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Tópico II Concepções de Infância PDF

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O conteúdo deste tópico foi retirado do artigo “Infância e adolescência social e culturalmente 
contextualizada: concepções de infância e adolescência, universalidade de direitos e o respeito às 
diversidades”, de Benedito Rodrigues dos Santos. 
 
O texto possui adaptações realizadas por Daniela de Macedo B.R.T. de Sousa, para a adequação 
do material à temática proposta. 
 
Introdução 
Este tópico é um chamamento para que profissionais envolvidos com crianças e 
adolescentes em processos judiciais reconheçam as especificidades da criança e do adolescente 
em relação ao adulto, a variabilidade das concepções de infância e adolescência através da 
história e entre as diferentes culturas e para a necessidade de uma prática social pautada no 
respeito às diversidades de infância no país. 
Uma distinção nos parece útil antes de prosseguir essa reflexão: a diferença entre infância 
e criança. Enquanto infância é um constructo social sobre as idades da vida, a criança é o 
sujeito empírico concreto que vivencia suas experiências na sociedade. 
Neste tópico o foco central é na infância como um artefato cultural social e historicamente 
variável. 
Por muitos séculos, o pensamento ocidental concebeu a infância como um dado natural 
universalmente existente em todas as sociedades e em todas as culturas. 
Foi somente a partir dos anos 1930 e, mais detidamente, a partir dos anos 1960, que 
pesquisadores concluíram que o sentimento de infância [moderna] foi descoberto por volta do 
século XVIII e que a adolescência é uma invenção do final do século XIX, mas que não existe em 
todas as sociedades e culturas. 
Contudo, hoje é possível falar da ocorrência de uma “globalização da infância” devido à 
disseminação massiva de culturas infanto-juvenis ocidentais modernas por intermédio, 
principalmente, dos meios de comunicação de massa. 
Embora hoje esta chamada “infância e adolescência” moderna tenha se transformado no 
“paradigma de infância e adolescência” que impacta as subjetividades de crianças e adolescentes, 
 
 
quase em escala planetária, esta deve ser apreendida nos seus contextos, sentidos e significados 
locais. 
 
A infância e adolescência moderna: uma construção histórico social. 
Teria existido alguma sociedade onde uma concepção de infância não tenha sido 
construída ou teria havido algum momento das sociedades ocidentais e/ou orientais no qual este 
conceito não tenha sido gestado? 
Dificilmente essas perguntas estariam sendo realizadas não fosse pela polêmica tese do 
historiador francês Philippe Ariès, enunciada no livro - hoje um clássico - a História Social da 
Infância e da Família, publicado nos inícios dos 1960, sobre a ausência de um conceito de 
infância nas sociedades medievais e sua lenta construção na modernidade. 
 
Na sociedade medieval, que tomamos como ponto de partida, o sentimento da 
infância não existia - o que não quer dizer que as crianças fossem negligenciadas, 
abandonadas ou desprezadas. O sentimento de infância não significa o mesmo que 
afeição pelas crianças: corresponde à consciência da particularidade infantil, essa 
particularidade que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo. Essa 
consciência não existia. Por essa razão, assim que a criança tinha condições de 
viver sem a solicitude constante de sua mãe ou de sua ama, ela ingressava na 
sociedade dos adultos e não se distinguia mais destes [...] (ARIÈS, 1960, p. 156). 
 
Para Ariès, a criança muito pequenina (abaixo dos sete anos de idade), ainda muito frágil 
para se misturar à vida dos adultos, “não contava”. 
Parte dessa pouca importância era atribuída aos altos índices de mortalidade infantil, numa 
época em que a sobrevivência era pouco provável. 
Assim que a criança ultrapassava esse período de risco e a fase de maior solicitude da 
mãe, "ela se confundia com os adultos”. 
A dimensão temporal da infância estava relacionada ao tempo em que ela dependia 
fisicamente dos cuidados dos adultos - "enquanto o filhote de homem não conseguia abastar-se". 
De criancinha pequena "ela se transformava imediatamente em homem jovem, sem passar 
pelas etapas da juventude [...]"(ARIÈS, 1960, p. 10). 
Daí por diante, sua socialização e a transmissão dos valores e dos conhecimentos a ela, 
de modo mais geral, [...] não eram, portanto, nem asseguradas nem controladas pela família. 
A criança se afastava logo de seus pais e pode-se dizer que durante séculos a educação 
foi garantida pela aprendizagem graças à convivência da criança ou do jovem com os adultos. 
 
 
A criança aprendia as coisas que devia saber ajudando os adultos a fazê-las (ARIÈS, 
1960, p. 157). 
Esse sistema era pautado pela reciprocidade e solidariedade social. 
Para Ariès, o sentimento de infância que temos hoje foi uma lenta construção social 
ocorrida ente os séculos XIII e XIX. 
Como todo trabalho pioneiro, as teses de Ariès despertaram volumosas análises, severas 
críticas e apaixonadas defesas por essas mais de quatro décadas que se sucederam à publicação 
do seu livro. 
A conclusão desse reexame pode ser sintetizada nas palavras do historiador Adrian Wilson 
(1974, p. 142-143), “What that society ‘lacked’ was our awareness [...]” 
[O que aquela sociedade não possuía era a nossa consciência da natureza 
particular da infância]. 
 
Essa conclusão de Wilson foi bastante referendada por outros historiadores como Pollock 
(1983), Gélis (1991), que possibilitaram responder às questões anteriormente apresentadas na 
negativa: tão longe se pode retroagir na história da humanidade, estudiosos encontraram 
evidências que demonstram a especificidade da condição infantil em relação à idade adulta, muito 
embora o tempo de duração da infância, formas de socialização e papéis atribuídos viessem 
variando de cultura para cultura, de momento histórico, para momento histórico. 
Tivesse a pesquisa de Ariès sido informada por estudos antropológicos ele teria 
incorporado no seu trabalho, além da variabilidade histórica, a “descoberta” da variabilidade 
cultural das noções de infância e adolescência. 
 
Traços característicos da concepção moderna de infância e adolescência. 
As sociedades ocidentais contemporâneas possuem uma consciência da natureza 
particular da infância e adolescência. 
As crianças têm o seu “próprio” mundo distinto dos adultos, assim como, instituições, bens 
e serviços destinados exclusivamente a elas, nas áreas da: Psicologia, Medicina, Direito, 
Literatura, Cinema, Mídia (programas de televisão), Entretenimentos (Jogos e Brincadeiras), 
Indústria de confecção, etc. 
Mas nem sempre foi assim. Nas sociedades passadas, a criança partilhava trabalho, 
festas, jogos - enfim, a vida com os adultos. A idade não era critério escolar essencial, e crianças 
e adultos estudavam na mesma classe na escola. Os colegiais geriam suas escolas e elegiam o 
seu reitor, e um adolescente de dezoito anos já podia ser oficial do Exército (Ariès,1986; Charlot, 
1986). 
Essas concepções modernas de infância e adolescência são relativamente recentes na 
história da humanidade. 
 
 
Elas nascem com um modo diferente de estruturar e dar significação às passagens da 
vida, no bojo das diversas mudanças ocorridas no processo de modernização da sociedade com 
passagem do padrão agrário/rural para industrial/urbano. 
Com o advento do capitalismo a modernização não foi somente econômica e tecnológica, 
mas também sociológica e antropológica - mudou o ambiente físico, o tipo de vida em 
comunidade, a cosmovisão, o modo de organizar a vida diária, a qualidade emocional das famílias 
e redefiniu os espaços públicos. 
Essas mudanças geraram uma nova maneira de ver e educar as crianças. 
A infância e a adolescência,como são concebidas na modernidade, são o tempo da vida 
dedicado à formação e à preparação para a fase adulta. 
Os espaços de socialização das crianças são a família, a escola e os grupos de pares 
(colegas, companheiros, amigos). 
 
A complexidade e a especialização da vida moderna nas sociedades modernas impactam a 
socialização das crianças de três maneiras: 
 
1) A separação das esferas sociais de crianças e adultos. 
Ocorre uma apartação entre as esferas sociais de adultos e crianças, embora continue 
havendo conexões e mediações entre esses dois mundos. Nas sociedades do passado a infância 
era vista como uma etapa ‘natural’ de uma progressão que leva a criança a se tornar adulta. A 
noção de infância se vinculava à primeira fase da vida da pessoa, a que atualmente designamos 
‘criancinhas’ ou ‘bebês’ e, a partir dos seis ou sete anos ela começava a participar da esfera social 
dos adultos (Ariès, 1986). 
 
2) Prolongamento do tempo de infância. 
O tempo de preparação das crianças para entrada na vida adulta é prolongado e o 
conceito de adolescência é ‘inventado’, no período de vida intermediário entre a infância e a 
juventude. Os limites etários anteriormente entre 5 e 7 anos foram estendidos até os dezoito ou 
dezenove anos, a partir de quando se passa para a juventude (Ariès, 1986). 
 
3) A segmentação dos espaços de socialização. 
Nas sociedades da era Medieval as crianças eram educadas na família até os 6 ou 7 anos 
depois disso eram colocadas numa espécie de ‘sistema de aprendizagem’ - elas eram enviadas à 
casa de vizinhos, amigos e parentes para serem educadas tanto por intermédio da convivência 
quanto do aprendizado de um ofício. Elas aprendiam pela observação direta ‘com’ os adultos e 
não apenas por instruções verbais ou informações conceituais, como em nossas sociedades 
 
 
modernas. Esse sistema era pautado pela reciprocidade e solidariedade social, de modo que os 
filhos de uma família sempre eram educados por outros familiares e pela comunidade. 
 
O lócus da socialização deixa os espaços da família e da comunidade e surgem como 
novos espaços de socialização da criança e do adolescente como a escola e o grupo de pares. 
A noção de infância se vincula de tal maneira à condição de estudante que alguns autores 
chegam a afirmar que foi a escola que construiu a visão moderna de infância. 
Assim o tempo de infância se vincula ao tempo de estudar e não de trabalhar. A 
preparação para vida adulta não se fará mais como no sistema de aprendizagem antigo e sim 
através da escola. A escola passa a assumir um lugar tão importante no desenvolvimento 
cognitivo das crianças que estudar e trabalhar são atividades de difícil conciliação sem prejuízos 
mútuos. 
A ausência de ritos institucionalizados e a descontinuidade entre a vida de criança e a de 
adulto. 
Traçando um paralelo entre a concepção moderna de infância das sociedades industriais e 
das chamadas sociedades primitivas, pode-se dizer que nestas últimas, a infância tem uma 
duração mais curta, e a entrada no mundo dos adultos se faz mais cedo e de maneira fortemente 
ritualizada e institucionalizada. 
Crianças acima de 4,5 anos são chamadas a tomar parte da divisão social do trabalho da 
tribo, desempenhando funções que são compatíveis com suas habilidades e capacidades físico-
intelectuais. Os comportamentos e hábitos ensinados às crianças guardam continuidade com os 
que se lhes serão requeridos quando adultas, e as fronteiras entre trabalho e brincadeiras não são 
demarcados de maneira tão drástica quanto nas sociedades industriais. Os modelos de 
identificação são os da própria família, e as opções para o encaminhamento da vida são poucas e 
marcadamente simples. 
Já nas sociedades industriais a falta de ritos de passagens claros e formalizados, que 
demarquem claramente quando termina a infância e começa a vida adulta, traz dois tipos de 
complicações. Em primeiro lugar, deixa a fixação dos limites etários à mercê das conveniências 
dos diversos grupos sociais, o que gera múltiplas determinações, todas com pretensas intenções 
universalistas. E o segundo, é um problema da própria construção da identidade, sobretudo do 
adolescente, que passa a viver um período de transitoriedade no qual ele não é mais uma criança, 
porém não se transformou ainda num adulto (“rapaz”). 
Esse prolongamento da infância como uma fase destinada à formação e à preparação para 
a existência adulta, transforma a vida da criança e do adolescente, particularmente a do 
adolescente, em uma espécie de tempo de espera. 
Por sua vez, a vida moderna oferece também uma multidiversidade de modelos de 
identificação e um leque variado de opções para o indivíduo encaminhar sua vida adulta. 
O compasso de espera, o conjunto de decisões a tomar sobre sua vida pessoal e afetiva, a 
falta de respostas às suas indagações internas, não respondidas nos dois principais espaços de 
 
 
socialização, a família e a escola, levam os jovens a formar os grupos de pares, nos quais eles 
buscam a confirmação de uma identidade social. 
Assim, a adolescência passa a ser um grupo etário, com valores e cultura próprios. 
Já no século passado a adolescência assumia a condição de transitoriedade ou de 
suspensão social e descrito por alguns autores como a época da ambiguidade, ou como período 
de turbulência e crise emocional. 
Nas culturas ocidentais contemporâneas é recorrente a visão da adolescência como uma 
fase problema. 
A partir dos anos 50, devido aos problemas de socialização de parcelas da infância e 
adolescência, elas passam a ser vistas como uma ameaça à ordem social, sejam como 
marginais/delinquentes ou como renovadores e revolucionários. 
Já mais para o final do século XX esse movimento de desconstrução da adolescência 
como uma fase problema contrapôs essa visão difundindo a perspectiva de adolescência como 
fase de potencialidades.

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