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FACULDADE PAULISTA DE ARTES LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS ELLEN TAVARES SAMANTA FERDINANDI POVO WAYANA: Geometria, simetria, tramas e traçados Artigo apresentado como trabalho final para a disciplina Folclore, cultura indígena e afro-brasileira. Docente: Prof. Dr. Maurício de Carvalho Teixeira São Paulo 2017 2 POVO WAYANA: Geometria, simetria, tramas e traçados Resumo Os Aparai e os Wayana são povos de língua karib que habitam a região de fronteira entre o Brasil (rio Paru de Leste, Pará), o Suriname (rios Tapanahoni e Paloemeu) e a Guiana Francesa (alto rio Maroni e seus afluentes Tampok e Marouini). No Brasil, eles mantêm há pelo menos cem anos relações estreitas de convivência, coabitando as mesmas aldeias e casando-se entre si. Por conseguinte, é muito comum encontrar referências a essa população como um único grupo, embora sua diferenciação seja reivindicada com base em trajetórias históricas e traços culturais distintos. A cultura como mercadoria Entre 1968 e 1992, os Aparai e os Wayana conviveram no rio Paru de Leste com missionários protestantes norte-americanos do então chamado Summer Institute of Linguistics (SIL, hoje também chamada Sociedade Internacional de Linguística). Junto com suas atividades proselitistas, e com propósitos educacionais, estes missionários iniciaram um trabalho de 'recuperação' e incentivo à comercialização de artigos da cultura material aparai e wayana, visando garantir a autossuficiência econômica destes índios e familiarizá-los com a economia monetária e mercantil. No final da década de 60, estabeleceu-se uma 'cantina' para troca de artesanato aparai e wayana por bens manufaturados, sob direção de um índio aparai chamado Zé Pereira. Com a morte de Zé Pereira, uma nova 'cantina de troca' foi criada em 1975, também com apoio dos missionários e sob-responsabilidade de outro índio aparai, Jaké. Este último foi, até recentemente, o principal intermediário na comercialização de artesanato e bens industrializados entre as cidades de Macapá e Belém e as aldeias indígenas. Entre 1977 e 1990, houve um grande aumento na produção e comercialização do artesanato Aparai e Wayana, apoiado desde então pela FUNAI e seu Programa Artíndia. A partir de 1997, a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU) iniciou o Projeto Tykasahmo de incentivo à produção e 3 comercialização de artesanato aparai e wayana, com financiamento do Subprograma Projetos Demonstrativos (PD/A-PPG7), e a instalação de três novas 'cantinas' de compra e venda nas aldeias. Desde o início, quando ainda era incentivada pelos missionários do SIL, a produção de itens destinados exclusivamente à comercialização tem acarretado mudanças na cultura material aparai e wayana. Progressivamente, os itens da cultura material têm sido estilizados, destinados apenas à comercialização e substituídos, no cotidiano das aldeias, por artigos industrializados. Além disso, verifica-se um fenômeno mais amplo de transformação da cultura – em suas formas mais 'substantivas': cultura material, festas, ritos e conhecimentos – numa mercadoria, destinada a veicular uma identidade étnica e cultural estereotipada e à obtenção de recursos para aquisição de artigos industrializados. Além da comercialização de artesanato, muitos Aparai e Wayana têm buscado dedicar-se a outras atividades como a prestação de serviços e o trabalho em garimpos vizinhos, ou para os órgãos assistenciais (FUNAI, FAB, Governo do Estado do Amapá). A partir de 1994, a APITU passou a estabelecer uma série de convênios com o Governo do Estado do Amapá, que aumentaram muito o número de contratações de índios como: professores indígenas, monitores de saúde, pilotos e 'proeiros' de lanchas, monitores para a produção de artesanato, assistentes de enfermagem. Por conseguinte, os Aparai e Wayana utilizam cada vez mais o dinheiro como medida de valor e meio de troca (moeda corrente) em algumas transações fora e dentro das aldeias. Lenda Na cultura dos Wayana e Aparatos, existe o mito da lagarta grande também chamada de cobra grande. Conta o mito que existe um tempo passado em que esses dois povos indígenas viviam no alto de um rio. Eles tentavam se encontrar, mas não conseguiam e muitos perderam a vida tentando. Não compreendiam o que acontecia e assim, culpavam uns aos outros. Os indígenas que viviam de um lado da margem achavam que aqueles que viviam de um. Lado eram responsáveis pela morte de seus parentes. 4 Eles se uniram para matar esse “ser” sobrenatural em forma de lagarta/cobra, depois de matarem o “monstro” eles vira. Que a sua pele era bonita e rica em detalhes e então decidiram utilizar os desenhos da pele em tudo que podiam nas pinturas corporais, cerâmicas e aprenderam também imitar a pele da grande lagarta até no trançar da palha para fazer os cestos decorados. A cultura indígena observa a natureza para criar arte. As técnicas usadas até hoje na construção da arte da cestaria, por exemplo, são passadas de geração para geração. Nas pinturas corporais também encontramos certos padrões de imagens. Assim como na cestaria em cada trama é feito um desenho que cria combinações de imagens sequenciais e assim apresentar vários tipos de simetrias. A simetria pode se apresentar de três formas: espelhada (especular), translação e rotação. Simetria espelhada - no balaio feito pelo povo WAYANA, a trama do cesto dividindo a imagem ao meio a imagem se repete como se um espelho projeta-se o desenho. Figura 1: Simetria espelhada Fonte: VELTHEM, Lúcia Hussak van; VELTHEM, Iori Leonel van (Org.). Livro da arte gráfica Wayana e Aparai: Waiana anon imelikut pampila - Aparai zonony imenuru papen. Rio de Janeiro: Museu do Índio - Funai/Iepé, 2010. Disponível em: <http://www.institutoiepe.org.br/infoteca/livros/arte- grafica-wayana-aparai/>. Acesso em: 24/04/2015. Simetria de translação - a simetria vem representando a figura sobrenatural da lagarta de duas cabeças. 5 Figura 2: Simetria de translação Fonte: VELTHEM, Lúcia Hussak van; VELTHEM, Iori Leonel van (Org.). Livro da arte gráfica Wayana e Aparai: Waiana anon imelikut pampila - Aparai zonony imenuru papen. Rio de Janeiro: Museu do Índio - Funai/Iepé, 2010. Disponível em: <http://www.institutoiepe.org.br/infoteca/livros/arte- grafica-wayana-aparai/>. Acesso em: 24/04/2015. Simetria rotacional - a imagem é formada pelo círculo. Figura 3: Simetria rotacional Fonte: VELTHEM, Lúcia Hussak van; VELTHEM, Iori Leonel van (Org.). Livro da arte gráfica Wayana e Aparai: Waiana anon imelikut pampila - Aparai zonony imenuru papen. Rio de Janeiro: Museu do Índio - Funai/Iepé, 2010. Disponível em: <http://www.institutoiepe.org.br/infoteca/livros/arte- grafica-wayana-aparai/>. Acesso em: 24/04/2015. 6 Artista Bené Fonteles José Benedito Fonteles inicia sua carreira em 1971, expondo no 3º Salão Nacional de Artes Plásticas do Ceará. Em Fortaleza, trabalha como jornalista. Durante as décadas de 1970 e 1980, integra anualmente diversas exposições coletivas, nacionais e internacionais, ligadas à arte postal e a pesquisas de novos meios de expressão. Nesse período, participa de quatro edições da Bienal Internacional de São Paulo (1973, 1975, 1977 e 1981). Realiza, ainda, a partir de 1974, diversas mostras individuais, no Brasil e no exterior. Fonteles1 trabalha com a apropriação de objetos, sempre com o objetivo de transfigurá-los a partir da evocação de seu potencial poético, sejaintervindo nesses objetos ou associando-os em instalações. Deve-se observar que grande parte dos materiais escolhidos pelo artista estão ligados à terra brasileira, uma opção que advém de sua postura política como ativista ambiental. Fonteles procura recolocar o homem em contato com a energia poética contida na natureza, estimulando a imaginação do observador com vistas a escapar de conceitos e usos convencionais associados aos objetos que utiliza. Como o próprio artista reconhece, essa postura inspira-se em mais de uma geração de artistas atuantes no século XX, que procuram inspiração na relação entre homem, natureza e universo. 1 FONTELES, Bené. Palavras e obras (1998 a 2004). São Paulo: Pinacoteca do Estado, 2004. 7 cria o de en onteles abarca instala es, esculturas e manifestos em profundo diálogo com questões ambientais, saberes populares e o desejo de fundir o “ser brasileiro” e o “ser universal”. Com projetos transdisciplinares que extrapolam as fronteiras da arte, autodenominando-se “artista”. gora: OcaTaperaTerreiro re ne tra os importantes de sua tra et ria, como o sincretismo simb lico e a cocria o do Pavilhão da Bienal. Experimento: Maluana / Maruana - proteção Na cultura indígena Wayana e Aparai tem um objeto de proteção o (maluana). É uma roda de madeira confeccionada para colocar no das casas. Figura 4: Roda da imaginação Fonte: VELTHEM, Lúcia Hussak van; VELTHEM, Iori Leonel van (Org.). Livro da arte gráfica Wayana e Aparai: Waiana anon imelikut pampila - Aparai zonony imenuru papen. Rio de Janeiro: Museu do Índio - Funai/Iepé, 2010. Disponível em: <http://www.institutoiepe.org.br/infoteca/livros/arte- grafica-wayana-aparai/>. Acesso em: 24/04/2015. Procedimento artístico A proposta será de criarmos rodas como as de proteção da cultura do povo indígena Wayana e Aparai. 8 A proposta será de criarmos os desenhos, com base da utilização de formas geométricas, simétricas e também com a memória visual e cultural do nosso mundo. Como suporte, utilizaremos uma embalagem de pizza e tinta guache. Arte ou artefato? Agência e significado nas artes indígenas Els Lagrou é professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia do IFCS/UFRJ e membro do Comitê de Gestão Cientifica do GDRI (Groupement de Recherche International). A autora Els Lagrou faz a reflexão que existe entre a arte conceitual com as produções indígenas. "Se fomos comparar a arte produzidas pelos indígenas com as obras conceituais dos artistas contemporâneos, encontramos muito mais semelhantes do que á primeira vista suspeitávamos". (GELL, 1996). Ela expressa em seu artigo que a arte indígena brasileira não tem a mesma noção de arte como nós, com nossa tradição entre arte e artefato, com o papel de inovação na produção como artista. A obra de arte, portanto, não serve somente para ser contemplada na pura beleza e harmonia das suas formas, ela age sobre as pessoas, produzindo reações cognitivas diversas. Lagrou apresenta que entre os Wayana, o peso do ‘modelo’ tem sentido cosmológico. Inovar é perigoso, porque o modo certo de se produzirem corpos e artefatos foram estabelecidos pelos demiurgos dos tempos de criação. O conservadorismo estilístico deste grupo de língua karib lembra o dos Wauja (autodenominação dos Waura, grupo arawak, Alto Xingu), produtores de máscaras rituais, no sentido de que ambos acreditam que a relação intrínseca entre o modelo e sua cópia torna a produção artesanal uma empreitada arriscada. "No caso wauja o ser parcialmente reproduzido no artefato pode se vingar se a confecção for artisticamente mal feita, enquanto entre os Wayana existe o risco da tradução do ser em artefato ser tão completa que ele ganhe agência e vida próprias" (VAN VELTHEM, 2003). Segundo (LAGROU, 2010), se olharmos para arte como um processo de construção de mundos – e não mais como um fenômeno a ser distinguido do artefato, ou como uma esfera. Ao fazer associada ao extraordinário, que, para manter sua aura de sacralidade, precisa ser separados do cotidiano - a relação cognitiva é alterada. 9 Considerações Finais Segundo a professora Els Lagrou a arte indígena e artistas contemporâneos têm mais semelhanças do imaginamos. O trabalho simétrico e geométrico dos indígenas “Wayana e parai” se relacionam muito com a obra “ gora: Oca Tapera Terreiro” do artista Bené Fonteles que foi exposta na 32° Bienal. Logo não devemos associar obras indígenas como artefato, e sim como obras de arte de um povo centenário que passa sua arte por geração á geração. 10 REFERENCIAS LAGROU, E. Arte ou artefato? Agência e significado nas artes indígenas. IN: Proa – Revista de Antropologia e Arte [on-line]. Ano 02, vol.01, n. 02, nov. 2010. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/proa/DebatesII/elslagrou.html> Acesso em: 15/06/2017. Povos Indígenas no Brasil - A cultura como mercadoria - Disponível em: < https://pib.socioambiental.org/pt/povo/wayana/1153> Acesso em: 16/06/2017. 32° Bieanal de São Paulo – Incerteza Viva – Disponível em <http://www.32bienal.org.br/pt/participants/o/2536> Acesso em: 18/06/2017.
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