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A Rainha Vitória (1837-1907) da Grã Bretanha marcou uma era muito importante para a cultura inglesa no século XIX: a Era Vitoriana. No seu reinado as artes, as ciências e a tecnologia foram desenvolvidas em um espaço de tensão entre a tradição do passado e a modernidade. Rainha Vitróia, JJE Mayall, 1860 O estilo vitoriano, do qual os ingleses se orgulharam, se estendia aos objetos, móveis, roupas tecidos, artes gráficas, arte, arquitetura, paisagismo e design de interiores. Sua influencia chegou a muitos outros continentes e durou mais de um século. The Art-Journal Em maio de 1851, a Inglaterra inaugurou “A Grande Exposição dos Trabalhos da Indústria de Todas as Nações”. A primeira exposição internacional de indústria, artes, ciência e comércio reunindo diversos países em um único local: mais de 14 mil expositores nos 92 mil metros quadrados de espaço de exibição The Crystal Palace, Hyde Park, London, 1851 Dentro de cada seção nacional, os trabalhos eram divididos e distribuídos dos objetos por seções: maquinaria, a norte; matérias-primas e produtos agrícolas, ao sul; e, por fim, os produtos artísticos e manufaturados, no meio. The Crystal Palace, Hyde Park, London, 1851 A sociedade industrial era orgulhosa do progresso material que trazia a Revolução Industrial. Mas muitos pensavam que este progresso material deixava de lado as preocupações espirituais e que assim ameaçava o tecido social. À medida que se encerrava o século XIX, a qualidade do design e da produção de livros tornou-se vítima da revolução industrial, como algumas excessões notáveis, como os livros do editor inglês William Pickering. Aos 14 anos de idade, ele tornou-se um livreiro e editor de Londres; aos 24 montou sua própria livraria especializada em títulos antigos e raros.The book of common prayer, 1844 Pickering desempenhou papel importante na separação do design gráfico da produção tipográfica. Controlava a definição de formato, seleção de tipos, ilustrações e todos os demais aspectos visuais. Sua paixão pelo design o levou a encomendar novos ornamentos, iniciais e ilustrações xilográficas. The Plays of Shakespeare A edição de Pickering de The Elements of Euclid, de Oliver Byre, é um marco no design de livros. Diagramas e símbolos são impressos com xilogravuras em brilhantes cores primarias; a cor substituir a rotulação alfabética tradicional para identificar as linhas, figuras e formas nas aulas de geometria. Livro The Elements of Euclid Livro The Elements of Euclid Livro The Elements of Euclid Livro The Elements of Euclid Apesar dos esforços de Pickering e outros, o design de livros continuou a decair até o final do século, quando começou a experimentar um renascimento. Essa revitalização - que primeiro tratou o livro como objeto de arte com edição limitada, depois influenciou a produção comercial - foi resultado, em grande parte, do movimento Arts and Crafts, que floresceu na Inglaterra durante as últimas décadas do século XIX como reação à confusão social, moral e artística da Revolução Industrial. John Ruskin encontrava na arte a possibilidade de devolver o equilíbrio entre o progresso material e espiritual. Ele escreveu muitos livros de história e crítica de arte que diziam que o gosto vitoriano encontrava-se moralmente edificante. Estes livros instruíram a classe média britânica na ideia da arte como reflexo das condições morais de uma sociedade: "o sinal visível da virtude nacional”. John Ruskin Ruskin via a arte como a imitação da natureza, além disto devia proporcionar também prazer. Mas aquilo que tornava um objeto em uma obra de arte era o propósito moral: a maior quantidade de grandes ideias. Para Ruskin as obras de arte são encontros com as grandes ideias. Por causa disto ele defendia a importância de viver em ambientes altamente estéticos. Detalhe de papel de parede criado por William Morris O arquiteto Augustus W. Northmore Pugin levou as ideias de Ruskin ao plano do design, propondo projetos baseados na utopia regressiva do retorno à beleza da natureza, em oposição ás novas tendências que exaltavam a beleza das máquinas. Sala Medieval na Grande Exposição de 1851 The Crystal Palace, Hyde Park, London, 1851 Arts and Crafts foi um movimento estético e social inglês, que defendia o artesanato criativo como alternativa à mecanização e à produção em massa. Ele reuniu teóricos e artistas em busca da revalorização do trabalho manual e da recuperação da dimensão estética dos objetos produzidos industrialmente para uso cotidiano. Catalogo da Primeira Exposiaoã Arts And Crafts As ideias de Ruskin e Pugin foram fundamentais para a consolidação da base teórica do movimento. Na vasta produção escrita de Ruskin, observa-se uma tentativa de combinar esteticismo e reforma social, relacionando arte à vida diária do povo. Pggina de Livro de John Ruskin As ideias nostálgicas de Pugin sobre as glórias do passado medieval diante da mediocridade das criações modernas tiveram impacto direto sobre Ruskin, que, como ele, realizava um elogio aos padrões artesanais e à organização do trabalho das guildas medievais. As Guildas Medievais eram associações de profissionais surgidas na Idade Média. Entende- se também por corporações de ofício que eram associações surgidas a partir do século XII para regulamentar o processo produtivo artesanal. Essas corporações estabeleceram regras para o ingresso na profissão e tinham controle de quantidade, de qualidade e de preços dos produtos produzidos, chamado de preço justo. A grande finalidade da Guilda era evitar a concorrência e adequar a produção do consumo local. Augustus W. Northmore Pugin O passo fundamental na transposição desse ideário ao plano prático foi dado por William Morris (1834-1896), o principal líder do movimento. Pintor, escritor e socialista militante, Morris tentou combinar as teses de Ruskin às de Marx, na defesa de uma arte "feita pelo povo e para o povo”. Willian Morris, 1897 Profundamente preocupado com os problemas da industrialização e do sistema fabril, Morris tentou implementar as ideias de Ruskin: a insipidez dos bens produzidos em massa e a falta de trabalho digno podiam ser sanadas pela junção de arte e ofício. A arte e o ofício poderiam combinar-se para criar belos objetos, de prédios a roupas de cama; os trabalhadores poderiam novamente encontrar alegria no trabalho, e o ambiente feito pelo homem - que havia decaído nas cidades industriais com cortiços asquerosos e deprimentes, cheios de bens manufaturados de gosto vulgar - poderia ser revitalizado. A ideia era que o operário se tornasse artista e pudesse conferir valor estético ao trabalho desqualificado da indústria. Com Morris, o conceito de belas-artes foi rechaçado em nome do ideal das guildas medievais, onde o artesão desenhava e executava a obra, num ambiente de produção coletiva. A missão social do movimento era dar solução aos males da Revolução Industrial: melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, levar a cultura a todos e restabelecer a união das artes e os ofícios perdida desde o Renascimento. Catláogo da Morris And Company Todas as peças feitas nos estúdios do Arts and Crafts seguiam os princípios estabelecidos por Morris: • considerar o material (qualidade e nobreza); • considerar o uso (função); • considerar a construção (design); • considerar a ferramenta (técnica). M veis produzidos pelaóMorris And Company O design do movimento Artsand Crafts caracteriza-se pela: • simplicidade vs. complexidade no ornamento; • sistema de guildas vs. sistema industrial; • acabado artesanal vs. acabado industrial. Mesa e cer micasâproduzidas pela Morris And Company Arts And Crafts Vitoriano Arts And Crafts Vitoriano Arts And Crafts Vitoriano O sonho de Morris de oferecer ambientes e objetos altamente estéticos a todos não era possível. Só os ricos podiam comprá-los. Mas o gosto pelos objetos Arts and Crafts cresceu e se estendeu na Alemanha e nos Estados Unidos onde se publicaram revistas especializadas que atingiam um grande público feminino. Walter Crane, A Floral Fantasy in an Old English Garden, 1899 Em 1861, foi fundada a Morris, Marshall, Faulkner & Co., especializada em mobiliário e decoração em geral: forrações, vidros, pratarias, tapeçarias etc. O sucesso da empresa pode ser comprovado por sua ampla e duradoura produção. Detalhe de papel de parede criado por William Morris Vitrais criados pela Morris And Company Detalhes de papel de parede criados pela Morris And Company Dissolvida em 1874, deixou sua marca, como por exemplo nos padrões de Morris para papéis de parede e também naqueles idealizados por Arthur Heygate Mackmurdo (1851-1942) - The Cromer Bird, 1884. Detalhe de papel de parede criado por Mackmurdo para a Morris And Company Em 1892, Morris criou a Kelmscott Press, uma editora para produzir exemplos de design aprimorado de impressão e livros. Ele desenvolveu tipos claros de letras, tais como seu tipo 'dourado' romano, que foi inspirado pelo tipo do antigo tipógrafo veneziano Nicolaus Jenson, e bordas decorativas medievalizadas para livros que eram inspirados pelos primeiros livros impressos no século XV e suas ilustrações talhadas em madeira. Logotipo da Kelmscott Press Sua primeira produção foi The Story of the Glittering Plain, de William Morris com ilustrações de Walter Crane. A princípio estavam previstas vinte cópias, mas à medida que a notícia do empreendimento se espalho, Morris foi obrigado a aumentar a tiragem para duzentas cópias em papel e sei em velino. PKgina de rosto do livro The Story of the Glittering Plain, editado pela áelmscott Press em 1891 A seleção de papel e tinta e a preocupação com a integração completa entre tipo e decorações nas páginas fez da Kelmscott Press a mais famosa das gráficas particulares do Movimento das Artes e Ofícios. Ela operou até 1898, produzindo 53 volumes e mais de 18 mil exemplares, inspirando outras gráficas particulares. Pgáinas de livro editado pela Kelmscott Press Páginas de livro editado pela Kelmscott Press Páginas de livro editado pela Kelmscott Press Páginas de livro editado pela Kelmscott Press O volume mais destacado da Kelmscott Press é o ambicioso The Works of Geoffrey Chaucer, de 556 páginas. Quatro anos de preparação, com 87 ilustrações xilográficas projetadas por Burne-Jones, além de catorze filetes largos e dezoito molduras menores em torno de ilustrações gravadas a partir do design de Morris. Capa de livro editado pela Kelmscott Press Páginas de livro editado pela Kelmscott Press Páginas de livro editado pela Kelmscott Press O paradoxo de William Morris é que, enquanto procurava refúgio no trabalho manual feito no passado, desenvolveu atitudes em relação ao design que delineavam seu futuro. Seu clamor pelo ofício manual, fidelidade aos materiais, a conversão do útil em belo e a adequação do design à função são comportamentos adotados pelas gerações ulteriores, que procuravam unificar não a arte e o ofício, mas a arte e a industria. Morris ensinou que o design podia trazer a arte para a classe trabalhadora, mas os móveis refinados da Morris & Co e os magníficos livros da Kelmscott estavam apenas ao alcance dos ricos. Aos 26 anos de idade, o arquiteto Arthur H. Mackmurdo, conheceu William Morris e inspirou-se em suas ideias e realizações no design aplicado. Em 1982, uniu-se a um grupo de jovens artistas e designers para criar a Century Guild. O grupo desenvolveu uma nova estética incorporando a seus trabalhos características do renascimento e do Japão. Logotipo da Century Guild Wren's City Churches, Mackmurdo, 1883 Cadeira , Mackmurdo, 1883 Um dos trabalhos mais importantes da guilda, foi o periódico The Century Guild Hobby Horse, que começou a ser publicado em 1884, sendo a primeira revista com impressão refinada exclusivamente dedicada às artes visuais. The Century Guild Hobby Horse, 1884 P gina de Rosto do livro Wren's 's Churches, Mackmurdo, 1883 P,peis de parede criados pela Century Guild Após a morte de Morris, o arquiteto, designer gráfico, joalheiro e prateiro Charles R. Ashbee entrou em contato com os herdeiros a fim de adquirir a Kelmscott Press para a Essex House, uma guilda artesanal fundada por ele em 1888. No entanto, as xilogravuras e tipos da Kelmscott foram doados ao Museu Britânico com a norma de que não fossem usados para impressão por cem anos, Ashbee resolveu contratar os principais funcionários de Morris, adquirir os equipamentos disponíveis para venda e fundar a Essex House Press. O Salmo de 1902 é uma obra- prima do design da Essex House Press. O texto está em inglês vernacular do século XVI, com um projeto gráfico para cada salmo, com numeral romano, o título em latim em versais vermelhas, um título descritivo em inglês em versais pretas, uma capitular composta em xilogravura e o corpo do salmo. Os versículos eram separados por ornamentos foliáceos xilográficos impressos em vermelho. Livro de Salmos editado pela Essex House Press, 1902 Livro de Salmos editado pela Essex House Press, 1902 Detalhe de capitular do livro de Salmos editado pela Essex House Press, 1902 Em 1900, o encadernador T.J. Cobden-Sanderson juntou-se a Emery Walker na fundação da Dove Press. Estavam dispostos a “atacar o problema da tipografia pura”, com a opinião de que “a obrigação primordial da tipografia é comunicar à imaginação, sem perder pelo caminho, o pensamento ou a imagem que o Autor pretendia transmitir. Bíblia Editada pela Dove Press, 1903 Os livros da Dove Press, entre os quais sua obra-prima, a Bíblia de 1903, são livros tipograficamente maravilhosos. Ilustração e ornamentos foram descartados nos cerca de cinquenta volumes produzidos em papel de excelente qualidade, impressão perfeita e tipos e espaçamentos requintados. Bíblia Editada pela Dove Press, 1903 Bíblia Editada pela Dove Press, 1903 Estabelecida em 1985 em Londres, a Ashedene Press, dirigida por C.H. St. John Horbny, mostrou-se um excepcional imprensa particular. Os tipos projetados por Ashendene era inspirados em tipos semi-gótigos, tinham elegância vibrante e boa legibilidade, como moderadas diferenças de peso entre os traços grossos e finos e uma letra ligeiramente comprida. Livro editado pela Ashedene Press Livro editado pela Ashedene Press Em 1984 Lucien Pissarro e Esther Bensusan fundaram a Erangy Press, inspirados pela Kelmscott. Trabalharam juntos na concepção, gravação de xilos e impressão dos livros. Muitos deles tinha xilogravuras de três ou quatro cores produzidas com base em ilustrações feitas por Lucien. Diferente de outros membros do Arts and Crafts, o casal Pissarro era inspirado tanto pelo passado como pelo presente; seus livros combinavam as sensibilidades tradicionais do movimento da imprensa particular com um interesse pelo florescente movimento Art Nouveau. Logotipo da Erangy Press Livro editado pela ErangyPress Livro editado pela Erangy Press Cartpo de natal da Erangy Press As ideias do movimento Arts and Crafts, os ventos românticos e a veloz modernização da Europa no final do século XIX inspiraram na França um movimento ainda maior e mais abrangente, o Art Nouveau.
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