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História da Espanha - LIVRO

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ESPANHA 
POLÍTICA E CULTURA 
 
Chanceler
Dom Dadeus Grings
Reitor
Joaquim Clotet
Vice-Reitor
Evilázio Teixeira
Conselho Editorial
Ana Maria Lisboa de Mello
Elaine Turk Faria
Érico João Hammes
Gilberto Keller de Andrade
Helenita Rosa Franco
Jane Rita Caetano da Silveira
Jerônimo Carlos Santos Braga
Jorge Campos da Costa
Jorge Luis Nicolas Audy – Presidente
José Antônio Poli de Figueiredo
Jurandir Malerba
Lauro Kopper Filho
Luciano Klöckner
Maria Lúcia Tiellet Nunes
Marília Costa Morosini
Marlise Araújo dos Santos
Renato Tetelbom Stein
René Ernaini Gertz
Ruth Maria Chittó Gauer
EDIPUCRS
Jerônimo Carlos Santos Braga – Diretor
Jorge Campos da Costa – Editor-chefe
 
Janete Abrão 
(Organizadora) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ESPANHA 
POLÍTICA E CULTURA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre 
2010 
© EDIPUCRS, 2010
CAPA Paloma Férez Pastor
REVISÃO DE TEXTO Rafael Saraiva
DIAGRAMAÇÃO Janete Abrão
E77 Espanha : política e cultura [recurso eletrônico] / org. 
 Janete Abrão. – Dados eletrônicos – Porto Alegre : 
 EDIPUCRS, 2010.
 96 p.
 Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader
 Modo de Acesso: World Wide Web: 
 <http://www.pucrs.br/edipucrs/>
 ISBN 978-85-7430-998-9 (on-line)
 1. Espanha – História. 2. História Contemporânea.
 3. Espanha – História Política. 4. Cultura – Espanha. 
 I. Abrão, Janete. 
CDD 946.08
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
Apresentação ..................................................................................................................... 6
 
A Espanha sob o regime franquista: do isolamento à aceitação internacional (1939 – 
1953) .................................................................................................................................. 8
 Valentina Terescova Veleda 
 
O Dois de Maio, a “Guerra de Independência” e a Memória manipulada durante a 
Guerra Civil e o Franquismo ............................................................................................. 18
 Janete Abrão 
 
A Imprensa e a Ditadura Franquista ................................................................................ 30
 Sara Getino Garasa 
 
Operação propaganda! O cinema espanhol: do Franquismo à Transição Democrática 
(1939-1978) ..................................................................................................................... 41
 Daniela Ribeiro Pereira 
 
O Labirinto do Fauno: o embate político-ideológico entre duas concepções de 
Espanha ........................................................................................................................... 66
 Bruno Kloss Hypólito 
 
A Música na Espanha Franquista .................................................................................... 79
 Marcus Antonio Wittmann 
 
 
 
APRESENTAÇÃO 
Nas páginas seguintes, os leitores poderão apreciar o resultado das pesquisas 
desenvolvidas por alunos do Curso de Graduação e Pós-Graduação em História da 
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da PUCRS, orientados pela Prof.ª Dr. Janete 
Abrão, sobre temas que se constituem em lacuna historiográfica em âmbito nacional: a 
fratricida Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e, principalmente, a Ditadura Franquista 
(1939-1975). O objetivo da publicação é o de promover debates, divulgar e incentivar 
pesquisas relativas a esses temas, além de buscar compreender a História 
Contemporânea da Espanha, no que se refere, tanto à política e às relações 
internacionais como à sociedade e à cultura. 
Nesse sentido, o presente volume reúne as contribuições de vários autores: 
Valentina Terescova Veleda que, com o capítulo intitulado: “A Espanha sob o regime 
franquista: do isolamento à aceitação internacional (1939-1953)” analisa as relações 
internacionais do regime durante a II Guerra Mundial e os anos iniciais da Guerra Fria. 
Janete Abrão, a organizadora do volume, discorre sobre os abusos da memória 
oficial em seu capítulo: “O Dois de Maio, a ‘Guerra da Independência’ e a memória 
manipulada durante a Guerra Civil e o Franquismo”. 
No plano cultural, Sara Getino Garasa analisa, em “A imprensa e a Ditadura 
Franquista”, a trajetória histórica da imprensa espanhola durante os anos do regime, 
com ênfase nas duas Leis de Imprensa (de 1948 e a de 1966) decretadas durante o 
franquismo. 
Daniela Pereira Ribeiro, em “Operação propaganda! O cinema espanhol: do 
Franquismo à Transição Democrática (1939-1978)”, explora as dinâmicas da ditadura 
que afetaram diretamente a produção cinematográfica espanhola no período em 
análise, assim como evidencia as contradições do regime através dos órgãos 
governamentais que controlavam a propaganda na época. 
Ainda se tratando de cinema, Bruno Kloss Hypólito analisa a partir do filme “O 
Labirinto do Fauno”, dirigido pelo cineasta mexicano Guillermo Del Toro, as 
concepções antagônicas sobre o Estado espanhol entre os diferentes grupos 
envolvidos durante a Guerra Civil, representados, no filme, em seus diferentes 
personagens e situações. 
 
 
7 
Por fim, Marcus Antonio S. Wittmann, no capítulo “A Música na Espanha 
Franquista”, traça um perfil das canções produzidas entre 1939 e 1975, evidenciando 
que as mesmas serviram, tanto para a evasão da sociedade e sua adesão ao regime 
como forma de protesto contra a ditadura. 
Esperando ter cumprido com a tarefa de publicar algumas pesquisas, 
atualmente em curso sobre a História da Espanha, desejo a todos uma ótima leitura. 
 
 
 
 
A Espanha sob o regime franquista: do isolamento à aceitação 
internacional (1939 – 1953) 
Valentina Terescova Veleda 
Acadêmica do Curso de História – PUCRS, Brasil. 
 
 
Guerra Civil Espanhola começou após o golpe perpetrado pelos militares, em 18 
de julho de 1936, contra o governo republicano legitimamente eleito pelo povo, 
estendendo-se por três anos e apresentando um saldo de mais de 400 mil mortos. 
Como acontece com toda guerra civil, foi uma guerra fratricida, que colocou em lados 
opostos pessoas de uma mesma família com pensamentos políticos e ideológicos 
dicotômicos, criando uma animosidade que ultrapassou o tempo de guerra e adentrou 
os anos posteriores. Segundo Eric Hobsbawm, “[...] a Guerra Civil Espanhola antecipou 
e moldou as forças que iriam, poucos anos depois da vitória de Franco, destruir o 
fascismo”.1
 
 O historiador argumenta que a Guerra Civil Espanhola prenunciou a aliança 
de frentes nacionais que ia de conservadores patriotas a revolucionários sociais, para a 
derrota do inimigo nacional e simultaneamente para a regeneração social. Manuel 
Tuñon de Lara, por sua vez, descreve como foi o dia imediatamente posterior ao fim da 
guerra, na nota preliminar de seu livro “España Bajo La Dictadura Franquista”: 
Milhões de espanhóis que haviam lutado nas fileiras republicanas ou que 
haviam se enquadrado sem paixão no exército de Franco, todos cansados de 
mais de três anos de guerra, assim como suas famílias, [...] terminaram por 
abraçar uma esperança ingênua e pensar, ‘depois de tudo, talvez não seja 
tão mal como tinham pintado’. E acreditavam no lema, ‘nenhum lugar sem 
lume, nenhum espanhol sem pão’, palavras do Caudillo que podiam ser lidas 
em edifícios, paredes nas ruas e imprensa diária. 2
 
 
O regozijo popular logo deu lugar às prisões e fuzilamentos sumários dos 
“inimigos internos”, termo utilizado por Francisco Franco, em seu discurso de 3 de 
abril de 1939, no qual conclama: “Espanhóis, alerta! Espanha segue em guerra contra 
 
1 HOBSBAWM, Eric. A Era dos Extremos – O breve século XX (1914- 1991). São Paulo: Companhia das 
Letras, 1994, p. 162. 
2 Millones de españoles que se habíanbatido en las filas republicanas lo que lo habían hecho sin pasión 
encuadrados en El ejército de Franco, cansados de casi tres años de guerra, así como sus familias [...], 
habían terminado por abrazar una esperanza ingenua y pensar ‘después de todo, tal vez no sea esto tan 
malo como lo han pintado. Y creían en el lema, ‘Ni un hogar sin lumbre, ni uno español sin pan’, palabras 
del Caudillo que podían leerse en edificios, paredes callejeras y prensa cotidiana. Cf. TUÑON DE LARA, 
Manuel. España Bajo La Dictadura Franquista (1939 – 1975). Barcelona, Editora Labor: 1980, p. 13. 
A 
 
 
9 
todo inimigo do interior e do exterior”. A propaganda utilizada de forma unilateral 
pelos vencedores contra los rojos∗∗
Pode-se afirmar que foi um período aproveitado por aqueles que faziam parte 
do lado vencedor para conseguirem mais facilmente acesso a cargos públicos e 
diversas sinecuras. O exílio de intelectuais, de técnicos e de mão de obra qualificada, 
resultou da mudança do pessoal da Administração Governamental e trouxe à Madri 
núcleos populacionais originários das províncias que haviam sido “zona franquista” 
durante a guerra, bem como de outras zonas empobrecidas da Espanha. O mesmo 
fenômeno também pôde ser observado na formação do aparato burocrático do 
Movimento “nacionalista”, em seus diferentes setores, o que criou um segmento 
específico da classe média, muito ligado ao regime. 
 revestiu-se de atitudes revanchistas, que incluíam a 
delação de qualquer desafeto como republicano; filhos de rojos não podiam estudar; 
as mulheres de los rojos tinham os cabelos raspados nas praças dos pueblos (situação 
semelhante à observada na França após a derrota nazista). 
Por sua vez, a base do regime franquista foi o “Nacional-Catolicismo” e o 
anticomunismo, criando um imaginário místico de uma “cruzada” dirigida pelo General 
Franco, que faria com que a Espanha resgatasse seu passado imperial de glória e 
poder, restituindo-a ao seu lugar de direito dentro da Europa. Os nomes de Isabel e 
Fernando, os reis católicos, foram bastante lembrados como os promotores dessa “era 
de ouro” do país, primeiramente com a expulsão dos muçulmanos e com as 
posteriores descobertas na América. O discurso dos apologistas do Caudillo vinculava 
Franco ao retorno desse período de prosperidade ou “idade de ouro”. 
Outro fato histórico vinculado ao franquismo foi o “Dois de Maio de 1808”, 
momento em que os espanhóis, tendo seu território invadido pelas forças de Napoleão 
e com o rei e a família real feito reféns em Bayona, se rebelaram contra o inimigo 
francês. Esse episódio foi utilizado pela propaganda franquista para criar uma ligação 
entre o golpe de 18 de julho, com a expulsão do poder dos inimigos espanhóis, 
representantes da derrocada da Espanha, os republicanos, e a tomada de poder pelos 
“verdadeiros espanhóis”, os franquistas. 
 
∗∗ A autora considerou que palavras com sentido não traduzível para a língua portuguesa e que 
perderiam seu sentido original deveriam ser escritas no idioma original. É o caso de rojos, pueblos, entre 
outras palavras presentes no texto. 
 
 
10 
Pode-se acrescentar que a Igreja Católica assumiu uma função legitimadora 
dentro do regime, desde o seu princípio. O papa Pio XII, no próprio dia 1º de abril de 
1939, remeteu um telegrama a Franco, enviando sua benção apostólica. Após duas 
semanas da emissão do referido telegrama, o Sumo Pontífice dirigiu à nação espanhola 
uma mensagem, na qual ele afirmava que: 
 
Os desígnios da Providência, amadíssimos filhos, voltaram a se 
manifestar mais uma vez sobre a heróica Espanha. A nação eleita por 
Deus como principal instrumento da evangelização do novo mundo e 
como baluarte inexpugnável da fé católica, acaba de dar aos 
prosélitos do ateísmo materialista de nosso século a prova mais 
excelsa de que acima de tudo estão os valores eternos da religião e 
do espírito. A propaganda tenaz e os esforços constantes dos 
inimigos de Jesus Cristo parece que, quiseram fazer, na Espanha, um 
experimento supremo das forças dissolventes que possuem a sua 
disposição espalhadas pelo mundo, e embora seja verdade que o 
Onipotente não permitiu por agora que conseguissem seu intento, 
tolerou ao menos alguns de seus terríveis efeitos, para que o mundo 
veja como a perseguição religiosa minando as bases da justiça e da 
caridade, que são o amor de Deus e o respeito a sua santa lei, pode 
arrastar a sociedade moderna aos abismos insuspeitos de uma 
mesma destruição e apaixonada discórdia.3
 
 
A participação da Igreja Católica foi intensa na censura, controle educativo, 
repressão moral, causando uma confusão entre o âmbito religioso e o civil. Ela 
promoveu a anulação dos matrimônios civis realizados durante o período republicano 
e de Guerra Civil, anulando inclusive suas inscrições no Registro civil; anulou a 
secularização dos cemitérios; restabeleceu a remuneração por haveres eclesiásticos e 
a Igreja ficou livre de pagamentos de impostos territoriais; criou assessorias religiosas 
em organizações falangistas, ministérios, centros de estudo, etc.4
 
3 Los designios de la Providencia, amadísimos hijos, se han vuelvo a manifestar una vez más sobre la 
heroica España. La nación elegida por Dios como principal instrumento da evangelización del nuevo 
mundo y como baluarte inexpugnable de la fe católica, acaba de dar a los prosélitos del ateísmo 
materialista de nuestro siglo la prueba más excelsa de que por encima de todo están los valores eternos 
de la religión y del espíritu. La propaganda tenaz e los esfuerzos constantes de los enemigos de Jesús 
Cristo parece que han querido hacer en España un experimento supremo de las fuerzas disolventes que 
tienen a su disposición repartidas por todo el mundo, y aunque es verdad que el Omnipresente no ha 
permitido por ahora que lograran su intento, ha tolerado al menos algunos de sus terribles efectos, para 
que el mundo viera cómo la persecución religiosa, minando las bases de la justicia y de la caridad, que 
son el amor de Dios y el respeto a su santa ley, puede arrastrar a la sociedad moderna a los abismos no 
sospechados de una misma destrucción y apasionada discordia. Tradução sob responsabilidade da 
autora. 
 
4 TUÑON DE LARA. Op. Cit., p. 16 -17. 
 
 
11 
Raymond Carr definiu o Estado espanhol franquista como “[...] unipartidarista, 
totalitário e imperial [...]”.5
No entanto, a política adotada por Franco, na Espanha, após 1939 foi, conforme 
Raymond Carr, “[...] uma estrutura bizantina de clãs políticos [...]”.
 Franco, e seus correligionários, pregavam um Estado 
espanhol baseado em uma “democracia orgânica”, oposta à “democracia inorgânica”, 
baseada no sufrágio universal, no sistema de partidos e na responsabilidade 
parlamentar dos governos. A “democracia orgânica”, segundo seus apologistas, era 
uma verdadeira democracia, em que se viam representados os interesses da nação, e 
não os interesses egoístas de eleitores individuais. 
6
Em termos econômicos, a indústria espanhola do fim da Guerra Civil foi, 
segundo Tuñon de Lara, “protoindustrial”. O grande número de baixas pessoais, por 
morte, exílio ou desaparecimento, provocou uma queda demográfica que se refletiu 
na falta de mão de obra nas indústrias e em um êxodo rural em direção às cidades de 
uma população de “ex-combatentes”, que assumiram cargos de segunda categoria, 
como porteiros, ordenanças, escriturários, etc. 
 Mesmo que 
parecesse um bloco monolítico e coeso aos que assistiam o regime do exterior, o 
governo era formado por clãs ou famílias, que disputavam a preferência do caudillo e 
os cargos de maior relevo e importância na estruturagovernamental. Essas famílias 
compunham-se de elementos do Exército, de grupos políticos que representavam a 
Igreja Católica, do Movimento da Falange (fascista), dos monárquicos franquistas, dos 
tecnocratas e dos funcionários do Estado. 
Em 1940, ocorreu a organização dos “sindicatos verticais”, com vistas a 
diminuir disputas de classe entre empregados e patrões, controlados pela Falange. A 
economia, nos anos abordados pelo presente texto, caracterizou-se pela adoção da 
autarquia, na qual houve uma forte proteção aos produtos internos e o comércio 
exterior foi dificultado através de mecanismos distintos. Cabe afirmar que essa 
tendência protecionista já fora utilizada durante o período da Restauração Bourbônica, 
no século XIX, quando ocorreu uma anulação progressiva do propósito de livre 
comércio. Apesar disso, o modelo econômico instaurado, após a Guerra Civil, supôs 
uma mudança qualitativa importante, pois, após 1939, não se tratava apenas de 
 
5 CARR, Raymond. España 1808 – 1975. Barcelona: Ariel, 2003, p. 667. 
6 CARR, Raymond. Op. cit., p. 665. 
 
 
12 
proteger a produção nacional, mas sim de colocar em marcha uma política econômica 
global, através da qual se pretendia alcançar a autossuficiência econômica frente ao 
Exterior e onde se refletiu com nitidez a influência do nacional-socialismo alemão e, 
sobretudo, do fascismo italiano. Separada do mundo exterior, a Espanha deveria ser 
capaz de produzir tudo dentro de suas fronteiras, sem pensar nos custos envolvidos 
nessa ação. 
A agricultura, na década de 40, era a atividade mais enaltecida pelo regime, 
devido, em parte, ao problema de alimentação enfrentado pelos espanhóis ocasionado 
por períodos bastante acentuados de seca e, em parte, porque o regime considerava o 
camponês como a verdadeira corporificação dos valores da “Cruzada Nacional”, em 
oposição ao trabalhador urbano, corrompido pelo marxismo. 
Nessa primeira fase do regime, situada entre 1939 e 1945, e marcada pela 
Segunda Guerra Mundial, os aliados de Franco na Guerra Civil, Hitler e Mussolini, 
iniciaram um conflito armado, primeiramente circunscrito à Europa, mas que, a partir 
de 1941, adquiriu características mundiais. Francisco Franco foi obrigado a adequar 
sua política – tanto interior como exterior – às mudanças no equilíbrio de forças 
Europeias. A Espanha encontrava-se alquebrada econômica e moralmente após três 
anos de guerra e Franco preferiu uma política de apoio ideológico ao Eixo, mas sem 
uma participação bélica no conflito, optando pela “neutralidade”. 
No dia imediato à ocupação de Paris pelas tropas nazistas, em 16 de junho de 
1940, o “Diário Informaciones”, dirigido por Victor de La Sema, publicou: “Saudamos a 
queda de Paris como um golpe mortal dirigido ao regime democrático”.7
 
7 “Saludamos la caída de Paris como un golpe mortal asestado al régimen democrático”. Tradução sob 
responsabilidade da autora. 
 O fato é que 
Franco, após a tomada de Paris, mostrava-se favorável à participação espanhola na 
guerra e, inclusive, ofereceu tropas a Hitler, mas, em troca, pediu apoio bélico e 
estratégico para suas pretensões territoriais no Norte da África. Hitler declinou do 
oferecimento, delimitando e restringindo, nesse momento, suas frentes de guerra em 
duas direções: o Canal da Mancha e o Leste, em direção à União Soviética. Hitler 
imaginava uma capitulação rápida da Grã-Bretanha após a queda da França, e não teve 
interesse na oferta de Franco nesse momento. Somente dois meses depois pensou em 
 
 
13 
um possível auxílio do ditador espanhol, quando lhe pareceu bastante claro que a Grã-
Bretanha não iria capitular frente ao exército alemão. 
Em 1941, a operação alemã denominada “Barbarossa” invadiu a União 
Soviética e o exército alemão rapidamente se aproximou das principais cidades 
soviéticas, inclusive da capital, Moscou. Diante das vitórias alemãs, o discurso 
franquista sofreu uma mudança: utilizando novamente o anticomunismo como 
justificativa plausível, Franco adotou uma postura de “não beligerância”, mas enviou 
soldados espanhóis, a Divisão Azul, para a frente soviética, como apoio ao exército de 
Hitler. Logo ao chegar a Berlim essa tropa jurou fidelidade não a Franco, mas a Hitler. 
Esse contingente de soldados fez parte da frente de Leningrado, participando no cerco 
à cidade, suportando mais de 900 dias de um clima verdadeiramente inadequado aos 
espanhóis, retirando-se em outubro de 1943 do país, antecipando a derrota e 
consequente retirada do exército nazista da União Soviética. 
Até 1943 a “prudência” de Franco, encarada por seus apologistas como a 
qualidade que eles consideravam o dom supremo de sua condição de estadista 
providencial, entrou em conflito com suas convicções, impedindo um apoio explícito a 
favor do Eixo. Incapaz de adaptar-se à vitória dos Aliados, Franco acreditou que os 
vencedores dariam apoio ativo à oposição para acabar com um ditador “fascista”. A 
imprensa espanhola, determinada pela política oficial, louvava cada vitória alemã, 
enquanto omitia, sempre que possível, as derrotas nazistas para os exércitos aliados, e 
apoiava abertamente os aliados da Guerra Civil, além de profetizar insistentemente 
sobre a derrota das democracias degeneradas nas mãos de uma ordem totalitária.8
Esse apoio, mais ideológico do que militar de Franco aos regimes fascistas, 
acarretou à Espanha um período de isolamento internacional, marcado pela sua 
ausência com relação ao Plano Marshall e pela sua falta de representação na 
Organização das Nações Unidas (ONU). 
 
O Plano Marshall (1948) foi um desdobramento da chamada “Doutrina 
Truman”, propagada pelo presidente estadunidense Harry Truman, e lançado em 
junho de 1947. Baseava-se em um programa de ajuda econômica aos países 
diretamente envolvidos na Segunda Guerra, investindo maçiçamente na Europa 
Ocidental, com o objetivo de diminuir a influência soviética no pós-guerra, 
 
8 CARR, Raymond. Op. cit.,p. 677. 
 
 
14 
assegurando sua hegemonia na região, bem como reestruturar a economia europeia. 
Os investimentos incluíam matérias-primas, produtos e capital, na forma de créditos e 
doações. Em contrapartida o mercado europeu evitaria impor qualquer restrição às 
indústrias norte-americanas. Entre 1948 e 1952, o Plano Marshall forneceu US$ 14 
bilhões para a reconstrução europeia. 
Por outro lado, a ONU, criada em 24 de outubro de 1945, com a representação 
de 51 países, como sucessora da Liga das Nações, foi formalmente elaborada em 
Moscou, na conferência dos países aliados, em 1943. O então presidente dos Estados 
Unidos, Franklin Roosevelt, sugeriu o nome de “Nações Unidas”, baseado em 
conversas preliminares com o primeiro-ministro inglês Winston Churchill.9
A Espanha desejava fazer parte dessa nova conjuntura mundial. Precisava do 
auxílio proporcionado pelo Plano Marshall e a ONU daria respaldo a um regime ainda 
não aceito pela comunidade internacional como legítimo. Franco tentou uma 
aproximação com Churchill, na expectativa da Espanha ser convidada a intervir numa 
futura organização mundial. Nem mesmo a mudança de governo, ocorrida em 1945, fez 
com que houvesse uma resposta positiva às aspirações franquistas. A ONU condenou o 
regime de Franco, aconselhando a retirada de embaixadores do país, em 1946. 
 
Somente em 1955 a Espanha tornou-se parte da ONU. Já a aproximação com os 
Estados Unidos aconteceu antes, em 1953. Esses acontecimentos foram possibilitados 
por pequenas “aberturas” proporcionadas pelo regime. A partir de 1946, ocorreu umamudança de estratégia da ditadura: ao fim da Segunda Guerra, Franco percebeu que 
nem a Inglaterra nem os Estados Unidos desejavam uma mudança brusca na Península 
Ibérica, ou seja, Salazar, em Portugal e ele próprio, na Espanha, representavam 
possíveis aliados aos dois países e a ideologia que ambos representavam. Os meios 
idealizados por Franco para alcançar a simpatia e a proteção dos dois países, e as 
consequentes vantagens dessa aliança, incluíam a estabilização da institucionalização 
governamental, inclusive através de uma “aproximação” com a monarquia exilada. Era 
preciso, também, que o “nacional-sindicalismo” fosse esquecido, de modo que essas 
pequenas alterações formais fizessem com que o regime fosse apresentável frente às 
potências ocidentais. 
 
9 CHURCHILL, Winston S. Memórias da Segunda Guerra Mundial. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 
1998, p. 592, v. 2. 
 
 
15 
Nesse mesmo ano de 1946, ocorreu uma série de acontecimentos, que criou 
uma situação preocupante para Franco e para sua equipe, e que resultariam em 
mudanças: a condenação pela ONU do regime, a existência do governo Giral no exílio e 
o auge da guerrilha. Todavia, o rápido desenrolar da Guerra Fria, com a consequente 
polarização em dois blocos, as divisões internas da oposição e uma intensificação dos 
mecanismos de repressão, provocaram um reforço das estruturas da ditadura, que 
começavam a soçobrar. A monarquia exilada era outro problema para Franco. A 
confederação monárquica estruturou-se ainda em 1946 e, Don Juan de Bourbon, saiu 
da França em direção a Portugal, onde permaneceu no exílio, articulando a 
restauração da monarquia bourbônica na Espanha. 
Em 1947, teve início uma propaganda laudatória do regime, com slogans que 
promoviam um clima de medo ao comunismo, relembrando sempre os horrores rojos, 
além de exaltar as vantagens proporcionadas por Franco aos comerciantes, 
proprietários, católicos, mulheres, entre outros. No mesmo ano, Franco outorgou a Lei 
de Sucessão, criando o Conselho do Reino e o Conselho da Coroa, e regulando o 
mecanismo de sucessão que, em definitivo, dependia inteiramente de Franco, que 
podia, inclusive, retificar o nome de seu sucessor designado até seu último dia de vida. 
Assim, Franco garantiria uma transição para a monarquia, mas em um futuro incerto, 
podendo inclusive destituir aquele a quem designaria como herdeiro. Em agosto de 
1948 ocorreu um encontro entre Don Juan, herdeiro legítimo do trono espanhol, e 
Franco, a bordo do iate “Azor”, de propriedade deste último. O assunto discutido entre 
os dois foi a sucessão pretendida pelos monarquistas e a possível designação de Don 
Juan Carlos como herdeiro de Franco. O encontro não teve uma definição nesse sentido 
naquele momento, mas, em novembro de 1948, o futuro rei Juan Carlos retornou para 
a Espanha para fazer seus estudos em seu próprio país, sob a tutela de Franco. 
Na década de 50, a política espanhola sofreu mudanças, ainda que não 
essenciais: as econômicas, com a mudança da burguesia agrária pela burguesia 
comercial e financeira como bloco dominante; as sociais, um crescimento irregular da 
população, o êxodo rural em direção às cidades adquiriu um caráter massivo e a 
diminuição demográfica ocorrida em áreas inteiras, como Castilla, Aragón, Galícia 
interior, entre outras. Ocorreu um abismo entre os salários reais e a condição de vida da 
população, o que ocasionou greves em algumas cidades, como Bilbao, no País Basco. 
 
 
16 
Em 1953, foi firmado um acordo entre o presidente estadunidense Dwight 
Eisenhower e Francisco Franco, com a visita de Eisenhower à Espanha, ocorrendo 
apenas em 1957. Em troca de ajuda financeira por parte dos Estados Unidos, a 
Espanha permitiria a instalação de bases militares (aéreas e navais) norte-americanas 
em seu território, como já acontecera na Alemanha Ocidental e na Itália, não ficando 
claro se essas bases teriam um caráter nuclear ou se aviões com carga atômica 
voariam sobre território espanhol. A primeira base foi a de La Rota, em Cádiz, ponto 
estratégico de entrada e saída entre o Mediterrâneo e o Oceano Atlântico. Em seu 
aspecto econômico, o acordo previa ajuda ao governo espanhol e aos organismos que 
este designasse. Um mês antes da assinatura do acordo entre os dois países, a Espanha 
tinha firmado uma Concordata com a Santa Sé, legitimando mais uma vez a Igreja 
Católica como uma das mantenedoras do regime no poder. 
CONCLUSÃO 
Ao realizar a análise do material historiográfico sobre o período abordado 
nesse capítulo é possível constatar o grande número de documentos à disposição, 
tanto na forma de livros como em sites na internet, filmes baseados na história da 
época, documentários, fotografias e testemunhos orais. 
As abordagens possuem divergências: alguns historiadores têm uma visão e 
uma posição a favor do franquismo e de Francisco Franco, enquanto que outros 
historiadores mostram-se críticos mordazes do regime. Historiadores, como Raymond 
Carr, por exemplo, abordam a história do período franquista de forma mais isenta 
possível, procurando evitar juízos de valores anacrônicos, baseados em perspectivas 
contemporâneas. 
De todas as formas, Franco, foi um ditador que governou o país por 36 anos, 
ainda que, a partir do final da década de 60, tenha se afastado progressivamente da 
vida pública em razão de seu estado de saúde, deixando a direção do governo nas 
mãos de colaboradores de confiança e, até mesmo, o Príncipe Juan Carlos ocupou, em 
algumas ocasiões, esse cargo. Sua política governamental, ainda hoje, é objeto de 
estudo, com autores a caracterizando como totalitária e outros preferindo classificá-la 
como uma forma particular de fascismo. Durante os primeiros anos de seu governo, a 
Espanha manteve-se isolada do mundo exterior, numa tentativa de proteger o regime 
 
 
17 
recém chegado ao poder e garantir a política autárquica concebida pelo governo. A 
Igreja Católica ocupou um papel importante, atuando como suporte do regime no 
exterior e dentro da própria Espanha. Com o fim da Segunda Guerra, ocorreu uma 
necessidade de mudança de posição por parte de Franco. Ele se utilizou mais uma vez 
do anticomunismo para se aproximar dos Estados Unidos, potência militar e política 
capitalista erigida depois da II Guerra em contraposição à União Soviética, com sua 
ideologia baseada no comunismo materialista, contrária ao “Nacionalismo-Católico” 
defendido por Franco. Em 1953, iniciou-se o processo de aceitação internacional do 
regime, que culminou com seu reconhecimento entre os membros da ONU, em 1955. 
Essa aceitação esteve vinculada à posição estratégica do território espanhol, 
seu envolvimento com a causa anticomunista e mudanças em sua apresentação 
governamental, o que foi chamado oportunamente de “constitucionalismo 
cosmético”. 
Por fim, a capacidade de adaptação de Francisco Franco e seu regime 
(comprovada pela mudança, senão ideológica, de posição, após a Segunda Guerra); o 
medo da população de que uma nova Guerra Civil acontecesse, levando novamente à 
morte pessoas de idade plenamente ativa, além de levar ao exílio grande parte da 
intelectualidade espanhola, como escritores, professores universitários, artistas, em 
geral, e mão de obra especializada; e, a partir dos anos 50, um desenvolvimento 
econômico baseado na instalação de indústrias multinacionais e desenvolvimento do 
turismo, podem explicar a sobrevivência do regime franquista por tempo tão longo 
sem que ocorresse tentativa, por parte de outros países democráticos, em destituir El 
Generalísimo do poder. 
REFERÊNCIAS 
CARR, Raymond. España 1808 – 1975. Barcelona: Ariel, 2003.CHURCHILL, Winston S. Memórias da Segunda Guerra Mundial. 3ª ed. , v.2. Rio de 
Janeiro: Nova Fronteira, 1998. 
HOBSBAWM, Eric. A Era dos Extremos – O breve século XX (1914- 1991). São Paulo: 
Companhia das Letras, 1994. 
TUÑON DE LARA, Manuel. España Bajo La Dictadura Franquista (1939 – 1975). 
Barcelona: Labor, 1980. 
 
 
 
O Dois de Maio, a “Guerra de Independência” e a Memória 
manipulada durante a Guerra Civil e o Franquismo 
Janete Abrão 
Professora do Departamento de História da Faculdade de Filosofia e Ciências 
Humanas da PUCRS, Brasil. 
Doutora em História Contemporânea
 
 
arrar a história é uma forma de operar sobre a identidade nacional, sobre o 
conceito de nação e de Estado, assim como sobre a “construção” discursiva 
acerca da memória coletiva e da cultura nacional.1
 
 Segundo afirma Paolo Jedlowski: 
No plano teórico, [...] convém entender a memória coletiva como a seleção, 
a interpretação e a transmissão de certas representações do passado 
produzidas e conservadas especificamente desde o ponto de vista de um 
grupo social determinado.2
 
 
Contudo, cabe esclarecer que: 
 
Na medida em que cada sociedade – e em particular cada sociedade 
moderna – está constituída por uma pluralidade de grupos, não é possível 
falar propriamente de uma única memória coletiva: cada grupo elabora 
aquela representação do passado que melhor se adapta a seus valores e a 
seus interesses. Assim, mais que um conjunto homogêneo e coerente de 
representações do passado, a memória coletiva tem que ser pensada como 
o lugar de uma tensão contínua: o passado que ela custodia é posto em jogo 
pelos conflitos recorrentes que o formulam e o reformulam 
incessantemente.3
 
 
O Dois de Maio de 1808, ocorrido em Madri, é um dos acontecimentos que mais 
há sido interpretado, apropriado e manipulado historicamente pelos diferentes 
regimes, partidos e ideologias implicadas no processo de “construção”, definição e 
consolidação discursiva da nação, da memória coletiva, da identidade e do Estado 
nacional espanhol. Nesse sentido, este capítulo tem por objetivo analisar, de forma 
 
1 “Por cultura nacional se designa essa parte do imaginário coletivo (produzido por práticas discursivas) 
que se oferece como marco formal de integração simbólica do conjunto da sociedade.” Cf. BOUCHARD, 
Gérard. (2003). Gênesis de las naciones y culturas del Nuevo Mundo. Ensayo de historia comparada. 
México: Fondo de Cultura Económica, p.35. Tradução sob responsabilidade da autora. 
2 JEDLOWSKI, Paolo. La sociología y la memoria colectiva. In: BAKHURST, David, BELLELLI, Guglielmo, 
RIVERO, Alberto Rosa (Orgs.). Memoria colectiva e identidad nacional. Madrid: Biblioteca Nueva, 2000, 
p. 126. Tradução sob responsabilidade da autora. 
3 JEDLOWSKI, Paolo. Op. cit., p. 127. Tradução sob responsabilidade da autora. 
N 
 
 
19 
breve, as diferentes interpretações sobre o Dois de Maio, bem como sobre a guerra que 
a historiografia espanhola convencionou relacionar diretamente com este 
acontecimento: a “Guerra de Independência”(1808-1814).4
Cabe afirmar que, a partir de 1808, existiram duas interpretações político-
ideológicas que buscavam explicar, tanto o Dois de Maio como a “Guerra de 
Independência”
 Pretende-se analisar os dois 
temas desde a interpretação absolutista e liberal, passando pelas interpretações 
elaboradas durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e pelo regime franquista 
(1939-1975). 
5
A interpretação absolutista e católica, de caráter reacionário e tradicionalista, 
concebeu o Dois de Maio e a Guerra como um levantamento de toda a Espanha, de 
todos os espanhóis que, de forma unânime, se voltam contra o usurpador francês do 
trono, contra a ameaça do ateísmo e contra a presença estrangeira em território 
espanhol. Segundo essa interpretação, Fernando, príncipe de Astúrias, foi proclamado 
rei no dia 19 de março de 1808, depois que o Motim de Aranjuez destituiu a Manuel 
Godoy e Carlos IV renunciou à Coroa. Contudo, pouco tempo durou seu primeiro 
reinado. Fernando VII foi enganado e conduzido a Bayona, onde o imperador francês, 
Napoleão Bonaparte, lhe impôs a renuncia ao trono e, assim, foi proclamado rei da 
Espanha José Bonaparte, o rei Intruso. Como reação os súditos espanhóis no dia Dois 
: a absolutista e católica e a liberal. 
 
4 “É duvidoso que o conflito desatado na península Ibérica entre 1808 e 1814 se ajustara realmente à 
categoria de ‘guerra de independência’, segundo ficou consagrado mais tarde pela versão nacionalista. 
Se por guerra de independência entendemos uma tentativa de secessão dos habitantes de um território 
integrados contra sua vontade em um conglomerado imperial, haverá que reconhecer que Napoleão 
não pretendia converter a monarquia espanhola em província de um império radicado em Paris, senão 
mudar a dinastia reinante; algo, por certo, nem extraordinário nem repugnante para a tradição 
peninsular, já que havia ocorrido cem anos antes, quando os Bourbons substituíram aos Habsburgos, 
com resultados considerados em geral positivos e sem originar uma situação de subordinação formal 
respeito à França. [...]. Apresentar, portanto, a longa e sangrenta confrontação de 1808 a 1814 como 
uma ´guerra de Independência´, ou enfrentamento com ‘os franceses’ por uma ‘liberação espanhola´, é 
uma dessas simplificações da realidade tão típicas da visão nacionalista do mundo, o de qualquer outra 
visão doutrinária em definitiva, sempre dadas a explicar conflitos complexos em termos dicotômicos e 
maniqueístas, graças ao qual conseguem atrair e mobilizar politicamente.” Cf. ÁLVAREZ JUNCO, José. 
Mater dolorosa: la idea de España en el siglo XIX. 5ª ed. Madrid: Taurus, 2003, p.119-120. Tradução sob 
responsabilidade da autora. 
5 Essa relação pode ser considerada uma distorção na medida em que, segundo afirma Alberto Rosa e 
outros autores, um dos procedimentos utilizados na distorção das representações do passado para fins 
identitários ou político-ideológicos é a manipulação de associações entre acontecimentos. BAKHURST, 
David, BELLELLI, Guglielmo, RIVERO, Alberto Rosa (Orgs.).Op. cit., p. 70. De fato, não há evidências de 
que o Dois de Maio deu origem à “Guerra de Independência”. O próprio título de “Guerra de 
Independência” é uma invenção posterior a 1833. Cf. ÁLVAREZ JUNCO, José. Op. cit., p. 127. 
 
 
20 
de Maio de 1808 se sublevaram contra a usurpação do trono, em defesa do monarca 
(Fernando, o Desejado)6 e da religião católica. Com a dura repressão das tropas 
francesas (e o fatídico Três de Maio, pintado por Goya), teve início, em toda a Espanha, 
a “Guerra de Independência”. Alguns dos principais representantes desse discurso e 
defensores da Espanha tradicional foram: José Joaquín Colón7 e o frade Simón López.8
O discurso liberal, por sua vez, interpretou o Dois de Maio como o nascimento 
da nação política espanhola, como o nascimento da nação cívica, que sonhava com a 
revolução (liberal) por fazer. O Dois de Maio surgiu, assim, segundo o discurso liberal, 
em decorrência da “vontade política do povo”, que buscava transformar o regime, as 
instituições existentes e alcançar a liberdade. Seus primeiros porta-vozes foram Flórez 
Estrada e Romero Alpuente.
 
Não obstante, inclui-se também nesse grupo o bispo de Orense, Miguel de Lardizábal, 
os frades Francisco de Alvarado e Rafael de Vélez, assim como Juan Pérez Villamil y 
Paredes, partidário acérrimo do Antigo Regime. 
9
 
 Portanto, para o primeiro liberalismo espanhol, o Dois de 
Maio era o mito fundador por excelência, sobre o qual se levantava e se legitimava a 
nação moderna espanhola. Segundo esclarece Jorge del Palácio Martín:[…] o Dois de Maio perpetuava a memória de um episódio histórico em que 
se predicavam todos os elementos constituintes de um discurso de 
construção nacional. Se predicava a defesa do território, a unidade, a luta da 
liberdade contra a tirania política e, sobretudo, a emergência de um sujeito 
chamado a ser a custódia da soberania: a nação.10
 
 
Conforme argumenta o liberal Antoni de Capmany y Montpalau, em sua obra 
Centinela contra franceses, editada em Madrid, em 1808: 
 
6 LA PARRA LÓPEZ, Emilio. “El mito del rey deseado” En: Sombras de Mayo: mitos y memorias de la 
Guerra de la Independencia en España (1808-1908). Madrid: Casa de Velásquez, Colección n. 99, 2007. 
7 COLÓN, José Joaquín. España vindicada en sus clases y autoridades de las falsas opiniones. 
Alicante/Cadiz: 1811 [s.n.] 
8 Para Simón López, autor de um folheto intitulado Despertador Cristiano-Político publicado em 
Valência, em 1809, “[...] la conducta de los franceses era ´sacrílega, pérfida, sanguinaria, inhumana, 
irreligiosa´ e Napoleão era ´la encarnación moderna del Anticristo´.” Cf. ÁLVAREZ JUNCO, José. Op. cit., 
p.345. 
9 FLÓREZ ESTRADA, Álvaro. Introdución para la historia de la revolución de España.,[1810] AL PUENTE, 
Juan Romero. El grito de la razón al español invencible. Folheto. Zaragoza, 1808. 
10 “[…] el Dos de Mayo perpetuaba la memoria de un episodio histórico del que se predicaban todos los 
elementos constituyentes de un discurso de construcción nacional. Se predicaba la defensa del 
territorio, la unidad, la lucha de la libertad contra la tiranía política y, sobre todo, la emergencia de un 
sujeto llamado a ser el custodio de la soberanía: la nación.” Cf. PALACIO MARTÍN, Jorge del. Madrid, 2 de 
Mayo de 1814: la invención de un mito liberal. Disponível em: http://portal.uam.es. Acesso em 
4/3/2008. 
 
 
21 
Que importaria a um Rei ter vassalos, se não tivesse nação? Esta é 
formada não pelo número de indivíduos, mas pela unidade das 
vontades, das leis, dos costumes, e do idioma, que as encerra e 
mantém de geração em geração. [...]. Onde não há nação, não há 
pátria, porque a palavra país não é mais que terra que sustenta 
pessoas e bestas ao mesmo tempo.11
 
 
Entretanto, com a reação absolutista, a interpretação liberal sobre o Dois de 
Maio não pode manter o caráter político consagrado à liberdade. Ricardo García Cárcel 
assegura que: 
 
Com o retorno de Fernando VII ao poder e a repressão sobre os 
liberais se legitima, desde a Corte, a interpretação conservadora da 
guerra, como expressão da lealdade ao rei de seu povo. Épica militar, 
xenofobia, fernandismo e integrismo religioso. A memória liberal 
somente ressuscita – salvo a fugaz experiência do Triênio [liberal] – a 
partir de 1837 e será distinta ao projeto que formularam Flórez 
Estrada ou Romero Alpuente. A guerra já é passado e sua análise se 
dá em função de seus resultados. Os liberais, aqueles velhos radicais 
das Cortes de Cádiz, se integraram na política de governo após a 
morte de Fernando VII. Toreno escreve sua clássica História do 
levantamento, guerra e revolução da Espanha (1836-1837), na qual 
enterra o sonho da revolução [liberal] pendente.12
 
 
Portanto, depois de muitas convulsões, o Estado liberal pôde ser implantado, 
mas com o forte caráter oligárquico que lhe dava o moderantismo. Para o governo dos 
liberais moderados, o Dois de Maio e a “Guerra da Independência”, seriam 
interpretados desde a ótica patriótica. Em outras palavras, para o governo dos 
moderados, o Dois de Maio não devia ser interpretado e comemorado como a luta do 
 
11 “¿Qué le importaría a un Rey tener vasallos, si no tuviese nación? A ésta la forma, no el número de 
individuos, sino la unidad de las voluntades, de las leyes, de las costumbres, y del idioma, que las 
encierra y mantiene de generación en generación. […]. Donde no hay nación, no hay patria, porque la 
palabra país no es más que tierra que sustenta personas y bestias a un mismo tiempo.” Cf. CAPMANY y 
MONTPALAU, Antonio. Centinela contra franceses. Madrid, 1808. Disponível em: 
http://www.cervantesvirtual.com Acesso em 10/5/2005. 
12 “Con la vuelta de Fernando VII y la represión sobre los liberales se legitima desde la Corte sólo la 
interpretación conservadora de la guerra, como expresión de la lealtad al rey de su pueblo. Épica militar, 
xenofobia, fernandismo e integrismo religioso. La memoria liberal sólo resucitará – salvo la fugaz 
experiencia del Trienio – a partir de 1837 y será distinta al proyecto que formularon Flórez Estrada o 
Romero Alpuente. La guerra es ya pasado y su análisis está en función de sus resultados. Los liberales, 
aquellos viejos radicales de las Cortes de Cádiz, se han integrado en la política de gobierno tras la 
muerte de Fernando VII. Toreno escribe su clasica Historia del levantamiento, guerra y revolución de 
España (1836-37), donde entierra el sueño de la revolución [liberal] pendiente.”GARCÍA CÁRCEL, 
Ricardo. “Memoria de la España indómita”. Disponível em 
http://www.muyinteresante.es/reportajes/memoria-de-la-espana-indomita.html Acesso em 9/3/2008. 
 
 
22 
povo pela sua liberdade política, mas circunscrever-se ao heroísmo daqueles 
“generosos patriotas” de 1808, como Luís Daoíz y Pedro Valverde.13
Transcorridos mais de cento e vinte anos, em 1936, o Dois de Maio e a “Guerra 
da Independência” contra a invasão napoleônica repousavam na memória coletiva dos 
espanhóis, e as duas facções – republicanos e “nacionais” – recorreram a ela para 
motivar seus seguidores a partir da relação estabelecida entre esses fatos históricos 
teoricamente “compartidos” e as “causas”, as ideologias e as concepções de nação e 
do Estado espanhol que defendiam. Dessa forma, no primeiro terço do século XX, e 
durante os breves anos da II República, o Dois de Maio esteve sujeito a várias 
interpretações, tanto da esquerda revolucionária como da direita defensora da religião 
e das tradições nacionais. 
 
Através da análise de algumas publicações, discursos e propagandas 
revolucionárias, surgidas durante a Guerra Civil Espanhola, evidenciam-se várias 
alusões ao Dois de Maio e à “Guerra de Independência”. Cabe ressaltar que dentre os 
lemas difundidos pelos republicanos, como os de: Liberdade, Frente Popular e 
República entre outros, o termo Independência não é o menos reiterado com a 
conotação de território invadido que o povo devia defender. Efetivamente, a palavra 
independência é exibida em numerosos discursos, panfletos e jornais da época. 
Republicanos e comunistas, com frequência, se referem à guerra civil que assolou o 
país como a “segunda guerra de independência”.14
 
 Por exemplo, Manuel Azaña, 
presidente de Governo da Segunda República Espanhola, em um discurso pronunciado 
em Valência, em 21 de janeiro de 1937, afirmou que 
A Guerra de Independência – a qual me remeto muitas vezes, sempre 
que falo da atual contenda – guardou e amparou o nascimento de 
um movimento político espanhol, o primeiro no qual nossa nação 
 
13 Entretanto, com a Ditadura de Primo de Rivera (1923-1930), a interpretação conservadora se 
sobrepõe à liberal. Em 1926, foi publicada a segunda edição da obra Memórias de um setentão, de 
Ramon Mesonero Romanos, na qual o autor sublinha os notáveis acontecimentos que “iam 
desenvolvendo o terrível drama de 1808, iniciado por aquele alçamento nacional”, no qual o povo dava 
“vivas a Fernando, à Religião, à Espanha, e à Virgem de Atocha”, com o objetivo de “mortificar no 
possível ao enfadado hóspede [Murat], a quem por instinto cordialmente detestavam”. Cf. MESONERO 
ROMANOS, Ramon de. Memorias de un setentón, natural y vecino de Madrid escritaspor el curioso 
parlante. 2ª. ed. Madrid: Renacimiento. 1926. 
14 Boletín de la Biblioteca del AGGCE, n.2, Madrid, março de 2008. 
 
 
23 
tomava consciência de seu próprio ser e começava a alçar vôo a 
independência política. 15
 
 
Com anterioridade, em dezembro de 1936, Santiago Carrillo, comunista e 
membro da Junta de Defesa de Madri, em seu discurso pronunciado, em Valencia, no 
Teatro Apolo, havia invocado a juventude para a “luta pela independência da pátria”.16
Há que se mencionar também a reedição dos populares Episódios Nacionais, de 
Pérez Galdós, escritos entre 1872 e 1912.
 
Em realidade parece que o planejamento da luta como rechaço ao invasor está 
presente quase desde o primeiro momento do enfrentamento bélico. 
17 Em 1936, em plena batalha de Madrid, o 
Ministério da Instrução Pública edita alguns fragmentos do “Dois de Maio” e de 
“Napoleão de Chamartín”, ambos de Galdós, incluindo aqueles episódios de guerra 
que são narrados na novela e que, tal e como se assevera no prólogo, descrevem uma 
situação que “guarda grande semelhança [...], inclusive com os pormenores da 
situação atual [...]: defendemos o espanhol nas guerras napoleônicas e o defendemos 
hoje contra o fascismo internacional”. 18
Dois anos depois, em 1938, foram editados, como especial homenagem ao 
Exército Popular, ao menos as três primeiras novelas da série galdosiana, nas quais não 
se duvida em apresentar a guerra como a “segunda guerra de independência da 
Espanha.” 
 
19
Avançado o conflito, e após os sucessivos reveses sofridos pelo bando 
republicano e a progressiva perda territorial, o modelo da guerra do século XIX era 
 
 
15 “La Guerra de la Independencia – hacia la cual me vuelvo muchas veces, siempre que hablo de la 
actual contienda – cobijó y amparó el nacimiento de un movimiento político español, el primero en que 
nuestra nación tomaba consciencia de su propio ser y empezaba a aletear con independencia política”. 
Cf. AZAÑA, Manuel. “Hacia la victoria: por la libertad y la independencia de España”. Discurso 
pronunciado en el Ayuntamiento de Valencia el día 21 de enero de 1937. Madrid: Consejo Nacional de 
Izquierda Republicana, 1937. 
16 CARRILLO, Santiago. ¡Salud a la heroica juventud española! Toda la juventud en defensa de la 
independencia de la patria. Texto taquigráfico del discurso pronunciado el día 16 de diciembre de 1936 
en el Teatro Apolo de Valencia. Bilbao: Joven Guardia, 1937. 
17 Os Episodios Nacionales trata-se de uma coleção de 46 novelas históricas escritas por Benito Pérez 
Galdós que foram redatadas entre 1872 e 1912. Estão divididas em cinco séries e tratam da História da 
Espanha desde 1805 até 1880, aproximadamente. 
18 “[...] guarda gran semejanza […] incluso con los pormenores de la situación actual […] defendimos lo 
español en las guerras napoleónicas y lo defendemos hoy contra el fascismo internacional”. Cf. PÉREZ 
GALDÓS, Benito. El 2 de Mayo. Madrid: Ministerio de Instrucción Pública y Bellas Artes, Sección de 
Publicaciones, 1936. Ediciones de la Guerra Civil. 
19 PÉREZ GALDÓS, Benito. [Prólogo de Enrique Diez-Canedo]. Edición especial en homenaje a nuestro 
glorioso Ejército Popular en la segunda guerra de la independencia de España. Madrid: Nuestro Pueblo, 
1938 (Barcelona: Sociedad General de Publicaciones). 
 
 
24 
igualmente útil para manter a esperança e, sobretudo, para cultivar o moral da 
resistência. No discurso de Santiago Carrillo, pronunciado no Cine Capitol durante a 
celebração do aniversário da passada guerra de independência, o Dois de Maio de 
1938 recordava aquela epopeia na qual “apesar dos progressos que fez o exército 
invasor, o povo soube levantar-se e vencer o inimigo”. 20 Igual perspectiva mantém o 
general Mariano Gámir, em 1938, com uma obra que analisa as façanhas do Dois de 
Maio, assim como as batalhas de Bailén e Bruc. Para esse militar republicano, foi “o 
surgimento espontâneo e formidável do povo o que fez com que aquela guerra de 
independência de 1808 e a atual formem dois elos de firme soldadura na corrente da 
nossa história pátria." 21
Nesse sentido, a luta pela independência – com o antecedente exemplar de 
1808 – era um conceito válido para deslegitimar o bando contrário como exército 
invasor, e para denunciar o fracasso da Política de Não-Intervenção, a “política de 
apaziguamento”, da Inglaterra e da França com relação à política imperialista da 
Alemanha nazista. 
 
O apelo ao sentimento de independência, por exemplo, pôde ser evidenciada 
no folheto intitulado A luta por nossa independência, publicado em 1938, no qual se 
narra a guerra contra Napoleão e se insiste em que apesar da inicial perda de território 
não só se conseguiu expulsá-lo da Espanha, mas também se contribuiu para que ele 
deixasse de ser imperador dos franceses.22
Cabe afirmar que o mito da “Espanha indomável” de 1808, que se opõe à 
dominação estrangeira, teve enorme repercussão durante o regime franquista (1939-
1975). Mas há que se levar em consideração o fato de que, o franquismo, não fez 
senão capitalizar, em seu interesse, o discurso romântico nacionalista, tradicionalista e 
 Um claro precedente, pois, no qual 
vislumbrar a futura expulsão do fascismo da Espanha e sua total derrota no âmbito 
internacional. 
 
20 “[…] a pesar de los progresos que hizo el ejército invasor, el pueblo supo levantarse y vencer al 
enemigo”. Cf. CARRILLO, Santiago. ¡Fuera el invasor de nuestra patria! Discurso pronunciado en el cine 
Capitol, de Valencia, el 2 de mayo de 1938. Valencia: Alianza/ J.S.U, Comité Provincial de Madrid, 1938. 
21 “[…] surgimiento espontáneo y formidable del pueblo el que hace que aquella guerra de la 
independencia de 1808 y la actual formen dos eslabones de firme soldadura en la cadena de nuestra 
historia patria.” Cf. GÁMIR ULIBARRI, Mariano. Tres hechos culminantes de la guerra contra Napoleón en 
España. Barcelona: Biblioteca Militar de Catalunya. 1938. 
22 SPAIN against the invaders: Napoleón 1808- Hitler and Mussolini 1936. London: United Editorial 
Limited/ Madrid: Ediciones Españolas, 1938 apud Boletín de la Biblioteca del AGGCE, n.2, Madrid, marzo 
de 2008. 
 
 
25 
católico de fins do século XIX, com toda a sua carga emocional. Foi nesse sentido que o 
franquismo relacionou o Dois de Maio de 1808 ao Dezoito de Julho de 1936.23 Dessa 
forma, a historiografia de cunho franquista não duvidou em afirmar que os 
acontecimentos históricos de maior transcendência para a “pátria espanhola” eram a 
“Guerra de Independência” (1808-1814) e a “Guerra de Libertação”(1936-1939).24 
Cabe ressaltar que um dos principais ideólogos do fascismo espanhol, Gimenez 
Caballero, recém finalizada a guerra civil, não vacilou em proclamar “el triunfo del Dos 
de Mayo”.25
 
 Já o historiador Ricardo del Arco y Garay, em Grandeza y Destino de 
Espana, obra publicada em 1942, em sua apologia ao bando “nacional” e ao exército 
de Francisco Franco, de forma anacrônica, compara o alçamento de 1936 com a 
revolta popular de 1808”: 
O Movimento Nacional há chegado – como chegou o Alçamento de 
1808 – pela traição de uns governantes que venderam a nação ao 
bolchevismo russo. E a boa Espanha, representada pelo seu Exército, 
se há levantado para defender sua vida livre e digna, depois de haver 
agüentado toda sorte de atropelos cometidos ou amparados pelo 
Poder público, que não se deteve nem pelo assassinato. Por muitas 
atrocidades que cometessem desde 1808 até 1813 os franceses 
invasores – e foram muitas –, não têm ponto de comparação com os 
horrores perpetrados pelos marxistas: mortes violentas de bispos, 
sacerdotes e religiosos; martírios, assassinatos[...]; incêndios de 
templos, [...], saques e destruição de tesouros artísticos. 26
 
 
Outro documento significativo é a LEGISLACIÓN DE LA ENSEÑANZA MEDIA 
ditada por Franco em 14 de abril de 1939. Segundo consta nesse documento: 
 
 
23 CÁRCEL, Ricardo García. El sueño de una nación indomable: los mitos de la guerra de la 
Independencia. 2ª. ed. Madrid: Temas de Hoy. 2007. 
24 CHAMORRO MARTÍNEZ, Manuel. 1808-1936: dos situaciones históricas concordantes. 6ª. ed. Madrid: 
Doncel. 1975 
25 GIMÉNEZ CABALLERO, Ernesto. Triunfo del 2 de mayo. Madrid: Los Combatientes. Fe y acción. 
Fascículo doctrinal, 3. 1939. 
26 “El Movimiento Nacional ha llegado – como llegó el Alzamiento de 1808 – por la traición de unos 
gobernantes que vendieron la nación al bolchevismo ruso. Y la buena España, representada por su 
Ejército, se ha levantado para defender su vida libre y digna, después de haber aguantado toda suerte 
de atropellos cometidos o amparados por el Poder público, que no se detuvo ni en el asesinato. Por 
muchas felonías que cometiesen desde 1808 hasta 1813 los franceses invasores – y fueron muchas -, no 
tienen punto de comparación con los horrores perpetrados por los marxistas: muertes violentas de 
obispos, sacerdotes y religiosos; martirios, asesinatos […]; incendios de templos, […], saqueo y 
destrucción de tesoros artísticos.” ARCO Y GARAY, Ricardo del. Grandeza y destino de España. Prólogo 
de Federico García Sanchíz. Madrid: Escelicer, 1942, p. 249-250. 
 
 
26 
Se estudará a gloriosa e espanholíssima guerra de Independência [...] 
com um sentido espanhol, anti-exótico, tradicional, católico e 
monárquico [...]. Não se deve esquecer que a História da Espanha 
nesses primeiros anos, ademais, deve senti-la [o aluno] como meio 
de sentir a pátria. 27
 
 
Do que foi exposto nas páginas anteriores, pode-se afirmar que o Dois de Maio 
e a “Guerra de Independência” foram processos bastante complexos, nos quais nem 
todos os segmentos da sociedade estavam contra Napoleão e as reformas de caráter 
modernizador que ele pretendia estabelecer na Espanha. A “Guerra de Independência” 
não se desenrolou de igual forma em todo o território espanhol, nem as elites estavam 
de acordo sobre qual regime dariam seu apoio. O Dois de Maio, por sua vez, foi uma 
revolta popular, repentina, inesperada, desorganizada e sangrenta, na qual não se 
valeu de proclames impressos nem artifícios de oratória para provocá-la. Ninguém 
esperava o que ocorreu, nem seus principais protagonistas: criados, operários, 
vendedores ambulantes, camponeses dos arredores de Madrid.28 Corroborando com o 
escritor espanhol Pérez-Reverte pode-se asseverar que a ira dos revoltosos “era mais 
visceral que ideológica”. 29 Nesse sentido, não existia um sujeito coletivo que então 
permitira falar da nação como titular da soberania. Tampouco o Dois de Maio foi 
resultado de conspirações patrióticas ou de uma vasta conspiração promovida por 
parte da nobreza.30 Foi uma revolta que teve como um dos fatores desencadeadores a 
insolência e a rapacidade das tropas de ocupação francesas e, em contrapartida, “a 
dose de xenofobia, especificamente anti-francesa, que indiscutivelmente existiu na 
reação popular”31
 
27 "Se estudiará la gloriosa y españolísima guerra de la Independencia [...] con un sentido español, 
antiexótico, tradicional, católico y monárquico […]. No se debe olvidar que la Historia de España en esos 
primeros años, además, debe sentirla [el alumno] como medio de sentir la patria." Cf. LEGISLACIÓN DE 
LA ENSEÑANZA MEDIA, dictada por el generalísimo Francisco Franco el 14 de abril de 1939. 
, mas também não pode ser descartado o sentimento de abandono 
28 “El recuento de los muertos por los alcaldes de barrio evidencia que la mayor parte de las víctimas 
identificadas son obreros, criados, vendedores ambulantes. Las víctimas desconocidas son 
numerosísimas, lo que deja suponer que tomaron parte en los combates muchísimos forasteros. Eran, al 
parecer, campesinos de los alrededores que habían acudido al mercado del día anterior (domingo, 1º de 
mayo) y permanecieron en la ciudad.” Cf. AYMÉS, Jean-René. La guerra de la independencia en España 
(1808-1814). 2ª. ed. Madri: Siglo XXI, 1980, p. 17. 
29 PÉREZ REVERTE, Arturo. Cólera de un pueblo, certeza de una nación. Disponível em: 
http://golfenix2.wordpress.com Acesso em 3/6/2008. Tradução sob a responsabilidade da autora. Ver 
também: PÉREZ REVERTE, Arturo. Un día de cólera. Madrid: Alfaguara. 2008. 
30 Esta é uma hipótese do historiador Jean-René Aymés. Ver: AYMÉS, Jean-René. Op. cit., p. 17. 
31 “[…] la dosis de xenofobia, específicamente antifrancesa, que indiscutiblemente existió en la reacción 
popular.” Cf. ÁLVAREZ JUNCO, José. Op. cit., p. 121. 
 
 
27 
do “povo” pelo seu rei32, pelo seu governo33, pelas suas forças armadas e pelas classes 
acomodadas, que ficaram em suas casas, observando desde as sacadas aquela “turba” 
que transtornava a ordem pública. 34 Não se pode negligenciar, portanto, o fato de que 
o vazio de poder também possibilitou o desencadear do conflito.35
Cabe matizar que os revoltosos pertenciam a uma sociedade que via o mundo 
através dos valores do Antigo Regime, na qual o analfabetismo estava na ordem do dia 
e uma das únicas fontes de informação política da maioria da população eram os 
sermões. Contudo, não obstante o baixo clero interpretar o Dois de Maio e a guerra 
como conflitos desencadeados em defesa da religião católica, assim como não se pode 
negar que grande parte da sociedade nutria simpatias pela Coroa, o Dois de Maio e a 
“Guerra de Independência” não podem ser considerados conflitos movidos pela 
fidelidade ao rei e tampouco podem ser concebidos como guerra de religião. Em 
realidade, o Dois de Maio se caracterizou por um conjunto de energias geradas pela 
sensação de crise geral, na qual, o mal-estar social existente se transformou em revolta 
popular. 
 
O Dois de Maio não foi desencadeado pela lealdade à pátria ou por uma “nação 
consciente de si mesma” que queria transformar as instituições e o regime absolutista 
existente. Tudo isso veio depois, com os discursos liberais e patrióticos sobre a “nação 
em armas”.36
 
32 “La partida de Fernando VII poco después de la de Carlos IV, la falta de noticias precisas de dónde se 
encuentran, los temores confusos experimentados sobre la suerte que pueden correr. La situación del 
país sin soberano y en la incertidumbre, crean una atmósfera de desconcierto y angustia.” Cf. ROUX, 
Georges. La guerra napoleônica de España. Madrid: Espasa-Calpe, 1971, p. 50. 
 Tampouco a “Guerra de Independência” foi uma guerra de unidade 
33 “Cuando Fernando VII abandonó a Madrid, sometiéndose a las intimaciones de Napoleón, dejó 
establecida una Junta Suprema de gobierno presidida por el infante don Antonio. Pero en mayo esta 
junta había desaparecido ya. No existía ninguno gobierno central, y las ciudades sublevadas formaron 
juntas propias, subordinadas a las de las capitales de provincia. Estas juntas provinciales constituían, en 
cierto modo, otros tantos gobiernos independientes, cada uno de los cuales puso en pie de guerra un 
ejército propio.” Cf. MARX, Karl. La España revolucionaria. Moscou: Progreso, 1980, p. 18. 
34 “Durante o motim se produz uma excisão entre a rua e a casa: [...]. Na rua se morre: é a sorte 
reservada aos soldados, aos camponeses. O burguês se protege em sua casa, com a possibilidade de 
eleger entre os papéis de ator ou espectador. [...]. O liberal Alcalá Galeano, menino ainda em 1808, 
recorda que seus pais – respeitáveis burgueses – lhe proibiram que fosse misturar-se com os insurretos,‘quase todos das classes inferiores’ – ‘a gente decente [...] não precisa lançar-se à contenda; ´as gentes 
de superior classe observam desde as suas sacadas nas zonas [da cidade] onde não havia tiroteio, e 
desde ali, vendo e ouvindo, procuravam entender o que passava.” Cf. AYMES, Jean-René. Op. cit., p.18. 
Tradução sob responsabilidade da autora. 
35 LOVETT, Gabriel H. La Guerra de la Independencia y el nacimiento de la España Contemporánea. La 
lucha, dentro y fuera del país. Traducción de José Cano Tembleque. Barcelona: Península, 1975, p. 14. 
36ÁLVAREZ JUNCO, José. Op. cit., p.129. 
 
 
28 
nacional, senão de particularismos ou “patriotismos locais” contra a ocupação 
napoleônica.37
Não obstante, o que se pretende criticar nas interpretações analisadas foi a 
omissão da dimensão histórica, social, econômica, cultural e política em que 
transcorreu o Dois de Maio de 1808 e a Guerra de Independência, visando atender a 
interesses políticos, ideológicos e partidários, muitos dos quais, legitimados pelo 
discurso historiográfico. 
 O mito de uma reação unânime do povo espanhol contra Napoleão foi 
alimentado por escritores, políticos e historiadores conservadores e liberais, no 
decorrer do século XIX, visando criar o conceito de uma nação política espanhola e 
consolidar, ainda no século XX, um Estado culturalmente homogêneo através da 
coesão social, cultural e nacional. 
REFERÊNCIAS 
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Taurus. 2003. 
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Sanchíz. Madrid: Escelicer, 1942. 
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Discurso pronunciado en el Ayuntamiento de Valencia el día 21 de enero de 1937. 
Madrid: Consejo Nacional de Izquierda Republicana, 1937. 
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historia comparada. México: Fondo de Cultura Económica. 2003. 
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6ª ed. Madrid: Doncel. 1975. 
CAPMANY y MONTPALAU, Antonio. Centinela contra franceses. Madrid, 1808. 
Disponível em: <http://www.cervantesvirtual.com>. Acesso em 10/5/2005. 
CÁRCEL, Ricardo García. El sueño de una nación indomable: los mitos de la guerra de la 
Independencia. 2ª ed. Madrid: Temas de Hoy. 2007 
CARRILLO, Santiago. ¡Salud a la heroica juventud española! Toda la juventud en 
defensa de la independencia de la patria. Texto taquigráfico del discurso pronunciado 
el día 16 de diciembre de 1936 en el Teatro Apolo de Valencia. Bilbao: Joven Guardia, 
1937. 
 
37 “¿Qué seria ya de los españoles, si no hubiera habido aragoneses, valencianos, murcianos, andaluces, 
asturianos, gallegos, extremeños, catalanes, castellanos, etc.?” Cf. CAPMANY y MONTPALAU, Antonio. 
Op. cit. Segundo Álvarez Junco: “Un último aspecto que cuestiona el caráter nacional del levantamiento 
antinapoleónico es ‘el predominio del patriotismo local sobre la unidad nacional’, […]; un particularismo 
que dotó precisamente de especial fuerza a la resistencia contra los franceses.”Cf. ÁLVAREZ JUNCO, 
José. Op. cit., p.125. 
 
 
29 
______. ¡Fuera el invasor de nuestra patria! Discurso pronunciado en el cine Capitol, de 
Valencia, el 2 de mayo de 1938. Valencia: Alianza/ J.S.U, Comité Provincial de Madrid, 
1938. 
COLÓN, José Joaquín. España vindicada en sus clases y autoridades de las falsas 
opiniones. Alicante/Cadiz: [s.n.]1811. 
GÁMIR ULIBARRI, Mariano. Tres hechos culminantes de la guerra contra Napoleón en 
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el 14 de abril de 1939. 
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Bellas Artes, Sección de Publicaciones, 1936. Ediciones de la Guerra Civil. 
______. [Prólogo de Enrique Diez-Canedo]. Edición especial en homenaje a nuestro 
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Nuestro Pueblo, 1938 (Barcelona: Sociedad General de Publicaciones). 
PÉREZ REVERTE, Arturo. “Cólera de un pueblo, certeza de una nación”. Disponível em: 
<http://golfenix2.wordpress.com>. Acesso em 3/6/2008. 
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ROUX, Georges. La guerra napoleônica de España. Madrid: Espasa-Calpe, 1971. 
SPAIN against the invaders: Napoleón 1808- Hitler and Mussolini 1936. London: United 
Editorial Limited/ Madrid: Ediciones Españolas, 1938 apud Boletín de la Biblioteca del 
AGGCE, n.2, Madrid, marzo de 2008. 
 
 
A Imprensa e a Ditadura Franquista 
Sara Getino Garasa 
Acadêmica do Curso de História 
Universidad Complutense de Madrid, Espanha. 
 
 
á do título do capítulo depreende-se claramente o objeto de análise que ao longo 
destas páginas proponho-me a abordar: A imprensa e a ditadura franquista. No 
entanto, a relação entre ambos não é fácil, e isso podemos observar desde um 
primeiro momento, analisando o significado desses conceitos. 
A imprensa chegou a ser definida como “o quarto poder”, evocando com isso a 
capacidade de penetração que os conteúdos informativos têm nos estados de opinião 
pública. Ao contrário, uma ditadura é uma forma de governo na qual o poder 
concentra-se em torno à figura de um só indivíduo. Um único poder, portanto, que se 
não contempla a existência de outros, não o fará tampouco de um quarto, a imprensa. 
Mas nessa explicação introdutória ao tema devo aclarar que, em realidade, o que 
caracteriza uma ditadura não é a carência de opinião pública senão a tentativa do poder 
por suprimir, controlar e manipular a informação. No entanto, é igualmente interessante 
observar que nem em todos os sistemas ditatoriais, nem em todos os momentos de sua 
existência, verificam-se nem os mesmos mecanismos de controle sobre os meios de 
comunicação, nem a mesma intensidade na sua aplicação, nem a mesma eficácia em 
seus resultados. Isso é precisamente o que me proponho estudar e analisar: como essas 
formas de controle político, que utilizou a ditadura franquista, transformaram-se, 
intensificaram-se ou relaxaram em função das necessidades legitimadoras da mesma. E 
tudo isso se refletiu claramente na imprensa, que foi sem dúvida, um dos meios em que 
mais claramente se exerceu essa tentativa de controle através da censura e da política 
de consignas. Contudo, ao mesmo tempo,o regime foi consciente da importância da 
imprensa como potencial educador e transmissor de valores. 
Dessa forma, ao longo deste capítulo, tentarei explicar a evolução que sofreu a 
imprensa nestes 40 anos, mostrando especial atenção às duas leis de imprensa (a de 
1948 e a de 1966) que foram publicadas ao longo do regime. Mencionarei também a 
J 
 
 
31 
história dos principais periódicos espanhóis. Mas não poderíamos começar a falar sem 
esclarecer qual foi o verdadeiro significado da imprensa durante o Franquismo. 
SIGNIFICADO DA IMPRENSA DURANTE O FRANQUISMO 
A imprensa foi concebida como um instrumento imprescindível ao serviço da 
construção de um novo estado e de uma nova sociedade. Está claramente 
demonstrado que a opinião não se engendra de baixo para cima, senão justamente de 
cima para baixo. Com isso, refiro-me que quando os homens creem pensar por conta 
própria, em realidade estão pensando através dos meios de informação de que 
dispõem e das notícias que recebem do mundo. Assim, os meios de informação 
convertem-se ao final em criadores de uma cultura e de uma consciência nacional e, 
daí, precisamente a necessidade do franquismo de subordinar a imprensa à autoridade 
do Estado, que não era outra coisa que o principal garante da ordem e do bem 
comum. A imprensa do franquismo, portanto, não foi mais do que um aparelho a 
serviço dos interesses do Estado; ao mesmo tempo, que um veículo de propaganda, 
controle da opinião pública, vigilância e castigo. Assim, poderíamos afirmar que 
encontramo-nos diante de uma imprensa a serviço da ordem pública. Nesse sentido, 
bem poderíamos recolher aqui a seguinte afirmação de Justino Sinova: 
 
El periodismo será concebido como una actividad de servicio al 
Estado; el periódico como un instrumento de acción política; y el 
periodista como un trabajador más de la administración, aunque su 
salario fuera pagado por una empresa privada.1
 
 
Portanto, para reforçar esses argumentos e corroborar com Sinova pode-se 
afirmar que “los amos efectivos de toda la prensa fueron las autoridades, que en cada 
momento se ocuparon del control y la pusieron (...) a los pies del régimen”.2
Assim sendo, dedicarei o próximo apartado ao estudo das diferentes 
conjunturas da imprensa na Espanha franquista. 
 
EVOLUÇÃO DA IMPRENSA, EVOLUÇÃO DO FRANQUISMO 
Para explicar essa evolução é necessário retroceder ao menos até a Guerra Civil. 
Na Guerra Civil além da frente bélica, existiu outra, não menos importante: a frente 
 
1 SINOVA, J., La censura de Prensa durante el franquismo, Espasa Calpe. Madrid, 1989, p. 17. 
2 SINOVA, J., op.cit, p.162. 
 
 
32 
jornalística. A imprensa e a rádio foram utilizadas como meios de propaganda com tal 
intensidade que se pode falar de uma guerra jornalística entre os bandos “franquista” e 
“frentepopulista”.3
Em 19 de julho de 1936, um dia depois de iniciada a guerra, declarou-se a 
censura prévia na zona sob o controle da República e nove dias depois o bando 
sublevado fez a mesma coisa. De imediato, deixaram de ser publicados os jornais 
considerados hostis nas duas zonas e expropriam-se os primeiros periódicos. No caso 
do ABC é paradigmático: foi editado simultaneamente em Madri, administrado pelas 
autoridades da República; e, em Sevilha, foi publicado para defender a causa dos 
sublevados. É, portanto, o mesmo periódico, mas com duas concepções políticas e 
ideológicas antagônicas. Nesse contexto, o bando Nacional aprovou a “Lei de Prensa” 
de 1938 que passarei a explicar mais adiante. 
 Mas também no âmbito internacional podemos observar essa 
batalha informativa com a chegada de muitos correspondentes de guerra a um ou 
outro bando, inclusive de um mesmo jornal. Exemplo disso, encontra-se nos jornalistas 
do New York Times. Um desses jornalistas, afim à causa franquista, enviou crônicas que 
contradiziam aquelas escritas por seu colega destinado à zona republicana. 
Nas duas zonas instalou-se, portanto, um modelo de aproveitamento do 
sistema informativo para defender seu conceito de Estado, mas de formas muito 
diferentes. No bando franquista consolidou-se um sistema centralizado com uma 
hierarquia bem estabelecida que obedeceu à lógica da guerra e ao objetivo único de 
ganhá-la, dessa forma, suas mensagens apresentavam uma uniformidade. É um 
discurso diáfano que foi orientado somente em uma direção: exaltação do Exército, 
integração da religião na vida diária, e a consagração de um Estado fascista. 
No bando republicano, ao contrário, existiam demasiadas concepções 
diferentes de Estado procedentes dos distintos partidos e sindicatos que apoiavam ao 
regime, que produziu uma desorientação informativa no bando republicano, em que 
cada setor atuou segundo suas próprias convicções. Enfrentaram-se, portanto, dois 
sistemas informativos contrapostos que, puderam denominar-se “lo contradictorio 
frente a lo compacto”.4
 
3 SÁNCHEZ ARANDA, J.J. y BARRERA DEL BARRIO, C., Historia del periodismo español, desde sus orígenes 
hasta 1975, Pamplona, EUNSA, 1992, p.357. 
 
4 GÓMEZ MOMPART, J. L. y TRESSERRAS, J.M., La reorganización del sistema informativo durante la 
guerra, in: Historia de los medios de comunicación en España, Ariel Comunicación, Madrid, 1989, p. 170. 
 
 
33 
Concluída a guerra, o governo de Franco manteve a “Lei de Prensa” que 
supunha um controle total da atividade jornalística. Ao início, a imprensa ficou sob o 
controle e a influência da “Falange”, que não só tentou controlar as publicações, mas 
também aos profissionais do periodismo. Em 1941, criou-se a “Escuela Oficial de 
Periodistas” na que foi imprescindível, para ingressar, ser militante da “Falange” 
espanhola y de las JONS. 
Após terminar a II Guerra Mundial iniciou-se um período de isolamento 
internacional. Aprovou-se o “Fuero de los Españoles”, em 1945, que em seu artigo 
número 12 manifestava: “Todo español podrá expresar libremente sus ideas mientras 
no atenten a los principios fundamentales del Estado”. Esse último indicava que tudo 
continuaria igual com respeito à liberdade de imprensa. 
Em 1951, Franco remodelou seu governo e foi se abandonando o referente 
formal do fascismo pelo modelo nacional-católico e isso teve consequências também 
na política de imprensa franquista. Criou-se, então, o Ministério de Informação e 
Turismo, a frente do qual se situou Gabriel Arias Salgado, que anunciou um possível 
aperfeiçoamento da “Lei de Prensa” de 1938, mas quando abandonou o cargo, após 11 
anos, o esboço da nova lei não tinha passado da fase de anteprojeto. Finalmente, em 
1962, e já em pleno processo de industrialização e recuperação econômica, foi 
nomeado ministro de Informação e Turismo Manuel Fraga Iribarne, que aprovaria, em 
1966, uma nova “Lei de Prensa”, que supunha uma maior flexibilização e liberalização. 
Mas essa maior liberalização não significou uma liberdade de imprensa plena, já que 
melhor foram os resultados das novas exigências do regime que fizeram necessário um 
controle mais sutil da política informativa. Mas não adiantemos conclusões e 
continuemos caminhando passo a passo nesta análise da evolução da imprensa 
franquista na qual, como já mencionei, possuem um lugar destacado as Leis de 
Imprensa de 1938 e 1966 para se entender esse processo. 
LEI DE IMPRENSA DE 1938 VERSUS LEI DE IMPRENSA DE 1966 
A Lei de Imprensa de 1938 instaurou a censura prévia, e deixou bem claro em 
seu preâmbulo qual seria a função da imprensa: 
 
[...] transmitir al Estado las voces de la nación y comunicar a ésta las 
órdenes y directrices del Estado y de su Gobierno, siendo la Prensa

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