scholars considered three types of sentences classification. Later, brazilian jurists, following the idea of Pontes de Miranda, defended the existence of two more types, considering five types of sentences in Civil Procedure. Thus, the current procedural law scholars are divided between followers of the Ternary Theory and defenders of Quinary Theory. Therefore, this article aims to conclu- de, through analyzing the arguments presented by the doctrinal theories, how many types of sentences should be admitted to the Civil Procedural Law. It should be noted that the definition of sentences classification in brazilian Procedural Law is significant for there to be a proper relationship between judicial ruling and the other procedural institutes, for example, the reasonable resources in the face of the given sentences. Keywords: Sentence. Classifications. Effects. Ternary theory. Quinary theory. 1 Graduada em Pedagogia com habilitação em Orientação Educacional e Habilitação em Supervisão pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestre e Doutora em Direito pela UFMG. Professora Adjunta da Faculdade de Direito da UFMG. Subcoordenadora do Programa de Pós-Graduação da FDUFMG. Vice-diretora da Divisão de Assistência Judiciária da FDUFMG. 2 Graduada em Direito pela UFMG. Advogada atuante nas áreas de Direito Civil, Comercial e Processual Civil. 130 PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 1. Introdução Inicialmente, cumpre esclarecer que as sentenças podem ser classificadas pela doutrina Processual Civil brasileira a partir de vários critérios. Conforme adotado pela maior parte dos juristas, o critério mais adequado para classificar as sentenças judiciais é aquele que se refere à natureza de seu conteúdo. Dessa forma, a partir do conteúdo da sentença, é possível ordenar os tipos de decisões judiciais. Os estudiosos do Direito Processual Civil estão divididos quanto ao entendimento desse tema, entre a Teoria Trinária, que admite três tipos de sentenças: declaratória, constitutiva e condenatória, e a Teoria Quinária, que aceita cinco tipos de sentenças: além das três já mencionadas, a executiva lato sensu e a mandamental. Diante disso, importante se torna a análise dos fundamentos de cada uma das teorias mencionadas, partindo-se do estudo do conceito de sentença, seu conteúdo e efeitos, para ao final chegar-se a uma conclusão acerca da corrente mais adequada para classificação das sentenças no âmbito do Direito Processual Civil moderno. 2. Conceito de sentença cível Conforme se verifica no §1° do artigo 162 do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/73), pode-se conceituar sentença como o ato do juiz que enseja alguma das hipóteses dispostas nos artigos 267 e 269 do CPC/733. Sendo assim, na sistemática processual vigente, o conceito de sentença está definido legalmente como o termo final do processo. 3 Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: I – quando o juiz indeferir a petição inicial; II – quando ficar parado durante mais de um ano por negligência das partes; III – quando, por não promover os atos e diligências que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de trinta dias; IV – quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V – quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou de coisa julgada; VI – quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual; VII – pela convenção de arbitragem; VIII – quando o autor desistir da ação; IX – quando a ação for considerada intransmissível por disposição legal; X – quando ocorrer confusão entre autor e réu; XI – nos demais casos prescritos neste Código. Art. 269. Haverá resolução de mérito: I – quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor; II – quando o réu reconhecer a procedência do pedido; III – quando as partes transigirem; IV – quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição; V – quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação. PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 131 Nesse sentido, vale citar a posição de Humberto Theodoro Júnior (2008, p. 590): “sentença, segundo o Código, é a decisão do juiz singular que põe termo ao processo (art.162).” Ademais, seguindo o mesmo entendimento, Daniel Amorim Assumpção Neves (2011, p. 489) também esclarece que o conceito de sentença está disposto no CPC. A sentença foi conceituada pelo legislador de 1973 como o ato que põe fim ao processo, incluindo-se, nessa conceituação, tanto as sentenças que resolvem o mérito da demanda (definitivas) como aquelas que apenas encerram o processo, sem manifestação sobre o mérito (terminativas). Mesmo admitindo que haja controvérsia na doutrina sobre a validade desse conceito legal, tendo em vista que o processo poderá não se acabar com a sentença de primeiro grau, entende-se que o melhor conceito para sentença é, conforme dispõe o art. 162 do CPC/73, a decisão implicada por alguma das hipóteses previstas nos artigos 267 e 269 do Código de Processo Civil de 1973. 3. Conteúdo e efeitos da sentença cível Primeiramente, cumpre diferenciar o conceito de conteúdo e o conceito de efeitos de uma sentença. Conforme dizeres de Fredie Didier Júnior (2009), o conteúdo da sentença tem relação com as normas de Direito aplicadas ao caso concreto pelo judiciário. Por ou- tro lado, os efeitos da sentença são as consequências da decisão proferida pelo juiz. Júnior (2009, p. 354-355) disserta: Não se confundem o conteúdo e os efeitos de uma sentença. [...] O conteúdo compreen- de a norma jurídica individualizada estabelecida pelo magistrado, seja para certificar o direito a uma prestação (fazer, não fazer ou dar coisa), seja para reconhecer um Direito potestativo, seja ainda para tão-somente declarar algo. Efeito é a repercussão que a de- terminação dessa norma jurídica individualizada pode gerar e que vincula, de regra, as partes do processo. [...] Uma importante consequência da distinção entre o conteúdo e os efeitos da sentença, aqui tomada em sentido amplo,é o fato de que a coisa julgada material atinge a norma jurídica individualizada estabelecida pelo magistrado (isto é, o conteúdo da sentença) e não os seus efeitos. Dessa forma, considerando a diferenciação feita acima, verifica-se que a doutrina do Di- reito pode admitir a classificação da sentença, tendo como critério diferenciador o conteúdo ou os efeitos da sentença. A maior parte da doutrina prefere adotar o critério do conteúdo das decisões, para a clas- sificação das sentenças. Essa ordenação verifica, do ponto de vista singular da composição de um litígio, quais são as espécies de sentenças admitidas no nosso ordenamento jurídico. Partindo-se da premissa de que o critério adotado para a classificação das sentenças é o seu conteúdo, as reconhecidas diferenças nas formas de efetivação das três espécies de sentença são irrelevantes para fins de classificação.4 4 NEVES, 2011, P. 493-494. 132 PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 Prefere Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 448-449) “falar [...] em classificação das sentenças quanto ao seu conteúdo e não quanto aos seus efeitos”. Da mesma forma, para Luiz Rodrigues Wambier (2008, p. 551): o critério utilizado para que se classifiquem as sentenças desse modo é o referente ao tipo de tutela jurisdicional que é veiculada pelo pedido. Então, o pedido que houver, no bojo da ação, é que irá determinar de que tipo de sentença se trata. Seguindo esse raciocínio, entende Humberto Theodoro Júnior (2008, p. 590) que: a classificação realmente importante das sentenças (considerando tanto a decisão do juiz singular como o acórdão dos tribunais) é a que leva em conta a natureza do bem jurídico visado pelo julgamento, ou seja, a espécie de tutela jurisdicional concedida à parte. Outro ponto importante levantado pela doutrina refere-se ao fato de que a classifica- ção das sentenças somente faz sentido nas decisões definitivas, com resolução do mérito, nas quais haja decisão de procedência do pedido do autor. Isso porque as sentenças termi- nativas que não apreciam o objeto da lide, bem como as que rejeitam o pedido do autor, serão decisões consideradas meramente declaratórias. Nesse sentido, seguem as explica- ções de Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 448) e Cândido Rangel Dinamarco (2005, p. 205), respectivamente: Note-se, porém, que esta é uma classificação das sentenças de procedência do pedido, uma vez que a sentença que rejeita o pedido do autor (dita “sentença de improcedência” ou “de rejeição”) será, sempre, meramente declaratória da inexistência do Direito afir- mado pelo autor. Os graus dessa natural vocação à efetividade variam de acordo com as diferentes es- pécies de sentenças de mérito, em razão da natureza dos diferentes efeitos de que são portadoras e, portanto, dos modos diversos como atuam sobre a vida dos litigantes. E esse é, também, o entendimento de Fredie Didier Júnior (2009, p. 357): restringe-se a classificação às decisões de procedência, porque as decisões de im- procedência têm normalmente conteúdo declaratório, o que retira a utilidade de que se submetam a uma classificação. Diante disso, verifica-se que as sentenças de mérito, isto é, aquelas que examinam e decidem a matéria na qual se fundamenta o pedido, desde que sejam de acolhimento do pedido do demandante, devem ser classificadas de acordo com o critério de seu conteúdo. Mesmo para os autores que admitem a classificação das sentenças a partir dos efeitos dessas decisões, as espécies classificatórias de sentenças são as mesmas apresentadas pe- los doutrinadores que adotam o conteúdo como critério de classificação. 4. Classificações das sentenças Conforme demonstrado, a doutrina processualista civil se divide acerca da definição de critérios a serem utilizados para classificação das sentenças cíveis. Assim, o entendi- mento majoritário entre os doutrinadores processualistas é de que as sentenças devem ser classificadas a partir do seu conteúdo. PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 133 Isso quer dizer que a classificação de uma determinada decisão judicial será definida de acordo com o tipo de tutela jurisdicional buscada pelo autor e acolhida pelo juiz. E não poderia ser de outra forma, já que a sentença proferida pelo juiz deve guardar estreita relação com o pedido formulado pelo autor, sobretudo em obediência ao Princípio da Adstrição do juiz ao pedido da parte (art. 128 e 469 do CPC/73)5. Sendo assim, a sentença proferida pelo judiciário traz características relacionadas ao pedido do autor, que permitem classificá-las em espécies diferenciadas de decisões. Dessa forma, a partir do conteúdo das sentenças, elas podem ser classificadas, de acordo com a Teoria Trinária, em três espécies e, segundo a Teoria Quinária, em cinco espécies. 4.1. Teoria trinária A Teoria Trinária, originada do Direito italiano, tem como representante o jurista En- rico Tulio Liebman e seu mestre Giuseppe Chiovenda. Para esses, as sentenças podem ser classificadas em três espécies: declaratórias, constitutivas e condenatórias. Para os adeptos dessa teoria, as sentenças podem ser declaratórias quando trazem declarações; podem ser constitutivas, quando criam, modificam ou extinguem relações jurídicas; ou mesmo podem ser condenatórias, quando comportam condenações. Essa classificação foi adotada pelo desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Elpídio Donizette, que entende o seguinte: “as sentenças que têm a mesma nature- za da ação em que são proferidas podem ser condenatórias, declaratórias e constitutivas”. Além disso, Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 448-449) também adepto dessa cor- rente, afirma: A sentença definitiva (isto é, a sentença que contém a resolução do mérito, aquela que dá uma definição ao objeto do processo) se classifica em três espécies, segundo o seu con- teúdo. [...] Assim sendo, distinguem-se, quanto ao conteúdo das sentenças definitivas, três espécies: meramente declaratórias, constitutivas e condenatórias. E ainda, seguindo a Teoria Trinária para a classificação das sentenças, Daniel Amorim Assumpção Neves (2011, p. 493) esclarece: Trata-se da Teoria Ternária (trinária) da sentença, defendida por substanciosa corrente doutrinária que segue as lições de Liebman. Contrapõe-se a essa tradicional corrente doutrinária a Teoria Quinária (quíntupla) da sentença, defendida por doutrinadores que seguem as lições de Pontes de Miranda, fundada no entendimento de que, além das três espécies de sentença descritas pela Teoria Ternária, existem ainda as sentenças executi- vas lato sensu e as sentenças mandamentais, o que resultaria num total de cinco espécies de sentença. 5 Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer questões não suscitadas, a cujo respeito a Lei exige a iniciativa da parte. Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado. 134 PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 Entendo ser mais adequado a Teoria Ternária por que concordo com a doutrina que não distingue diferenças no conteúdo de sentenças condenatórias, executivas lato sensu e mandamentais. Em todas elas, há a imputação de cumprimento de uma prestação ao réu, havendo diferença entre elas somente na forma de satisfação dessa prestação, o que naturalmente não faz parte do conteúdo do ato decisório, mas sim de seus efeitos. Ademais, é também adepto dessa corrente Humberto Theodoro Júnior. Sobre isso, Júnior (2008, p. 590) relata: Classificam-se, portanto, as sentenças em: a) sentenças condenatórias; b) sentenças constitutivas; c) sentenças declaratórias.[...] Assim, de par com a tradicional classifica- ção das sentenças em condenatórias, declaratórias e constitutivas, existem também as sentenças homologatórias, que são aquelas de mera verificação de legitimidade de ato das partes para alcançar a autocomposição do litígio. E outro não é o entendimento de Alvim Arruda (2003, p. 652): Por outro prisma, classificam-se as ações tendo em vista basicamente os efeitos proces- suais especialmente visados pelo autor, quando propôs a demanda. Está, nesta classi- ficação, portanto, relevantemente considerado o critério da simetria ou congruência, a que já nos referimos, dado que, sendo a sentença de recebimento total da ação, produzir- se-ão, precisamente, aqueles efeitos colimados pelo autor. Segundo esse critério, são as sentenças declaratórias, constitutivas e condenatórias (precipuamente no processo de conhecimento), em função do tipo de ação proposta. Corroborando com a maior parte da doutrina processualista, Vicente Greco Filho (2003, p. 245-246) também concorda com a classificação das sentenças em três espécies. De acordo com o pedido formulado pelo autor, as sentenças podem ser meramente decla- ratórias, constitutivas e condenatórias. Pontes de Miranda viu, também, a possibilidade de existirem sentenças mandamentais e executivas, sendo que a doutrina tradicional as classifica entre as três categorias anteriores. [...] A declaração, a constituição ou a con- denação são os efeitos primários da sentença, também chamados de efeitos principais. Conforme se verificou, a maior parte dos doutrinadores do Direito Processual Civil adota a Teoria Trinária para classificar as sentenças, pela qual são admitidas apenas três espécies de sentenças. Contudo, o entendimento acerca da classificação das sentenças não é pacífico, uma vez que existem autores que defendem a existência de cinco espécies de sentenças no pro- cesso civil brasileiro, cujas ideias serão objeto de reflexão do próximo item deste artigo. Com a entrada em vigor das Leis nº 8.952/1994 e nº 10.444/02, e posteriormente da Lei nº 11.232/05, no ordenamento jurídico brasileiro e a concretização do sincretismo processual, esperou-se que fosse consagrada a Teoria Trinária para pacificação do enten- dimento doutrinário acerca da classificação das sentenças. Isso porque, conforme explicitado pelo jurista Fredie Didier Júnior (2009, p. 357), os dois tipos de sentença trazidos pela Teoria Quinária poderiam ser considerados apenas subespécies das sentenças condenatórias. Com a edição da Lei nº 11.232/2005, essa discussão perdeu um pouco a sua razão de ser. [...] Perdeu o sentido, pois, distinguir as sentenças condenatórias das mandamentais e das executivas. O critério distintivo era exatamente a necessidade ou não de um novo processo para a efetivação da decisão judicial: a sentença condenatória deveria ser exe- cutada ex-intervalo, em outro processo, a sentença mandamental/executiva poderia ser executada sine intervalo, ou seja, no mesmo processo em que foi proferida. PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 135 O conceito de sentença condenatória é jurídico-positivo, e não lógico-jurídico: de- pende, pois, do exame do Direito positivo. Se antes a execução ex intervalo era a regra, agora a regra é a execução sine intervalo. Muda-se a técnica de execução, mas permanece sempre a mesma realidade: somente sentenças de prestação dão ensejo à atividade executiva. Como não há mais distinção da técnica executiva, todas podem, sem problema, ser chamadas de condenatórias. É a partir dessa argumentação que Júnior (2009, p. 357) reforça a sua opção pela Teoria Trinária para classificação das sentenças cíveis: É nesse sentido que dividimos as decisões de procedência entre as sentenças de prestação (que podem ser chamadas de condenatórias), as constitutivas e as decla- ratórias. Contudo, não obstante a adesão da maioria dos doutrinadores processualista pela Teoria Trinária, mesmo após o advento do sincretismo processual, há ainda estudio- sos do Direito que classificam as sentenças por meio das cinco espécies de sentenças trazidas pela Teoria Quinária, conforme será analisado a seguir. 4.2. Teoria quinária Na década de 1970, a Teoria Quinária foi apresentada pelo alagoano Pontes de Miranda, em Tratado das ações, com o objetivo de romper com a Teoria Clássica do Processo Civil que classifica as sentenças em apenas três espécies. Nesse sentido, Luciano Vianna Araújo (2010, p. 332) esclarece que “no Tratado das Ações, Pontes de Miranda classifica, com todos os pormenores, as ações em cinco espécies [...]”. Ademais, a classificação proposta pela Teoria Quinária fundamenta as sentenças proferidas nos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa. Isso por que uma das características apresentada nesses casos é a delimitação das sentenças condenató- rias, dentre as executivas lato sensu e as mandamentais. Assim, nos dizeres de Humberto Theodoro Júnior, os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa não podem ser considerados apenas como um desdobramento do processo de conhecimento, sobretudo por que as suas sentenças comportam não só acertamento de um direito, mas também força judicial. Para Humberto Theodoro Júnior, esses são casos de “acertamento com preponderante função executiva”. Nesse sentido, as sentenças proferidas nos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa seriam qualificadas como executivas lato sensu. Assim, para a classifica- ção das sentenças proferidas nas ações de procedimentos especiais, devem-se consi- derar os argumentos da Teoria Quinária. Conforme dizeres de Luiz Rodrigues Wambier (2008, p. 551), segundo a Teoria Quinária, as sentenças podem ser classificadas em declaratórias, constitutivas, conde- natórias, mandamentais e executivas lato sensu. Há forte tendência doutrinária no sentido de incluir, ao lado das três espécies já referidas, utilizadas pela chamada classificação tradicional, mais duas espécies de sentenças: as sentenças mandamentais e as executivas. 136 PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 Os dois primeiros tipos admitidos (declaratórias e constitutivas) têm o mesmo concei- to já trazido pela Teoria Trinária. Já os outros três tipos englobados na Teoria Quinária são espécies de sentenças de prestação, efetivadas cada uma de uma forma. A Teoria Quinária diferencia a sentença condenatória, a mandamental e a executiva lato sensu, sob o ponto de vista do cumprimento de cada uma delas. A primeira, sentença condenatória, deverá ser cumprida posteriormente pelo réu. A segunda e a terceira deve- rão ser cumpridas imediatamente, sendo a diferença definida pela voluntariedade do réu, presente apenas na sentença mandamental. Assim, a partir desse prisma, o cumprimento da sentença executiva lato sensu seria possível apenas em razão da força estatal. Dessa forma, Nagib Slaibi Filho (2010, p. 245), adepto da teoria para classificação da sentença trazida por Pontes de Miranda, afirma que: Dentro da classificação ternária, usualmente adotada em nossa doutrina, as ações de conhecimento dividem-se em ações declarativas, constitutivas e condenatórias. Influen- ciada por Pontes de Miranda, há a parcela minoritária que prefere utilizar a classificação quinária (ações declarativas, constitutivas, condenatórias, mandamentais e executivas), e nela procurar resguardar todos os efeitos sentenciais nesta obra; por razões inclusive de exposição, adotaremos tal classificação. Além disso, Luiz Guilherme Marinoni (2007, p. 414) também concorda com a classi- ficação da Teoria Quinária. Na época da formação do processo civil, as sentenças eram apenas três – declaratória, constitutiva e condenatória – por que assim bastava ao Estado Liberal e exigiam os seus valores. Com o passar do tempo, e o surgimentode novos direitos, passaram a ser necessárias novas técnicas para a tutela dos direitos, quando apareceram as sentenças mandamental e executiva, delineadas com base nas expressões normativas constantes dos arts. 84 do CDC e 461 do CPC. E mais: a diferença teórica entre a execução direta e indireta, já frisada pela doutrina italiana clássica, não pode ser ignorada quando as sentenças são classificadas a partir dos meios executivos. A forma de atuação de tais sentenças é completamente distinta. A execução indireta, segundo o seu próprio nome indica, é incapaz de, diretamente, permitir a tutela do Direito. Ela atua sobre a vontade do demandado para constrangê-lo a adimplir a sen- tença, de modo que a tutela do Direito, em última análise, dependerá da vontade do réu. Por sua vez, a execução direta, também conforme faz sentir a nomenclatura, viabiliza a tutela do Direito diretamente, sem se importar com a vontade do demandado. Ao lado disso, em termos de valores, é substancialmente diversa a atuação judicial mediante execução direta e a que se dá por meio de execução indireta. Ainda que ambas sejam resultado da quebra de garantia de liberdade que se pensava outorgar, por intermédio do Princípio da Tipicidade, é certo que a atuação estatal sobre a vontade do cidadão tem sensível diferença em relação à atividade do Estado, que prescinde de tal forma de inter- venção. Tanto é verdade que a grande preocupação do Direito Liberal Clássico sempre esteve ligada à incoercibilidade da vontade. [...] Mas a tradição terminológica, impor- tante para a boa circulação e compreensão dos conceitos, fez com que mantivéssemos as expressões condenatória, mandamental e executiva, já que com isso não perdemos os conteúdos e os significados que estão por detrás de cada um desses signos, conforme antes explicitado. (MARINONI, 2007, p. 420.) PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 137 Seguindo o mesmo posicionamento, Manuel Galdino de Paixão Júnior (2002, p. 312) também registra em sua obra a adoção pela classificação quinária das sentenças: Existe nos hábitos forenses costume já definitivamente instalado, também, em sede dou- trinária, consistente em se classificarem os processos (embora se utilize a palavra ação), tomando-se por ponto de referência a eficácia imediata do julgamento de procedência. Fala-se, assim, de ação declaratória, ação condenatória, ação constitutiva, ação man- damental e ação executiva, definindo-se cada uma das classes pela natureza do efeito imediato do julgamento procedente. Toda decisão se fundamenta numa base de decla- ratividade. Quer-se dizer: quando se condena, se está reconhecendo, declarando um direito, com fundamento no qual se impõe a condenação. Apesar de toda a argumentação supra em favor da teoria construída por Pontes de Miranda, para grande parte da doutrina, a Teoria Quinária propõe cinco tipos de sentenças em razão somente da mistura de elementos díspares, quais sejam o conteúdo e a eficácia da sentença. Nesse sentido, os esclarecimentos de Luciano Vianna Araújo (2010, p. 335) nos tra- zem descrença em relação à Teoria Quinária, sobretudo porque ela se funda em elementos dessemelhantes: A maior crítica da doutrina em relação à Teoria Quinária decorre do fato de que Pon- tes de Miranda, na aludida classificação, ora utilizaria elementos típicos do conteúdo (declaração, constituição e condenação) ora empregaria elementos característicos da eficácia (executiva e mandamental). Seguindo essa ideia, Pontes de Miranda teria focado seus estudos na eficácia das sen- tenças para tentar explicar a classificação a partir do critério do conteúdo das sentenças. Conforme comentário de Paulo Afonso de Souza Sant’anna, esse entendimento é com- partilhado pela maior parte dos doutrinadores: “não há dúvida de que o maior mérito de Pontes de Miranda é a sua doutrina sobre a eficácia das sentenças.” Humberto Theodoro Júnior (2010, p. 329) explicou de maneira cristalina que os dife- rentes efeitos das sentenças condenatórias sejam mandamentais ou executivas lato sensu, não têm o condão de aumentar a classificação das sentenças para cinco espécies, posto que a categorização se refere ao conteúdo das sentenças. O que varia, entre estas diversas sentenças, é apenas a técnica de praticar os atos poste- riores à condenação, que ora exigem atos de sub-roração mais complexos, ora se con- tentam com mandados executivos de expedição e cumprimento imediatos. Como essa técnica executiva atua depois da sentença, não pode, evidentemente, alterar a natureza do seu conteúdo. Dessa forma, mesmo admitindo a existência das sentenças chamadas executivas e mandamentais, Humberto Theodoro Júnior (2010, p. 329) adverte que não se pode consi- derá-las “como espécies que devam figurar dentro da tradicional classificação em função do conteúdo das sentenças”. Por fim, acompanhando outros autores, Humberto Theodoro Júnior (2010, p. 329) reconhece que a grande contribuição de Pontes de Miranda, não obstante tenha falhado na inovação da classificação das sentenças, está “na distinção entre a ação de Direito Pro- 138 PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 cessual e a ação de Direito Material, ou seja, entre o direito à prestação jurisdicional e o direito à tutela jurisdicional [...]”. Logo, pode-se afirmar que a Teoria Quinária falhou por ter acrescentado os efeitos da sentença condenatória como espécies que poderiam ser incluídas na classificação que considera o conteúdo das sentenças. Ademais, verifica-se que embora os argumentos dos processualistas adeptos da Teo- ria Quinária sejam bastante coerentes, a existência de cinco tipos de sentenças perdeu o sentido, com o advento do sincretismo processual, introduzido primeiramente pela Lei nº 8.952/1994, nas obrigações de fazer e não fazer, depois pela Lei nº 10.444/2002 para as obrigações de dar coisa e finalmente pela Lei nº 11.232, no ano de 2005, também para as obrigações de pagar a quantia certa. 5. Conclusões Conforme o estudo doutrinário desenvolvido, verificou-se que a classificação das sentenças segue critérios determinados pelos estudiosos do Direito Processual Civil. A maioria dos autores entende que o critério mais adequado para classificar as sentenças é aquele que tem como foco o seu conteúdo, ilustrado pela tutela jurídica buscada pela parte e concedida pelo judiciário. Dessa forma, a partir da comparação entre os argumentos apontados pelos doutrinado- res adeptos da Teoria Trinária e as explicações dos adeptos da Teoria Quinária, sobretudo após a consolidação do sincretismo processual pela Lei nº 11.232/2005, verifica-se ser mais acertada a classificação das sentenças em apenas três tipos. Entende-se que os dois tipos diferenciados de sentença trazidos pela Teoria Quinária nada mais são do que subespécies da própria sentença condenatória, ou mesmo diferentes efeitos da sentença condenatória. Isso por que, considerando o critério de classificação das sentenças, não se pode ad- mitir diferença no conteúdo das sentenças condenatórias, mandamentais e executivas lato sensu. Até porque, quando a parte aciona o judiciário para obter tutela sobre a prestação pretendida, a decisão judicial sempre se caracteriza pelo caráter condenatório. Além disso, não seria adequado subdividir as sentenças condenatórias somente em ra- zão de seus efeitos, diferentes formas de realização e cumprimento dessas decisões. Ora, as sentenças condenatórias, aqui englobadas à mandamental e à executiva lato sensu, são todas decisões que ordenam o cumprimento de prestação. Diante disso, conclui-se que o entendimento mais adequado para se consagrar no Direito Processual Civil vigente é a prevalência da Teoria Trinária, a qual comporta a clas- sificação das sentenças judiciais em três espécies, quaissejam declaratórias, constitutivas e condenatórias. PHRONESIS: Revista do Curso de Direito da FEAD • no 7 • Janeiro/Dezembro de 2011 139 Referências ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 8. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 652 (Volume 2.) ARAÚJO, Luciano Vianna. A Teoria Quinária (a Teoria da Constante Quinze) e a Lei nº 11.232/2005. In: COSTA, Eduardo José da Fonseca et al. Teoria Quinária da ação. 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